Lênin e a teoria acerca do imperialismo
Alessandro de Moura
INTRODUÇÃO
Apresentamos
aqui elementos centrais do livro Imperialismo, fase superior do capitalismo de
autoria de Vladimir I. Lênin, publicada em 1916. Este livro elaborado por Lênin
é um dos mais importantes aportes para compreensão marxista acerca do imperialismo. A crise internacional em
curso, bem como os conflitos no Oriente Médio, acabam por fazer valido
recuperar suas teses centrais.
Após a derrubada do
muro de Berlim, e a dissolução da URSS, e logo, da burocracia stalinista em
meio à burguesia, por meio de uma fusão retrograda, chegou-se a comemorar o fim
da história. O fim da bipolaridade (E.U.A X URSS) inauguraria uma nova era de
“paz social”, que seria garantida pela governança UNIPOLAR sob direção
estadunidense. Os E.U.A adentra à uma nova etapa de sua consolidação como potência internacional.
Busca estender seus domínios aos território antes hegemonizados pela extinta
U.R.S.S. Dentro dessa nova investida enquadram-se as ações dos governos
norteamericanos para redesenhar o Oriente Médio por meio de uma ofensiva
guerrilherista. Ao mesmo tempo, a nova posição
conquistada permitia aos governos imperialistas dar inicio a uma nova etapa de
neocolonização do Oriente sob a cobertura da ONU e da OTAN.
A ofensiva
imperialista sobre territórios orientais não se daria sem conflitos armados,
como a Guerra do Golfo (1991-1998). Os assassinatos em massa de civis,
violência militar contra a classe trabalhadora do oriente médio, estupros e
demais formas de abuso sobre a população, instaurava condições sociais
caóticas. A classe trabalhadora ficava entre a invasão imperialista e a
violência das classes dominantes locais com suas milícias particulares.
Os atentados de 11 de
setembro de 2001, contra as Torres Gêmeas do World Trade Center, em Nova Iorque , e contra
o Pentágono, em Virgínia são desdobramentos trágicos das disputas entre
burguesias. Os atentados que chocaram a humanidade, trazendo grandes perdas,
eram parte constituintes dos ajustes das classes dominantes. De forma mais
profunda, os atentados evidenciavam a debilidade imperialista em exercer
domínio sobre aliados e inimigos do imperialismo Ocidental. Frente a isso, os
Estados Unidos e seus aliados recorrerem a níveis cada vez maiores de coerção,
o que se vê refletido em seu unilateralismo e na tendência crescente ao
militarismo no terreno político internacional.
Buscando assegurar os
interesses imperialistas no oriente médio, sobretudo o domínio das jazidas de
petróleo, mas com discurso de guerra “contra o terrorismo” e “ataque
preventivo” em 2001 invadem o Afeganistão, foguetes e bombas são lançados sobre
suas principais cidades, hospitais, mesquitas e aldeias civis. No dia 7 de
Outubro de 2001, dezenas de mísseis Tomahawk foram disparados por aviões,
navios e submarinos norte-americanos e ingleses contra as principais cidades do
país. Esta era a "Operação Duradoura". Em 2003 tem-se nova invasão do
Iraque.
Em meio a estas
guerras a classe trabalhadora continua sendo a mais prejudicada. São milhares
de assassinatos e os casos de violação de direitos humanos. A crise econômica
que aflorou em 2008 gerou crise profunda na dominação estadunidense no Oriente
Médio. Sua hegemonia segue debilitada. A primavera árabe marca o inicio de uma
nova etapa histórica.
Harvey
(2003), afirma que o giro belicista dos EUA efetiva-se
no marco da perdida hegemonia desse país. A premissa da economia dos E.U.A. como
motor mundial da acumulação de capital acabou por conferir base material para sua
posição guardião de “uma ordem internacional aberta ao comércio, ao
desenvolvimento econômico e a rápida acumulação de capital”. (pp. 57/ 58). Assim poderia diferenciar-se do
“velho” imperialismo europeu, ocultando “a ambição imperial sob o manto de um universalismo abstrato” (p. 54). O fato é que nos últimos anos os EUA tem levado o bruto de sua
capacidade produtiva fronteiras a fora, sobretudo ao sudeste asiático. E nesse interím que Harvey define o conceito de acumulação por espoliação
como a utilização dos métodos de acumulação primitiva que não criam um novo
sistema, progressivo frente ao anterior, mas sim para manter o atual,
para fazer com que os setores mais pobres dos países mais pobres sejam os que
paguem os custos das crises de sobre-acumulação de capital.
Também
Harvey toma como centrais muitas da teses apresentadas por Lênin em “O
imperialismo, fase superior do capitalismo. A obra de Lênin, que discutiremos
agora foi uma elaboração escrita em meio a uma situação de dura censura
czarista, Lênin anuncia que se restringirá a abordar a emergência da época
imperialista concentrando este debate em seus aspectos econômicos fundamentais,
sobre as relações entre os Estados, e menos nos efeitos trazidos para a relação
entre as classes. Nas palavras do próprio Lênin no prefácio: “o imperialismo
é o prelúdio da revolução socialista".
Entretanto,
mesmo com esta limitação forçada pelas circunstâncias, esta sintética obra
elaborada por Lênin é um divisor de águas no movimento revolucionário internacional.
