Combate Classista

Teoria Marxista, Política e História contemporânea.

quinta-feira, 28 de junho de 2012

PRIMEIRO CONGRESSO DA III INTERNACIONAL (março de 1919)

PRIMEIRO CONGRESSO DA III INTERNACIONAL (março de 1919)

Carta de Convite ao Partido Comunista Alemão (Spartakusbund) ao 1º Congresso da Internacional

Caros camaradas! Os partidos e organizações abaixo assinados consideraram que a convocação do primeiro Congresso da nova Internacional revolucionária é de uma necessidade urgente. Durante a guerra e a revolução, manifestou-se não apenas a falência completa dos antigos partidos socialistas e social-democratas e ao mesmo tempo da Segunda Internacional, não apenas a incapacidade dos elementos intermediários da antiga social-democracia (dita “Centro”) para a ação revolucionária efetiva, mas atualmente vêem-se desenhar contornos da verdadeira Internacional revolucionária. O movimento ascendente extremamente rápido da revolução mundial propondo constantemente novos problemas, o perigo de sufocação desta revolução pela aliança dos países capitalistas contra a revolução se unindo sob a bandeira hipócrita da “Sociedade das Nações”, as tentativas dos partidos social-traidores de se unir e ajudar seus governos a trair a classe operária pela negociação de uma “anistia” recíproca; enfim, a experiência revolucionária extremamente rica já adquirida e a internacionalização de todo o movimento revolucionário – todas essas circunstâncias nos obrigam a tomar a iniciativa de colocar na pauta da discussão a questão da convocação de um Congresso internacional dos partidos proletários revolucionários.

I – OBJETIVOS E A TÁTICA

O reconhecimento dos parágrafos seguintes, instituídos aqui como programa e elaborados com base nos programas do Spartakusbund da Alemanha e do Partido Comunista (bolchevique) da Rússia deve, a nosso ver, servir de base para a nova Internacional.

1 – O período atual é de decomposição e ruína de todo o sistema capitalista mundial e ele será a destruição da civilização européia em geral, se não destruir o capitalismo com suas contradições insolúveis.

2 – A tarefa do proletariado consiste, presentemente, em tomar o poder de Estado. A tomada do poder de Estado significa a destruição do aparelho de Estado da burguesia e a organização de um novo aparelho de poder proletário.

3 – O novo aparelho de poder deve representar a ditadura da classe operária e em alguns lugares também a dos pequenos agricultores e trabalhadores agrícolas, isto é, ela deve ser o instrumento de substituição sistemática da classe exploradora por aquela que é hoje alvo de sua exploração. Não a falsa democracia burguesa – esta forma hipócrita de dominação da oligarquia financeira – com sua igualdade puramente formal, mas a democracia proletária, com a possibilidade de realizar a liberdade das massas trabalhadoras; não o parlamentarismo, mas auto-administração dessas massas por seus organismos eleitos; não a burocracia capitalista, mas órgãos de administração criados pelas próprias massas com a participação real dessas massas na administração do país e no trabalho de edificação socialista – eis como deve ser o Estado proletário. O poder dos conselhos operários ou das organizações operárias é a sua forma concreta.

4 – A ditadura do proletariado deve ser a alavanca da expropriação imediata do capital, da abolição da propriedade privada sobre os meios de produção e da transformação dessa propriedade em propriedade popular.

A socialização (por socialização entende-se aqui a abolição da propriedade privada que é remetida ao Estado proletário e à administração socialista da classe operária) da grande indústria e dos bancos, seus centros de organização; o confisco das terras dos grandes proprietários e a socialização da produção agrícola capitalista; a monopolização do comércio; a socialização dos grandes imóveis nas cidades e no campo; a introdução da administração operária e a centralização das funções econômicas nas mãos de organismos emanados da ditadura do proletariado – eis os problemas essenciais de hoje.

5 – Para a segurança da revolução socialista, para sua defesa contra os inimigos internos e externos, para a ajuda às outras frações nacionais do proletariado em luta, etc... o desarmamento completo da burguesia e seus agentes, e o armamento geral do proletariado são necessários.

6 – A situação mundial exige atualmente o contato mais estreito entre os diferentes partidos do proletariado revolucionário e a união completa dos países nos quais a revolução socialista triunfou.

7 – O método fundamental da luta é a ação de massa do proletariado e compreende a luta aberta e armada contra o poder de Estado do capital.

II – RELAÇÕES COM OS PARTIDOS “SOCIALISTAS”

8 – A II Internacional se dividiu em três grupos principais: os social-patriotas declarados que, durante toda a guerra imperialista dos anos de 1.914-1.918, sustentaram sua própria burguesia e transformaram a classe operária em carrasco da revolução internacional; o “centro” cujo dirigente teórico atualmente é Kautsky, que representa uma organização de elementos constantemente oscilantes, incapazes de seguir uma linha determinada, constituindo-se, muitas vezes em verdadeiros traidores; e, enfim, a ala esquerda revolucionária.

9 – Com relação aos social-patriotas que, por toda parte, nos momentos críticos, se recusaram a pegar em armas para a revolução proletária, só a luta implacável é possível. Com relação ao “centro” – a tática de esgotamento dos elementos revolucionários, crítica implacável e desmascaramento dos chefes. Em certa etapa do desenvolvimento, a separação organizativa dos elementos do centro é absolutamente necessária.

10 – Por outro lado, é necessário a formação de um bloco com esses elementos do movimento revolucionário que, não tendo pertencido outrora ao partido socialista, se colocam agora no conjunto sobre o terreno da ditadura do proletariado sob a forma do poder soviético. Estes são em primeira linha os sindicalistas do movimento operário.

11 – Enfim, é necessário atrair todos os grupos e organizações proletárias que, não estando abertamente vinculados à corrente revolucionária de esquerda, manifestam muitas vezes em seu desenvolvimento uma tendência nessa direção.

12 – Concretamente, nós propomos que participem do Congresso os representantes dos seguintes partidos, tendências e grupos (os membros com plenos direitos da Terceira Internacional serão outros e se colocarão inteiramente sobre seu terreno):

1 – Spartakusbund (Alemanha); 2 – Partido Comunista (Bolcheviques) (Rússia); 3 – Partido Comunista da Áustria alemão; 4 – Partido Comunista da Hungria; 5 – Partido Comunista da Finlândia; 6 – Partido Comunista Operário polonês; 7 – Partido Comunista da Estônia; 8 – Partido Comunista da Letônia; 9 – Partido Comunista da Lituânia; 10 – Partido Comunista da Rússia Branca; 11 – Partido Comunista da Ucrânia; 12 – Os elementos revolucionários do Partido social-democrata tcheco; 13 – Partido social-democrata búlgaro (restrito); 14 – P.s.-d. romeno; 15 – A ala esquerda do p.s.-d. sérvio; 16 – A esquerda do Partido s.-d. sueco; 17 – Partido s.-d. norueguês; 18 – Pela Dinamarca o grupo Klassemkampen; 19 – Partido Comunista holandês; 20 – Os elementos revolucionários do partido operário belga; 21 e 22 – Os grupos e organizações no interior do movimento socialista e sindicalista francês, que, no conjunto, se solidarizam com Loriot; 23 – A esquerda s.-d. da Suíça; 24 – o Partido Socialista italiano; 25 – Os elementos revolucionários do P.S. espanhol; 26 – Os elementos de esquerda do Partido Socialista português; 27 – Os partidos socialistas britânicos (sobretudo a corrente representada por Mac Lean); 28 – S.L.P. (Inglaterra); 29 – I.W.W. (Inglaterra); 30 – I.W. (Grã-Bretanha); 31 – Os elementos revolucionários da organizações operárias da Irlanda; 32 – Os elementos revolucionários dos shop stewards (Grã-Bretanha); 33 – S.L.P. (América); 34 – Os elementos de esquerda do P.S. da América (a tendência representada por Debs e a Liga de Propaganda Socialista); 35 – I.W.W. (América); 36 – I.W.W. (Austrália); 37 – Workers International Industrial Union (América); 38 – Grupos socialistas de Tóquio e Yokohama (representado pelo camarada Katayama); 39 – A Internacional Socialista dos Jovens (representada pelo camarada Muzenberg).

