O PCB, seu bolivarianismo e o chamado
envergonhado a votar em Dilma:
para além da miséria da política e da
política da miséria
Alessandro de Moura
Come abacaxi, mastiga perdiz.
Teu dia esta prestes, burguês.
Vladimir Maikovsky, 1917
Partimos do pressuposto que
vivemos em uma sociedade de classes. Onde os meios de produção e reprodução da
vida humana (as máquinas, terras, tecnologias) estão em posse de uma minoria
social. Por conseqüência disso, os trabalhadores e trabalhadoras, os
despossuídos de meios de produção, necessitam diariamente vender sua força de
trabalho como uma mercadoria. Esta estruturação social produz uma série de
conseqüências. A burguesia, centralmente por conta do monopólio das armas, das
forças repressivas, da produção e difusão ideológica, e da concentração dos
meios de produção consegue impor (via repressão, enganação e consenso) sua
hegemonia política e econômica. Os processos eleitorais emergem como mais um
momento da produção de ilusões onde, demagogicamente, afirma-se que seriam as
massas e os trabalhadores que definem os rumos políticos e econômicos do país.
A impossibilidade de intervenção qualitativa do proletariado nas eleições
expressa-se, por exemplo, no fato de que o processo eleitoral reserva espaço
quase nulo às organizações operárias, enquanto, por outro lado, os partidos dos
grandes monopólios e frações da burguesia martelam sua demagogia meses a fio, o
que é facilitado via monopólio dos meios de comunicação. Porém, em meio a todas
estas contradições, os processos eleitorais impõem-se como um momento em que a
classe trabalhadora e as amplas massas discutem a política nacional, o que
obriga os revolucionários a debaterem não só as táticas eleitorais, como as
estratégias contidas por trás delas.
Sobre a tradição histórica do socialismo
Para pensarmos as eleições como
parte da totalidade social, é necessário pensar também o caráter do Estado que
está em disputa pelas diferentes frações de classe. Karl Marx, no artigo Glosas
Criticas Marginais..., destacava que “Onde há partidos políticos, cada um
encontra o fundamento de qualquer mal no fato de que não ele, mas o seu partido
adversário, acha-se ao leme do Estado”. Para o teórico revolucionário o jogo
parlamentar centra-se na produção de dicotomias parciais estabelecidas entre o
governo em exercício e a oposição que está fora do governo. Desta forma a
miséria social, a desigualdade é sempre explicada por conta da má administração
do Estado burguês. Nunca é explicitado que a subsunção do proletariado pelas
classes dominantes e pelo próprio Estado burguês é elemento sine qua non
do capitalismo. O Estado burguês, e sua máquina eleitoral existem para manter e
legitimar a dominação entre as classes sociais e a escravidão assalariada do
proletariado. Nesse sentido, para os marxistas revolucionários, nenhum governo
da burguesia é capaz de governar atendendo as necessidades histórico-sociais
dos trabalhadores e trabalhadoras. Mas, ainda assim, o processo eleitoral nas
democracias burguesas é um dos momentos em que, os trabalhadores e as massas
despossuídas de meios de produção, discutem organização política e econômica da
sociedade, bem como uma série de problemas nacionais. Por isso, sem nenhum
traço de fetichismo parlamentar é preciso que os revolucionários apresentem uma
alternativa independente dos partidos da burguesia, que dialoguem com as
demandas do proletariado e, ao mesmo tempo, denunciem o cretinismo parlamentar
que se nega a intervir nestes processos, para que, com isso, os trabalhadores e
as massas exploradas e oprimidas avancem em sua consciência política. A
necessidade de organização do proletariado em um partido comunista independente
das classes dominantes é colocado por Marx e Engels desde o Manifesto do partido Comunista, onde os
autores convocam os revolucionários a organizarem-se em partido comunista, que
defenda o programa histórico do proletariado.
A crítica ao Estado burguês e seu regime político não pode
levar ao abstencionismo
Todos os marxistas
revolucionários devem partir do pressuposto de que o Estado burguês é o comitê
de negociação da burguesia, como destacavam Marx e Engels no Manifesto do
Partido Comunista. Este é, e será sempre, um instrumento de opressão de
classe. O sistema eleitoral, organizado e dirigido pela burguesia e o patronato,
estão a serviço da reprodução desta ordem. Ao invés de disputar cargos neste
aparato, os revolucionários devem utilizar a tribuna burguesa para denunciar o
sistema social da burguesia e difundir o programa comunista. Ou seja, como
dizia Lenin no O que fazer?, utilizar
este espaço para avançar na agitação, organização e propaganda da perspectiva
revolucionária. Desde o processo eleitoral, os marxistas revolucionários devem
empenhar-se para resgatar a perspectiva colocada também por Trotski n’O programa
de transição, acerca a
necessidade de em todo momento atuar para “ajudar as massas no processo de suas
lutas cotidianas a encontrar a ponte entre suas reivindicações atuais e o
programa da revolução socialista”.
