Combate Classista

Teoria Marxista, Política e História contemporânea.

terça-feira, 10 de setembro de 2013

Movimento operário em Osasco e no ABC paulista: tradição, rupturas e continuidades - parte II



XVI Congresso Brasileiro de Sociologia



10 a 13 de setembro de 2013, Salvador (BA)
Grupo de Trabalho: GT35 - Trabalho, Sindicalismo e Ações Coletivas








Movimento operário em Osasco e no ABC paulista:
tradição, rupturas e continuidades[1]






Alessandro de Moura
doutorando em Ciências Sociais.
Universidade Estadual
Paulista – Unesp-Marília




Mobilizações operárias massivas na década de 1960
Para uma compreensão mais expandida sobre as mobilizações, levantes e processos grevistas no Brasil nesse período, é necessário denotar a conjuntura daquela década. Já em janeiro de 1959 é deflagrada a revolução cubana, esse processo influenciará uma série de outros movimentos políticos pelo mundo. No Brasil serão muitas as organizações políticas, partidos e correntes políticas que buscarão se adaptar a elementos estratégicos dessa revolução, sobretudo os grupos que aderiram a luta armada. Mesmo após o assassinato de Che Guevara na Bolívia, seu nome continua sendo reivindicado por amplos setores da juventude, mas também por correntes políticas, partido de esquerda, e uma ampla vanguarda operária e estudantil. Ainda, para além do exemplo cubano, a década de 1960 foi marcada por uma série de processos de enfrentamentos agudos no terreno da luta de classes. Nos Estado Unidos, em outubro de 1966, é publicado O programa de dez pontos dos Panteras Negras, corrente armada do movimento negro que reivindicava aspectos do maoísmo. Dentro desta década, o pico das mobilizações convergirão no 1968.
O 1968 foi trágico no México, o presidente Gustavo Dias Ordaz Bolaños ordena o massacre contra estudantes da Universidad Autonoma del México (UNAM) mais de 500 são assassinados. No mesmo ano tem-se a Primavera de Praga, nas principais fábricas na Itália operários organizam-se contra as burocracias sindicais e partidárias do Partido Comunista Italiano e contra a CGIL, nesse terreno deflagram o Outono Quente Italiano. Na França operários e têxteis revoltam-se contra o PC e contra a CGT e articulam-se com os estudantes, desencadeiam uma greve geral no dia 13 de maio de 1968. Uma onda de greves, por fora dos sindicatos, varre a França. São greves com ocupação de fábrica. O Maio Francês contribui diretamente para fortalecer as mobilizações contra a Guerra do Vietnã. Fortes mobilizações estudantis e operárias tomam conta também das lutas sociais no Japão. Em síntese, poderíamos dizer que 1968 foi o ano em que operários e estudantes combateram abertamente as instituições capitalistas, as burocracias partidárias, sindicas e estalinistas.
A década de 1960 no Brasil
A década de 1960 no Brasil foi marcada por intensificação progressiva da luta de classes no campo e nas cidades, que se somavam às crises das instituições políticas. A crise política e institucional foi coroada pela renuncia de Jânio Quadros em 24 de agosto de 1961, que, por sua vez produziu a crise da sucessão. O sociólogo Moniz Bandeira no livro A renuncia de Jânio Quadros e a crise pré 64, analisa que “As eleições para a presidência da República, em 1960, refletiram essa crise, que explodiu mais intensamente com a tentativa do golpe bonapartista de Jânio Quadros”. (p. 74). Sendo que, com a renuncia, o presidente tentava, por meio de um golpe bonapartista, sobrepor-se as instituições políticas e dirigir o país com uma ditadura pessoal, “jogara uma cartada com objetivo de provocar um impasse entre o povo, as Forcas Armadas e o Congresso, o que lhe possibilitaria exigir poderes extraordinários como condição para o seu retorno ao Governo. Em outras palavras, ele tentou produzir um trauma institucional e submeter o Pais a sua ditadura. E fracassou. (BANDEIRA, 1979, p. 09).
De acordo com a analise do autor, o presidente Quadros, com seu “espírito pequeno-burguês e de lumpen político”, pretendia “instrumentalizando o apoio popular, promover a mesma política de direita, que, em última instância, os militares realizariam, diretamente, após o golpe de estado de 1964”. (Idem, p. 18). Seu plano fracassou, mas a crise política fundiu-se com as altas inflacionárias, que orbitaram em torno de 45% em 1961, confluindo com o ascenso das lutas sociais no Brasil. A crise da sucessão convergiu com os levantes das Ligas Camponesas e as greves nas cidades “Só em São Paulo, 980 firmas, com 158.891 operários entraram em greve. (p. 72). Outro fenômeno político verificado foi a radicalização das classes médias e do funcionalismo público. No Rio de Janeiro desencadeou-se a greve dos Bancários. No Estado de São Paulo deflagra-se uma greve de jornalistas. No campo intensifica-se a ocupação de terras e organização do proletariado agrícola que levantam a consigna "Reforma agrária já. Reforma agrária na lei ou na marra”. De acordo com Bandeira
As massas camponesas passaram para níveis mais adiantados de organização e luta. Sucederam-se as ocupações de terra no Estado do Rio, no Rio Grande do Sul, no Maranhão, na Bahia, na Paraíba, enfim, em vários pontos do território nacional. A realização do Congresso Camponês, em Belo Horizonte, de 15 a 17 de novembro de 1961, reuniu cerca de 1600 delegados. Os camponeses, com faixas e cartazes, pediam: "Reforma agrária já. Reforma agrária na lei ou na marra". O povo revelava sua capacidade de luta, adquiria experiência. (p. 68-69).
De imediato, em meio a crise de sucessão, “A burguesia tratou de desenvolver a sua política de compromissos, a fim de estabilizar o capitalismo. Nunca se falou e se cantou tanto o espírito pacifico do povo brasileiro. Era a união nacional”. (p. 69). Porém, o desejo das classes dominantes não se realizaria pacificamente. Como conseqüência da renúncia, Leonel Brizola e o PTB empreendem no Sul grande movimento pela legalidade, para que o vice de Jânio, João Goulart assumisse a presidência. Improvisa-se em Porto alegre o “Comitê de Resistência Democrática”, armas são distribuídas a setores de confiança de Leonel Brizola, que chega a declarar que estava preparado para marchar com 90 mil homens armados contra Brasília e dissolver o Congresso, caso João Goulart fosse impedido de assumir o governo. Jango assume, mas a crise de política persiste fazendo acelerar a crise pré-revolucionária. (LEAL, 2004).
Durante o governo de João Goulart intensifica-se a luta de classes. Na Região Nordeste as lutas camponesas agudizam-se sobremaneira. Em junho de 1962 ocorrem mobilizações massivas no Estado do Rio de Janeiro. Uma greve geral em apoio a Goulart paralisa o país. No movimento sindical e operário organizam-se entidades políticas, entre elas estavam o cupulista Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), o Pacto de Unidade e Ação (PUA), o Foro de Santos e os Conselhos Permanentes das Organizações Sindicais (CPOS), entidades em que o PCB tinha peso determinante, e que pautavam-se pelo legalismo e reformismo social. Em meio as intensas e recorrentes mobilizações, o espectro da revolução cubana assombra as classes dominantes no Brasil.(BANDEIRA, 1977: LEAL, 2004).
