Combate Classista

Teoria Marxista, Política e História contemporânea.

sábado, 12 de setembro de 2015

QUEDA DO MURO DE BERLIM - 1989

Anotações de estudo - primeiro semestre de 2010

Alessandro de Moura








Crise do stalinismo e as restaurações capitalistas

Os Partidos Comunistas, sob orientação do Partido da União Soviética, nos diferentes países do globo, ao invés de lutar acatar as demandas revolucionárias dos trabalhadores, passam a defender a linha prognosticada pela cúpula stalinista, repetindo em progressão geométrica os fracassos da Alemanha em 1923, na China, Espanha, novamente a Alemanha em 1953, na Hungria em 1956 (aqui com apoio explicito e ativo de Georg Lukács)[11], na Tchecoslováquia em 1968; no Chile em 1973 (cordões industriais); e na Polônia em 1980 – 1982. Sobre a generalização do modelo soviético estalinista Edmundo Fernandes Dias no artigo O possível e o necessário: as estratégias das esquerdas[12]analisa que:

O modelo “soviético” generalizou esse conjunto de equívocos e os transformou em palavra de ordem internacional. O stalinismo apagava não apenas suas oposições internas (ver em especial a trotskista) mas toda e qualquer oposição em qualquer lugar onde existisse um partido comunista. E, perversamente, ao negar a questão da socialização das forças produtivas e a conseqüente questão da democracia dos trabalhadores, o stalinismo atuava como o braço esquerdo do revisionismo social-democrata.
     Sobre a estratégia stalinista, de aliança com frações da burguesia em detrimento do proletariado, em outra passagem do mesmo artigo Edmundo Fernandes afirma:

Em nome de um acúmulo de forças, necessário, buscavam em outra classe (a burguesia nacional progressista) a direção real e inconteste do processo de “libertação” das forças produtivas. (...) Ou seja, afirmavam que essa transição poderia ser encaminhada nas formas vigentes do capitalismo tornando-se, assim, prisioneiras umbilicalmente daquele, atrelando a ele as classes trabalhadoras e decapitando suas possibilidades reais de libertação. Impediam, pois, a constituição da identidade destas classes, limitavam seus projetos, ajudavam a perpetuar aquele que em teoria, era seu “inimigo”. Suas ações eram, portanto, pautadas, agendadas, pelo inimigo de classe.
 Assim, de forma violenta e traumática, foi imposta uma série de retrocessos ao que Lenin, Trotsky e os revolucionários russos haviam construído até 1923, como argumenta Michael Löwy no recente artigo Por um novo internacionalismo[13]:

[o] formidável movimento de fé e de ação internacionalistas — sem precedente na história do socialismo — o incrível capital de energia e de engajamento internacionalistas que representava a Internacional Comunista, tudo isso foi destruído pelo stalinismo. Este último canalizou essa energia em benefício do nacionalismo burocrático, de sua política de Estado e de sua estratégia de poder. O internacionalismo foi posto a serviço da política externa soviética e o movimento comunista mundial transformado em instrumento da construção do “socialismo em um só país”. A política feita pelo Komintern em relação ao nazismo alemão, desde o final dos anos 20 até sua dissolução em 1943, fornece o exemplo mais chocante: seus estranhos ziguezagues tinham pouca relação com os interesses vitais dos trabalhadores e dos povos europeus, mas estavam exclusivamente determinados pelas mudanças que intervinham na política soviética (stalinista) de alianças diplomáticas e militares.
            A atuação do partido comunista no Brasil não foi muito distinta. É conhecida a defesa incondicional que o PCB preconizara sobre o caráter feudal brasileiro e a necessidade da revolução por etapas por meio da aliança com uma suposta burguesia nacional. Teses totalmente estranhas as formulações de Marx, Engels, Lenin e Trotsky, mas convergentes com as formulações de Stalin e seus consortes.