III – A QUESTÃO DA ORGANIZAÇÃO E O NOME DO PARTIDO

13 – A base da Terceira Internacional é dada pelo fato de que nas diferentes regiões da Europa já estão formados grupos e organizações de camaradas de idéias, colocando-se sobre uma plataforma comum e empregando no geral os mesmos métodos táticos. Trata-se em primeiro lugar dos espartaquistas na Alemanha e dos partidos comunistas em muitos outros países.

14 – O Congresso deve criar, pela necessidade de uma ligação permanente e de uma direção metódica do movimento, um órgão de luta conjunta, centro da Internacional Comunista, subordinando os interesses do movimento de cada país aos interesses comuns da revolução em escala internacional. As formas concretas da organização, da representação, etc. serão elaboradas pelo Congresso.

15 – O Congresso deverá tomar o nome de “Primeiro Congresso da Internacional Comunista”, os diferentes partidos deverão ser seções desta. Teoricamente Marx e Engels já achavam equivocado o nome “social-democrata”. O desmoronamento vergonhoso da Internacional Social-democrata exige aqui também uma separação. Enfim, o núcleo fundamental do grande movimento já está formado por uma série de partidos que tomaram este nome.

Considerando o que foi dito, propomos a todas as organizações e partidos irmãos colocar na ordem do dia a convocação do congresso Comunista Internacional.

Saudações socialistas.

Comitê Central do Partido Comunista Russo (Lênin, Trotsky).

Bureau Estrangeiro do Partido Operário Comunista da Polônia (Karsky).

Bureau Estrangeiro do Partido Operário Comunista da Hungria (Rudniansky).

Bureau Estrangeiro do Partido Operário Comunista da Áustria alemã (Duda).

Bureau russo do Comitê Central do Partido Comunista da Letônia (Rosing).

Comitê Central do Partido Comunista da Finlândia (Sirola).

Comitê Executivo da Federação social-democrata Revolucionária Balcânica (Ravovsky).

Pelo S.L.P. (América) (Reinstein).

****

O convite acima convocou os comunistas de todos os países para a conferência que deveria se iniciar em Moscou, a 15 de fevereiro de 1.919. As grandes dificuldades de circulação retardaram a inauguração. Ela só pôde acontecer no dia 2 de março. A conferência foi aberta por Lênin, às dezoito horas. Adotou-se a língua alemã para os debates, em outras circunstâncias falava-se russo, francês e inglês.

Como presidentes do Congresso foram eleitos por unanimidade os seguintes camaradas: Lênin (Rússia), Albert (Alemanha), Platten (Suíça), o quarto presidente foi eleito pela ordem de inscrição pelos diversos países. O Congresso elegeu como secretário o camarada Klinger.

A Comissão de mandatos constatou a participação dos seguintes partidos e dividiu os votos:

PARTICIPANTES DO CONGRESSO DA INTERNACIONAL COMUNISTA DE MOSCOU (2 a 6 de março de 1919)

Partido e Número de votos

1 – Partido Comunista Alemão (5)

2 – Partido Comunista Russo                                                                                                              (5)

3 – Partido Comunista da Áustria alemã                                                                (3)

4 – Partido Comunista Húngaro                                                                                                (3)

5 – S.-D. de esquerda Sueca                                                                                                                        (3)

6 – P.S.-D. norueguês                                                                                                                                             (3)

7 – P.S.-D. suíço                                                                                                                                        (3)

8 – S.L.P. americano                                                                                                                                             (5)

9 – Federação Revolucionária Balcânica (Tchecoslováquia e PC romeno) (3)

10 – Partido Comunista polonês                                                                                    (3)

11 – Partido Comunista da Finlândia                                                                       (3)

12 – Partido Comunista ucraniano                                                                                              (3)

13 – Partido Comunista da Letônia                                                                                     (1)

14 – Partido Comunista branco-russo e lituano                                      (1)

15 – Partido Comunista da Estônia                                                                                     (1)

16 – Partido Comunista armênio                                                                                                (1)

17 – Partido Comunista da Volga alemã                                                                  (1)

18 – Grupo Unificado dos Povos da Rússia Oriental             (1)

19 – Esquerda Zimmerwaldense francesa                                                                    (5)

VOTOS DELIBERATIVOS

20 – Partido Comunista tcheco

21 – Partido Comunista búlgaro

22 – Partido Comunista dos países eslavos meridionais

23 – Partido Comunista inglês

24 – Partido Comunista francês

25 – P.S.-D. holandês

26 – Liga da Propaganda Socialista da América

SEÇÕES DO BUREAU CENTRAL DOS PAÍSES ORIENTAIS

27 – Comunistas suíços

28 – Comunistas do Turquestão

29 – Turco

30 – Georgiano

31 – Adzerbaidjano

32 – Persa

33 – Partido Operário Socialista chinês

34 – União Operária da Coréia

35 – Comissão de Zimmerwald



DISCURSO DE ABERTURA DE LÊNIN

Por solicitação do Comitê Central do Partido Comunista russo, inauguro o primeiro Congresso Internacional. Antes de mais nada, pelo que honrem a memória dos melhores representantes da III Internacional, Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo.

Camaradas, nosso Congresso reveste-se de uma grande importância na história mundial. Ele demonstra o fim de todas as ilusões da democracia burguesa. A guerra civil se transformou num fato, não só na Rússia, mas nos países capitalistas mais desenvolvidos, por exemplo a Alemanha.

O povo percebeu a grandeza e a importância desta luta. Tratava-se de encontrar a forma prática quer permitisse ao proletariado exercer sua dominação. Esta forma é o regime dos Sovietes com a ditadura do proletariado. A ditadura do proletariado; essas palavras eram “latim” para as massas até nossos dias. Agora, graças ao sistema dos Sovietes, esse latim se traduziu para todas as línguas modernas; a forma prática da ditadura foi encontrada pelas massas populares. Ela se tornou inteligível para a grande massa de operários graças ao poder dos Sovietes na Rússia, aos espartaquistas da Alemanha, às organizações análogas nos outros países, como Shop Stewards Committes na Inglaterra. Tudo isso prova que a forma revolucionária da ditadura do proletariado foi encontrada e que o proletariado está em ação para exercer de fato sua dominação.

Camaradas! Penso que depois do que aconteceu na Rússia, depois dos combates de janeiro na Alemanha, importa sobretudo observar que a nova forma do movimento do proletariado se manifesta e se amplia também nos outros países. Hoje, li num jornal inglês anti-socialista um telegrama anunciando que o governo inglês recebeu o soviete de delegados operários de Birmingham e prometeu-lhe reconhecer os Sovietes como organizações econômicas. O sistema soviético conseguiu a vitória não apenas na Rússia atrasada, mas também no país mais civilizado da Europa: a Alemanha, e no mais antigo país capitalista: a Inglaterra.

A burguesia pode maltratar; pode também assassinar milhares de operários – mas a vitória é nossa, a vitória da revolução comunista mundial está assegurada.

Camaradas! Em nome do Comitê Central desejo cordialmente que sejam bem-vindos.

TESES DE LÊNIN SOBRE A DEMOCRACIA BURGUESA E A DITADURA DO PROLETARIADO

1 – O crescimento do movimento revolucionários proletário em todos os países suscita os esforços convulsivos da burguesia e dos agentes que ela possui nas organizações operárias para descobrir os argumentos filosófico-políticos capazes de servir à defesa da dominação dos exploradores. A condenação da ditadura e a defesa da democracia figuram entre esses argumentos. A mentira e a hipocrisia de tal argumentação repetida à saciedade na imprensa capitalista e na conferência da Internacional Amarela de Berna em fevereiro de 1919 são evidentes para todos os que procuram não trair os princípios fundamentais do socialismo.

2 – Em primeiro lugar, este argumento se apóia nas concepções de “democracia geral” e de “ditadura em geral”, sem precisar a questão da classe. Colocar assim o problema, fora da questão das classes, pretendendo considerar o conjunto da nação, é zombar da doutrina fundamental do socialismo, a saber a doutrina da luta de classes, aceita nas palavras, mas esquecida na prática pelos socialistas que passaram para o campo da burguesia. Pois em nenhum país civilizado, em nenhum país capitalista, existe democracia em geral: existe apenas democracia burguesa. Não se trata mais da ditadura exercida pela classe oprimida, isto é, pelo proletariado, sobre os opressores e os exploradores, sobre a classe burguesa, com o objetivo de triunfar sobre a resistência dos exploradores, sobre a classe burguesa, com o objetivo de triunfar sobre a resistência dos exploradores lutando por seu poder.