Moniz Bandeira, no livro O governo João Goulart – as lutas sociais no Brasil 1961-1964 analisa que “De qualquer forma, a participação militante do proletariado urbano, sua entrada na cena política, mudou, daí por diante, a qualidade do espetáculo”. (p. 60). Em 1963 a mobilização em torno das Reformas de Base ganham caráter candente, agregam-se três sujeitos políticos coletivos: o movimento operário, camponeses e setores das Forças Armadas. Rapidamente aprofunda-se uma situação pré-revolucionária, na qual as frações da burguesia não conseguiam mais dominar e as classes trabalhadoras não queriam mais aceitar a ordem política vigente.
(...) O CGT ameaçou com uma greve geral para exigir do Congresso a aprovação das reformas de base, com a mudança da Constituição. Os conflitos abalaram tanto as cidades como os campos. Os trabalhadores, em Pernambuco, paralisaram pela primeira vez os engenhos de açúcar. As invasões de terras tomaram características de rebeliões. E as lutas de classe refletiam-se no seio das Forças Armadas (...). (p. 104).
O nacional-reformismo de Goulart e dos siameses PDT-PCB provaram-se insuficientes para resolver as demandas e necessidades sociais e políticas daquela época.
Durante a década de 1960 a organização das Ligas intensifica-se. Em 1963 atingiam 18 dos 22 estados brasileiros existentes à época, com 218 Ligas no total concentradas sobretudo no Nordeste, mas também em estados importantes do centro sul, segundo os números que seguem: 64 ligas em Pernambuco, 15 na Paraíba, 12 no Maranhão, 10 no Ceará e 9 na Bahia, 15 em São Paulo, 14 no Rio de Janeiro, 12 em Goiás e 11 Espírito Santo. No momento de auge, as Ligas afirmavam contar com 500 mil afiliados. Além das Ligas Camponesas, também era crescente o número de sindicatos rurais organizados pelo proletariado agrícola. Em números oficiais, os sindicatos rurais no país passaram de 6 em 1961, para 60 em 1962 e 270 no inicio de 1963, saltando para 1300 justamente nas vésperas do golpe contra-revolucionário.
O expressivo crescimento das Ligas e sua atividade permanente, colocavam em risco a manutenção dos lucros do patronato agrícola, a propriedade privada em posse dos latifundiários, e assim a própria estrutura fundiária no Brasil. Sob o consigna “reforma agrária na lei ou na marra!”, as Ligas reivindicavam a utilização de métodos de guerra civil no campo para impor o fim do latifúndio. Desta forma, exerciam intensa pressão sobre os grandes proprietários, sobre os governos locais, estaduais e o patronato agrícola. Articulado o governo e as classes dominantes, sustentavam grupos paramilitares para combater o proletariado agrícola com métodos de guerra civil, como se dava no caso da região de Alagoas. Ou seja, o patronato e a burguesia do campo respondiam ao ascenso camponês com repressão armada, atentados e assassinatos de militantes e suas famílias.
Os militares
Setores do exército estavam se organizando e se rebelando com tendências a unificação de pautas com o conjunto do movimento que se desenvolvia no campo e na cidade. As décadas de 50 e 60 foram marcadas por intenso processo de politização nas Forças Armadas, percorrendo desde o alto-comando até as bases e passando por toda a oficialidade. Um período marcado por um importante peso dos militares na vida política nacional: a tentativa de golpe militar contra Vargas em 1953, a “Novembrada” em 1954, o peso determinante de Lott na estabilidade do governo JK e a tentativa de golpe militar em 1961. As divisões entre as distintas frações burguesas e a polarização de classes atravessavam o Exército e as demais Armas, reunindo de um lado os setores que se ligavam ao trabalhismo e apoiavam o ascenso popular e de outro os setores mais diretamente pró-imperialistas e que se ligavam à UDN. A partir de 1961, as divisões que até então se expressavam predominantemente entre setores da oficialidade e do alto-comando, passaram a se expressar também com revoltas das bases contra o alto-comando e tendências à ligação dos soldados e suboficiais com o movimento operário e camponês.
Em 1962 setores das forças armadas criaram uma forma de sindicato para organizar as reivindicações dos militares, constituíram a Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil – AMFNB. Essa associação tinha acordo com as demandas das Ligas Camponesas por reforma agrária e queriam contribuir para a organização dos trabalhadores e trabalhadoras. Os militares de baixa patente eram oriundos da classe trabalhadora e também sofriam intensa opressão nas Forças Armadas, comiam em cozinhas separadas, não podiam ouvir rádio, não podiam se casar, nem votar ou serem eleitos e seus salários não chegavam sequer um salário mínimo. A AMFNB foi a forma sindical encontrada para lutar por suas demandas imediatas. No entanto, com a agudização da luta de classes no país este sindicato politizou-se rapidamente e avançando para o acumulo de elementos de auto-organização, até que em 1963 eclodiu a “revolta dos sargentos”. (Confira: LEAL, 2004: SALLES; MATOS, 2007).
Nas cidades, os trabalhadores e trabalhadoras organizam-se contra as condições paupérrimas que lhe eram impostas, utilizando-se de suas tradicionais formas de luta: greves, piquetes e paralisações. Assim, entre 1961 e 1963, o processo dá um novo salto, quadruplicando o número de greves econômicas nos serviços e na indústria. Os grevistas chegam a 5,6 milhões, caracterizando o maior ascenso grevístico da história do país até aquele momento. Em março de 1963, via Federação de Metalúrgicos do Estado de São Paulo, desencadeia-se uma greve que envolve 220.000 trabalhadores, que durou três dias. Em outubro, a greve dos 700 mil atingiu 40 cidades do interior paulista, englobando 80 sindicatos de 11 categorias. Porém, o movimento operário articulado por meio do CGT-PCB, vive os processos organizativos quase que isolado da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil (AMFNB) e das Ligas Camponesas. As greves representaram um pico na ação conjunta e organizada da classe a nível nacional, no entanto, foram ainda mobilizações controladas, organizadas pela burocracia do CGT para demonstrar seu apoio político a João Goulart e seus projetos. As direções, em primeiro lugar o PCB, faziam da classe operária um peso a mais na balança da correlação de forças entre as distintas frações das classes dominantes.
Frente à ofensiva operária, camponesa e militar, o Estado, a burguesia e o patronato reagem, e reagem duramente em defesa dos seus lucros, da dominação de classes e da estabilidade do sistema capitalista brasileiro. Assim, o golpe militar-burguês que figurava como risco eminente concretizou-se, mas Jango optou pelo não resistir, e a partir do golpe de 1964 o processo de desenvolvimento da organização do movimento sindical e proletário foi interrompido, abre-se uma intensa onda governamental repressiva. Milhares de sindicalistas e militantes são cassados. No lugar dos representantes eleitos pelos trabalhadores e trabalhadoras, o governo militar designa interventores para o principais sindicatos do país.
Ou seja, o golpe foi uma investida militar para manter a ordem de classe, dissolvendo sindicatos, partidos políticos e demais organizações proletárias que pressionavam as classes dominantes e seu governo em busca de transformações estruturais. Desta forma podemos dizer que a ditadura militar era também uma ditadura burguesa, tínhamos na verdade um Estado burguês em módulo de guerra contra o proletariado e suas instituições (partidos, sindicatos e correntes políticas). Dessa forma, a investida militar teve um destinatário certo: o proletariado brasileiro que emergia como sujeito político.