MESMO COM AS AMARRAS IMPOSTAS PELOS PCS A RESISTÊNCIA REVOLUCIONÁRIA CONTINUA

Também é necessário considerar que o stalinismo, mesmo com sua inserção mundial, não conseguiu homogeneizar as respostas do proletariado, este não se calou frente ao stalinismo, os trabalhadores continuaram a se organizar, lutaram contra as burocracias stalinistas pactuadas com as burguesias e o patronato mundo a fora, conforme nos referimos em relação a Berlim em 1953, Hungria e Polônia 1956; Polônia e Tchecoslováquia 1968; Primavera de Praga, maio de 68 na França; o “outono quente” italiano, a etapa revolucionária aberta na Argentina depois do Cordobazo; Assembléia Popular boliviana, a revolução portuguesa, a derrota norte-americana no Vietnã, o ascenso espanhol com a morte de Franco as revoluções sandinistas e iraniana e a Polônia 1980.
Deste período de ascenso, a revolução polonesa foi a última oportunidade para que o proletariado revertesse a dinâmica de derrotas e desvios sofridos nos distintos processos revolucionários. Mas foi derrotada. O imperialismo não sofrendo derrotas decisivas nessa etapa recria as condições para retomar sua ofensiva na década de 1980 pela via “reaganiano-thatcheriana”. É claro que entre os elementos que levaram estes processos a definharem está a política de conciliação do PCUS (burocrática e nacionalista).
Ora, a defensiva stalinista insiste, pelo menos desde a revolução alemã em 1923, na argumentação de que não se tinha condições objetivas para fazer avançar as lutas proletárias pelo mundo, e que a alternativa era a aliança com setores da “burguesia progressista”, ao invés de trabalhar pela autoorganização do operariado, como fazia a oposição de esquerda.

POR QUE RESTAURAÇÃO CAPITALISTA?

            Os países capitalistas nunca desistiam de forçar a abertura da URSS e dos demais Estados operários, pois tratava-se de um vasto mercado para valorização de capitais, o que criaria um impulso para sair da crise mundial da década de 1970. As potencias internacionais desde 1917 pressionavam a Rússia à abertura dos mercados e restituição da propriedade privada. Já em estagnação econômica na década de 1960, no inicio da década de 1970 a URSS entrou em profunda crise, como afirma o próprio Mikhail Gorbachov em seu livro Perestroika, esta crise continuou aprofundando-se na década de 1980. O livro de Gorbachov é importante para compreender o processo de restauração, uma vez que seria ele um dos principais articuladores do processo de restauração capitalista.
Além da pressão externa, feita pelas potencias imperialistas, havia também grande pressão interna ao partido pela restauração. Isso porque, segundo Cerdeira, sem a restauração capitalista, sem consolidar relações de propriedade privada, a burocracia stalinista não poderia transformar-se em burguesia. Para se ter ideia dos benefícios da não-propriedade para o proletariado, num relatório do Banco Mundial, Do plano ao mercado. Informe sobre o Desenvolvimento Mundial, Washington, 1996, (apud Cerdeira), afirma-se que “No final da era soviética as famílias dedicavam à moradia (aluguel e serviços) apenas 2,4% de seus salários — menos do que gastavam em bebidas alcoólicas e cigarros”. O mesmo relatório afirma que “Durante a transição aumentou o número de mortes na Rússia. Entre 1990 e 1994, a esperança de vida se reduziu de 64 para 58 anos entre os homens e de 74 para 71 anos entre as mulheres”. (p.141).
Desta forma, segundo o autor, buscando atender as necessidades da burocracia que queria se transformar em classe social burguesa, o próprio governo do país passou a adotar políticas restauracionista. É nesse contexto que Mikhail Gorbachov, no inicio da década de 1980 idealizou e implementou a perestroika. Segundo Cerdeira, entre as medidas mais importantes adotada por Gorbachov estava o fim do monopólio do comercio exterior, e o fim da planificação da economia. Em junho de 1987, foi aprovada a Lei das empresas do Estado que eliminava as subvenções estatais, por meio desta ficou estabelecido que cada empresa poderia desenvolver seu próprios planos anuais ou quinquenais, tanto com a união soviética como com o exterior! Em seguida o Ministério do Comércio Exterior foi dissolvido...
Em novembro de 1986, aprovou-se a Lei sobre as atividades individuais, e depois, em maio de 1988, a Lei sobre cooperativas. De acordo com Cerdeira, por meio desta medida avançaram as privatizações, abrindo amplo campo para restauração da propriedade privada. Também em 1988 o Estado autoriza a constituição de bancos privados, “por meio de uma lei que autorizou a criação de bancos cooperativos, foi um elemento fundamental para a formação dos grandes grupos capitalistas monopólicos da Rússia, consolidando o processo de restauração capitalista”. Além disso, empresários e banqueiros passaram a compor o governo. É o caso de Wladimir Potanin, ex-presidente do maior banco privado da Rússia, o Oneximbank, Potanin tinha sido nomeado primeiro vice-ministro da Economia, e também Kremlin Boris Berezovski, segundo Cerdeira, este não era apenas dono de um banco, mas também de negócios de venda de automóveis e de emissoras de televisão. De acordo com o autor:

Ambos os empresários integram, junto com outros cinco, um grupo que se reúne semanalmente e influi decisivamente nas altas esferas governamentais. Fazem parte deste grupo Piotr Aven, do Banco Alfa; Vladimir Gussinnski, chefe do grupo Most, que atua na área bancária e de comunicação; Mikhail Khodorkovski, presidente do grupo Menatep, com negócios no setor petrolífero e financeiro; e Alexander Smolenski, do Banco Stolichni. Segundo Berezovski, este grupo de empresários, controla 50% da economia russa.
                Cerdeira, em outra passagem, de forma concisa, afirma “O que também se torna evidente nesta análise é que para implantar o capitalismo a burocracia soviética e o imperialismo necessitaram destruir a planificação econômica, abolir o monopólio do comércio exterior e finalmente (e isto foi qualitativo), permitir de novo o livre e irrestrito direito à propriedade privada para recriar uma burguesia destruída há quase 80 anos. O autor destaca ainda que com as privatizações e abertura de mercados houve a “destruição do parque industrial da União Soviética, o decréscimo do seu Produto Interno Bruto e a conseqüente queda do nível de vida das massas”. Nesse sentido, a queda de nível de vida da maioria da população seria “produto direto da competição no mercado mundial e da submissão dos novos países capitalistas aos mais poderosos países imperialistas do mundo”. O definhamento político e econômico avançou até que a URSS se desfizesse no ar. Importante notar que com a queda do Estado operário degenerado da URSS o stalinismo não foi preservado: a burocracia não pôde colocar-se como “vítima” e sim, ao contrário, destacou-se como abertamente pró-capitalista.

MARX CONTRA O STALINISMO
Certamente é possível analisar a experiência soviética à luz do das reflexões de Karl Marx, assimilando o contudo do texto “Glosas criticas marginais...”, podemos dizer que o que aconteceu com a tomada do poder pelas massas proletárias na figura do Partido Bolchevique em outubro de 1917 foi um processo de emancipação política extremamente radical, uma vez que se aboliu ali a propriedade privada, baniu a burguesia, estabeleceu-se a nacionalização e a planificação central da economia. Porém, com o isolamento da revolução, e a consolidação de uma casta autoritária e centralista no poder político-social impediu-se a onto-negação da política, de forma mais clara, não se realizou a superação da política como mediação humana, o isolamento da revolução e o desenvolvimento da burocracia impediu a dissolução da política. A partir de 1923 estas variantes, o isolamento e a burocracia, mesmo alternando-se em centralidade solidificaram-se em freio contra-revolucionário. Assim, a emancipação política radical conquista pelas massas operárias de 1917-1923 ficou impedida de avançar em direção da emancipação humana. Esta obstrução da marcha do processo revolucionário de massas impediu que a classe operária desse um salto na direção de sua autoemancipação e na construção do socialismo, como uma sociedade baseada na autoorganização das capacidades humanas como forcas próprias, como controle coletivo livre, autoconsciente e universal dos trabalhadores sobre o processo de produção e assim da organização social.
Para a classe operária colocava-se de forma urgente dois caminhos candentes, ou suplantava os obstáculos à sua autoemancipação, extirpando a casta contra-revolucionária e avançava no processo de emancipação humana, ou veria a própria emancipação política radical conquistada com lágrimas e sangue recuar até “desmanchar-se no ar como tudo que é sólido”.  No final do século XX, com as restaurações capitalistas, constatamos que foi o segundo processo que prevaleceu.
Por todos os elementos postos, fica patente que a análise sobre a restauração capitalista ocorrida mundo a fora necessita precisa lidar com aspectos contraditórios. Esta sugestão é certamente aplicável a restauração capitalista na Alemanha. Não cabe ao campo marxista defender a restauração da propriedade privada como aconteceu com a restauração, uma vez que a luta contra a propriedade privada é luta histórica do proletariado mundial. Também não cabe ao campo marxista reivindicar a restauração/criação de burguesias, como ocorreu nos processos pós-restauração capitalista. Nesse sentido a restauração pode ser considerada como retrocesso histórico. Mas, mais estranho ainda ao campo marxista seria defender o stalinismo, uma forma social baseada no amordaçamento e aniquilação do proletariado e no pacto com extratos burgueses. Então os marxistas revolucionários reivindicam a dissolução da propriedade privada, com a extinção das burguesias, ao mesmo tempo em que combatem os stalinistas e suas estratégias de conciliação e sufocamento do movimento da classe dos trabalhadores. Então vejamos o quanto esta reflexão útil para pensar o ano de 1989.