A partir do texto Esquerdismo,
doença infantil do comunismo, escrito por Lênin em 1920, se pôde aprofundar
em grande medida a discussão em relação à participação dos revolucionários nas
eleições. Neste trabalho, o revolucionário avalia que o simples fato de
milhares de proletários ainda sustentarem ilusões no regime parlamentar já
justifica participação do partido revolucionário nas eleições. Porém os
revolucionários devem atuar nas eleições como um tribuno do povo, expondo a
farsa que as eleições representam. Deve-se utilizar tal espaço para critica
radial do sistema eleitoral da burguesia e do patronato, utilizando o
parlamento contra o próprio parlamento. Assim, nas palavras de Lênin “os
comunistas podem (e devem) travar uma luta prolongada e tenaz, sem retroceder
diante de nenhuma dificuldade, para denunciar, desvanecer (...)”. Não
alimentarão então nenhuma ilusão no parlamento. Com isso explicita-se que não
se pode obter as demandas históricas da classe trabalhadora por meio do
parlamento.
Desta forma, os revolucionários,
também nos processos eleitorais, devem tomar a defesa das principais questões
que mais afetam a classe trabalhadora, tal como a concentração da propriedade
privada, o trabalho extenuante, as condições de habitação, transporte, saúde,
educação. Assim evidencia-se que o parlamento, composto em sua maioria pelas
classes dominantes e por seus representantes, não pode servir ao proletariado.
Nas palavras do revolucionário russo “(...) a participação nas eleições
parlamentares e na luta através da tribuna parlamentar são obrigatórias para o
partido do proletariado revolucionário, precisamente para educar os setores
atrasados de sua classe, precisamente para despertar e instruir (...). Enquanto
não tenhais força para dissolver o parlamento burguês e qualquer outra
organização reacionária, vossa obrigação é atuar no seio dessas instituições”.
Para Lênin cabe ao revolucionário
“Usar o parlamento reacionário para fins revolucionários”, deixando claro para
qual classe o parlamento trabalha. Com isso, explicita-se a necessidade de
dissolução de tal organismo. Atuando para sua destruição, utiliza-se o
parlamento contra as classes dominantes, como tribuno do povo. Nesse sentido
faz-se correta a defesa de candidaturas de revolucionários, centradas sempre
sob a independência de classe. No mesmo sentido é desenvolvida a orientação de
Trotski n’O programa de transição, para o revolucionário trata-se de “Olhar a
realidade de frente; não procurar a linha de menor resistência; chamar as
coisas pelo seu nome; dizer a verdade às massas, por mais amarga que seja; não
temer obstáculos; ser rigoroso nas pequenas como nas grandes coisas; ousar
quando chegar a hora da ação: tais são as regras da IV Internacional”. (p. 65).
De Marx a Lênin e Trotski, ao
mesmo tempo em que se participa das eleições é necessário manter explicito que
apenas a organização do proletariado, independente das classes dominantes e
seus lacaios, é que pode garantir suas conquistas. Para avançar a luta do
proletariado, como já destacou Lênin no Esquerdismo..., é necessário, em
todos os espaços sociais, travar a mais ferrenha guerra contra a burguesia e o
patronato, isso porque a “a vitória sobre a burguesia torna-se impossível sem
uma guerra prolongada, tenaz, desesperada, mortal; uma guerra que exige
serenidade, disciplina, firmeza, inflexibilidade e uma vontade única”. Nenhuma
ilusão na democracia burguesa. Todos os esforços, dentro e fora do parlamento,
devem ser voltados contra as classes dominantes. Para Lênin tratava-se de
“combinar a ação de massas fora do parlamento reacionário com uma oposição
simpatizante da revolução (ou, melhor ainda, que a apóia, abertamente) dentro
desse parlamento”.
Nesse sentido, para Lênin o
abstencionismo parlamentar, a negação de participação nos processos eleitorais,
constitui uma doença infantil que deve ser superada pelos comunistas. Segundo
sua análise “A infantilidade de "negar" a participação no
parlamentarismo consiste, exatamente, em que com esse método tão
"simples", "fácil" e pseudo-revolucionário querem "resolver"
a difícil tarefa de lutar contra as influências democrático-burguesas no seio
do movimento operário e, na realidade, a única coisa que fazem é fugir de sua
própria sombra, fechar os olhos diante das dificuldades e desembaraçar-se delas
apenas com palavras”.