Não é apenas uma obra econômica, mas a síntese de uma análise das
transformações do capitalismo que balizou todos os combates políticos
fundamentais dados durante o processo de fundação da III Internacional, e o
combate com a visão apologética do desenvolvimento do capitalismo típica de
Kautsky e dos reformistas, que materializavam a degeneração da II Internacional
e dos que aderiram à Internacional (dois e meio) “2 ½”. Lenin, a partir das
definições sintetizadas no Imperialismo pôde chegar à conclusão lapidar
de que a mudança de época que teve lugar na virada do século XIX para o século
XX se materializa como a abertura de uma época de “crises, guerras e
revoluções”. Esta caracterização da época que se estende até nossos dias está
na base de toda a orientação assumida pelos quatro primeiros Congressos da III
Internacional, que são os que reivindicamos, antes da sua burocratização.
Sem a
reflexão sobre o imperialismo, não seria possível aos revolucionários russos adotar
uma posição correta sobre a revolução russa, sobre a luta contra o
social-chovinismo da social-democracia alemã, e definir todas as importantes
orientações de estratégia e tática, que permitiram os acertados combates de
Lênin e Trotsky contra as pressões putchistas em um momento e de adaptação
passiva em outro, existentes no interior da III Internacional que não passaram
à prova dos grandes acontecimentos de 1921 e 1923 na Alemanha.
Por
meio das teses de Lênin em o Imperialismo pode-se compreender muitos dos
elementos dos contornos da crise capitalista internacional que se desenvolve
hoje. Conjuntura estrutural que reforça a tese de que ainda vivemos uma época
de crises, guerras, e também revoluções. Desta forma, apresentaremos definições
fundamentais acerca dos principais elementos que constituem para Lênin os mais
fundamentais apontados na obra O Imperialismo:
5. o
termo da partilha territorial do mundo entre as potencias capitalistas mais
importantes. O imperialismo é o capitalismo em sua fase de desenvolvimento que
ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, adquiriu
marcada importância a exportação de capitais, começou a partilha do mundo pelos
trusts internacionais e terminou a partilha de toda a terra entre os países
capitalistas mais importantes. Inaugura-se o momento da dominação dos Estados
rentistas.
I – A concentração da produção dos
monopólios
O
primeiro capítulo do livro trata do salto de qualidade de tendências inerentes
ao capitalismo operadas na virada do século XIX para o XX, das quais a fase
imperialista deriva. O desenvolvimento da indústria, o processo de concentração
extremamente rápido da produção em empresas cada vez
mais importantes eram algumas destas tendências fundamentais
apontadas por Lênin. Para demonstrá-las o autor recorre uma série de dados
sobre a concentração crescente da produção, gerando alguns dos grandes
conglomerados em países como a Alemanha, Inglaterra e EUA comparando-os na
década de 80 do século XIX com os da primeira década do século
XX. Como Lênin aponta:
Na Alemanha, por
exemplo, em cada 1000 empresas industriais, em 1882, 3 eram grandes empresas,
quer dizer, empregavam mais de 50 operários assalariados; em 1895 eram 6, e 9
em 1907. De cada 100 operários correspondiam-lhes, respectivamente, 22, 30 e
37. Mas a concentração da produção é muito mais intensa do que a dos operários,
pois o trabalho nas grandes empresas é muito mais produtivo, como indicam os
dados relativos às máquinas a vapor e aos motores elétricos. (...)Noutro país
avançado do capitalismo contemporâneo, os Estados Unidos da América do Norte, o
aumento da concentração da produção é ainda mais intenso. Neste país, a
estatística considera à parte a indústria, na acepção estrita da palavra, e
agrupa os estabelecimentos de acordo com o valor da produção anual. Em 1904,
havia 1900 grandes empresas (num total de 216 180, isto é, 0,9 %), com uma
produção de um milhão de dólares e mais; estas empresas empregavam 1 400 000
operários (num total de 5 500 000, ou seja, 25,6 %), e o valor da produção
ascendia a 5 600 milhões (em 14 800 milhões, ou seja, 38%). Cinco anos depois,
em 1909, os números correspondentes eram: 3 060 empresas (num total de 268 491,
isto é, 1,1%) com 2 milhões de operários (num total de 6 600 000, isto é,
30,5%) e 9 000 milhões de produção anual (em 20 700 milhões, isto é, 43,8%).
A
partir destes dados, Lênin chega a uma das definições mais fundamentais desta
obra, ao notar como quanto mais intensa for a competição capitalista, mais
profundamente operam as tendências à concentração da produção, o que por sua
vez, abre caminho para a formação dos monopólios. Desta maneira, se pode definir que uma das principais características da
emergência da época imperialista é a substituição do capitalismo de livre
concorrência, em que capitalistas isolados entre si atuavam produzindo
mercadorias para serem vendidos em mercados igualmente isolados, pelo
capitalismo baseado na concentração da produção que atinge um nível tão
exacerbado, que dá lugar ao advento dos monopólios. Esta tendência já
havia sido analisada embrionariamente por Marx. Mas a sua concretização como
base fundamental do capitalismo é definida por Lênin, que pôde ver em forma
mais acabada a partir do desenvolvimento do capitalismo o que Marx vira em seus
contornos incipientes.
Decorrente
das grandes navegações e do mercantilismo desenvolve-se a livre concorrência na
fase inicial de desenvolvimento da produção capitalista. Com o desenvolvimento
da indústria desenvolve-se também acirradas disputas entre as burguesias
industriais. Estas buscam organizar-se para disputar mercados de forma
organizada. Desta forma, Lênin analisa que o modo de produção capitalista
passou por importantes transformações no final do século XIX, primeiro sob as
determinações do desenvolvimento dos cartéis, que se originaram a partir da
necessidade dos grandes capitalistas estabelecerem determinados acordos entre
si para poderem sobreviver às crises, que com o próprio avanço do capitalismo
se tornam mais recorrentes. Depois
os cartéis passaram a ser parte orgânica da economia capitalista, sobretudo dos
países avançados, como elementos que passam a estruturar a base econômica da
sociedade. Esquematicamente, Lênin define o desenvolvimento do capitalismo, e
do processo de concentração da produção, que deriva na proliferação dos cartéis
responsáveis pelo nascimento dos monopólios nas seguintes fases:
1)
Décadas de 1860 e 1870, o grau superior, culminante, de desenvolvimento da
livre concorrência. Os monopólios não constituem mais do que germes quase imperceptíveis.