1989: A LUTA CONTRA A BUROCRACIA STALINISTA

O fim da segunda guerra mundial estabelece uma nova ordem internacional, as duas potencias, E.U.A e URSS “dividem o mundo” por ordem de influência. A Alemanha será um destes países divididos. Em 13 de Agosto de 1961, por ondem da república Democrática Alemã (RDA) deu-se inicio a construção de um muro de concreto e aço de 166 quilômetros de extensão, quatro metros de altura e um metro e meio de largura para dividir o país em a República Democrática Alemã (Alemanha Oriental) e a República Federal da Alemanha (Alemanha Ocidental). A divisão gerou uma série de conflitos, enfrentamentos, prisões e mortes durante todo o período da guerra “fria”.
O muro existiu até 1989. Neste ano aconteceram no “Leste europeu” uma série de mobilizações populares que varreram os governos stalinistas, o que constituiu uma série de vitorias sociais. Porém este processo não é tão simples de ser analisado, pois tais mobilizações, sem um programa para longo prazo, sem direção para além do imediato, extirpou o stalinismo, mas criou um vácuo social que foi ocupado pela burguesia, assim, com restauração capitalista veio também a restauração da propriedade privada e das burguesias e o restabelecimento do mundo “unipolar”. Sobre a nova politica dos E.U.A pós-desagregação da URSS.
Mesmo com a Alemanha dividida, desde 2 de maio de 1989 já era possível passar de um lado para outro do muro via Hungria, onde soldados húngaros sob ordem do governo tinham começado a derrubar as fronteiras com a Áustria. Importante ressaltar que os acontecimento na Alemanha não deram-se de forma isolada, também na Hungria, em 10 de Junho, o Partido Comunista, buscando sanar pressões sociais, dá uma saída pela direita, mas assina com a oposição do governo um acordo que marcou a transição da Hungria para o multipartidarismo. Em agosto de 1989 o clima esquenta ainda no Leste europeu, no dia 21 eclodem manifestações na Checoslováquia,  milhares de manifestantes vão para as ruas do país  no vigésimo aniversário da invasão a Checoslováquia por tropas do Pacto de Varsóvia.
Segundo Sagra (2009), em setembro de 1989 15.000 alemães orientais chegaram à Alemanha Federal via Hungria. Mesmo perdendo sua função de barreira, o muro ainda era um fantasma concreto que aterrorizava os alemães, era chamados por muitos de “muro da vergonha”. Em outubro de 1989 desencadeia-se uma manifestação em Leipzig, situada na Alemanha do Leste, decorre dai um série de outras manifestações populares no país. O governo, sobre a presidência de Erich Honecker, em 18 de Outubro, manda reprimir os manifestantes. A ação presidencial causa um escândalo, Honecker perde sua base de sustentação com isso perde também o cargo, este é substituído por Egon Krenz, o antigo chefe de segurança. O governo sob liderança de Krenz continuam tentando dissuadir os manifestantes, mas a mobilização popular continua crescente. Cinco dia depois, 23 de outubro de 1989 mais de 200.000 mil manifestantes vão para as ruas. Em 6 de novembro são mais de 500 mil manifestantes nas ruas. Desta forma a situação torna-se insustentável, o mundo todo volta os olhos para Berlin. A URSS, bem como outros países sob sua influencia já estava em crise a décadas. Diante de tal quadro em 7 de Novembro, todo o conselho de ministros, o organismo que regia o destino da RDA, renuncia, a re-unificação é um fato, no dia 9 é feito o pronunciamento oficial.