É seguindo a tradição do marxismo
revolucionário que, no primeiro turno das eleições de 2010, lançamos o chamado
a votar criticamente no PSTU, e em outro nível no PCO. Estas são organizações
que se mantiveram independentes da burguesia. Porém, chamamos voto critico
nestas organizações por avaliarmos que existem debilidades em suas propostas.
Nossas críticas a estas organizações foram extensamente desenvolvidas em uma
série de artigos. No segundo turno, por não ter se colocado nenhuma organização
que defendam um programa socialista e de independência de classe, chamamos o
voto nulo. O PCB (Partido Comunista Brasileiro), por outro lado, optou por
apoiar a candidatura de Dilma Rousseff e do PT. Pretendemos agora demonstrar
como esta constituiu uma estratégia equivocada, que em determinada medida
contribuiu para debilitar a luta pela auto-organização e pela emancipação da
classe trabalhadora.
O programa bolivariano do PCB é anticapitalista e
antiimperialista?
“Aqueles que não se atrevem a mencionar as tarefas
revolucionárias em alto e bom som jamais terão coragem de realizá-las”. Leon
Trotsky. Pela Quarta Internacional, 1935.
A partir destes elementos
iniciais colocados por Marx, Lênin e Trotsky abriremos a polemica com o PCB
(Partido Comunista Brasileiro). Inicialmente tomaremos para análise o “Programa
do PCB para as eleições de 2010”, que consta no site do partido.
Adiantaremos ao leitor que o programa distancia-se muito da perspectiva dos
revolucionários debatidos anteriormente, abrindo mão inclusive do principio de
independência de classe, capitulando ao chavismo e governos “pós-neoliberais”.
Trata-se de um programa para governar um país capitalista, que, embora mova-se
um pouco mais à esquerda em seu projeto, de forma alguma constitui um programa
para derrubar o capitalismo.
Logo de inicio, cabe observar a
caracterização que fazem das classes dominantes brasileiras. O programa
professa existir uma fração da burguesia que defende “um Estado promotor de
políticas compensatórias e incentivador de um “desenvolvimentismo” capaz de
acelerar o crescimento capitalista e pretensamente resolver as desigualdades
sociais através do ciclo virtuoso da produção, emprego, consumo”. Esta
caracterização que fazem da candidata apresentada pelo Partido dos
Trabalhadores (PT), por sua vez, contribui para que o partido termine por
encarar a candidatura de Dilma como “um mal menor” para o proletariado
brasileiro (seguindo esta mesma lógica, no segundo turno, o PCB vai compor a
“ala envergonhada” de apoio a Dilma, colocando como saída a consigna abstrata de
“derrotá-la nas ruas”). Mesmo sabendo que tal candidatura não pode resolver as
demandas das trabalhadoras e trabalhadores e brasileiros, abre-se mão da
independência de classe do proletariado em relação à burguesia e seus
candidatos.
Esta fração da burguesia
brasileira, articulada ao redor de Dilma, este “mal menor”, segundo a visão do
PCB, seria contraposta à burguesia neoliberal representada pelo PSDB, “os que
defendem a ampliação das políticas neoliberais, com mais retirada de direitos
dos trabalhadores, mais privatização, mais dependência do Estado ao capital
financeiro internacional”. Esta contraposição entre o “mal maior” e o “mal
menor” leva o PCB orientar o proletariado a ceder apoio à fração da burguesia
representada por Dilma e o PT.
A estratégia do seguidismo
político em relação às classes dominantes não fica restrita as fronteiras
nacionais. Pois também em suas posições internacionais, o PCB tampouco prima
pela independência de classe. Neste terreno o PCB levanta a política de apoio
aos governos “pós-neoliberais” de Evo Morales (que se caracteriza por ter
tinturas frente-populista) e, sobretudo o bonapartismo (hoje já debilitado) de
Hugo Chávez. O PCB se inspira em seus projetos para elaborar seu próprio
programa em âmbito partidário nacional. Com isso o partido abre mão da
estratégia de independência do proletariado em relação a frações das classes
dominantes. Pretende-se com esta base, com melhoras progressivas, desenvolver a
democracia burguesa.