2)
Depois da crise de 1873, longo período de desenvolvimento dos cartéis, os quais
constituem ainda apenas uma exceção, não são ainda sólidos, representando ainda
um fenômeno passageiro.
3)
Ascenso de fins do século XIX e crise de 1900 a 1903: os cartéis passam a ser uma das
bases de toda a vida econômica. O capitalismo transformou-se em imperialismo.
A
partir do surgimento do imperialismo, a concorrência transforma-se em monopólio. Isso
resulta, como aponta Lênin em diversas passagens de seu texto, em um
“gigantesco progresso na socialização da produção”, e nos avanços tecnológicos.
Isso porque a partir da concentração da produção permite-se saber, por exemplo,
“uma estimativa aproximada de todas as fontes de matérias-primas de um país, ou
de vários países de todo mundo” questão que se estende para as inovações
tecnológicas. Neste sentido:
O capitalismo, na
sua fase imperialista, conduz à beira da socialização integral da produção nos
seus mais variados aspectos; arrasta, por assim dizer, os capitalistas, contra
sua vontade e sem que disso tenham consciência, para um novo regime social, de
transição entre a absoluta liberdade de concorrência e a socialização completa.
A produção torna-se social mas a apropriação continua privada. Os meios de produção
permanecem propriedade privada de um pequeno número de indivíduos. O quadro
geral da livre concorrência, que se reconhece nominalmente subsiste e o jugo
exercido por um punhado de monopolistas sobre o restante da população torna-se
cem vezes mais pesado, mais sensível, mais intolerável.
No
âmbito da classe dominante isso significa que as burguesias enfrentam-se
brutalmente, chocando-se monopólios contra monopólios. Voltam-se contra os
pequenos e médios produtores, fixam preços de matérias-primas de modo a
aniquilar outros competidores, impõem sanções ao negar-se a fornecer insumos.
Impedem que os capitalistas menores lhe façam concorrência. Fusionam-se para
ampliar o seu domínio sobre os mercados. Os monopólios buscam intensificar a
exploração para terem maiores lucros, demite-se e fecham fábricas.
Assim,
os monopólios não eliminam a concorrência. Pelo contrário, a exacerbam e elevam
a um grau máximo, que envolve não somente as frações da classe burguesa no
interior de cada país, mas de maneira feroz eleva a competição entre os
Estados. Isso porque a base da época
imperialista constitui o aprofundamento, sem precedentes até então, da
contradição existente entre a crescente socialização das relações de produção,
e a apropriação privada – cada vez mais concentrada nos monopólios, isto é em
menos e mais concentrados grupos capitalistas, que se apropriam do grosso da
riqueza produzida. Vemos a agudez desta definição quando se
constata que cerca de 70 famílias dominam a economia do país mais rico do
mundo, os EUA. E que a saída que os imperialismos dão à crise capitalista é uma
tentativa de concentrar ainda mais esta riqueza, em detrimento da imensa
maioria dos trabalhadores e dos povos dos países centrais.
Desta
forma, a utopia de uma sociedade baseada em pequenos e médios produtores é
engolida pela ferocidade dos monopólios, que ataca a estes e aos trabalhadores.
Ainda, de acordo com Lênin, os monopólios também não eliminam a tendência à
queda da taxa de lucro, que por sua vez intensifica as disputas. Com a queda
dos lucros tem-se a decomposição dos monopólios, que leva ao desaparecimento de
determinados monopolistas. A competição fratricida e disputa de mercados,
rebaixamento dos preços leva à diminuição de lucros. Com isso, na produção, os
capitalistas intensificam a exploração do trabalho, reduzem salários e demitem
trabalhadores. Estas medidas intensificam as disputas entre capital e trabalho,
incrementa-se a luta de classe, concorrência sobre o preço da força de
trabalho.
Por
isso, dialeticamente, ao mesmo tempo em que o imperialismo promove uma
socialização superior das forças produtivas, é marcado também pelo incremento
do parasitismo dos Estados imperialistas e suas burguesias, e pela “putrefação”
típica desta fase superior do capitalismo.
As
condições de organização superior da produção trazida pelos monopólios
inauguram as condições que tornam possíveis do ponto de vista das forças
produtivas da superação do próprio capitalismo. Os monopólios rompem as
fronteiras nacionais do ponto de vista das forças sociais que engendram para
produzir, ao criar uma escala de socialização das forças produtivas imensamente
mais avançadas que na época do capitalismo de livre concorrência. A contradição
disso é que a burguesia se incumbe de defendê-las, para garantir a continuidade
de sua existência como classe dominante.
Segundo
a tese de Lênin, a internacionalização do capital a um nível nunca antes visto,
produto do caráter expansivo por definição do capitalismo e exacerbado na época
imperialista, transforma o mundo todo em um palco de guerras comerciais,
monetárias, que podem chegar ao seu ponto culminante com os enfrentamentos
bélicos, que arrastam a humanidade a sofrimentos inauditos. Competem entre si
de uma forma tal que a burguesia lança a humanidade em guerras e misérias
inauditas. Como produto disso, a partir de então as guerras que marcam o
advento inquestionável da época imperialista são agora mundiais, envolvendo as
principais potências, e estendendo seus efeitos para o conjunto do mundo
semicolonial. Aprofundaremos isso ao tratar da partilha do mundo na época
imperialista.