Vimos pela televisão[16], em 9 de novembro de 1989, o anuncio oficial que a partir da meia-noite, os alemães do Leste poderiam cruzar qualquer uma das fronteiras da República Democrática Alemã (RDA), incluindo o Muro de Berlim, sem necessidade de contar com permissões especiais. O momento era histórico, pela televisão vimos que muito antes da meia-noite, milhares de berlinenses tinham-se aglomerado tanto do lado Ocidental quanto do lado Oriental do muro. Os minutos passavam lentamente, as pessoas não conseguiam conter-se e esperar a longinquá meia-noite, começaram a se pendurar e pular o muro. Familiares e amigos a muito separados se encontravam e abraçavam-se emocionados, muitos com lágrima nos olhos. Os ânimos foram se intensificando, começou então um ataque, num primeiro momento ainda tímido ao muro, até que eram centenas. O muro era simbolo de muitos sacrifícios, as pessoas chutavam o muro, batiam nele com qualquer objeto que tivesse às mãos, assim víamos milhares de jovens derrubando o muro a golpes. Para aqueles milhares de manifestantes tratava-se de por abaixo o muro.
No mesmo mês na Checoslováquia uma assembleia de estudantes marchou sobre a praça Wenceslasmanifestando seu descontentamento com o governo. A reação do governo Checo foi semelhante a de Honecker em outubro, repressão. A resposta da população Checa também foi semelhante a dos alemães. Milhares de Checos vão para a praça.
Em dezembro de 1989 foi a vez da Romênia, uma onda de protestos contra o governo agita o país. A resposta do governo romeno foi a mesma do governo alemão e do checo, mandou reprimir os manifestante. Porém aqui acontece algo distinto, o exército recusa-se a reprimir os manifestantes. Então o governo aciona suas Tropas Especiais que acabam por desencadear uma violenta e sangrenta repressão a 21 de dezembro, muitos manifestantes são mortos. Com isso intensifica-se ainda mais  a crise no país. Cresce a mobilização popular, desencadeia-se um movimento de massas radicalizado contra o governo, parte do exército, certamente muitos dos que se recusaram a reprimir os manifestantes, apoiam as mobilizações. Durante dois dias os enfrentamentos entre as massas e as forças pro-governo generalizam-se pelo país. No dia 23 de Dezembro, o presidente e sua esposa são presos, acusados de abuso de autoridade e do assassinato de 60.000 romenos. Dois dias depois foram executados. É formado um governo provisório.
Entendemos que entre 1989 e 1991, abriu-se um curto período pré-revolucionário em nível mundial. Que não pode ser confundido com um período revolucionário. Durante este período  pré-revolucionário as massas dos Estados Operários deformados e degenerados se levantaram contra as conseqüências das políticas “fundomonetaristas” aplicadas pelas burocracias governantes. Porém a ausência de um partido revolucionário, ou de direções operárias revolucionárias, ou inclusive de organismos embrionários de tipo soviético permitiram que desde o início a direção desses movimentos, denominados no período como “revoluções de veludo” recaísse em movimentos “democráticos” pequeno burgueses que lhes imprimiram sua marca e permitiram o ascenso de governos abertamente restauracionistas.