O golpe militar-burguês foi justificado pelas forças militares, classes dominantes e suas bases pequeno-burguesas e de classe média, como a única forma possível de combater a corrupção, restabelecer a ordem política e controlar a inflação. Este discurso visava ganhar apoio para os propósitos castrenses e burgueses. Pois, de fato o golpe visava fazer refluir o período pré-revolucionário que se abria no País desde o inicio da década de 1960. Em síntese, no caso do Brasil, os principais elementos constitutivos deste período pré-revolucionário seriam: a) a crise econômica, com explosão inflacionária e déficits na balança de pagamentos. b) organização e radicalização do campesinato, com a consigna “reforma agrária na Lei ou na marra”. c) organização e radicalização dos trabalhadores demonstradas em greves políticas contra governo, bem como contra os “arrochos”, expressa pela deflagração de greves massivas no período d) insubordinação, organização e radicalização de setores das Forças Armadas, com tendência a unificação com movimentos operários e camponeses.
Com o golpe militar-burguês 1800 dirigentes sindicais são caçados. Interventores sindicais são nomeados pela Ditadura. As greves são proibidas, os reajustes salariais também. O mesmo se passa com os partidos políticos. Parlamentares perdem seus mandatos, se exilam ou são exilados. Organizações sindicais são proibidas. Toda a superestrutura sindical é sufocada e controlada pelo governo militar. Inicia-se um profundo refluxo no movimento operário. Todos esses elementos obrigam à organização de novos organismos sindicais pela base, a partir de cada unidade produtiva. Tem-se um novo terreno para o desenvolvimento de comissões de fábricas, grupos de trabalho e comitês operários. Novos processos e novos dirigentes operários surgirão para ocupar os espaços esvaziados pela repressão militar-burguesa, sobretudo em Contagem e Osasco.
Movimento operário em Osasco
Durante o governo Juscelino Kubitschek, instalou-se em Osasco a Brown Boveri (1957), Braseixos Rockwell (1959), Ford-Motor do Brasil (1959) e White Martins (1960). A instalação dessas fábricas contribuía para incrementar o movimento operário na cidade. Na década de 1960 80% dos postos de trabalho na cidade decorriam da atividade industrial. (Orlando, 1987, p. 55). O movimento operário de Osasco confluía com as mobilizações nacionais, tomaram parte na greve dos 300 mil em 1953, da greve 500 mil em 1957 e da greve dos 700 mil de 1963 “os metalúrgicos de Osasco, principalmente os da Cobrasma [Companhia Brasileira de Material Ferroviário], tiveram participação destacada” (Espinosa, 1978).
Entre as mobilizações políticas em Osasco, colocava-se também a luta para emancipar-se da cidade de São Paulo, buscando constituir-se como cidade autônoma. Assim iniciou-se o Movimento emancipacionista que realizou os plebiscitos de 1953 e 1958. A emancipação só viria em 1962. Esse movimento iniciou-se com o protagonismo das classes médias, pequena-burguesia, comerciantes e profissionais liberais, mas ao longo do processo foi envolvendo cada vez mais setores do proletariado e do movimento estudantil secundarista. Salazar foi o primeiro prefeito da recém criada cidade. Com a emancipação da cidade tornava-se possível ter um sindicado próprio. Conrado Del Papa do Partido Socialista buscará encaminhar os tramites. De acordo com Orlando Miranda no livro Obscuros heróis de capricórnio “Com a autonomia, os sindicalistas locais, Papa à frente, trataram de criar o Sindicato dos metalúrgicos de Osasco, desligando-se de São Paulo”. (p. 53). Contando com apoio do PCB, Conrado Del Papa elegeu-se com chapa única para a presidência do novo sindicato. No entanto a presidência de Del Papa duraria pouco, pois no dia 8 de abril de 1964 foi cassado e substituído pelo interventor designado pela Ditadura, seu nome era Luiz Camargo. O prefeito Salazar também foi cassado pelos militares.
Organização a partir do chão das fábricas
Já em 1962 forma-se comitês operários clandestinos nas fábricas de Osasco, na Braseixos e na Cobrasma. Nesse mesmo ano organiza-se em Osasco a Frente Nacional do Trabalho (FNT), um grupo político que congregava membros da Ação católica operária (ACO) e da Juventude operária católica (JOC), esses buscavam se ater as demandas imediatas, abstendo-se das lutas políticas  e contrapunham-se a política do PCB. De acordo com Ibrahim (1978), na Cobrasma, a FNT servia “como amortecedor entre patrões e empregados”. Espinosa afirma que essa organização de operários-cristãos “se opunha ao sindicato por este ser dirigido por comunistas e se propunha a realizar um trabalho de denuncia e conscientização dentro das fábricas”. (p. 42). Em publicação posterior (1986), Ibrahim afirma:
O grupo dos Cristãos atuava no sentido de buscar o diálogo com os patrões dentro de uma visão que colocava as injustiças existentes como frutos da falta de diálogo e que acreditava que muitos dos desmandos que aconteciam não eram do conhecimento dos patrões. Seu lema era dialogar e negociar para humanizar a fábrica. Para eles, a direção sindical boicotava qualquer mecanismo de diálogo e negociação interna, porque estava mais interessada em fazer a política dos partidos através da máquina sindical do que em cuidar dos problemas concretos que afligiam o trabalhador. Sua função era legalista e mais aberta pois colocava como prioritário o contato direto com os patrões na busca do diálogo e chegaram a institucionalizar-se como comissão sem contar com aval dos patrões foi a chamada Comissão dos Dez. Foi assim denominada, pois foram dez operários os seus fundadores. (p. 53).
Também, a FNT chegou a compor gestão com os interventores da ditadura na gestão do Sindicato Metalúrgico de Osasco em 1965. Ainda assim, ela seria a principal responsável por impulsionar a Comissão de Fábrica legal naquela fábrica em 1963.
Também em 1963, operários da Braseixos que eram militantes do PCB se afastam desse partido por discordar de suas práticas sindicais cupulistas. Consequentemente esses operários formam um “comitê clandestino” na Braseixos. Esse comitê influenciará operários da Cobrasma que seguirão seu exemplo e criarão um comitê clandestino nessa fábrica. (Ibrahim, 1986, 1978: Espinosa, 1978).
Com isso, passa a existir dois organismos de auto-organização operária na Cobrasma, um legal, articulada pela FNT e um clandestino chamado de Comitê. De acordo com Ibrahim, o comitê clandestino foi “o resultado da aglutinação de militantes de esquerda com os que criticavam a cúpula sindical e elementos do PCB, reforçados após 1964 por militantes do próprio PC, que ficariam órfãos de orientação”. (p, 52). Acrescenta ainda que “o grupo de esquerda formou-se por volta de 1963, sob influencia do comitê da Braseixos. Sua atividade na fábrica era quase clandestina. Somente pessoas de total confiança do grupo participavam das reuniões de planejamento da ação sindical a ser desenvolvida na empresa”. (p. 53).
 Com o golpe militar, a Diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco foi cassada, Conrado Del Papa perdera seu cargo. No entanto, mesmo com a cassação da diretoria do Sindicato, as comissões continuaram atuando. Conforme destaca Orlando Miranda, a repressão militar “(...) afetou aparelhos sem desarticular movimentos nem tocar-lhes o ânimo. Sua influência”. (p. 126). Dessa forma, para o autor, a repressão desmantelava as instituições supra-estruturais sem comprometer a auto-organização das bases operárias. A repressão causou maiores prejuízos então sobre a administração da “Prefeitura e Câmara Municipal, desligadas das organizações de base”. (p. 126). Assim, de acordo com o autor “os movimentos de operários e estudantes tinham sido apenas postos à margem, havia somente perdido a ocasião de demonstrar sua vitalidade. Sua capacidade e seu potencial de luta permaneciam intactos”. (MIRANDA, 1987, p. 126).