3 – A história ensina que nenhuma classe oprimida jamais chegou ao poder, e não pode fazê-lo sem passar um período de ditadura durante o qual se ampara no poder político e abate pela força a resistência desesperada, exasperada, que não se detém diante de nenhum crime, que sempre opuseram os exploradores. A burguesia, cuja dominação é sustentada hoje pelos socialistas que peroram sobre a ditadura em geral e que se debatem a favor da democracia em geral, conquistou o poder nos países civilizados ao preço de uma série de insurreições, guerras civis, aniquilação pela força – de reis, nobres, proprietários de escravos -, e pela repressão das tentativas de restauração.

Milhares de vezes os socialistas de todos os países explicaram ao povo o caráter de classe dessas revoluções burguesas em seus livros, brochuras, resoluções de seus congressos, discursos de propaganda. Eis porque esta defesa atual da democracia burguesa em meio a discursos sobre a “ditadura em geral”, são uma verdadeira traição ao socialismo, uma deserção caracterizada em proveito da burguesia, uma negação do direito do proletariado à sua revolução proletária. É defender o reformismo burguês, precisamente no momento em que ele fracassou no mundo inteiro, quando a guerra criou um estado de coisas revolucionário.

4 – Todos os socialistas, demonstrando o caráter de classe da civilização burguesa, da democracia burguesa, do parlamento burguês, expressaram a idéia já formulada com o máximo de exatidão científica por Marx e Engels que a mais democrática das repúblicas burguesas não sabe ser outra coisa que uma máquina de oprimir a classe operária à mercê da burguesia, a massa de trabalhadores à mercê de um punhado de capitalistas. Não um único revolucionários, um único marxista, entre os que gritam hoje contra a ditadura e pela democracia que não tenha jurado por seus deuses diante dos operários que aceitou essa verdade fundamental do socialismo; e agora que o proletariado revolucionário está em fermentação e em movimento, que se encaminha para destruir esta máquina de opressão e para conquistar a ditadura do proletariado, esses traidores socialistas desejam fazer crer que a burguesia deu aos trabalhadores a “democracia pura”, como se a burguesia tivesse renunciado a toda resistência e estivesse prestes a obedecer à maioria dos trabalhadores, como se, numa república democrática, não houvesse uma máquina governamental feita para operar o esmagamento do trabalho pelo capital.

5 – A Comuna de Paris, que todos os que desejam passar por socialistas honram em palavras, porque sabem que as massas operárias têm uma viva e sincera simpatia por ela, mostrou com particular nitidez a relatividade histórica, o valor limitado do parlamentarismo burguês e da democracia burguesa, instituição que significaram um grande progresso em relação à Idade Média, mas que exigem necessariamente uma reforma fundamental à época da revolução proletária. Marx, que apreciou melhor que ninguém a importância histórica da Comuna, provou, analisando o caráter de exploração da democracia e do parlamentarismo burguês, que este é o regime sob o qual as classes oprimidas ganham o direito de decidir num único dia para um período de vários anos quem será o representante das classes possuidoras que representará e oprimirá o povo no Parlamento. E esta é a hora em que o movimento sovietista, abarcando o mundo inteiro, continua aos olhos de todos a obra da Comuna, que os traidores do socialismo esquecem repetindo as velhas futilidades burguesas sobre a “democracia em geral”. A Comuna não foi portanto uma instituição parlamentar.

6 – O valor da Comuna consiste em que ela tentou desarticular, destruir completamente o aparelho governamental burguês na administração, na justiça, no exército, na polícia, substituindo-o pela organização autônoma das massas operárias, sem reconhecer qualquer distinção entre os poderes legislativo e executivo.

Todas as democracias burguesas contemporâneas, sem excetuar a República alemã que os traidores do socialismo chamam proletária apesar da verdade, conservam o velho aparelho governamental. Assim, se confirma mais uma vez, de forma absolutamente evidente, que todos esses clamores em favor da democracia não servem, na realidade, senão para defender a burguesia e seus privilégios de classe exploradora.

7 – A liberdade de reunião pode ser tomada como exemplo dos princípios da democracia pura. Todo operário consciente que não rompeu com sua classe compreenderá de imediato que seria insensato permitir a liberdade de reunião aos exploradores, no momento e nas circunstâncias em que os exploradores se opõem à sua desgraça e defendem seus privilégios. A burguesia, quando era revolucionária, na Inglaterra em 1649 ou na França em 1793, jamais concedeu a liberdade de reunião aos monarquistas ou aos nobres que chamaram tropas estrangeiras e se “reuniram” para organizar as tentativas de restauração. Se a burguesia de hoje, que há muito tempo se tornou reacionária, exige do proletariado que ele garanta por antecipação, apesar de toda resistência que farão os capitalistas à sua expropriação, a liberdade de reunião para os exploradores, os operários só poderão rir da hipocrisia dessa burguesia.

De outra parte, os operários sabem muito bem que a liberdade de reunião, mesmo na república burguesa mais democrática, é uma frase vazia de sentido, pois os ricos possuem os melhores prédios públicos e privados, assim como o ócio necessário, para se reunirem sob a proteção deste aparelho governamental burguês. Os proletários da cidade e do campo e os pequenos agricultores, isto é, a imensa maioria da população, não possuem nem um nem outro. Longe disso, a igualdade, isto é, a democracia pura, é um engodo. Para conquistar a verdadeira legalidade, para realizar verdadeiramente a democracia em proveito dos trabalhadores, é necessário, preliminarmente, dar tempo livre aos trabalhadores; é necessário que a sua liberdade de reunião seja protegida por operários armados e não por oficiais provincianos ou capitalistas com soldados postados para sua devoção.

Só então se pode, sem zombar dos operários, dos trabalhadores, falar de liberdade de reunião e igualdade. Ora, quem pode executar essa mudança, a não ser a vanguarda dos trabalhadores, o proletariado, pela derrubada dos exploradores e da burguesia?

8 – A liberdade de imprensa é igualmente uma das grandes divisas da democracia pura. Mais uma vez, os operários sabem que os socialistas de todos os países reconheceram milhões de vezes que esta liberdade é uma mentira, tanto que as melhores impressores e os maiores estoques de papel são açambarcados pelos capitalistas, tanto mais subsiste o poder do capital no mundo inteiro com muito mais clareza, nitidez e cinismo quanto mais desenvolvido é o regime democrático e republicano, como por exemplo na América. A fim de conquistar a verdadeira igualdade e a verdadeira democracia no interesse dos trabalhadores, dos operários e dos camponeses, é preciso começar por tirar do capital a possibilidade de alugar todos os escritores, de comprar e corromper os jornais e as editoras, e por isso é necessário destruir o jugo do capital, destruir os exploradores, quebrar sua resistência. Os capitalistas chamam liberdade de imprensa à faculdade dos ricos corromperem a imprensa, à faculdade de utilizar sua riqueza para fabricar e sustentar uma suposta opinião pública. Os defensores da “democracia pura” são na realidade os defensores do sistema vil e corrompido da dominação dos ricos sobre a instrução das massas; eles são os que enganam, o povo e o desviam com belas frases mentirosas desta necessidade histórica de libertar a imprensa de sua submissão ao capital.

Verdadeira liberdade ou igualdade só existirá no regime edificado pelos comunistas, no qual será materialmente impossível submeter a imprensa direta ou indiretamente ao poder do dinheiro, no qual nada impedirá cada trabalhador, ou cada grupo de trabalhadores, de possuir ou usar, em total igualdade, o direito de se servir das máquinas e do papel do Estado.

A história do século XIX e do século XX nos mostrou, mesmo antes da guerra, o que era a famosa democracia pura sob o regime capitalista. Os marxistas sempre repetiram que quanto mais desenvolvida era a democracia pura, quanto mais pura era ela, tanto mais devia estar viva, encarniçada e impiedosa a luta de classes e mais nítido o domínio do capital e a ditadura da burguesia. O caso Dreyfus na França republicana, as violências sangrentas dos destacamentos assalariados e armados pelos capitalistas contra os grevistas na república livre e democrática da América, estes milhares de outros fatos que em vão a burguesia tenta esconder demonstram que é precisamente nas repúblicas mais democráticas que reina na realidade o terror e a ditadura da burguesia, terror e ditadura que aparecem abertamente toda vez que os exploradores supõem que o poder do capital começa a ser abalado.