A DERRUBADA DO MURO SIGNIFICOU UMA VITORIA PARA O PROLETARIADO MUNDIAL?

Foi certamente positiva a extirpação do autoritarismo e da castração ideológica levada a cabo pelos partidos stalinistas. Porém a restauração da propriedade privada e da democracia burguesa, que é fundada sobre a desigualdade material é certamente um retrocesso a luta do proletariado alemão. A demanda por maiores liberdades políticas, pela emancipação humana, e pelo fim das desigualdades são demandas históricas do proletariado. A restauração da propriedade privada e a democracia burguesa, bem como as privatizações são demandas da burguesia, do patronato e dos ricos e não do proletariado.
A derrubada do muro trouxe no bojo a restauração capitalista, com a restauração da propriedade privada e implantação do neoliberalismo e considerável aprofundamento da subsunção da classe operária aos imperativos capitalista. Interessante notar que na esteira da mobilizações populares, também na a restauração capitalista foi coordenada pelos governos stalinista, como soviético e Alemão. Uma parte dos dirigentes dos “partidos comunistas” que acumularam privilégios, a denominada burocracia stalinista, estava ansiosa para converter-se em burguesia. Assim em 1989 as direções stalinistas fazem seu pacto final com a burguesia mundial, e assim dissolvem as ultimas conquistas do movimento operário (como o fim da propriedade privada e a extinção da burguesia) no lamaçal da ordem burguesa. Embora não se restrinja a questão econômica, uma analise fina sobre a economia dos países onde ocorreram as restaurações certamente revelaria aspectos importantes sobre os principais beneficiados pela restauração.
É necessário estar atento ao significado que se busca atribuir a 1989. O que os defensores do capitalismo argumentam é que o socialismo não deu certo e que o capitalismo vai bem. Corriqueiramente falam de “fracasso do socialismo”, “fracasso do marxismo” etc. Ora, como já colocamos inicialmente, o que vigorava no “Leste europeu” estava muito distante do socialismo e do marxismo. A confusão entre stalinismo e socialismo não é gratuita, aos defensores do capitalismo interessa colocar o capitalismo como forma única de pensar e organizar a sociedade. Para estes a humanidade já teria atingido o alto de seu desenvolvimento e agora trata-se de acertá-lo aos poucos. Já para os marxistas revolucionários, o capitalismo é incorrigível, para que uns poucos acumulem riquezas e bem estar, multidões de seres humanos necessitam acumular misérias e viver de formas precárias e ainda castrados em potencialidades humanas.
Ajuda compreender a intencionalidade dos governos capitalista pensar quem impulsionou suas comemorações e no teor ideológico que lhe foi empregado. No dia 9 de novembro de 2009 os representantes de governos das principais potencias do globo, entre eles estava a Chanceler da Alemanha Angela Merkel do Partido União Democrático-cristã, o presidente da França Nicolas Sarkozy do partido União por um Movimento Popular - UMP - (o mesmo de Jacques Chirac). Também participou das comemorações o Primeiro Ministro inglês Gordon Brown do Partido Trabalhista (Labour Party) e a Secretária de Estado dos E.U.A. Hillary Clinton, junto com outros convidados como o presidente russo Dimitri Medvedev, o último presidente soviético Mikhail Gorbachev e populista Lech Walesa. Este grupo foi s protagonista do que chamaram de “Festival da Liberdade”, em que os das principais potências capitalistas tomaram a dianteira para celebrar o 20º aniversário da derrubada do muro de Berlim. Seus discursos estavam permeados de referências a esse acontecimento com a “abertura de uma nova época” de “liberdade e democracia”.
As celebres personas ao falar de “uma nova época” de liberdade e democracia não tocaram esqueceram de considerar os estudos divulgados pela Organização da Nações Unidas, o estudo realizado pelo Conselho Econômico e Social da ONU  (The Inequality Predicament), demonstrou que mais de 50% (cinqüenta por cento) da renda mundial está concentrado  nas mãos de apenas 10% (dez por cento) da humanidade . Esqueceram também de considerar o relatório divulgado em Washington, 10 outubro de 2007, o estudo feito pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) revelou que nas ultimas década, mesmo frente ao enorme crescimento econômico mundial, a desigualdade de renda na maioria dos países do globo aumentou.