II – Os Bancos, sua nova função e a dominação da oligarquia financeira
O
papel do crédito e dos bancos no capitalismo de livre-concorrência
restringia-se, grosso modo, a um intermediário de pagamentos. Quando a
concentração da produção tem lugar, o volume de capital necessário para
alimentar os monopólios aumenta. O crédito amplia sua importância. O lucro dos
grandes bancos aumenta igualmente.
A
emergência de operações baseadas em capitais futuros também se amplifica, ainda
que de maneira completamente distinta da proliferação do capital especulativo
típica da segunda metade do século XX. Desta maneira, ao monopólio produtivo
segue-se o surgimento do monopólio bancário. Lênin ja apontava na referida obra
que na fase imperialista os bancos deixam de ser meros intermediários. Passam a
subordinar a si através de um punhado de operações a sociedade como um todo.
Conhecem o segredo comercial das indústrias. As dominam, controlando o crédito às
empresas. Passam a determinar sua sorte ao se transformarem em fornecedores de
capitais. Através da contabilidade dos grandes bancos se conhece a
contabilidade geral de toda a classe capitalista, bem como de patrões médios e
dos trabalhadores. São os que conhecem materialmente o estado geral da economia
não apenas de determinados ramos da produção, mas de toda uma nação, e em
nossos dias, pela interligação da rede bancária, de vários países do mundo.
Esta
transformação do papel dos bancos, exacerbada ainda mais em nossos dias, é a base
da fusão do capital industrial com o capital bancário, inaugurando o domínio
inquestionável do capital financeiro. Esta é uma segunda definição chave do
Imperialismo, de suma importância, visto que isso opera agudizando ainda mais a
dominação dos monopólios, através da compra de ações de outros grandes bancos e
conglomerados produtivos, abrindo uma época de intensa promiscuidade entre os
altos executivos bancários – pelo conhecimento do estado da economia e dos
vários monopólios que detém – e os membros dos altos escalões dos governos. De
acordo com Lênin:
“A união pessoal
dos bancos e das indústrias é completada pela “união pessoal” de uns e outros
com o governo. Lugares nos conselhos fiscais, escreve Jeidels, são livremente oferecidos
a personalidades do Estado que possam facilitar (!!) consideravelmente as
relações com as autoridades... Geralmente no conselho fiscal de um grande banco
encontra-se um membro do Parlamento ou membro da municipalidade de Berlim”.
Portanto, a estruturação e, por assim dizer, e o pôr em marcha dos grandes
monopólios capitalistas, prosseguem a todo vapor por todos os meios “naturais”
e “sobrenaturais”. Daí resulta uma divisão sistemática do trabalho entre
algumas centenas de reis das finanças da moderna sociedade capitalista”.
Esta é
outra característica que assumiu traços importantes hodiernamente. Nos anos 80,
auge da restauração burguesa na Europa Ocidental, se discutia abertamente que o
verdadeiro homem de decisões do governo norte-americano não era Ronald Reagan,
mas o diretor da Goldman Sachs. Este padrão se manteve sucessivamente. Se em
meio à crise capitalista de 2008 os altos executivos de agências que quebraram
como Fannie Mae, ou da própria Goldman Sachs foram agraciados com indenizações milionárias
por “perderem seus empregos”, enquanto as casas da população eram tomadas pelos
bancos. Os altos executivos carregam segredos comerciais de grandes monopólios
e do próprio Estado, produto de suas relações carnais com os governos
imperialistas. Vemos na crise da UE o mesmo: a Grécia é barbaramente
semicolonizada, lança-se a juventude espanhola â altissimos niveis de
desemprego, e, no entanto, os grandes conglomerados bancários seguiram
recebendo capital proveniente do Estado, ou seja, impostos que a população
paga, e este montante sequer é repassado à população endividada sob a forma de
crédito. Os bancos “preferem” recompor seus estoques de capitais, sob o
beneplácito dos governos.
Desta
maneira, a definição do Estado como balcão de negócios da burguesia assume uma
característica ainda mais determinante que quando Marx cunhou esta definição no
Manifesto Comunista. Faz-se mais atual que nunca a caracterização de Lênin de
que “o capital financeiro concentrado em algumas mãos e exercendo um monopólio
de fato, obtém da constituição de firmas, da emissão de títulos, dos
empréstimos do Estado, etc, enormes lucros, cada vez maiores, consolidando o
domínio das oligarquias financeiras onerando toda a sociedade com um tributo em
benefício dos monopolistas”.
Esta
oligarquia financeira que assume um lugar predominante na apropriação da
riqueza produzida é a mais parasitária e usurária. Lucra enormemente mesmo em
momentos de grande crise, podem acessar um volume de capital muitas vezes
superior a sua renda real, através da especulação. Esta oligarquia financeira,
que já em 1916 Lênin indica que tem na especulação sobre os terrenos grande
parte da origem de sua riqueza, é a materialização do caráter parasitário que
assumem os próprios Estados imperialistas. Assim, a supremacia do capital
financeiro significa a hegemonia dos que vivem dos rendimentos e do oligarca
financeiro: significa uma situação privilegiada de um pequeno número de Estados
financeiramente “poderosos” em relação a todos os outros. Assim, a partir da
transformação do caráter dos bancos, Lênin conclui, portanto que o século XX
marca o ponto de viragem em que o antigo capitalismo dá lugar ao novo, em que o
domínio do capital financeiro substituiu o domínio do capital em geral.
III – A exportação de capitais
Lênin inicia este tópico
definindo que o que caracterizava o antigo capitalismo, onde reinava a livre
concorrência era a exportação de mercadorias. O que caracteriza o capitalismo
atual é a exportação de capitais.