9 – A guerra imperialista de 1914-1918 demonstrou definitivamente, mesmo aos olhos dos operários não esclarecidos, o verdadeiro caráter da democracia burguesa, mesmo nas repúblicas mais livres – como característica da ditadura burguesa. Para enriquecer um grupo alemão ou inglês de milionários ou de miliardários foram massacrados dezenas de milhares de homens e foi instituída a ditadura militar da burguesia nas repúblicas mais livres. Esta ditadura militar persiste, mesmo após a derrota da Alemanha, nos países da Entente. A guerra abriu os olhos dos trabalhadores, arrancou os falsos atrativos da democracia burguesa, mostrou ao povo inteiro o abismo da especulação e do lucro durante a guerra. Em nome da liberdade e da igualdade, a burguesia fez esta guerra; em nome da liberdade e da igualdade os fornecedores de armas acumularam riquezas inauditas. Todos os esforços da Internacional amarela de Berna não conseguiram esconder das massas o caráter de exploração atualmente manifesto da liberdade burguesa, da democracia burguesa.

10 – No país capitalista mais desenvolvido da Europa, a Alemanha, os primeiros meses desta completa liberdade republicana, ocasionada pela derrota da Alemanha imperialista, revelou aos operários alemães e ao mundo inteiro o caráter de classe da república democrática burguesa. O assassinato de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo é um fato de importância histórica universal, não só pela morte trágica de homens e dos melhores dirigentes da verdadeira internacional proletária e comunista, mas também porque ele desnudou no Estado mais avançado da Europa e, pode-se dizer, do mundo inteiro, a verdadeira essência do regime burguês. Se pessoas em estado de prisão, isto é, presas pelo poder governamental dos social-patriotas, sob sua guarda, puderam ser mortas impunemente por oficiais e capitalistas, é porque a república democrática na qual tal fato foi possível é apenas a ditadura da burguesia. Os que expressam sua indignação pelo assassinato de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo, mas não compreendem esta verdade, mostram com isso sua ignorância ou sua hipocrisia. A liberdade, numa das mais livres e avançadas repúblicas do mundo, na república alemão, é a liberdade de matar impunemente os dirigentes do proletariado em estado de prisão, e não pode ser de outra forma, pois o desenvolvimento do princípio democrático, longe de enfraquecer, superexcita a luta de classes que, por causa das repercussões e influências da guerra, chegou a seu ponto de ebulição.

Em todo o mundo civilizado, os bolcheviques são hoje expulsos, perseguidos e aprisionados. Na Suíça, uma da repúblicas mais livres, massacram os bolcheviques. Na América também acontece a mesma coisa. Do ponto de vista da democracia em geral ou da democracia pura, é de fato ridículo que os Estados civilizados e avançados, democráticos, armados até os dentes, temam a presença de algumas dezenas de homens vindos da Rússia atrasada, faminta, arruinada, desta Rússia que, em suas dezenas de milhões de exemplares, os jornais burgueses chama de selvagem, criminosa, etc. É claro que as condições sociais nas quais uma contradição tão gritante pôde nascer realizam na realidade a ditadura da burguesia.

11 – Neste estado de coisas, a ditadura do proletariado não é apenas absolutamente legítima, enquanto instrumento adequado à destruição dos exploradores e ao esmagamento de sua resistência, mas também absolutamente indispensável para toda a massa trabalhadora, como o único meio de defesa contra a ditadura da burguesia que causou a guerra e prepara novas guerras.

O ponto mais importante, que os socialistas não compreendem e que constitui sua miopia teórica, seu apego aos preceitos burgueses e traição política para com o proletariado, é que na sociedade burguesa, quando se acentua a luta de classes, não há meio-termo entre a ditadura da burguesia e a ditadura do proletariado. Todos os sonhos de uma solução intermediária são apenas lamentações reacionárias de pequeno-burgueses.

A prova disso é apresentada pela experiência do desenvolvimento da democracia burguesa e do movimento operário há mais de um século em todos os países civilizados e em particular pela experiência dos últimos cinco anos. É também verdade que ensina toda a ciência da economia política, todo o conteúdo do marxismo que explica por qual necessidade econômica nasce a ditadura da burguesia e como ela só pode ser substituída por uma classe desenvolvida, multiplicada, fortalecida e tornada coerente com o desenvolvimento do próprio capitalismo, isto é, a classe dos proletários.

12 – Um outro erro teórico e político dos socialistas consiste em não compreenderem que as formas da democracia mudaram constantemente ao longo dos séculos, desde seus primeiros germes na Antiguidade, à medida que uma classe dominante era substituída por outra. Nas antigas repúblicas da Grécia, nas cidades da Idade Média, nos países capitalistas civilizados, a democracia assume formas diversas e um grau de adaptação diferente. Seria a maior tolice crer que a revolução mais profunda da história da humanidade, a passagem do poder, pela primeira vez no mundo, de uma minoria de exploradores para maioria dos explorados, possa se produzir nos velhos marcos da democracia burguesa e parlamentar, sem rupturas claras, sem que se criem novas instituições encarnando as novas condições de vida, etc.

13 – A ditadura do proletariado assemelha-se à ditadura das outras classes, porque ela é provocada, como toda espécie de ditadura, pela necessidade de reprimir violentamente a resistência da classe que perde o poder político. O ponto fundamental que separa a ditadura do proletariado da de outras classes, da ditadura de elementos feudais na Idade Média, da ditadura da burguesia em todos os países civilizados, consiste em que a ditadura dos elementos feudais e da burguesia era o esmagamento violente da resistência da imensa maioria da população, da classe trabalhadora, enquanto que a ditadura do proletariado é o esmagamento pela força da resistência dos exploradores, isto é, de uma ínfima minoria da população: os proprietários dos meios de produção e os capitalistas.

Acrescente-se ainda que a ditadura do proletariado acarreta não apenas uma modificação das formas e instituições democráticas em geral, mas também uma modificação tal que atinge toda uma extensão até então desconhecida do princípio democrático em favor das classes oprimidas pelo capitalismo, em favor das classes trabalhadoras.

Com efeito, a forma da ditadura do proletariado, já elaborada de fato, isto é, o poder dos Sovietes na Rússia, o “Raete” Sistema na Alemanha, os “Shop Stewards Committes” e outras instituições análogas em outros países, significa precisamente e realiza para classe trabalhadora, vale dizer, para a imensa maioria da população, um rápido aproveitamento dos direitos e liberdades democráticas como jamais houve, mesmo nas melhores e mais democráticas repúblicas burguesas.

A essência do poder dos Sovietes consiste em que a base constante e única de todo o poder governamental é a organização das massas antes oprimidas pelos capitalistas, isto é, os operários e os semiproletários (pequenos proprietários de terras que não exploram o trabalho de outrem e que constantemente têm necessidade de vender parte de sua força de trabalho). Essas são as massas que, mesmo nas repúblicas burguesas mais democráticas, gozando da igualdade segundo a lei, estão isoladas na prática pela tradição e pelas manobras de toda participação na vida política, do uso de direitos e liberdades democráticas e que agora são chamadas a tomar parte, de forma decisiva, na gestão democrática do Estado.

14 – A igualdade de todos os cidadãos, independentemente de sexo, religião, raça, nacionalidade, que a democracia burguesa sempre e em todos os lugares promete mas não executa, dada a dominação do capitalismo, o poder dos Sovietes ou a ditadura do proletariado realiza imediata e completamente, pois só ela tem condições de realizar o poder dos operários que não estão interessados na propriedade privada dos meios de produção, mas na luta por sua divisão e distribuição.

15 – a velha democracia, vale dizer, a democracia burguesa e o parlamentarismo, está organizada de tal maneira que as massas operárias estão cada vez mais distantes do aparelho governamental. O poder dos Sovietes, isto é, a ditadura do proletariado, é, ao contrário, constituída de forma a aproximar as massas trabalhadoras do aparelho governamental. A reunião dos poderes legislativo e executivo atendem a este objetivo na organização sovietista do Estado, assim com a substituição das circunscrições territoriais pelas unidades de trabalho, como nas usinas e fábricas.

17 – Não é somente sob a monarquia que o exército é um instrumento de opressão. Ele o é também em todas as repúblicas burguesas, mesmo as mais democráticas. Assim, o poder dos Sovietes, organização permanente das classes oprimidas pelo capitalismo, é capaz de suprimir a submissão do exército ao comando burguês e fundir realmente o proletariado com o exército, realizando o armamento do proletariado e o desarmamento da burguesia, sem o que é impossível o triunfo do socialismo.