Mas, como golpe militar-burguês cerceou todas as instituições operárias e estudantis, colocou claramente a necessidade urgente da auto-organização pela base. A morte de um operário em um acidente de trabalho na Cobrasma levara a construção de uma ação conjunta, uma paralisação da fábrica. Aos poucos o “grupo de Osasco” e a FNT vão começar a construir outras ações conjuntas, isso ocorrerá tanto na comissão de fábrica legal como nas as eleições sindicais contra os interventores da Ditadura. Na Cobrasma formaram-se importantes quadros operários que congregariam a vanguarda operária de 1968.
A crise política combina-se com a inflação crescente. A inflação evoluirá rapidamente entre a data do golpe e o ano de 1967, acumulando-se em torno de 35%. (ESPINOSA). Segundo Jarbas Passarinho, Ministro do Trabalho em 1968, em 1966 a inflação foi de 41% e de 24 % em 1967 (Passarinho, 1978). O arrocho salarial elevava sobremaneira o custo de vida. As instituições políticas estavam sufocadas. Toda organização operária clandestina, semi-legal e legalizada, aos poucos passam a confluir com novos setores sociais que estão descontentes com a Ditadura militar-burguesa. Conforme destaca Espinosa, entre “1965, 1966 e a primeira metade de 1967 é o tempo em que a pequena burguesia se afastou do regime que havia ajudado a instaurar em 1964. Em 1964, grande parte dessa camada social se manifestava contra o comunismo, clamando pelo golpe de Estado”. (p. 37). É nessa conjuntura que são saudadas as mobilizações estudantis de setembro de 1966, denominadas de Setembrada, quando diversos setores estudantis e do funcionalismo público buscam aproximações com setores organizados do movimento operário.
Na esteira desse processo é que se desenvolverá o movimento estudantil secundarista de Osasco. “A reorganização do movimento estudantil secundarista em Osasco iniciou-se em 1965, mas completou-se em setembro de 1966, logo depois das tentativas feitas em Osasco para promover passeatas de solidariedade aos universitários paulistas”. O movimento secundarista de Osasco portaria uma especificidade, pois o CENRART (um grande colégio da cidade) fornecia mão de obra para as suas fábricas, sendo que na Cobrasma os estudantes eram admitidos aos 14 anos. Tornavam-se então operários-estudantes. Praticamente todos os dirigentes operários (de maior destaque na região) passaram por esse colégio e pela Cobrasma.
Ao longo da década de 1960, os operários da Cobrasma fazem continuas experiências políticas de auto-organização. Foi a organização dos núcleos operários que tornou possível a realização de uma operação tartaruga em 1966. Em represaria, a patronal demite 46 operários. A comissão mobiliza toda a fábrica pela incorporação imediata, e consegue rever parte das demissões. “Essa luta mobilizou toda a fábrica, e o seu desfecho fortaleceu bastante o pólo que propunha a mobilização permanente como forma de dar respaldo à comissão e evitar o seu imobilismo”. (p. 58). Nesse mesmo ano, tem-se novas eleições para a comissão de fábrica da Cobrasma, e o “grupo de esquerda”, também chamado de “grupo de Osasco” sai fortalecido. Segundo Espinosa, “Na segunda comissão, eleita em 1966, a maior parte pertencia ou estava sob influência do grupo de Osasco, tendo José Ibrahim sido eleito presidente e Roque aparecido da Silva secretário da comissão”. (p. 43).
Em julho de 1967 os operários dessa fábrica, ligados a FNT e ao “grupo de Osasco” organizarão, com operários de outras fábricas, uma chapa para concorrer ao sindicato metalúrgico da cidade contra uma chapa organizada pelo PCB (chapa azul – que tinha a frente Henos Amorina), e uma terceira chapa inexpressiva. No programa da Chapa Verde constava: a revogação da Lei anti-greve (Lei 4.330) e também da lei do arrocho (4.725), luta contra a estrutura a estrutura sindical, liberdade organizativa e contra a carestia. Essa chapa organizou “comitês eleitorais dentro da empresa”. Devido o trabalho de base anterior, somado a um programa que atendia os interesses do operariado, e a uma boa campanha eleitoral. De acordo com Orlando (1987), a Chapa Verde fez “uma campanha propriamente política e conclamando à organização dos trabalhadores para fazer frente ao Estado”. (p. 155). Com isso, garantiu-se a vitória da Chapa, sendo que o peso decisivo nas votações foi exercido pelo operariado da Cobrasma, a maior fábrica da região, onde 90% dos operários aderiram a esse programa. Dos 24 membros da chapa, 15 eram operários da Cobrasma, Ibrahim seria o seu presidente. “A FNT ficou com a maioria dos cargos, mas o grupo de Osasco teve maior influencia na definição do programa”. (Espinosa, p. 45).
Com a vitória da “Chapa Verde”, iniciou-se uma nova fase do sindicalismo na região. O programa geral de “organização pela base” que desabrochará na Cobrasma, é projetado à super-estrutura política e sindical, disseminando-se por todas as fábricas da região. Esse programa pôde ainda ser chocado com o programa da Federação Metalúrgica de São Paulo e do Sindicato de Guarulhos, respectivamente sob gestão de Joaquinzão e seus apoiadores do PCB. O movimento operário articulado em torno do bastião da Cobrasma pode propagandear um programa combativo e de independência operária em relação aos patrões e ao governo. Como analisava Ibrahim: “Agora, a comissão tinha o sindicato na mão e essa era a oportunidade para demonstrar de forma mais ampla a eficácia da sua concepção de organização pela base, de sindicalismo de massa e democracia participativa condensadas na experiência de alguns anos de luta no âmbito de uma única empresa”. (1986, p. 64).
A gestão do sindicato seria composta por operários independentes e militantes da FNT. O acordo comum era com um giro para as bases operárias, formação de comissões nos locais de trabalho, luta contra a Lei anti-greve e contra o arrocho salarial imposto pela ditadura militar. De acordo com Ibrahim “Para atingir esse objetivo voltamos toda a máquina sindical,no sentido de criar uma organização independente, iniciando um processo de mobilização fábrica por fábrica. A agitação de todos os problemas internos na empresa abria caminho para a organização dos comitês clandestinos” (1978, p. 10). Além disso, a gestão do sindicato era feita por meio de assembléias gerais com participação direta do operariado nas decisões. Como explicara Ibrahim (1986):
A direção sindical era exercida de forma coletiva, sem distinção entre efetivos e suplentes, e instituiu-se um conselho político, formado pela comissão da Cobrasma, pela diretoria e pelos grupos de fábrica que eram considerados como comissão de fato, mesmo sem a formalização diante dos patrões. Esse conselho era o responsável pela direção política do sindicato, e a diretoria funcionavam como órgão executivo desse conselho. (1986, p. 65).
            Osasco não foi o único lugar onde desenvolvem-se organismos pela base. Também em 1967, em Contagem (MG), começam a surgir as Comissões de Fábrica, chamadas de “comissões de cinco”. O movimento operário de Osasco influencia Contagem em 1967. Já em abril de 1968, serão as greves de Contagem que influenciarão as greves de julho em Osasco.