Isso significa que a partir do processo
que elevou a produção de mercadorias ao seu grau mais elevado, transformando o
trabalho também em mercadoria, cuja base se deu de maneira não linear, mas
desigual entre ramos de produção e países, muitas vezes aos saltos, resultou em
uma divisão internacional do trabalho. Esta divisão implicou na formação de
monopólios em todos os países de capitalismo tecnica e economicamente mais
avançado, e em seguida de países muito ricos, que possuíam excedentes de
capitais.
Desta
forma, ao contrário da competição entre os Estados no capitalismo mercantil, em
que a chave era a dominação de colônias, agora se tratava de uma disputa por
mercados para a realização deste capital acumulado em um punhado de nações.
Ainda que em 1916 Lênin assinale que os imperialismos ainda disputavam entre si
pela dominação colonial, a chave passa a ser a dominação dos mercados mundiais,
e a exportação de capitais. Esta é uma tendência que ganha contornos mais
precisos no decorrer do século XX, já que os EUA, que se constituem como o imperialismo
por excelência não chegaram a estabelecer uma colônia duradoura, como a França,
que mantém até hoje colônias africanas, ou a Inglaterra, que dominou metade da
África e do Oriente Médio até a metade do século XX. Mas foi uma imensa
exportadora de capitais, e desde o início de sua decadência histórica na década
de 70, uma devoradora de capitais mundiais (vide o financiamento que China
realiza comprando títulos de sua divida pública), e exportadora de capitais
dedicados aos investimentos diretos neste e outros países asiáticos que se
tornaram alvos das grandes “deslocalizações” dos monopólios que se dirigem a
estes países, em busca de uma extração de mais-valia superior, e melhores condições
de realização de capitais.
Um
exemplo utilizado por Lênin é a construção das ferrovias de São Paulo,
financiada com capitais ingleses, franceses, belgas, etc. “Deste modo”, diz
Lênin, “o capital financeiro lança, permita-se a expressão, as suas redes
a todos os países do mundo.(...) Os países exportadores de capitais partilham
(no sentido figurado da palavra) o mundo entre si. Mas o capital financeiro
conduziu também à partilha direta do globo”. Esta competição entre os
países imperialistas para dominar os negócios e mercados de países
semicoloniais define a partilha do mundo. Mas esta partilha, concretizada na
exportação de capitais imperialistas, não se dá apenas sob a forma de
investimento direto, isto é na produção e na construção de grandes obras nos
países semicoloniais. Dá-se também sob a forma de empréstimos a juros
exorbitantes.
IV – A partilha do mundo entre os
grupos capitalistas e as grandes potências
A
instauração dos monopólios leva à partilha das riquezas nacionais entre estes
setores. Porém, como define Lênin, no capitalismo o mercado interno liga-se
necessariamente ao mercado externo, ao mercado mundial, cada vez mais
interdependente. E à medida que aumentava a exportação de capitais se ampliavam
as relações com as “zonas de influência” dos maiores conglomerados
internacionais, impulsionando a formação de cartéis internacionais, que atinge
graus superiores a qualquer momento histórico anterior.
Um
exemplo a que Lênin recorre são os acordos entre os EUA e a Alemanha em 1907
para a partilha de grandes ramos de produção por eles dominados em escala
internacional, materializada nos pactos firmados entre os grandes conglomerados
de energia elétrica alemão e norte-americano, que acordam os investimentos que
cada um farão em cada país semicolonial. Esta mesma tendência é observada
também no setor petroleiro, que em 1905 estava dividida entre dois grupos
financeiros, ligados por sua vez ao Deutsche Bank e o outro ao milionário
Rockefeller. Lênin analisa como estas duas grandes corporações estendem seus
tentáculos mundo afora, demonstrando claramente que a sua relação estava
dialeticamente determinada por acordos e disputas sobre a partilha do mundo.
Estas
relações entre os grupos capitalistas refletem a disputa e a partilha do mundo
entre as grandes potências. Neste momento mesclam-se as disputas por colônias,
com as disputas por mercados, dando vazão de maneira infinitamente superior ao
capitalismo mercantil, à internacionalização da produção, e à competição por
mercados. Lênin demonstra como as colônias inglesas no Egito e na Índia são
alvo de competição interimperialista. “O capitalismo transformou-se num
sistema universal de subjugação colonial e de estrangulamento financeiro da
imensa maioria da população do planeta por um punhado de países avançados. A
partilha desse saque efetua-se entre duas ou três potências rapaces, armadas
até os dentes (América, Inglaterra, Japão), que dominam o mundo e arrastam todo
o planeta para a sua guerra pela partilha do seu botim.”
(p. 11).
Mas o
desenvolvimento da subordinação imposta pela dominação imperialista aos demais
países do globo através da dominação de mercados inaugura uma série de
categorias de países marcados por relações intermediárias de dependência, e
pelas as semicolônias. Podemos afirmar que o pós II Guerra Mundial agudizou
esta forma de dominação imperialista, em detrimento de colônias, tornando-a a
via de dominação predominante desta época. Inclusive parte da política dos EUA
na década de 50 frente ao início do movimento nacionalista árabe foi insuflar
estes movimentos contra as metrópoles francesas e inglesas para debilitar estas
potências competidoras, e abrir estes mercados para a exploração
norte-americana.