18 – Só a organização sovietista do Estado pode realmente quebrar de imediato e destruir definitivamente o velho aparelho administrativo e judiciário burguês que é conservado, e deve inevitavelmente ser conservado sob o capitalismo, mesmo nas repúblicas mais democráticas, uma vez que ele é de fato o maior empecilho à prática dos princípios democráticos em favor dos operários e dos trabalhadores. A Comuna de Paris deu, nesse sentido, primeiro passo de uma importância histórica universal; o poder dos Sovietes deu o segundo.

19 – O aniquilamento do poder governamental é o objetivo a que se propõem todos os socialistas. Sem a realização desse objetivo, a verdadeira democracia, isto é, a igualdade e a liberdade, é irrealizável. Ora, o único meio de chegar a isso é a democracia sovietista ou proletária, pois chamando as organizações das massas trabalhadoras a tomar uma parte real e obrigatória no governo, ela começa a preparar o desaparecimento completo de todo governo.

20 – A completa bancarrota dos socialistas reunidos em Berna, sua incompreensão absoluta da nova democracia proletária, aparecem particularmente no que segue: em 10 de fevereiro de 1919, Bratin encerrava em Berna a Conferência Internacional da Internacional amarela. Em 11 de fevereiro, em Berlim, era publicada no jornal de seus correligionários Die Freheit uma proclamação do partido dos Independentes ao proletariado. Nesta proclamação é reconhecido o caráter burguês do governo de Scheidemann, que é reprovado por seu desejo de abolir os Sovietes, chamados de mensageiros e defensores da Revolução, é exigida a sua legalização e a concessão de direitos políticos, o direito de voto contra s decisões da Assembléia Constituinte, servindo o referendum de julgamento em última instância.

Esta proclamação denota a completa falência dos teóricos que defendiam a democracia sem compreender seu caráter burguês. Esta tentativa ridícula de combinar o sistema dos Sovietes, isto é, a ditadura do proletariado, com a Assembléia Constituinte, isto é, a ditadura da burguesia, desvela até a raiz, ao mesmo tempo, a pobreza de pensamento dos socialistas amarelos e dos social-democratas, seu caráter reacionário de pequeno-burgueses e suas frouxas concessões diante da força irresistivelmente crescente da nova democracia proletária.

21 – Condenando o bolchevismo, a maioria da Internacional de Berna, que não ousou votar formalmente uma ordem do dia correspondente ao seu pensamento por medo das massas operárias, agiu justamente segundo seu ponto de vista de classe. Esta maioria é totalmente solidária aos mencheviques e socialistas revolucionários russos, assim como aos Scheidemann na Alemanha.

Os mencheviques e socialistas revolucionários russos, queixando-se de serem perseguidos pelos bolcheviques, tentam esconder o fato de que essas perseguições são causadas pela posição assumida pelos mencheviques e os socialistas revolucionários na guerra civil ao lado da burguesia contra os operários.

É, portanto, perfeitamente natural que a maioria dos participantes da Internacional de Berna tenha se pronunciado contra os bolcheviques; aqui e ali é evidente não tanto o desejo de defender a democracia pura, mas o desejo de se defenderem perante os que sentem e sabem que na guerra civil eles estão ao lado da burguesia e contra o proletariado.

Eis porque, do ponto de vista da luta de classes, é impossível não reconhecer a justeza da decisão da maioria da Internacional amarela. O proletariado não deve temer a verdade, mas olhá-la de frente e tirar as conclusões que dela decorrem.

Com base nessas teses, e considerando os relatos dos delegados dos diferentes países, o Congresso da Internacional Comunista declara que a tarefa principal dos partidos comunistas, nas diversas regiões onde o poder dos Sovietes ainda não está constituído, consiste em:

1º - Esclarecer amplamente as massas operárias sobre a significação histórica e a necessidade política e prática de uma nova democracia proletária, que deve ocupar o lugar da democracia burguesa no parlamento;

2º - Ampliar e organizar Sovietes em todos os setores da indústria, exército, marinha, entre os operários agrícolas e os pequenos camponeses;

3º - Conquistar, no interior dos Sovietes, uma maioria comunista segura e consciente.

DISCURSO DE LÊNIN SOBRE SUAS TESES

Camaradas,

Gostaria de acrescentar algumas palavras aos dois últimos pontos. Penso que os camaradas que nos devem fazer relato sobre a Conferência de Berna nos darão mais detalhes.

Nenhuma palavra foi dita sobre a significação do poder soviético durante toda a Conferência de Berna. Há dois anos nós discutíamos esta questão na Rússia. Já em abril de 1917, no congresso do partido, colocamos esta questão do ponto de vista teórico e político: “O que é o poder soviético, qual é sua substância, qual é sua significação histórica?” Durante 2 anos estudamos esta questão e no congresso do partido adotamos uma resolução a esse respeito.

A Freheit, de Berlim, publicou em 11 de fevereiro um chamado ao proletariado alemão assinado não só pelos dirigentes social-democratas independentes da Alemanha, mas por todos os membros da fração dos independentes. Em agosto de 1918, Kautsky o maior teórico dos independentes, escreveu em sua brochura, A Ditadura do Proletariado, que ele era partidário da democracia e dos órgãos soviéticos, mas que os Sovietes deveriam ter apenas um caráter econômico e não deveriam ser reconhecidos como organizações do Estado. Kautsky repete essa afirmação nos números da Freheit de 11 de novembro de 12 de janeiro. Em 9 de fevereiro aparece um artigo de Rudolph Hilferding, que é igualmente considerado um dos teóricos mais autorizados da II Internacional. Ele propõe fundir juridicamente, isto é, pela via legislativa, os dois sistemas – o dos Sovietes e o da Assembléia Nacional. Era 9 de fevereiro. Esta segunda proposição foi adotada por todo o Partido dos Independentes e publicada sob a forma de conclamação.

Apesar da Assembléia Nacional já existir de fato, mesmo depois da “democracia pura” tomar corpo e realidade, depois que os maiores teóricos social-democratas independentes explicaram que as organizações soviéticas não saberiam ser organizações do Estado, depois e apesar de tudo isso, há ainda hesitações. Isso prova que esses senhores realmente não compreenderam nada do novo movimento e de suas condições de luta. Mas isso prova, além do mais, outra coisa, a saber que deve haver circunstância, motivos determinando tais hesitações. Quando depois de todos esses fatos, depois de dois anos de revolução vitoriosa na Rússia, nos propõem semelhantes resoluções como tendo sido adotadas na Conferência de Berna, resoluções nas quais nada é dito dos Sovietes e sua significação, Conferência na qual nenhum delegado sequer balbuciou uma palavra dentro de um discurso qualquer sobre essas questões, nós temos o direito de afirmar que todos esses senhores estão mortos para nós como socialistas e como teóricos.