Certamente existem distinções
qualitativas entre o que representa Dilma e o PT no Brasil e o que é o
chavismo. O apoio à Dilma é fruto da lógica reformista de adesão ao “mal
menor”. Porém, o apoio do PCB ao chavismo se dá porque o governo de Hugo Chávez
é tomado como base para o projeto estratégico do PCB. Cabe a nos aqui colocar
alguns elementos que contribuam para desmistificar o governo Chávez. Este
apesar de ter tido tensões com o imperialismo, sobretudo na era Bush, de ter
feito algumas expropriações (em que a patronal recebeu ricas indenizações) e da
retórica socialista governa por meio de plebiscitos e referendos,
utilizando-se de uma espécie de bonapartismo sui generis enquanto
constrói um curioso “socialismo com empresários”. Para isso, Chávez ora se
apóia nas classes dominantes, hora volta-se para as massas, apoiando-se nas
Forças Armadas, para regatear com o imperialismo, sem romper efetivamente com o
mesmo. Para verificar a centralidade que o PCB atribui ao modelo chavista em
sua própria estratégia basta conferirmos seu programa nas eleições de 2010:
No
plano político, os exemplos dos governos progressistas da América Latina,
eleitos com o apoio de movimentos populares organizados e impulsionados por
eles, têm demonstrado que há alternativas reais ao capitalismo e ao
imperialismo capazes de elevar, de fato, o nível de qualidade de vida e de
participação política da classe trabalhadora.
Tomando o chavismo como modelo, o
PCB não se propõe ao combate imediato à propriedade burguesa, do patronato e
dos ricos, que subalterniza o proletariado. Não busca atuar a partir da
perspectiva revolucionária e insurrecional de tomada dos meios de produção,
cassação e extirpação de todas as frações das classes dominantes. Trata-se
segundo o programa, de uma “Campanha Movimento do PCB, estruturada na
perspectiva de contribuir para a organização da Frente Anticapitalista e
Antiimperialista”. Porém, efetivamente, o governo Chávez não pode de fato
ser considerado verdadeiramente como anticapitalista, pois setores ligados ao
petróleo e às grandes montadoras lucraram muito nem seus governos, chegando a
ser conhecidos como “boliburguesia”. Também, não pode nem sequer ser
considerado como um governo verdadeiramente antiimperialista, como ficou
expresso em sua total paralisia frente ao golpe militar em Honduras em 2009.
Nesse sentido o PCB busca
construir um chavismo abrasileirado, e para isso encobre os processos
repressivos desencadeados por Chávez para conter o proletariado venezuelano. O
governo Chávez, por sustenta-se sobre frações da burguesia venezuelana, não
pode permitir que o proletariado do país se auto-organize e confronte-se com
seus patrões e sua burguesia, levando suas demanda as ultimas conseqüências.
Cada vez que o proletariado se levanta, Chávez se vê obrigado a sair em defesa
de seus empresários aliados, como foi no caso da repressão desencadeada sobre
os trabalhadores da Sanitários Maracay, em abril de 2007, momento em que
o governo Chávez exigia que a fábrica fosse devolvida aos patrões. Também foram
reprimidos os petroleiros da PDVSA, no dia 6 de agosto de 2007, contando
inclusive com a prisão dos dirigentes sindicais Juan Cahuao, Jairo Ollarves,
Aulio Soto e Francisco Villalobos. Defendendo intransigentemente os empresários
aliados, Chávez, por intermédio da Guarda Nacional, atacou sistematicamente as
manifestações dos trabalhadores, que lutavam por melhores condições de vida e
trabalho, como se fossem “sabotadores” ou “contra-revolucionários”. A mesma
política anti-proletária foi levada a cabo em relação aos trabalhadores da
siderúrgica Sidor (Siderúrgica
del Orinoco). Em março de 2008, os trabalhadores da Sidor desencadearam
um processo grevista que durou quatro dias, mas tiveram que pagar por isso.
Estes foram reprimidos com bobas de gás lacrimogêneo e balas de borracha. Na
ocasião foram realizadas cinqüenta e três (53) prisões. Ou seja, o socialismo do século XXI de Chávez,
construído com o empresariado e o patronato, e que é tomado como estratégia
pelo PCB, é um governo que protege os patrões e reprime trabalhadores.
A gana do PCB por administrar o Estado burguês, o comitê de negócios da burguesia, é
reafirmada logo em seguida quando diz: “O programa aponta para a construção de
uma ordem institucional e política própria dos trabalhadores, capaz de
impulsionar a criação de uma nova cultura proletária e popular e de contribuir
para colocar o bloco proletário em movimento na luta contra a ordem
conservadora”. A tarefa primeira é chegar ao poder por meio dos votos, com um
programa democrático-burguês. Vejamos como o PCB, por meio da via eleitoral
burguesa, pretende aplicar tal modelo no Brasil:
O
PCB luta pela inversão da base do poder político atual – lastreado no domínio
econômico dos grandes grupos capitalistas –, pela construção da democracia
direta dos trabalhadores, com o fortalecimento do poder popular e a
reformulação do sistema partidário-eleitoral atual.