As greves de abril de 1968 em Contagem
Os levantes de 1968 serão expressão da reorganização do movimento operário pós golpe militar. Dessa forma, podemos dizer que será fruto de um acumulo de forças e experiências políticas. Ou seja, o golpe militar não conseguiu paralisar a auto-organização operária. A movimentação é crescente nos centros mais industrializados do país, seguida por movimentações no campo e nas periferias. Contagem, Osasco, São Paulo, ABC paulista, Guarulhos e Campinas serão palco dessas mobilizações. Nos sindicatos formam-se oposições, que tem por objetivo central combater os interventores da ditadura e a conquista da liberdade de organização sindical. Em 1967, em Contagem, a chapa de Enio Seabra sairá vitoriosa das eleições do sindicato dos metalúrgicos, com isso aprofunda a mobilização contra o arrocho salarial determinado pelo governo militar.
As mobilizações dos metalúrgicos em 1967, vão convergir com uma série de outras mobilizações de trabalhadoras e trabalhadores: professoras, bancários, outros setores do funcionalismo público, e dos mineiros vão às ruas contra o arrocho salarial e demissões. No dia 6 de junho professoras primárias deflagram uma greve que mobilizará 4.000 professoras em 26 Municípios de Minas Gerais. Um mês depois, no dia 7 de julho, ocorre a greve dos funcionário municipais  de Belo Horizonte. No mesmo mês tem-se os protestos de bancários e de operários municipais. (Weffort, 1969). A luta contra o arrocho salarial atinge o funcionalismo público e soma-se as mobilizações dos operários nas empresas privadas. De acordo com Weffort:
Em abril de 1967 a Mannesman dispensara cerca de 600 operários (…). Em junho, quando se iniciava a campanha eleitoral, começa também uma greve por atraso de pagamento por parte dos mineiros de Ibirité e São João de Rei (Cia. Siderúrgica Nacional) que deverá durar perto de um mês e meio. Em novembro começa o movimento dos operários da Companhia Brasileira de Usinas Metalúrgicas de Barão de Cocais, também por salários atrasados. Em dezembro surgem vários casos de protesto por atraso no pagamento do “13 salário”. Em inicio de 1968, pouco antes portanto da greve de abril, cerca de vinte pequenas empresas se viram obrigadas a fechar as portas por más condições financeiras (entre estas se encontrava a Minas Aço que causou por ter dispensado sem indenização 170 trabalhadores). Na mesma época, a A.E.I efetuou seu programa de redução de pessoal, despedindo 230 trabalhadores em um total de 300. Em fins de fevereiro entram em greve 3.500 operários da ACESITA reivindicando o cumprimento  do anterior reajuste de salários. Em março, o Sindicato dos Metalúrgicos denunciava que a indústria havia despedido cerca de 40 operários em bases fraudulentas. Em abril, toca à MAFERSA empreender seu programa de redução de pessoal: diminui o quadro de pessoa de 500 para 360 e ameaça de dispensa também os restantes argumentando com a má situação financeira da empresa. (p. 32-33).
Conflui com a mobilização operária e de diversos setores da classe trabalhadora a efervescência do movimento estudantil. (…) Num ambiente de agitação crescente, renasce o movimento estudantil nos três colégios locais, surgem novas organizações de bairro (cineclubes, sociedades de amigos de bairro etc) e ampliam-se as atividades das igrejas locais, em especial por meio de assembleias paroquiais. (p. 33). Ainda, no final de 1967, em meio a efervescência social em Contagem, busca-se organizar as diversas mobilizações por meio do movimento anti-arrocho. (…) Em outubro de 1867, os sindicatos dos metalúrgicos e dos bancários tentam, juntamente com outros sindicatos, formaram a “frente inter-sindical” semelhante ao Movimento Anti-arrocho (M.I.A.) que então se criava em São Paulo. (…). (WEFFORT, 1969, p. 34-35).
Contagem: a greve de abril de 1968
No mesmo ano da Primavera de Praga, do Maio Francês e do Outono Quente Italiano, será desencadeado no Brasil, um massivo movimento contra a ditadura militar. Weffort afirma que as greves de 1968, em Contagem, envolveram 15.000 grevistas. O movimento operário, vinha acumulando forças significativamente desde 1967, com mobilizações permanentes. É sobre a esteira desse processo que será preparada a greve em Contagem em abril de 1968. O estopim das mobilizações em Contagem/MG foi a greve da Belco-Mineira, que foi deflagrada em 16 de abril na seção de trefilaria da empresa. Era então uma greve parcial na empresa que atingiu 1.200 operários. (p. 37). Esses operários eram munidos de experiências auto-organizativa e grevista pelo menos desde as mobilizações de 1964. De acordo com Weffort a greve “Teve inicio às 7 horas da manhã, com a ocupação da empresa, e de imediato cria a organização que deveria ampliá-la e mantê-la por uma semana: operários elegem uma comissão de 25 membros que assume a tarefa de representá-los no diálogo com os diretores, alguns dos quais ficaram detidos na fábrica”. (p. 38).
Da Belco-Mineira, o movimento grevista espalha-se e atinge outras fábricas, novos setores grevistas engrossam e dão amplitude ao movimento. Atinge a empresa Sociedade Brasileira de Eletrificação, que contava com cerca de 500 operários. Esses deflagram greve em apoio ao operariado da Belco-Mineira, e reforçam a reivindicação de derrubada da lei de salários. Além dessa, também 4.500 operários da Mannesman deflagram greve. Com isso, a greve já atingira mais de 6000 operários. Esse número seria novamente incrementado a partir do dia 21 de abril com a adesão de operários de mais três empresas: a RCA Victor, a DEMISSA e a INDUSTAM. Ainda, somaram-se a esses mais 2.300 operários das demais seções da Belco-Mineira (até então eram apenas 1.200 dessa empresa, agora totalizavam 3.500 apenas na Belco).
E não parou por ai. No dia 22 de abril novos setores operários também aderem à onda grevista, agora era a vez dos operários da SIMEL, com 800 operários, seguidos por mais 800 da Metalúrgica Belo Horizonte, além desses, deflagrou-se greve na Metalgráfica Triangulo envolvendo mais 650 operários e também na Pollig-Haeckel operários entram em greve. Além desses, mais 500 das Minas Ferro deflagram greve. Na MAFESA 360 operários engrossam o movimento grevista. Outras empresas menores seguem o mesmo procedimento.
O Coronel Jarbas Passarinho, então Ministro do Trabalho, buscando justificar uma pretendida ação repressiva intensa, já havia declarado na mídia que o movimento grevista extrapolava os limites políticos. Assim já encarava a onda grevista como um movimento que intencionava a “contra-revolução” para derrubada dos militares por meio de uma greve geral nacional. (PASSARINHO, 1978). No entanto, frente à amplitude e organização do movimento, e o risco de espalhar-se por outros centros industriais, o Ministro é obrigado a recuar e atender parte das reivindicações salariais. Concede assim um reajuste fora da data pré-determinada. A onda grevista empolgou as bases operárias e sindicais de Osasco, São Paulo e ABC.
Movimento Intersindical Anti-arrocho – MIA
            As posições políticas de organização pela base por meio das comissões e comitês clandestinos, tornaram-se parte do programa político da gestão do Sindicato Metalúrgico de Osasco. Ainda, essas posições programáticas não ficaram circunscritas a Osasco, foram difundidas para outras regiões operárias, pois o sindicato passou a integrar o MIA onde podia difundir suas posições. Dessa forma “o Sindicato de Osasco aderiu à nova ‘organização paralela’ emergente. Contudo, Osasco ingressa no MIA se contrapondo à liderança e a atuação do Sindicato paulistano, com quem acabavam de romper em razão do dissídio, onde o acusava de fraqueza e omissão”. (Orlando, p. 155).