Mas, de fato, do ponto de vista político, isso prova, camaradas, que um grande progresso se realiza nas massas, pois esses independentes,, teoricamente e por princípio adversários dessas organizações do Estado, nos propõem subitamente tamanha tolice como a fusão “pacífica” da Assembléia Nacional com o sistema dos Sovietes, isto é, a fusão da ditadura da burguesia com a ditadura do proletariado. Vê-se a que ponto essas pessoas caíram política e teoricamente e que enorme transformação se produziu nas massas. As massas atrasadas do proletariado alemão vêm a nós, digo, elas vieram a nós. Assim, a significação do partido independente social-democrata alemão, a melhor parte do ponto de vista teórico e socialista é igual a zero; entretanto ela conserva uma certa importância no sentido em que esses elementos nos servem como indicação do estado de espírito do setor mais atrasado do proletariado. Segundo meu ponto de vista, esta é a enorme importância histórica desta conferência. Vimos alguma coisa análoga durante nossa revolução: nossos mencheviques seguiram passo a passo, por assim dizer, a mesma evolução que os teóricos dos independentes da Alemanha. Quando eles tinham a maioria nos Sovietes, eles eram pelos Sovietes. Ouviam-se somente os gritos de “Viva os Sovietes!" “Para os Sovietes!”, “Os Sovietes e a democracia revolucionária!”. Mas quando nós tivemos a maioria nos Sovietes, nós bolcheviques, eles entoaram outros cantos: “Os Sovietes, declararam eles, não devem existir ao mesmo tempo que a Assembléia Constituinte”: e inclusive certos teóricos mencheviques propuseram qualquer coisa análoga à fusão do sistema dos Sovietes com a Assembléia Constituinte e sua inclusão nas organizações do Estado. Uma vez mais surgiu que o curso geral da revolução proletária é idêntico no mundo inteiro. Primeiro constituição espontânea, elementar, dos Sovietes, depois sua ampliação e desenvolvimento, em seguida surgimento na prática da questão: Sovietes ou Assembléia Nacional Constituinte ou então parlamentarismo burguês, confusão absoluta entre os dirigentes e enfim revolução proletária. Parece-me, entretanto, que depois de dois anos de revolução nós não devemos colocar a questão de tal maneira, mas tomar resoluções concretas dado que a propagação do sistema dos Sovietes é para nós, e particularmente para a maioria dos países da Europa Ocidental, a mais essencial das tarefas. O estrangeiro que nunca ouviu falar do bolchevismo dificilmente terá uma opinião própria sobre nossas discussões. Tudo o que os bolcheviques afirmam, os mencheviques contradizem e vice-versa. Certamente não será de outra forma ao longo da luta, pois é extremamente importante que a última conferência do partido menchevique, realizada em dezembro de 1918, tenha adotado uma longa e detalhada resolução inteiramente publicada no Jornal dos Tipógrafos, órgão menchevique. Nesta resolução os próprios mencheviques expõem brevemente o histórico da luta de classes e da guerra civil. A resolução diz que os mencheviques condenam os grupos do partido aliado das classe possuidoras do Ural e no Midi, na Criméia e na Geórgia e indicam com precisão todas essas regiões. Os grupos do partido menchevique que, aliados às classes possuidoras, combateram contra o poder soviético são agora condenados nesta resolução, mas o último ponto condena igualmente aqueles que passaram para o lado dos comunistas. Mais adiante dizem que os mencheviques são obrigados a reconhecer que não ponto de unidade em seu partido e que se jogam ou para o lado da burguesia ou para o lado do proletariado. Uma grande parte dos mencheviques passou para o lado da burguesia e lutou contra nós durante a guerra civil. Naturalmente nós perseguimos os mencheviques, inclusive os fuzilamos, pois na guerra contra nós, eles combatem nosso exército vermelho e fuzilam nossos oficiais vermelhos. À burguesia que nos declarou guerra, nós respondemos com a guerra proletária: não pode haver outra saída. Então, do ponto de vista político, tudo isso é apenas hipocrisia menchevique. Historicamente é incompreensível que, na Conferência de Berna, pessoas que não são oficialmente reconhecidas como loucas, pudessem, sob a ordem dos mencheviques e dos socialistas revolucionários, falar da luta dos bolcheviques contra eles calando sobre sua luta em comum com a burguesia contra o proletariado.

Todos eles nos atacam com obstinação porque nós os perseguimos; isto é exato, mas eles se reservam de falar um palavra que seja sobre a posição que tomaram na guerra civil. Penso que é conveniente retomar, para que conste em ata, o texto completo da resolução e peço aos camaradas estrangeiros que prestem toda a atenção, pois é um documento histórico no qual a questão está perfeitamente colocada e que fornece a melhor documentação para a apreciação da discussão entre as diversas tendências “socialistas” na Rússia. Entre o proletariado e a burguesia existe uma classe de pessoas que se inclinam ora para um lado, ora para outro. Sempre foi assim em todas as revoluções, e é absolutamente impossível que na sociedade capitalista, em que o proletariado e a burguesia constituem dois campos inimigos e opostos não existem entre eles camadas sociais intermediárias. Historicamente a existência desses elementos flutuantes é inevitável; infelizmente esses elementos que não sabem de que lado combaterão amanhã existirão por um tempo ainda relativamente grande.

Desejo fazer uma proposição concreta no sentido de se adotar uma resolução na qual três pontos devem ser especialmente sublinhados:

1 – Uma das tarefas mais importantes para os camaradas dos países da Europa Ocidental consiste em explicar às massas a significação, a importância e a necessidade dos Sovietes. Constata-se sobre esta questão uma compreensão ainda insuficiente. Se é verdade que Kautsky e Hilferding faliram como teóricos, os últimos artigos da Freiheit provam entretanto que eles souberam expressar exatamente o estado de espírito dos partidos atrasados do proletariado alemão. Aconteceu o mesmo entre nós: durante os oito primeiros anos da revolução russa a questão da organização soviética foi muito discutida, e os operários não viam muito claramente em que consistia o novo sistema; nem se se podia constituir aparelho de Estado com os sovietes. Em nossa revolução progredimos não pela via teórica, mas pela via prática. Assim, por exemplo, jamais antes tínhamos colocado teoricamente a questão da Assembléia Constituinte e jamais dissemos que não a reconhecíamos. Somente mais tarde, depois que as instituições soviéticas se espalharam por todo o país conquistaram o poder político, decidimos dispersar a Assembléia Constituinte. Vemos atualmente que a questão se coloca com muito mais agudeza na Hungria e na Suíça. De um lado é excelente que seja assim; quanto a isso temos a convicção absoluta de que a revolução avança mais rapidamente nos países da Europa Ocidental e que ela nos dará grandes vitórias. Mas, por outro lado, há um certo perigo e esse é saber que a luta será de tal forma encarniçada e longa que a consciência das massas operárias poderá não estar em condições de seguir esse ritmo. Ainda hoje a significação do sistema dos Sovietes não está clara para as grandes massas operárias alemãs politicamente instruídas, porque eles foram conduzidos dentro do espírito parlamentar e de precedentes burgueses.

2 – Ponto relativo à propagação dos sistema dos Sovietes. Quando nós vemos quão rapidamente a idéia dos Sovietes se espalha na Alemanha e mesmo na Inglaterra, podemos dizer que esta é uma prova essencial de que a revolução proletária vencerá. Só se poderá deter seu curso por pouco tempo. Mas isso é outro caso quando os camaradas Albert e Platten vêm-nos declarar que não há nada de Sovietes entre eles, no campo, entre os trabalhadores rurais e os pequenos proprietários. Li, na Rote Fahne, um artigo contra os sovietes de pequenos proprietários, mas (e isso é absolutamente certo) favorável aos Sovietes de trabalhadores rurais e de camponeses pobres. A burguesia e seus lacaios , como Scheidemann e companhia, já deram a palavra de ordem dos Sovietes camponeses. Mas nós queremos apenas os Sovietes de trabalhadores rurais e camponeses pobres. Resulta, infelizmente, dos relatos dos camaradas Albert e Platten e outros que, à exceção da Hungria, muito pouco foi feito para a expansão do sistema soviético. Isso talvez seja porque lá há um perigo bastante considerável para a obtenção da vitória pelo proletariado alemão. Com efeito, a vitória só será considerada segura quando estiverem organizados não só os trabalhadores da cidade, mas também os proletários do campo e organizados não mais como antes, dentro dos sindicatos e cooperativas, mas nos Sovietes. Obtivemos a vitória com mais facilidade porque em outubro de 1917 nós caminhamos junto com todo o campesinato. Nesse sentido, nossa revolução era ainda burguesa. O primeiro passo de nosso governos proletário consistiu em que as velhas reivindicações do campesinato, expressas ainda no governo de Kerenski pelos Sovietes e assembléias de camponeses, foram atendidas pela lei editada por nosso governo em 26 de outubro (antigo calendário) de 1917, dia imediato ao da revolução. Nisso consistia nossa força e por isso foi fácil conquistar a simpatia da ampla maioria. Para o campo, nossa revolução continua a ser burguesa, mas, mais tarde, fomos forçados a começar, nos planos da organização do Estado, a luta de classes no campo, a instituir em cada povoado comitês da pobreza, de semiproletários, e a lutar sistematicamente contra a burguesia rural. Isso era inevitável entre nós, pois a Rússia é um país atrasado. Isso será totalmente diferente na Europa Ocidental e é por isso que devemos sublinhar a necessidade absoluta da expansão do sistema dos Sovietes também entre a população rural em formas correspondentes e talvez novas.

3 – Devemos dizer que a conquista da maioria comunista nos Sovietes constitui a principal tarefa em todos os países onde o poder soviético ainda não triunfou. Nossa comissão de resoluções estudou ontem esta questão. Talvez outros camaradas também queiram dar sua opinião, mas eu gostaria de propor que se adote este terceiro ponto sob a forma de resolução especial. Ele vai sem dizer que nós não sabemos como prescrever sua via de desenvolvimento. É de fato provável que em muitos países da Europa Ocidental a revolução eclodirá rapidamente; em todo caso, nós, na qualidade de fração organizada dos operários e do Partido, tendemos e devemos tender a obter a maioria nos Sovietes. Então nossa vitória estará assegurada e não haverá mais nenhuma força em condições de interpor o que quer que seja contra a revolução comunista. De outro lado, a vitória não será tão fácil e não será duradoura.