Uma
questão importante que emerge no que se remete à relação entre os Estados no
imperialismo é a constatação de Lênin de que em 1914, no ano em que se inicia a
I Guerra Mundial, a partilha do mundo entre as nações imperialistas já estava
feita. E para que uma nova partilha se desse, implicaria necessariamente em
grandes conflitos, em crises e guerras. E, como a própria experiência da
revolução russa havia provado em 1917, a guerra é parteira de revoluções, pois
de um só golpe aniquila as ilusões de desenvolvimento pacífico e gradual, e
arrasta as massas para imensos sofrimentos. Neste sentido, Lênin não nega em
absoluto a questão de que novas partilhas do mundo entre as potências possam
emergir. Mas trava um combate incansável contra os que superficialmente
acreditam que esta poderia dar-se a partir da diplomacia, de um concerto mais
equitativo entre as nações, como sugerem todas as expectativas utópicas e
reacionárias kantianas que originaram a Liga das Nações (e em nossos dias a
ONU). Demonstra como a decadência de uma potência hegemônica, desembocou na
disputa por uma nova partilha do mundo, com a I Guerra Mundial. Lênin não pôde
vivenciar a II Guerra Mundial, mas a análise legada no Imperialismo
permitiu que Trotsky formulasse a orientação revolucionária correta em relação
a esta, que tinha como missão estabelecer uma nova partilha, resolvendo desta
forma esta questão que a I Guerra apesar da imensa destruição promovida não
havia podido realizar. Como destaca Lênin
“Dezenas de
milhões de cadáveres e de mutilados vítimas da guerra de 1914 – essa guerra
feita para decidir que grupo de bandoleiros financeiros, o inglês ou o alemão,
deveria receber uma maior parte do saque -, e depois estes dois tratados
de paz, abrem os olhos, com uma rapidez até agora desconhecida, a milhões e
dezenas de milhões de homens atemorizados, oprimidos, iludidos e enganados pela
burguesia. Em conseqüência da ruína mundial, fruto da guerra, cresce, pois a
crise revolucionária mundial, que, por mais longas e duras que sejam as
vicissitudes que atravesse, não poderá terminar senão com a revolução
proletária e sua vitória”.
Cabe destacar ainda que nas crises e nas guerras abrem-se
novas problemáticas sociais, novas possibilidades, os problemas sociais
agudizados podem levar a questionar elementos do status quo que
até então permaneciam aceitáveis, vide a primavera árabe, crise na Europa e
EUA, e o surgimento de novos movimentos, ainda sem uma estratégia para tomar o
poder, mas sintomas importantes da aceleração dos ritmos da situação, como é o
“Ocuppy”. Assim, as crises capitalistas devem ser encaradas como re-atualização
da época das guerras crises e revoluções. No entanto, esta definição vista de
forma laxa, fica sem nenhum conteúdo (como faz Pablo Rieznik – do PO argentino,
este tem uma visão catastrofista da perspectiva de Lênin sobre as crises). A
determinação mais profunda é que não se trata apenas de uma vontade de ver revoluções
atrás de cada processo de instabilidade econômica. É a partir disso que devemos
pensar como o texto se re-atualiza com a crise econômica mundial.
Mas os
Estados imperialistas utilizaram parte de seu capital acumulado para criar um
setor de aristocracia operária. Segundo Lênin: “É evidente que tão
gigantesco superlucro (visto ser obtido para além do lucro que os capitalista
extraem aos operários do seu próprio país) permite subornar os dirigentes
operários e a camada superior da aristocracia operária. Os capitalistas dos
países avançados subordinam-no efetivamente, e fazem-no de mil e uma maneiras,
diretas e indiretas, abertas e ocultas”. Sobre estes setores se baseia a
social-democracia alemã, a II Internacional degenerada e a Internacional “2 ½”
, que combatem a política revolucionária de Lênin e Trotsky na III Internacional
antes de sua stalinização.
Assim
para sustentar-se o capitalismo monopolista e financeirizado necessita também
barganhar com uma parte da classe trabalhadora, com os sindicatos
burocratizados para que contenha as lutas proletárias. Cria-se uma relação
entre monopólios e oportunismo em setores do movimento operário, a sua
aristocracia. Entre os setores melhor assalariados, surge uma camada de
dirigentes que negociam condições melhores de salário e de vida com os
monopólios para dominar setores mais precários do movimento operário nacional e
internacional. Com isso, estes setores da aristocracia operária buscam defender
a burguesia para salvaguardar seus próprios privilégios. A aristocracia
operária é beneficiada diretamente pela dominação burguesa e a manutenção dos
monopólios. A defesa dos monopólios é a defesa de suas condições diferenciadas
de vida em relação a classe operária do próprio país e do proletariado mundial.
Estes setores têm muitas tendências a assumirem perspectivas sociais
chauvinistas “(...) o capitalismo deu agora uma situação privilegiada a um
punhado (menos da décima parte da população da terra, ou, calculando de um modo
muito generoso e muito acima, menos de um quinto) de países particularmente
ricos e poderosos que, com simples corte de cupons, saqueiam todo o mundo”.
(13).
V – Os Estados rentistas
(parasitários)
A
exportação de capitais dos países imperialistas para o conjunto do mundo não se
conforma apenas em investimentos na produção, mas em empréstimos de capital,
especulação, e empréstimos estatais, e demais operações ligadas ao capital
especulativo. Assim nascem os Estados credores e os devedores. Isso é o que
abre as perspectivas para a formação de Estados baseados em setores rentistas,
que acumulam as altíssimas somas de capital em base à exportação de capitais,
empréstimos aos demais Estados sob a pena de pagamento de juros exorbitantes,
aprofundando as tendências ao parasitismo nos países imperialistas. O volume de
capital acumulado pelos Estados imperialistas através destas operações já no
começo do século XX superava o volume adquirido pelo comércio internacional e
as atividades ligadas ao que se convenciona chamar “economia real”. Esta é a
essência do caráter parasita do imperialismo. Lênin resgatando Hobson, que
também analisa o surgimento do imperialismo, e é muito citado nesta obra
aponta:
"A Inglaterra
- diz Schulze-Gaevernitz - converte-se paulatinamente de Estado industrial em
Estado credor. Apesar do aumento absoluto da produção e da exportação
industriais, cresce a importância relativa para toda a economia nacional das
receitas procedentes dos juros e dividendos, das emissões, das comissões e da
especulação. Em minha opinião é precisamente isto que constitui a base
econômica do assenso imperialista. O credor está mais solidamente ligado ao
devedor do que o vendedor ao comprador"(5*). Em relação à Alemanha, A.