Propomos
a instituição de novas formas de representação direta dos trabalhadores – o
Poder Popular –, que viabilizarão a mais ampla liberdade de opinião, com a
participação de movimentos organizados e partidos políticos.
Entendemos
ser necessárias: a reforma do sistema de representação político / institucional
/ partidário / eleitoral vigente, com a proposição de um Congresso Nacional
unicameral, com o fim do Senado e a abertura das Tribunas parlamentares para
organizações de trabalhadores e de lutas sociais; uma reforma eleitoral, com a
adoção do financiamento público de campanha (...).
Esta consigna de Poder
Popular é também inspiração direta do governo Hugo Chávez. Tal forma
organizativa de inspiração chavista não resiste a uma análise minimante
marxista. Mesmo os "círculos bolivarianos" que seriam expressão
máxima do pretenso “poder popular” chavista funcionam na verdade como meras
correias de transmissão da política chavista e de seu hall de empresários
e patrões junto aos setores populares. Na realidade, os círculos bolivarianos,
que em tese deveriam impulsionar a auto-organização destes setores, acabam por
fazer garantir o poder do presidente e de seus sócios sobre a classe
trabalhadora, impedindo que estas se organizem de maneira independente do
governo por suas demandas mais candentes no marco da crise
capitalista. Mas o PCB não vê problema algum nestes aspectos e ainda
propõem em seu programa o “fortalecimento dos instrumentos atualmente existentes,
como a ALBA, Banco do Sul e Unasul”. Estes organismos não passam de pactos
entre as burguesias latino-americanas para garantir seus interesses. Nada tem a
ver com a necessidade histórica de unidade latino-americana dos trabalhadores e
dos povos subalternizados para combater o imperialismo, e sua sócia-menor, as
burguesias locais. Necessitamos construir uma unidade latino-americana que dê
resposta aos interesses mais sentidos dos trabalhadores e das massas espoliadas
de nosso continente, está unidade só pode ser construída em combate direto às
ilusões geradas pelas unidades burguesas, como o são a ALBA e a Unasul.
Apesar das diversas revisões, o PCB nunca fez um balanço
sério de seu passado
O PCB segue seu curso de
conciliador histórico e, quando não encontra no país uma fração burguesa
“nacionalista” e “progressista” busca-as, agora, fora do Brasil, nos governos
“pós-neoliberais” de Evo Morales e Hugo Chávez. Esta capitulação à frações das
classes dominantes é produto direto da estratégia do PCB. Este partido de há
muito – a despeito das várias revisões teórico-políticas que tenha feito –
abandonou a estratégia da revolução. Se antes, na era do PCB histórico, este
partido defendia a necessidade de uma revolução burguesa, o que o levava a
buscas incansáveis de caudilhos pequeno-burgueses, agora, mesmo se dizendo
socialista, o PCB vestindo um velho defunto defende um curioso “socialismo”,
que necessita ser construído em aliança com as frações progressistas da
burguesia, num já malfadado “bloco histórico”.
O PCB passou de “coveiro das
revoluções proletárias” – quando tinha peso político e social no proletariado e
nas massas em todo o mundo, sobretudo até os anos 60, momento em que podia
esconder sua política contrarrevolucionária no biombo dos estados operários
(essencialmente a URSS) – para se tornar um recriador das revoluções burguesas
dirigidas por um pactuante “bloco histórico”. Em síntese, o PCB não rompeu seu
curso histórico, mas adaptou-se à degeneração pró-imperialista das antigas
frações “progressistas” e “nacionalistas” da burguesia e da pequena burguesia.
A grande dívida que o PCB teria
que saldar junto ao proletariado – ao menos como revisão histórico-política –
diz respeito às incomensuráveis traições que este partido perpetrou nos
momentos em que dirigiu o movimento operário. Estas traições foram levadas a
cabo repetidas vezes. Por décadas o PCB conduziu o proletariado a aliar-se aos
diversos “males menores” (Getúlio, Juscelino, Jango). Ainda, para não afrontar
frações da burguesia, o PCB traiu inúmeras greves, abandonando a luta pela
independência política diante dos golpes militares, e levando adiante suas
aventuras putchistas (como a Intentona Comunista, que impôs anos de
retrocesso, perseguições, prisões e mortes para os lutadores operários e
políticos). Para agir de forma conseqüente, este partido, que reivindica
atuação no seio do proletariado, teria que ter feito um balanço sério de seu
passado, que, infelizmente, deixou marcas profundas com qualidade de
retrocessos para movimento operário brasileiro[i].