RESOLUÇÃO SOBRE A POSIÇÃO EM RELAÇÃO ÀS CORRENTES SOCIALISTAS E À CONFERÊNCIA DE BERNA

Já em 1907, no Congresso Internacional Socialista de Stuttgart, quando a Segunda Internacional abordou a questão da política colonial e das guerras imperialistas, se constatou que mais da metade da Segunda Internacional e a maior parte dos seus dirigentes estavam, nessas questões, mais próximos do ponto de vista da burguesia do que do ponto de vista comunista de Marx e Engels.

Apesar disso, o Congresso de Stuttgart, adotou uma emenda proposta pelos representantes da ala revolucionária, N. Lênin e Rosa Luxemburgo, que começava nos seguintes termos:

“Se todavia inicia-se uma guerra, os socialistas têm o dever de agir para seu fim imediato e utilizar de todos os modos a crise econômica e política provocada pela guerra para despertar o povo e apressar com isso o fim da dominação capitalista.”

No Congresso de Bâle, em novembro de 1912, convocado na época da guerra dos Bálcãs, a Segunda Internacional declarou:

“Que os governos burgueses não esqueçam como a guerra franco-alemã deu origem à insurreição revolucionária da Comuna, e que a guerra russo-japonesa colocou em movimento as forças revolucionários da Rússia. Aos olhos dos proletários é um crime se entrematar para aumentar o lucro dos capitalistas, em proveito da rivalidade dinástica e da proliferação dos tratados diplomáticos.”

***

                                    No final de julho e começo de agosto de 1914, 24 horas antes de iniciar a guerra mundial, os organismos e instituições competentes da Segunda Internacional ainda continuavam a condenar a guerra que se aproximava como o maior crime da burguesia. As declarações concordavam nesses dias e emanando dos partidos dirigentes da Segunda Internacional constituem o ato de acusação mais eloquente contra os dirigentes da Segunda Internacional.

Com o primeiro tiro de canhão disparado sobre os campos de batalha, os principais partidos da Segunda Internacional traíram a classe operária e passaram, sob o disfarce da “defesa nacional”, cada um para o lado da “sua” burguesia. Scheidemann e Ebert na Alemanha, Thomas e Renaudel na França, Henderson e Hyndman na Inglaterra, Vandervelde e De Brockère na Bélgica, Renner e Pernestorfer na Áustria, Plékhanov e Roubanovitch na Rússia, Branting e seu partido na Suécia, Compers e seus camaradas de idéias na América, Mussolini e Cie na Itália, exortaram o proletariado a uma “trégua” com a burguesia de “seu” país, a renunciar à guerra contra a guerra e servir de carne de canhão para os imperialistas.

Foi neste momento que a Segunda Internacional faliu definitivamente e pereceu.

Graças ao desenvolvimento econômico geral, a burguesia dos países mais ricos, através de pequenas esmolas tiradas de seus ganhos enormes, teve a possibilidade de corromper e seduzir a camada mais alta da classe operária, a aristocracia operária. Os “companheiros de luta” pequeno-burgueses do socialismo afluíram às fileiras dos partidos social-democratas oficiais e orientaram pouco a pouco o seu curso no sentido da burguesia. Os dirigentes do movimento operário parlamentar e pacífico, os dirigentes sindicais, secretários, redatores e empregados da social-democracia, formaram uma casta de uma burocracia operária, tendo seus próprios interesses de grupo, e que foi na verdade hostil ao socialismo.

Devido a todas essas circunstâncias, a social-democracia degenerou em um partido anti-socialista e chauvinista.

No seio da Segunda Internacional já se revelavam três tendência fundamentais. Durante a guerra e no início da revolução proletária na Europa, os contornos dessas três tendência se desenhavam já com toda nitidez:

1 – A tendência social-chauvinista (tendência da “maioria”), em que os representantes mais típicos são os social-democratas alemães, que hoje dividem o poder com a burguesia alemã e que se tornaram os assassinos dos dirigentes da Internacional Comunista, Karl Liebkencht e Rosa Luxemburgo.

Os social-chauvinistas se revelam hoje completamente como os inimigos do proletariado e seguem o programa de “liquidação” da guerra que a burguesia lhes ditou: fazer recair a maior parte dos impostos sobre as massas trabalhadores, inviolabilidade da propriedade privada, manutenção do exército nas mãos da burguesia, dissolução dos conselhos operários formados em todos os lugares, manutenção do poder político nas mãos da burguesia – a democracia burguesa contra o socialismo.

Apesar da aspereza com a qual os comunistas lutaram até aqui contra os “social-democratas da maioria”, os operários reconheceram entretanto o perigo com o qual esses traidores ameaçavam o proletariado internacional. Abrir os olhos de todos os trabalhadores para o trabalho de traição dos social-chauvnistas e colocar pela força das armas esse partido contra-revolucionário fora desse quadro confuso, eis uma das tarefas mais importantes da revolução proletária internacional.

2 – A tendência centrista (social-pacifistas, kautskystas, independentes). Esta tendência começou a se formar desde antes da guerra, principalmente na Alemanha. No começo da guerra, os princípios gerais do “Centro” coincidiam quase sempre com os dos social-chauvinistas. Kautsky, o chefe teórico do “Centro”, defendia a política seguida pelos social-chauvinistas alemães e franceses. A Internacional era apenas um “instrumento em tempo de paz”, “luta de classes em tempo de paz”, tais eram as palavras de ordem de Kautsky.

Desde o início da guerra, o “Centro” (Kautsky, Victor Adler, Turatia, MacDonald) se puseram a pregar a “anistia recíproca”, com relação aos chefes dos partidos social-chauvinistas da Alemanha e da Áustria, por um lado, da França e da Inglaterra por outro. O “Centro” preconiza essa anistia até hoje, depois da guerra, impedindo assim os operários de fazerem uma idéia clara sobre as causas do desmoronamento da Segunda Internacional.

O “Centro” enviou seus representantes a Berna para a conferência internacional dos socialistas comprometidos, facilitando assim aos Scheidemann e as Renaudel sua tarefa de enganar os operários.

É absolutamente necessários separar do “Centro” os elementos mais revolucionários, e só se pode chegar a isso através da crítica implacável e comprometendo os dirigentes do “Centro”. A ruptura organizativa com o “Centro” é uma necessidade histórica absoluta. A tarefa dos comunistas de cada país é determinar o momento desta ruptura segundo a etapa que o movimento atingiu em cada um.

3 – Os comunistas. No interior da Segunda Internacional onde esta tendência defendeu as concepções comunistas-marxistas sobre a guerra e as tarefas do proletariado (Stuttgart 1907, resolução Lênin-Luxemburgo) essa corrente estavam minoria. O gruo da “esquerda radical” (o futuro Spartakusbund) na Alemanha, o partido dos bolcheviques na Rússia, os “tribunistas” na Holanda, o grupo de Jovens numa série de países, formaram o primeiro núcleo da nova Internacional.

Fiel aos interesses da classe operária, esta tendência proclamou desde o início da guerra a palavra de ordem de transformação da guerra imperialista em guerra civil. Esta tendência se constitui hoje na Terceira Internacional.

A conferência socialista de Berna, em fevereiro de 1919, foi uma tentativa de galvanizar o que restava da Segunda Internacional.

A composição da Conferência de Berna demonstrou que o proletariado revolucionário de todo o mundo nada tem em comum com esta conferência.

O proletariado vitorioso da Rússia, o proletariado heróico da Alemanha, o proletariado italiano, o partido comunista do proletariado austríaco e húngaro, o proletariado suíço, a classe operária da Bulgária, Romênia, Sérvia, os partidos operários de esquerda suecos, noruegueses, finlandeses, o proletariado ucraniano, letão, polonês, a Juventude Internacional, a Internacional de Mulheres, recusaram-se ostensivamente a participar da Conferência de Berna dos social-patriotas.