Lansburgh, diretor da revista berlinense Die Bank, escrevia o seguinte, em
1911, no artigo "A Alemanha, Estado-rentier": "Na Alemanha, as
pessoas riem-se facilmente da tendência verificada em França para se
transformar em rentier.
Mas esquecem-se que, no que se refere à burguesia, as
condições da Alemanha parecem-se cada vez mais com as da França".(6*)
- O termo da partilha do mundo e o
lugar do Imperialismo na história – crítica a Kautsky e o ultraimperialismo
É
pensando a totalidade destes elementos que Lênin afirma que “O imperialismo é a
véspera da revolução social do proletariado”. Em fevereiro de 1917, em meio a
crise economia, somada aos efeitos da primeira guerra mundial, o proletariado
russo derruba o Estado czarista. Desta forma, para Lênin a fase imperialista do
desenvolvimento do sistema capitalista é a fase que constrói bases econômica e
produtivas para a transição entre o capitalismo e o socialismo. Por isso afirma
que o imperialismo é a fase da revolução proletária. Demonstra que as forças
produtivas estão maduras para a revolução proletária e socialista. A definição
de que o imperialismo é uma época de crises, guerras e revoluções assume,
portanto, um caráter científico. Seguindo Lênin:
Primeiro: o
monopólio é um produto da concentração da produção num grau muito elevado do
seu desenvolvimento. Formam-no as associações monopolistas dos capitalistas, os
cartéis, os sindicatos e os trustes. Vimos o seu enorme papel na vida econômica
contemporânea. Nos princípios do século XX atingiram completo predomínio nos
países avançados, e se os primeiros passos no sentido da cartelização foram
dados anteriormente pelos países de tarifas alfandegárias protecionistas
elevadas (a Alemanha, os Estados Unidos), a Inglaterra, com o seu sistema de
livre-câmbio, mostrou, embora um pouco mais tarde, esse mesmo fato fundamental:
o nascimento de monopólio como conseqüência da concentração da produção.
De acordo com Lenin, a segunda fase seria marcada pela
intensificacação das disputas entre os monopólios pelo domínio sobre as
matérias-primas disponivéis.
Segundo: os
monopólios vieram agudizar a luta pela conquista das mais importantes fontes de
matérias-primas, particularmente para a indústria fundamental e mais
cartelizada da sociedade capitalista: a hulheira e a siderúrgica. A posse
monopolista das fontes mais importantes de matérias-primas aumentou enormemente
o poderio do grande capital e agudizou as contradições entre a indústria cartelizada
e a não cartelizada.
Decorrente
ds duas fases anteriores de desenvolvimento dos monopólios,inicia-se uma
terceira etapa, onde irão se desenvolver os bancos.
Terceiro: o
monopólio surgiu dos bancos, os quais, de modestas empresas intermediárias que
eram antes, se transformaram em monopolistas do capital financeiro. Três ou
cinco grandes bancos de cada uma das nações capitalistas mais avançadas
realizaram a "união pessoal" do capital industrial e bancário, e
concentraram nas suas mãos somas de milhares e milhares de milhões, que
constituem a maior parte dos capitais e dos rendimentos em dinheiro de todo o
país. A oligarquia financeira, que tece uma densa rede de relações de
dependência entre todas as instituições econômicas e políticas da sociedade burguesa
contemporânea sem exceção: tal é a manifestação mais evidente deste monopólio.
Por
fim, de acordo com Lênin, estrutura-se a quarta etapa de desenvolvimento dos
monopólios:
Quarto: o
monopólio nasceu da política colonial. Aos numerosos "velhos" motivos
da política colonial, o capital financeiro acrescentou a luta pelas fontes de
matérias-primas, pela exportação de capitais, pelas "esferas de
influência", isto é, as esferas de transações lucrativas, de concessões,
de lucros monopolistas, etc., e, finalmente, pelo território econômico em geral. Quando as
colônias das potências européias em África, por exemplo, representavam a décima
parte desse continente, como acontecia ainda em 1876, a política colonial
podia desenvolver-se de uma forma não monopolista, pela "livre
conquista", poder-se-ia dizer, de territórios. Mas quando 9/10 da África
estavam já ocupados (por volta de 1900), quando todo o mundo estava já
repartido, começou inevitavelmente a era da posse monopolista das colônias e,
por conseguinte, de luta particularmente aguda pela divisão e pela nova
partilha do mundo. De tudo o que dissemos sobre a essência econômica do-
imperialismo deduz-se que se deve qualificá-lo de capitalismo de transição ou,
mais propriamente, de capitalismo agonizante.