O desempenho insatisfatório do capitalismo não se restringe a economia. O mundo avançou pouco (ou quase nada) neste aspecto. Mesmo as liberdades políticas. Além do mais lembremos que os mesmos líderes mundiais que celebram a derrubada do muro de Berlim, apóiam as invasões militares e ocupações em outros países. Intervém na política e na economia de países subdesenvolvidos. Levantam diariamente novos muros e constroem campos de concentração contra os imigrantes dos países semicoloniais, a centenas de milhões que o capitalismo impõe condições precárias de sobrevivência para o beneficio de uma pequena parcela mundial. Ao mesmo tempo estes governantes, representantes da grande burguesia mundial, ‘dão sustentação’ à construção do muro com o qual o Estado de Israel fecha em guetos ao povo palestino.
 Mesmo no que diz respeito a nova era de “liberdade e democracia” aberta em 1989, devemos lembrar que com a derrubada do muro, e o fortalecimento do neoliberalismo, institucionalizou-se a flexibilização dos direitos trabalhista, além disso desencadeou-se uma série de contra-reformas no sistema educacional ataques e de saúde em vários países da Europa. Nas universidades abriu-se uma nova temporada de “caça as bruxas”, na defesa intransigente do “pensamento único” desencadearam-se campanhas de ofensiva ideológica e política contra o marxismo e os marxistas. Neste contexto veio também a absurda formulação de F. Fukuyama de fim da história.  Para qualquer um que reivindique o marxismo a conjuntura tornou-se desfavorável e até mesmo opressiva. Frente a tal conjuntura parte importante da esquerda mundial caiu na desmoralização. Setores que até então compunham a intelligentsia marxista abriram mão do marxismo, ou então encastelaram-se nas universidades por meio de uma marxismo estéril, descomprometido com a intervenção e transformação radical  da realidade social, nos termos colocados por Marx, Engels, Lenin e Trotsky. Muitos dos que se reivindicavam de esquerda foram para o centro e muitos que se diziam de centro migraram para a direita, passando a defender as coisas como estão e combatendo movimentos populares reivindicatório. Mas, a homogeneidade de pensamento e política não conseguiu se impor.
Na luta de classes, desde 1995 com a greve francesa de novembro-dezembro como marco, temos observado tendências regenerativas no movimento operário e de massas, com a tendência às lutas mais radicalizadas como na América Latina e na Palestina e o surgimento, nas potências imperialistas, da juventude anticapitalista que se expressou em Seattle e Praga.
Num primeiro momento (1995-1997) vivemos um período de dois anos que denominamos como “contra-ofensiva de massa em numerosos países”, com várias greves gerais e ações políticas de massas tanto na Europa ocidental como na América Latina e na Coréia do Sul, ações que foram muito massivas mas pouco radicalizadas. Nos extremos, em uma vanguarda ampla, isto também se expressou no fortalecimento (fundamentalmente no terreno eleitoral) de variantes à esquerda da terceira via como o peso eleitoral de LO e da LCR na França, Refundação Comunista na Itália, o Bloco de Esquerda em Portugal, o Partido da Esquerda na Suécia ou o SWP na Grã-Bretanha. Na América Latina, devido às características próprias do ascenso na região, junto com o surgimento de alternativas de substituição aos governos neoliberais (como a Aliança na Argentina), o que se fortaleceu à sua esquerda foram fundamentalmente as direções camponesas (MST brasileiro, EZLN mexicano, ASP de Evo Morales na Bolívia). Além disso, uma minoria espalhada pelo mundo continuou nos marcos do marxismo revolucionário, reivindicando-o como única filosofia que pode conduzir a emancipação humana.