O MIA (Movimento Intersindical Anti-arrocho) foi um movimento de cúpula sindical impulsionado inicialmente a partir do Sindicato Metalúrgico de São Bernardo, de acordo com José Barbosa Monteiro, um de seus impulsionadores “Em Santo André estava o Marcílio (...). Em São Caetano estava o Onélio Dias, um pelegão. Além disso, conseguimos reunir imediatamente 17 sindicatos da região do ABC. (...) Até que o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, o Joaquim e o Ageu dos Santos, da Federação dos Metalúrgicos de São Paulo encamparam o movimento. encamparam para desmontar. (MONTEIRO, 1978, p. 23-24).
Por fim, o MIA “aglutinava a maioria dos sindicatos paulistas com o objetivo de pressionar contra a política salarial do governo” (IBRAHIN, 1986, p. 66). Esse articulou, no segundo semestre de 1967, cinco assembleias entre categorias, que foram realizadas nos sindicatos: dos Metalúrgicos de São Paulo, em Guarulhos, Santo André, Osasco e Campinas. Nessas assembleias apenas as direções sindicais é que tinham o direito a palavra. Por isso, Espinosa afirma que o MIA atuava nos moldes cupulistas anteriores ao golpe militar-burgês, embora organizasse dirigentes sindicais como José Ibrahim de Osasco, que defensor da centralidade do trabalho de base. E de outro, tinha o peso determinante do “aparato” na entidade Joaquim Andrade dos metalúrgicos de São Paulo e Frederico Falcão, dos bancários de São Paulo. Por isso, “a divergência que opunha a prática cupulista e as posições que pleiteavam a participação intensa e organizada das bases, seis meses depois, provocariam o fim do MIA”.
Essas assembléias teriam como um de seus desdobramentos a organização do Primeiro de maio na Praça da Sé em 1968, sendo que os operários de Osasco defenderiam posição própria contra Joaquim dos Santos Andrade (Joaquinzão-pelego) e o PCB. Segundo Ibrahim, “Nessas concentrações, os metalúrgicos de Osasco destoavam dos outros sindicatos por sua combatividade e palavras de ordem como ‘Só a greve derruba o arrocho’ e ‘Organização pela base através das comissões de fábrica’. (1986, p. 66). Ainda que o MIA fosse um movimento supra-estrutural e cupulista, acabou servindo como ferramenta para fortalecimento e aglutinação de oposições sindicais “em torno das propostas de Osasco”, as posições de Osasco passam a compor o debate sindical estadual. Para Espinosa o principal reflexo do MIA dentro de Osasco “foi a ativação da participação das bases na vida sindical: assembleias constantes por fábricas, seções, etc. Como resultado desse trabalho de agitação, começaram a ser criadas comissões de empresa clandestinas em outras fábricas, como a Lonaflex e a Brown Boveri”. (p. 45).
O Primeiro de Maio na Praça da Sé
Em Osasco organiza-se um grande bloco operário que levaria as posições defendidas pelo sindicato dos metalúrgicos, pelas comissões de fábricas e comitês clandestinos. Estes eram contra realizar um Primeiro de Maio em acordo com o governo e com a presença de Abreu Sodré. Duas formas de sindicalismo chocam-se, a do sindicalismo de cúpula (PCB e peleguismo) que arbitra por cima das bases em conluio os o governo e o patronato, e a da atuação sindical estruturada sobre as comissões de fábrica: “uma, que era imobilista e levava à prática o mesmo tipo de sindicalismo de cúpula e queria realizar um 1.º de Maio com participação do ministro do Trabalho, parlamentares e demais autoridades e que tinham com referência o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e os Bancários”. (1986, p. 66).
Os operários de Osasco vão as centenas para o ato, segundo Espinosa, o sindicato de Osasco fretou vários ônibus e custeou a ida de mais de mil pessoas ao ato (p. 46). As bases estão mobilizadas e sustentando as palavras de ordem “Minas é exemplo de luta” e “greve contra o arrocho” (Espinosa, p. 40). Na Praça da Sé, as delegações de Osasco tomam a linha de frente, armados com bastões de madeira, cabos de aço e barras de ferro, dispõem-se cara a cara com o palanque prontos para o enfrentamento com as Forças Armadas que faziam a segurança do ato. Começa o empurra-empurra que redunda em enfrentamento, uma pedrada na cabeça de Abreu Sodré, um discurso dos militantes de Osasco e o incêndio do palanque. Como Lembra Ibrahim “Tomamos o palanque e logo em seguida saímos em passeata pelas ruas da cidade. Eram cerca de 15.000 pessoas que desfilavam até a Praça da República, onde [Zequinha] Barreto fez um excelente discurso, explicando a significação do Primeiro de Maio e a ocupação do palanque”. (p. 11). Na passeata operária podia-se ver cartazes com a imagem de Che Guevara. Abreu Sodré em entrevista afirmava que “Aquele 1º de Maio, ele nasceu sob inspiração do movimento revolucionário que já vinha se instalando em Paris e Naterre, na França”. (ABREU SODRE, 1978, p. 28).
Roberto Espinosa, que era operário da Cobrasma e militante de destaque do movimento operário e da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), relatou-nos em entrevista realizada em junho de 2013, que participou da organização daquele Primeiro de Maio. Afirmou que naquele dia, além dos materiais levados pelos operários para se enfrentarem com as Forças Armadas na Praça da Sé, o grupo guerrilheiro, que se constituiria com VPR, também estava dando cobertura armada aos operários. Alugaram um apartamento em frente a Praça, onde foram instalados ninhos de metralhadora apontados para o militares e policiais. Disse ainda que o Capitão Lamarca, futuro membro da VPR, que servia na região de Osasco, também estava se articulando para marchar com um batalhão para a Praça da Sé caso houvesse repressão ao ato dos operários. O objetivo de Lamarca seria rebelar-se contra as forças do Estado e defender os operários.
O sucesso do Primeiro de Maio deu projeção estadual aos militantes operários de Osasco. A euforia que é incrementada com outra vitória política. Em meio a estas experiências, no fim de maio é deflagrada uma greve dos operários da Barreto-keller, fábrica que contava com 300 trabalhadores, esta greve estende-se por 7 dias, sendo vitoriosa, conquistou reajuste salarial e a formação de uma comissão legalizada. Em seguida é deflagrado um amplo movimento grevista na Cidade de Contagem (MG). Ibrahim, presidente do sindicato vai até Contagem para apropriar-se das suas principais lições. No mesmo mês as mobilizações operárias ganham as ruas da França. Estabelece-se o clima de insubordinação e auto-organização operária generalizada.
A greve da Cobrasma
Em meio as greves e mobilizações que eclodiam, o operariado de Osasco também ansiava pela deflagração de um amplo movimento contra o arrocho salarial e contra a ditadura militar. O Maio Francês, o a imagem de Che Guevara e as teses de Regis Debrey, somados as mobilizações estudantis no Rio de Janeiro, a marcha dos 100 mil e as mobilizações em São Paulo influenciavam diretamente o clima de mobilização no movimento estudantil secundarista, nas fábricas e por consequência na gestão do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco. Jimi Hendrix, Beatles, Janis Joplin, Rolles Stones, Mutantes, Secos e Molhados misturavam-se com palavras de ordem no movimento estudantil e operário. Como relembra Espinosa “Na época, 1968 parecia o ano da grande revanche. Pelas milhares de cabeças que o incendiavam, passava a certeza de que aquele era o ano da lavagem de alma dos movimentos populares derrotados em 1964”. (Espinosa, 1978, p. 36).