O PCB busca agora, apagando seu passado de coveiro da revolução brasileira,
colocar-se com protagonista da construção de uma “revolução social”, neste
ínterim procura, e ao mesmo tempo, calar-se diante dos pactos efetuados com os
partidos burgueses, que remontam aos tempos da transição negociada, ajudando a
renegar a memória dos que tombaram diante das forças repressivas oficiais e não
oficiais do Estado brasileiro e das “frações burguesas progressistas” a quem o
PCB capitulou durante toda a sua história.
O PCB e o segundo turno das eleições nacionais
Durante o segundo turno das
eleições brasileiras de 2010 recoloca-se no pleito duas candidaturas burguesas.
A perspectiva da existência de um “mal menor” para o proletariado na figura de
Dilma leva o PCB a organizar o apoio à candidatura de Dilma. Frente a tal
conjuntura retomamos o principio revolucionário de não conceder nenhum apoio às
candidaturas que representam o patronato e a burguesia. Não apoiamos votos nos
partidos das classes dominantes, nem no PSDB nem no PT. Para nós, seguindo a
tradição dos revolucionários, a única forma possível de defender a autonomia da
classe trabalhadora neste momento é votando nulo. O voto nulo é o voto contra
os burgueses, os patrões e seus partidos.
O PCB tomou posição oposta.
Coerente com a concepção e as propostas defendidas em seu programa para o
primeiro turno das eleições de 2010, volta seu apoio à fração da burguesia que
entende como mais progressista. E nesse sentido que destacamos que o PCB coloca-se
como a “ala envergonhada” do bloco de apoio de Dilma. Retomando sua tradição de
ruptura com o marxismo e de conciliação com as classes dominantes (dogma
stalinista), este partido reformista, mesmo admitindo que ambas as candidaturas
representam os interesses das classes dominantes, conclamam a classe
trabalhadora (em nota oficial) a “Derrotar Serra nas urnas e Dilma nas ruas”
usando para esta orientação o argumento de que “com o possível agravamento
da crise do capitalismo, podem aumentar os ataques aos direitos sociais e
trabalhistas e a repressão aos movimentos populares”.
Esta consigna de “derrotar Dilma
nas ruas” coloca-se como uma mera forma abstrata para o PCB se “desculpar” do
apoio à candidatura que representa, por fim, as classes que exploram e
subalternizam, política e economicamente, o proletariado. Como derrotar Dilma
nas ruas se o PCB não sequer cedeu tempo em sua campanha televisiva para dar
visibilidade às lutas de classe que aconteceram no país? Além disso, o PCB
“esqueceu-se” da declaração de Lula, em 2010, posicionando-se favorável ao
corte de pontos dos trabalhadores em luta (USP, INSS e Judiciário), que
assentou menos famílias do MST, do limitadíssimo Programa Nacional de Direitos
Humanos (PNDH-3), engavetado para sempre pela candidata eleita (ela mesma uma
vítima da ditadura militar), e ainda, que Dilma posicionou-se em rede nacional
contra o direito ao aborto gratuito, legal e seguro. O que por sua vez abriu as
portas para o desenvolvimento de uma onda reacionarismo no país.
Certamente o PCB não esqueceu-se
destes ataques aos direitos da classe trabalhadora. Porém, a capitulação às
frações da burguesia e do patronato é elemento constitutivo de sua estratégia.
Basta recordarmos que o PCB, em 2002 esteve na coligação com o PT. Por fim, acabou
por sair do governo sem explicar o que mudou, mesmo fora do governo, não teve
qualquer plano sério para “derrotar Lula nas ruas”. A cada ato, o PCB mostra
que não se pauta pela organização da classe trabalhadora de forma independente
para a destruição do capitalismo – única tarefa progressista diante da
decadência, cada vez maior, desse regime social – e pela construção do
socialismo.
Sua incapacidade de colocar-se em
luta pela construção do socialismo é reafirmada em sua opção por votar em Dilma
como “mal menor” e na afirmação de que “irá às ruas” apenas se “aumentar os
ataques aos direitos sociais e trabalhistas e a repressão aos movimentos
populares”, ou seja, se os ataques e a repressão continuarem sendo os mesmos o
partido deve se manter na inércia política. Ou seja, não se trata de buscar,
por meio da atuação conseqüente na luta de classes, combatendo todas as frações
da burguesia e do patronato, organizando greves, piquetes e ocupações, avançar
na consciência, programa e prática para a estratégia de derrubar o capitalismo,
mas de “combater seus males maiores”. Teoricamente, mesmo diante da crise
capitalista mundial, não se pode descartar relativo crescimento econômico que
permita ao governo Dilma manter-se demagogicamente sem “aumentar” os ataques.