20 ANOS DA DERRUBADA DO MURO DE BERLIM: O QUE FAZER?

Hoje a economia mundial atravessa sua pior crise desde a Grande Depressão de 1929, gerada na principal potencia econômica capitalista, os Estados Unidos. Esta crise está novamente desnudando o caráter do capitalismo fundado sobre crises e guerras, um sistema de exploração e opressão, contrariando por fato os discursos ideológicos de seus apologistas. É claro que não estamos dizendo que as crises econômicas levam às revoluções, ou que o capitalismo cairá por si só conduzindo a humanidade a patamares superiores de sociabilidade, é preciso ter clareza que o sistema capitalista não teria sido sustentado até hoje se não pudesse construir equilíbrios, rompe-los, reconstruí-los e rompe-los outra vez, ampliando, ao mesmo tempo, os limites de seu domínio. O equilíbrio do capitalismo é dinâmico, está sempre em processo de ruptura ou restauração.
Os Estado-nacionais burgueses empreendem intensa atividade para manutenção do sócio-metabolismo do capital. Basta observar como os governos intervieram nesta crise para salvar da quebra, com dinheiro público, a elite financeira e aos grandes monopólios, que seguem fazendo seus grandes negócios a custo de aumentar consideravelmente a dívida estatal, enquanto milhões de pessoas são empurradas ao desemprego e à pobreza.
Por tudo o que foi posto, é patente pensar formas de superar a ordem social posta, sem repetir erros do passado. Já argumentamos que o que se estabeleceu na URSS e na Alemanha não era socialismo, como também não era marxismo. A confusão entre tais processos tende a ocultar as possibilidades de superação da barbárie capitalista que estão contidas nas formulações de Marx, Engels, Lenin e Trotsky.
A 20 anos da derrubada do muro de Berlim, a crise econômica, as guerras, as convulsões sociais, depois de longas três décadas de retrocesso e ofensiva burguesa, a classe operária está recriando as condições para que a perspectiva da revolução social volte a ser colocada na luta dos explorados, superando os anos de reação ideológica e política que seguiram à restauração capitalista. Os processos decorridos na URSS não foram o fracasso da filosofia da práxis, nem do socialismo, bem porque o que imperava ali não era socialismo, e também stalinismo é antimarxismo, basta considerar, além da utopia-reacionária do socialismo num só pais, sua prática histórica bloqueando e/ou estrangulando os desenvolvimentos revolucionários.
A tragédia que foi o stalinismo, tanto na URSS como pelo mundo afora está diametralmente oposta à emancipação humana e ao materialismo histórico dialético. Aquela experiência deve ser estudada, criticada e superada, em busca de construir socialmente novas possibilidades estratégicas. Estamos dizendo que a compreensão destas experiências humanas deve ser utilizada na elaboração um programa, que abranja não só os Estados operários burocratizados, mas a sociedade capitalista como totalidade, em suas múltiplas determinações contraditórias. É claro que para nós este programa deve articular emancipação política e emancipação humana. Possibilitando liberar e canalizar as energias humanas para uma profunda mudança de sistema social.
De um extremo a outro coloca-se como tarefa a expropriação da burguesia, tanto da nova burguesia surgida no Estados operários burocratizados, como da “velha burguesia” emergida com a revolução burguesa. Para os marxistas revolucionários, trata-se ainda de construir a revolução mundial.
Neste sentido, coloca-se como premente a reconstrução da forma partidária da classe trabalhadora. Num partido internacionalista, que comprometido com a transformação social radical, com a revolução internacional proletária, faça das experiências de opressão a que os trabalhadores de todos os países do globo estão subalternizados e a terrível penúria da esmagadora maioria das massas. Por isso a experiências dos trabalhadores compõe matéria prima para a superação de tudo que existe. A experiência histórica nos mostrou que uma revolução é impossível sem a participação das massas em grande escala, e que estas massas, para serem vitoriosas devem estar munida de uma estratégia e um programa. É certo que as insurreições proletárias não dependem do partido para eclodirem, porém é inegável o salto qualitativo das insurreições quando o proletariado passou a se organizar em partidos revolucionários.
A sua posição na estruturação social dá ao proletariado o poder de suspender à vontade, parcial ou totalmente, o próprio funcionamento da economia da sociedade, é indispensável a luta conduzida em comum contra a exploração, pois a luta comum, por meio da experiência compartilhada, cria importantes momentos de solidariedade e de sacrifício, por greves parciais ou pela greve geral, esta por sua vez, em uma série de momentos históricos, avançou de greve geral para insurreição armada, e de insurreição armada para revoluções e de revolução para a ditadura do proletariado. O partido do proletariado, o partido revolucionário, deve tencionar-se à liberação e canalização das energias humanas para a superação do sóciometabolismo do capital.
Não cabe para nós a afirmação abnegadora de que a classe trabalhadora não tem consciência de classe. Na sociedade capitalista todo ser humano esta esquadrinhado por relações de classe social (possuidor de meios de produção e despossuídos de meios de produção). Bem como todo ser humano tem percepções das relações de dominação. Ter consciência de classe não significa ter consciência de classe revolucionária (consciência de classe contingente). O mais importante é que o partido revolucionário, atento as alterações produzidas por causas históricas profundas, não pode se adaptar passivamente a todas as mudanças no estado de ânimo das massas, cedendo as frações mais incertas do proletariado. Nesse sentido, a função central do Partido Revolucionário é a de revolucionar a consciência da classe operária. Transformando a consciência de classe contingente em consciência de classe necessária. Ajustando-a as tarefas do presente.

Pois o melhor momento para construir um partido proletário revolucionário é certamente o momento em que o proletariado encontra-se subalternizado. Não se pode esperar pela “conjuntura revolucionária” para dar inicio a esta tarefa árdua, é necessário começar já a forjar hoje a vanguarda revolucionária que será o coveiro coletivo da burguesia manhã. Os revolucionários necessitam articular-se em um partido revolucionário, o exército conscientemente das necessidades históricas do proletariado deve ser mais forte do que o exército contra-revolucionário do capital, intensificando suas ações defendendo as tentativas de autoorganização operária, pautando o programa histórico do proletariado. Apenas a ditadura do proletariado contra as classes dominantes é que pode realizar a reforma agrária, como apenas sobre o controle operário da produção se elimina a desigualdade sócio-material. Apenas o proletariado pode levar a cabo a dissolução das classes sociais, abolição da propriedade privada e dissolução do Estado, para assim, novamente como dissera o poeta Maiakovski, ‘desatar o futuro, pois este não virá por si só’.



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