Depois da morte de Edson Luís, em março, o movimento estudantil entrara num período de rápido ascenso. Passeata dos 100 mil; movimentos de rua nas principais cidades; luta acirrada entre várias correntes políticas pelo controle da UNE e da UEEs (Uniões Estaduais dos estudantes); correntes políticas tentando romper o cerco do movimento estudantil e influenciar o desenvolvimento dos movimentos de outras camadas sociais; ocupação de faculdades etc. Esse ascenso refletia-se  também no surgimento de inúmeras entidades de profissionais liberais, artistas e intelectuais, que se inspiravam e viviam a sombra do movimento estudantil. (ESPINOSA, p. 36).
Todos estes movimentos exerceram influência sobre a militância política de estudantes,  operários e operários-estudantes em Osasco, exemplo disso pôde se observado novamente em abril de 1968, mês em que ocorriam passeatas em várias capitais brasileiras em protesto à morte de Edson Luís, “em Osasco houve duas passeatas de estudantes, operários (este minoritários) e operários estudantes, com 2.500 e 3.000 participantes; na segunda, principalmente, foram agitadas questões operárias, tendo o desfile sido aberto com uma bandeira do Vietcong”. (Espinosa, p. 44).
A conjuntura internacional combinava-se com o acumulo de experiências nas lutas de classe dos anos anteriores “A greve de Contagem em abril, o 1º de Maio na Praça da Sé, a greve de Osasco em julho vieram a animar e a alimentar a grande esperança de desforra”. (Espinosa, p. 36). Todas as mobilizações dos anos anteriores confluíam-se no 1968. A direção do Sindicato Metalúrgico de Osasco é pressionada por todos os lados, até decidir realizar uma grande greve em julho de 1968, quatro meses antes da data base que era em novembro. Ibrahim, após a visita a Contagem, afirmou posteriormente que “voltei convencido de que tínhamos mais condições do que eles para realizar a greve. E havia um dado concreto: lá não houvera repressão, e, em São Paulo o movimento estudantil não estava sendo reprimido”. (p. 12).
Em julho de 1968 a Cobrasma contava com cerca de 4.000 operários. Mas a greve fora planejada como uma estratégia foquista. De acordo com Ibrahim, apenas 200 operários saberiam da greve, Ibrahim afirma que o número reduzido de operários ligados à organização da greve foi determinado pela estratégia guerrilheira que pairava sobre os dirigentes operários em 1968. Roberto Espinosa alegou que pelo menos 300 operários sabiam da greve. O reduzido número por um lado facilitaria a preparação da greve, por outro lado, seria também o maior ponto fraco. Uma contradição importante, pois embora a gestão do Sindicato fosse programaticamente defensora dos organismos de auto-organização operária, e os estimulasse cotidianamente, acabou planejando uma atuação de grandes dimensões políticas de forma foquista. Na avaliação de Ibrahim, na retrospectiva feita em 1978 “Estávamos ligados ao movimento de massa, mas ideologicamente nos encontrávamos bastante comprometidos com as propostas da luta armada que setores da esquerda começavam a levantar”. (p. 12).
A greve iniciou-se na manhã de 16 de julho. Como lembra Espinosa “atendendo ao sinal convencionado (o apito da Cobrasma, as 8h e 40m), a partir da seção da limpeza acabamento da fundição, os operários começaram a ocupar a fábrica. Organizaram,  durante o dia, as comissões de vigilância, abastecimento e mobilização”. (p. 47). Mas a massa de operários da Cobrasma não nutria o mesmo espírito que os organizadores da greve. Conforme denota Orlando Miranda
Ao lado da Oficina Mecânica improvisa-se um campo de malha. as caixinhas de dominô são abertas mais cedo. Em várias salinhas de encarregados aparecem ensebados baralhos. Os operários aguardam, de folga, tranquilamente, o resultado das negociações que seus representantes estão mantendo com a diretoria. São nove e meia da manhã. (1978, p. 174).
No mesmo dia, as 13:45 da tarde os operários da Lonaflex paralisaram os trabalhos e ocuparam a fábrica. “Nas horas marcadas, 12h, 14h, foram parando outras fábricas. Os operários da Barreto Keller, Osran e Granada dirigiram-se em passeata para o sindicato”. (Espinosa, 1978). Ainda no dia 16, representando o Ministro do Trabalho, Moacir Gaya foi até Osasco negociar a volta ao trabalho. O coronel Jarbas Passarinho voou para São Paulo para coordenar a desocupação. Negociará com os operários no Sindicato dos Químicos.
As greves foram consideradas ilegais pela ditadura. Ao anoitecer as forças repressivas do Estado começam a cercear a cidade. “A tropa de choque da Força Pública entrou em Osasco trazendo cavalaria, tatus, brucutus e atuando em consonância com o DEOPS e passando a controlar todas as saídas da cidade”. (1978, p. 14). As fábricas ocupadas foram cercadas. A Lonaflex foi desocupada com intervenção armada. Em seguida foi a vez da Cobrasma. Conforme lembra Ibrahim “Os tatus e brucutus romperam as barricadas e os companheiros, para se protegerem, apagaram todas as luzes. A tropa de choque entrou na fábrica dando rajadas de metralhadoras para cima e jogando bombas de efeito moral. Houve muito combate corpo a corpo”. (p. 14).
No entanto, a greve foi toda preparada por um pequeno grupo, na prática, a massa dos operários não estava preparada para resistir a desocupação. As forças repressivas esmagaram os grevistas “O massacre diminui a intensidade à medida que os caçadores se dividem, vão ocupando as primeiras oficinas, constando nenhuma resistência. Um empurrão, uma tapona, um pontapé, e os operários encontrados vão sendo juntados em grupos imobilizados, mãos à cabeça”. (Orlando, p. 183).
A invasão militar produziu solidariedade entre os operários de outras fábricas. Segundo Espinosa  “No dia seguinte, outras fábricas aderiram: Bráseixos, Brown Boveri e, parcialmente, a Cimaf, a Eternit (total aproximado de grevistas: 10.000). Depois a policia investiu contra o sindicato, pois já havia sido decretada a intervenção” (p. 47). No momento da desocupação centenas de operários foram presos “No primeiro dia, cerca de 300 a 400 prisões na Cobrasma” (Idem). No segundo dia ocorrem novas prisões.
Esperava-se que a greve da Cobrasma espalhasse-se por outras fábricas e culminasse em uma paralisação geral das fábricas de Osasco, nas palavras de Ibrahim “No primeiro dia ocuparíamos a Cobrasma e a Lonaflex, paralisaríamos a Barreto-Keller e a Fósforos Granada, cujos operários tomariam o sindicato. No segundo dia, seriam paralisadas a Brown Boveri e a Braseixos”. (p. 12). As greves deveriam atingir todas as fábricas de Osasco e estender-se para todo o Estado “Em três dias toda Osasco estaria em greve, e nosso plano era estendê-la a São Paulo, só não contávamos com a repressão no primeiro momento” (p. 13).