Neste
sentido, de acordo com Lênin, o imperialismo não pode ser entendido como uma
mera política agressiva dos países mais desenvolvidos. Ainda que implique uma
política extremamente agressiva dos imperialismos, entre si, e acima de tudo
sobre os povos dos países semicoloniais e dependentes, o imperialismo é muito
mais que uma mera orientação política. Esta apreensão vulgar e falsa do sentido
do imperialismo, muito em voga em nossos dias marcados pela deriva estratégica
da própria esquerda, deixa de lado sua essência, e implica em riscos fatais de
se acreditar que mudando a linha de governo dos países imperialistas se muda o
seu conteúdo de fundo. Isso se demonstrou concretamente quando após os anos de
governo neoconservador de Bush, ascende Obama, primeiro presidente negro, que
foi saudado por setores da centro-esquerda como uma viragem em relação á
política imperialista. O mesmo Obama agora ameaça o Irã, mantém suas tropas no
Afeganistão, interveio na Líbia, e salvou os especuladores em meio á crise
capitalista, provando que o imperialismo não é uma opção política, mas uma
determinação que define toda a atuação dos países imperialistas, que se
sobrepõe às diferenças entre governos e regimes, resultante das leis
fundamentais expostas por Lênin, que corretamente afirma:
“Sem ter
compreendido as raízes econômicas desse fenômeno, sem ter conseguido ver a sua
importância política e social, é impossível dar o menor passo para o
cumprimento das tarefas práticas do movimento comunista e da revolução social
que se avizinha. (..) O imperialism“... Não poderá a política imperialista
atual ser suplantada por outra nova, ultra- imperialista, que em vez da luta
dos capitais financeiros entre si estabelecesse a exploração comum de todo o
mundo pelo capital financeiro unido internacionalmente? Tal nova fase do
capitalismo, em todo o caso, é concebível. A inexistência de premissas
suficientes não permite resolver se é realizável ou não?o é a véspera da
revolução social do proletariado. Isto foi confirmado à escala mundial desde 1917” .
Na contramão desta concepção,
Kautsky ao invés de concluir que as leis gerais do Imperialismo arrastam a
humanidade para uma época em que, ao contrário do século XIX se esgotam
estrategicamente as perspectivas de crescimento das forças produtivas de uma
perspectiva orgânica por fora do custo de uma ampla destruição precedente das
mesmas, como havia sido a II Guerra Mundial, se pergunta:
“... Não poderá a
política imperialista atual ser suplantada por outra nova, ultra- imperialista,
que em vez da luta dos capitais financeiros entre si estabelecesse a exploração
comum de todo o mundo pelo capital financeiro unido internacionalmente? Tal
nova fase do capitalismo, em todo o caso, é concebível. A inexistência de
premissas suficientes não permite resolver se é realizável ou não?
A esta questão Lênin
respondia:
Kautsky qualifica
de ultraimperialismo ou superimperialismo aquilo que Hobson qualificava, treze
anos antes, de interimperialismo. Se excetuarmos a formação de uma nova e
sapientíssima palavra mediante a substituição de um prefixo latino por outro, o
progresso do pensamento "científico" em Kautsky reduz-se à pretensão
de fazer passar por marxismo aquilo que Hobson descreve, em essência, como
manifestação hipócrita dos padres ingleses. Depois da guerra anglo-boer era
natural que esta respeitável casta dedicasse os seus maiores esforços a
consolar os filisteus e operários ingleses, que tinham sofrido um bom número de
mortos nas batalhas sul-africanas e tiveram de pagar impostos elevados para
garantirem maiores lucros aos financeiros ingleses. E que melhor poderia
consolá-los do que a idéia de que o imperialismo não era assim tão mau, que se
encontrava muito próximo do inter ou ultraimperialismo, capaz de assegurar a
paz permanente. Quaisquer que fossem as boas intenções dos padres ingleses ou
do melífluo Kautsky, o sentido objetivo, isto é, o verdadeiro sentido social da
sua "teoria" é um e só um: a consolação arqui-reacionária das massas
com a esperança na possibilidade de uma paz permanente sob o capitalismo,
desviando a atenção das agudas contradições e dos agudos problemas da
atualidade, para a dirigir para as falsas perspectivas de um pretenso novo o
ultraimperialismo- futuro. Para além do engano das massas, a teoria
"marxista" de Kautsky nada mais contém.
Ou
seja, de acordo com o autor, a perspectiva reivindicada por Kautsky faz com que
sustente uma análise superficial segundo a qual o imperialismo seria meramente
uma orientação política agressiva das grandes potências, passível de ser
substituída. Kautsky propõe ainda a superação do imperialismo não a partir da
revolução proletária, com o faz Lênin, mas sim a partir da transformação do
imperialismo em
superimperialismo. Isso na prática significaria que para
Kautsky seria possível acabar com a concorrência capitalista...sem acabar com o
capitalismo e a burguesia.
Esta
concepção é a que está na base na degeneração da II Internacional, que levou
Kautsky de referência marxista a ser referido como um “renegado” que assume em
1918 o cargo de vice-ministro das relações exteriores na Alemanha, abdicando
completamente de uma estratégia revolucionária, e contribuindo para promover a
derrota da revolução alemã em 1919, e posteriormente em 1923. Crer que a
organização do capitalismo agora em base aos monopólios extinguiria a
competição capitalista, pois esta concentração avançaria continuamente e sem
contradições até haverem monopólios mundiais totais dos ramos de produção, é
crer que o capitalismo pode levar adiante suas tendências em forma absoluta,
até as últimas consequências. E isso constitui uma visão completamente
anti-marxista, pois o fundamento do capitalismo é o lucro e sua apropriação
privada, e este não pode existir por fora da competição entre os capitalistas.
E estes capitalistas integram burguesias nacionais, ligadas a Estados, que
competem entre si.
BIBLIOGRAFIA
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5 comentários:
Boa!
O pt e o sindicalismo brasileiro compõem o status quo imperialista.
estou precisando de um texto sobre a fase superior do capitalismo e as transformações entre 1875 a 1991 vc poderia me ajudar
Muito bom, me ajudou muito!
Grande!
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