Frente a tal cenário o que fará o PCB? E ainda, como “derrotará Dilma nas ruas”
se ajudou a disseminar as ilusões nesta?
Concretamente o PCB, ao apoiar
envergonhadamente Dilma, fica detrás até mesmo do Ministério Público Federal,
que está processando os torturadores da ditadura militar. O partido segue com a
mesma linha de conciliação de classes que fez com que fosse o principal
expoente em favor da assinatura da Lei da
Anistia com o regime militar na transição. Momento em que o Deputado
Federal emedebista Roberto Freire, dirigente do PCB, tornou-se o responsável
pelo aval desses “comunistas” pcbistas à lei que igualava os torturados aos torturadores e assassinos. Uma vergonha histórica que o PCB não fez
balanço. Por uma infinidade de elementos históricos e programáticos que compõe
sua estratégia de conciliação de classes, o PCB não teve qualquer problema em
manter-se com Dilma, o que por sua vez faz com que o PCB assine em baixo
novamente a anistia aos torturadores e assassinos da ditadura militar-burguesa.
Com apoio do PCB, os torturadores, mandantes e apoiadores da ditadura
militar-burguesa podem continuar vivendo tranquilos – como Romeu Tuma, que
morreu há poucas semanas livre e impune.
Com tal posicionamento o PCB
reafirma toda sua trajetória histórica de capitulação ao reformismo (que é
reafirmada desde Julio Prestes, passando por Caio Prado Junior até os dias
atuais). Como é constitutivo da lógica de tradição stalinista, o PCB capitula a
conciliação de classes, atacando o principal aspecto da perspectiva marxista: o
principio da autonomia da classe trabalhadora em relação às classes dominantes.
Alimenta ainda a ilusão nas eleições burguesas com a palavra de ordem “Vote
nos comunistas, eles farão a
diferença”. Explicita-se aqui novamente seu o desvio teórico reformista,
pois difunde para o proletariado que é possível chegar ao socialismo por meio
do parlamento burguês. Com tudo o que está exposto, evidencia-se que seu
programa não tem nada de comunista. O programa do PCB para 2010 centra-se na
busca da conquista do governo, em assumir o “leme” do Estado burguês para
democratizá-lo, mantendo suas bases estruturais. Os comunistas devem denunciar
incansavelmente os partidos como este, que recorrentemente produzem ilusões no
seio do proletariado. Não devem temer a guerra de classes, pelo contrário,
devem preparar cotidianamente a classe trabalhadora para identificar e negar
estas direções conciliadoras, preparando o proletariado para ser vitorioso
nesta guerra e avançar na conquista e consolidação da emancipação humana, com
abolição das classes sociais, do patronato e extinção do Estado e da burguesia.
O PCB desde a década de 1920 tem
agido como o braço esquerdo da burguesia, ao longo das décadas vem organizando
os trabalhadores para derrotas de classe. Também nas eleições de 2010 continua
a alimentar a ilusão nos governos burgueses (como fez com Getúlio Vargas, João
Goulart e em outro nível agora com Dilma), alega (corretamente) que a vitória
da Serra traria ataques aos direitos dos trabalhadores, e acaba (equivocadamente)
defendendo que forma dos trabalhadores precaverem-se destes ataques é apoiar a
burguesia que circunscreve Dilma Rousseff!
A única forma de evitar
retrocessos nas conquistas da classe trabalhadora, bem como a intensificação do
privatismo, é com a organização da classe trabalhadora em um programa
independente. Trata-se de lutar conseqüentemente contra os ataques que a
burguesia e seus governos vêm desferindo contra o proletariado, bem como sua
intensificação nos próximos períodos. O combate do proletariado deve ser
direcionado marco da ampliação das suas conquistas, centrado na perspectiva de
dar solução aos grandes males sociais que o assolam. Nesse sentido, lutamos
pela revolução operária e socialista, destruição do capitalismo e seu Estado, para
abrir caminho para as verdadeiras conquistas das massas, a independência
nacional, o monopólio social da terra e dos meios de produção, uma democracia
de massas, soviética, que pressupõe nenhuma conciliação com qualquer fração
burguesa ou seus agentes políticos. Efetivamente nossa estratégia é antípoda a
defendida pelas classes dominantes e seus representantes, são inconciliáveis.