Conforme recorda Ibrahim “nos baseamos nas atitudes de Sodré, em relação ao movimento estudantil e na posição adotada pelo Ministério do Trabalho por ocasião da greve de Contagem”. (p. 13). Diferente da resposta do governo ditatorial às mobilizações em Contagem, nas greves de Osasco a Ditadura interveio rapidamente para evitar que as greves se alastrassem e colocasse a Ditadura militar-burguesa em risco, com isso o ascenso operário não pôde encontrar terreno. As mobilizações eram crescentes no Brasil e em vários países do globo, o governo militar entendeu que os operários da Cobrasma queriam imitar as mobilizações operárias da França, por isso resolveu intervir rapidamente.
Ibrahim no balanço da greve feito em 1978 apontava três motivos principais para a derrota do movimento grevista em Osasco: 1) a greve deveria ter sido preparada por mais tempo “para que se tivesse força suficiente para sustentar o movimento” (p. 15). 2) Outro erro fundamental teria sido que “Jamais nos preocupamos a sério em montar, nos bairros, uma infra-estrutura independente do sindicato”. 3) E por fim, o erro principal seria ter feito uma greve com perspectiva foquista “existe o problema da visão política (nessa época bem militarista), que influiu na decisão de antecipar a greve, bem como a forma de encaminhá-la”. (p. 15). Em 1986 Ibrahim reafirma seu balanço no livro O que todo cidadão precisa saber sobre comissões de fábrica:
A ação sindical de massa e de classe não pode reduzir-se às lutas dentro dos locais de trabalho ou mesmo relações de produção, mas deve estender-se a todos os níveis das relações sociais, a todos os problemas que afetam os trabalhadores fora das empresas, tais como transporte, alimentação, saúde, lazer, educação, habitação. Esse tipo de ação sindical se estende ao conjunto de todas as lutas contra o capitalismo e é inconciliável com qualquer concepção vanguardista ou elitista de ação sindical. (IBRAHIM, 1986, p. 11).
Espinosa acrescenta que, o tratamento a greve de Osasco diferentemente de Contagem decorrido em abril de 1968, pois “Em junho, o fator surpresa não existia. Só um movimento amplo e extremamente organizado (...) poderia ser vitorioso” (p. 46). Espinosa acrescenta ainda que os militantes dirigentes do sindicato estavam sendo pressionados por sua corrente foquista (VPR) para decretar a greve “a própria organização militarista, que pretendia a radicalização dos movimentos de massa, pressionava seus militantes a decidir-se pela greve”. (p. 46).
Considerações finais
Um elemento muito elucidado nas entrevistas que realizamos, é que, com a repressão às mobilizações, os principais dirigentes e lideranças que despontaram ao longo da década de 1960 na região de Osasco foram demitidos e perseguidos. Poucos conseguiram manter seus empregos. A repressão e perseguição permanente por meio de “listas negras” levou muitos operários a abandonarem a militância. Outro setor considerável dos quadros dirigente e lideranças sindicais ingressaram na luta armada, separando-se de vez do movimento operário.
As greves de Osasco foram deflagradas em um momento de efervescência da luta de classes no país, com um grande desafio à Ditadura Militar. No entanto, essas greves foram feitas sem estruturar-se em dezenas de núcleos e seções por fábrica e pelos bairros. Sem estruturar-se estadualmente. Nem mesmo pôde estruturar-se no eixo Osasco-ABC-São Paulo. A experiência provou que sem estruturar-se por cada seção, de cada fábrica e no bairros, a greve não poderia sustentar-se, e muito menos converter-se em um levante operário geral e coordenado que pudesse derrubar o arrocho ou a lei anti-greve. A repressão às greves, somada ao AI5 e, em outra medida, a debandada de grande parte dos melhores quadros políticos, sindicais e teóricos para a luta armada, interrompeu o desenvolvimento de uma ampla vanguarda operaria militante e combativa que vinha se formando pelo menos desde o inicio da década de 1960 em Osasco.
A repressão de 1968 conseguiu impedir o enraizamento e o posterior florescimento de uma ampla vanguarda operária que poderia constituir-se aos milhares a partir de Osasco e construir uma nova forma de sindicalismo e de organização de correntes e partidos revolucionários. O erro estratégico da nova e inexperiente camada dirigente que emergia em 1968 levou-a a sacrificar-se progressivamente nas fileiras da luta armada foquista, até sua própria extinção quase total.
Com a guerrilha, abortou-se precocemente aquela gestação de dirigentes operários. A camada dirigente separou-se definitivamente das massas e não pôde se fundir com as novas camadas combativas que emergissem do chão das fábricas e dos campos durante a década de 1970. Os quadros que foram para a luta armada fizeram muita falta na auto-organização do movimento operário de São Paulo e do ABC. Com sua ausência, deixaram um lugar vago, que acabou sendo ocupado por quadros políticos ligados à ditadura, ao velho sindicalismo cupulista. Deram lugar aos autênticos do ABC, que isolavam as comissões de fábrica acusando-as de serem formas de ‘paralelismo sindical’. (Ibrahim, 1986, p. 74). Lula (1978) declarava abertamente ser contra as comissões:
Olha, existe um conceito assim sobre comissões, sabe. Eu não sou contra comissões, acho que elas devem existir. Mas veja: no sindicato a gente procura fazer toda a classe trabalhadora ser uma comissão única. Porque a partir do momento que você criar grupos de comissões você terá colocado na prática grupos de trabalhadores a mercê dos nossos empresários pra serem dispensados na hora que bem convier aos donos das empresas. Eu acredito que todo dirigente de sindicato tem consciência de quantos companheiros bons a gente perde por exigir que os nossos companheiros tenham uma atuação sindical dentro da empresa. Eu acho que o problema não é responsabilizar um ou mais grupos de trabalhadores, o problema é responsabilizar toda a classe trabalhadora pelas conquistas dela. Eu acho que a partir do momento que eu formar uma comissão de 5 trabalhadores pra agir dentro de uma determinada empresa, eu estarei colocando 5 companheiros com a corda no pescoço, em relação a perder seu emprego. Então, o que a gente tem feito e que a gente discute hoje com outros dirigentes sindicais é o seguinte: nenhum diretor de sindicato deve assumir responsabilidade de tutelar a classe trabalhadora. À classe trabalhadora deve ser dada a liberdade de agir e pensar. Cabe ao sindicato coordenar esse pensamento e essa ação da classe trabalhadora.
Com tais argumentos Lula e os autênticos sufocavam as formas de auto-organização operária que surgiam pela base. (confira também: Stanislao, 1978). Dessa forma, fortalecia a posição de seu próprio grupo que galgava a direção do ascenso operário de 1978-1980. Assim, construiu a transição pactuada durante a década de 1980. Acertadamente Ibrahim denunciava que os autênticos “eram filhos da estrutura sindical e parte integrante da estratégia da ditadura e da burguesia em reciclarem os antigos pelegos, criando outros tipos de interlocutores no movimento sindical para negociar a transição conservadora”. (p. 74). Na década de 1990, a desilusão das antigas camadas derrotadas somaram-se aos efeitos da restauração burguesa no Leste Europeu e o refluxo mundial da esquerda.






























Referências
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[1]Uma primeira parte desta pesquisa, contendo trechos das entrevistas, foi apresentada no V Seminário Internacional: Teoria politica do socialismo - “Marx: Crise do capitalismo e transição”. 2013. Está disponível no endereço: http://www.inscricoes.fmb.unesp.br/publicacao.asp?codTrabalho=ODYyMQ==

 
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