Para nós, fazem-se extremamente atuais as consignas elencadas por Trotski n’O programa de transição, aos
revolucionários, neste momento de crise estrutural do capital, trata-se de
exigir um amplo plano de obras públicas de longa duração para criar
empregos e distribuir moradias para o proletariado, redução da jornada de
trabalho sem redução salarial, e ainda com aumento automático dos salários em
relação aos preços, divisão das terras, reestatização das empresas privatizadas
e dos bancos, sobre controle dos trabalhadores etc.
Não cabe aos marxistas
revolucionários a capitulação e o colaboracionismo de classe expresso nas candidaturas
da burguesia e da patronal. Dilma, assim como fez Lula, governará em favor dos
monopólios e não para os trabalhadores. Continuará organizando os ataques
contra os trabalhadores e trabalhadoras, referendando a terceirização, os
empregos precários no campo e na cidade, coadunando com a morte de milhares de
mulheres em abortos clandestinos, com as péssimas condições do sistema de saúde
(SUS) e das escolas públicas, legitimando o limitadíssimo estatuto da igualdade
racial, impedindo ainda a reforma agrária. Por tudo isto, defendemos junto aos
trabalhadores, trabalhadoras e estudantes o voto nulo. Quando não se tem
partidos que representem os interesses históricos do proletariado, esta se
coloca com única forma possível de manter a independência de classe,
alternativa que não conduz o proletariado aos grilhões enfeitados. Pois é isto
que significa o apoio aos projetos das classes dominantes. Não aceitamos ceder
nenhum apoio aos algozes do proletariado. O voto nulo deve expressar a defesa
dos direitos democráticos dos trabalhadores e trabalhadoras, das mulheres, dos
homossexuais, do povo negro e demais setores em condição de subalternização.
Estes direitos não são defendidos por nenhuma das candidaturas pró-burguesas.
O exemplo dado pelos
trabalhadores e trabalhadoras da França, apoiados pelos estudantes, nos apontou
os caminhos para preparar a defender nossos direitos. Sua juventude e seus
trabalhadores tomaram as ruas, ocuparam escolas, organizaram piquetes em
refinarias e aeroportos, e enfrentam-se decididamente com o governo de Sarkozy
em defesa de seu direito à aposentadoria. Sigamos o exemplo da juventude e dos
trabalhadores franceses! O que garante os direitos e as liberdades dos
trabalhadores não é o parlamento, mas sim a auto-organização do proletariado
por meio de seus métodos históricos de luta (paralisações, greves, piquetes,
ocupações, expropriações e greve geral insurrecional). Trata-se de resgatar os
sindicatos nas mãos da burocracia sindical governista e pró-patronal,
transformando-os em escolas de guerra de classe. E ainda de construir um
partido revolucionário como fez Lênin e Trotski.
Preparar o proletariado para o novo período de luta de
classes
Com a crise do Lerman Brother,
em 2008, entramos em uma nova fase da luta de classes em nível mundial. No
primeiro capitulo da crise capitalista mundial, os governos imperialistas
fizeram com que os Estados assumissem as dividas das grandes empresas e
multinacionais. Com isso, tanto na Europa, como nos EUA, China, etc., os Estado
estão endividados. Por conseqüência disso, agora os Estados necessitam aplicar
planos de enxugamentos de gastos. Segue-se com isso uma série de reformas
pro-capitalistas, que atacam diretamente os direitos trabalhistas e os empregos.
Busca-se descarregar os efeitos da crise sobre a classe trabalhadora mundial.
No Brasil, por conta de uma série
de fatores (que vão desde a conjuntura do período anterior, tangido por um
ciclo de crescimento da economia mundial, passando pela diversificação das
exportações brasileira, até a reprimarização da economia), a crise capitalista
chegou com menos força. Ainda assim, trata-se de um país dependente da economia
dos países imperialistas. Assim, também no Brasil, a crise capitalista vai
cobrar seu preço, sobretudo no período pós-eleitoral. No próximo período
deve-se agravar a crise fiscal do Estado, bem como a crise decorrente da
dificuldade de realização dos lucros da burguesia. A tendência colocada ao país
é de uma nova onda de ataques a classe trabalhadora. Desta forma, é necessário
preparar, desde já, o proletariado e demais lutadores para resistirem aos
ataques do Estado burguês e das classes dominantes e lutar pela construção do
socialismo. Nesse sentido, os revolucionários não devem alimentar qualquer
ilusão em relação ao governo de Dilma e do PT, pois são representantes diretos
da burguesia, que legislam contra os interesses históricos dos trabalhadores e
trabalhadoras. É necessário defender o principio marxista de que a classe
trabalhadora só pode confiar em suas forças para a transformação da sociedade.
Cabe aos militantes, correntes e partidos que reivindicam o socialismo,
levantar uma ampla campanha contra a burguesia, o patronato e seus
representantes.