Os participantes da Conferência de Berna, que têm ainda algum contato com o verdadeiro movimento operário de nossa época, formaram um grupo de oposição que, na questão essencial, pelo menos, “apreciação da Revolução russa”, estão em oposição à astúcia dos social-patriotas. A declaração do camarada francês Loriot, que estigmatizou a maioria da Conferência de Berna como suporte da burguesia, reflete a verdadeira opinião de todos os operários conscientes do mundo inteiro.

Na pretendida “questão das responsabilidades”, a Conferência de Berna se moveu sempre nos limites da ideologia burguesa. Os social-patriotas alemães e franceses fizeram-se mutuamente as mesmas censuras que se lançaram reciprocamente os burgueses alemães e franceses. A Conferência de Berna se perdeu em detalhes mesquinhos sobre tal ou qual diligência de tal ou qual ministro burguês antes da guerra, não querendo reconhecer que o capitalismo, o capital financeiro dos dois grupos de poder e seus vassalos social-patriotas eram os principais responsáveis pela guerra. Uma olhadela no espelho seria suficiente para que todos eles se reconhecessem como os responsáveis.

As declarações da Conferência de Berna sobre a questão territorial estão cheias de equívocos. É precisamente desses equívocos que a burguesia precisa. O senhor Clemenceau, o representante mais reacionário da burguesia imperialista, reconheceu os méritos da conferência social-patriota de Berna e lhe propôs participar de todas as comissões da conferência imperialista de Paris.

A questão colonial revelou claramente que a Conferência de Berna estava a reboque desses políticos liberais-burgueses da colonização que justificam a exploração e a escravização das colônias pela burguesia imperialista e procuram apenas mascara-las com frases filantrópico-humanitárias. Os social-patriotas alemães exigiram que o domínio das colônias alemãs pelo Reich fosse mantido, isto é, a manutenção da exploração dessas colônias pelo capital alemão. As divergências que se manifestaram sobre esse assunto demonstram que os social-patriotas da Entente têm o mesmo ponto de vista dos negreiros, e considera natural a escravização das colônias francesas e inglesas pelo capital metropolitano. Assim a Conferência de Berna mostra que esqueceu completamente a palavra de ordem de “Abaixo o política colonial”.

Na avaliação da “Sociedade das Nações”, a Conferência de Berna mostra que segue a linha desses elementos burgueses que, pela aparência enganadora da pretensa “Liga das Nações”, desejam banir a revolução proletária que cresce no mundo inteiro. Em vez de desmascarar os estratagemas da conferência dos aliados em Paris, como os de um bando que espolia as colônias e os domínios econômicos, a Conferência de Berna a secunda, servindo-lhe de instrumento.

A atitude servil da conferência, que entregou a uma conferência governamental burguesa de Paris o trabalho de resolver a questão da legislação de proteção ao trabalho, mostra que os social-democratas estão conscientemente a favor da conservação da escravidão do trabalho assalariado pelo capitalismo e estão prontos a enganar a classe operária com vagas reformas.

As tentativas inspiradas pela política burguesa de fazer a Conferência de Berna adotar uma resolução segundo a qual uma intervenção armada na Rússia teria cobertura da Segunda Internacional não frutificaram graças aos esforços da oposição. Esta vitória da oposição de Berna sobre os elementos chauvinistas declarados é para nós a prova indireta de que o proletariado da Europa Ocidental simpatiza com a revolução proletária da Rússia e de que está pronto para lutar contra a burguesia imperialista.

Em seu temor de se ocupar deste fenômeno de importância histórica mundial se reconhece o medo que toma conta desses vassalos da burguesia diante da extensão dos conselhos operários.

Os conselhos operários constituem o fenômeno mais importante depois da Comuna de Paris. A Conferência de Berna, ignorando esta questão, manifestou sua indigência espiritual e sua falência teórica.

O congresso da Internacional Comunista considera a “Internacional” que a Conferência de Berna tenta construir como uma Internacional amarela de fura-greves, como um instrumento da burguesia.

O Congresso conclama os operários de todos os países a empreenderem uma luta enérgica contra a Internacional amarela e a preservar as massas mais amplas do povo desta Internacional de mentira e traição.

DECLARAÇÃO FEITA PELOS PARTICIPANTES DA CONFERÊNCIA DE ZIMMERWALD AO CONGRESSO DA INTERNACIONAL COMUNISTA

As Conferência de Zimmerwald e de Kiethal tiveram sua importância numa época em que era necessário unir todos os elementos proletários dispostos de uma forma ou outra a protestar contra a carnificina imperialista. No grupamento de Zimmerwald entraram, ao lado de elementos nitidamente comunistas, elementos “centristas”, pacifistas e hesitantes. Esses elementos centristas, como mostrou a Conferência de Berna, estão atualmente unidos aos social-patriotas para lutar contra o proletariado revolucionário, utilizando assim Zimmerwald em proveito da reação.

Ao mesmo tempo, o movimento comunista crescia em vários países, e a luta contra os elementos centristas que obstaculizavam o desenvolvimento da revolução social se tornava a tarefa principal do proletariado revolucionário. O grupamento de Zimmerwald teve sua época. Tudo o que havia de verdadeiramente revolucionário no grupamento de Zimmerwald passa e adere à Internacional Comunista.

Os participantes abaixo de Zimmerwald declaram que consideram dissolvido o grupamento de Zimmerwald e solicitam ao Bureau da Conferência de Zimmerwald que remeta todos os seus documentos ao Comitê Executivo da 3ª Internacional.

Rakovsky, Lênin, Trotsky, Platten

Decisão Referente ao Grupamento de Zimmerwald

Depois de escutar o relato do camarada Balabanov, secretário do Comitê Socialista Internacional, e dos camaradas Rakovsky, Lênin, Trotsky e Zinoviev, membros do grupamento de Zimmerwald, o primeiro Congresso de Zimmerwald comunistas decide: considerar dissolvido o grupamento de Zimmerwald.

Decisão Referente à Questão da Organização

A fim de poder começar sem demora seu trabalho ativo, o Congresso designa imediatamente os órgãos necessários, dentro da idéia de que a constituição definitiva da Internacional Comunista deverá ser dada pelo próximo congresso sob proposição do Bureau.

A direção da Internacional Comunista é confiada a um Comitê Executivo. Este se compõe de um representante de cada um dos partidos comunistas dos países mais importantes. Os partidos da Rússia, Alemanha, Áustria alemão, Hungria, Federação dos Bálcãs, Suíça e Escandinávia devem enviar imediatamente seus representantes ao primeiro Comitê Executivo.

Os partidos dos países que declararam aderir à Internacional Comunista antes do segundo congresso obterão um lugar no Comitê Executivo.

Até a chegada dos representantes estrangeiros, os camaradas dos países que têm lugar no Comitê Executivo se encarregam de assegurar os trabalhos. O Comitê Executivo elege um bureau de cinco pessoas.

RESOLUÇÃO SOBRE A FUNDAÇÃO DA INTERNACIONAL COMUNISTA

PLATTEN – presidente - ...Agora, levo ao seu conhecimento uma proposição apresentada pelos delegados Rakovsky, Gruber, Grimland, Rudniansky.

Ela está apresentada assim:

“Os representantes do Partido Comunista da Áustria alemã, do Partido social-democrata dos Bálcãs, do Partido Comunista da Hungria, propõem a fundação da Internacional Comunista.

1 – A necessidade da luta pela ditadura do proletariado exige a organização unificada, comum e internacional de todos os elementos comunistas que se colocam neste terreno.

2 – Esta fundação é um dever tanto mais imperioso quando atualmente tenta-se em Berna e talvez se tente mais tarde em algum outro lugar restabelecer a antiga Internacional oportunista e reunir todos os elementos confusos e hesitantes do proletariado. Por isso é necessário estabelecer uma separação nítida entre os elementos revolucionários proletários e os elementos social-traidores.

3 – Se a III Internacional não for fundada pela Conferência a realizar-se em Moscou, isto dará a impressão de que os partidos comunistas estão em desacordo, o que enfraquecerá nossa posição e aumentará a confusão entre os elementos indecisos do proletariado de todos os países.

4 – A constituição da III Internacional é portanto um dever histórico absoluto, e a Conferência comunista internacional a realizar-se em Moscou deve torná-la uma realidade.”

Esta proposição supõe que nós nos debruçamos sobre uma resolução para sabermos se éramos uma conferência ou um congresso. A proposição visa à constituição da III Internacional. A discussão é aberta.

Após a discussão, o camarada Platten apresenta a proposição assinada por Rakovsky, Gruber, Grimland, Rudniansky.

“Esta proposição, diz ele, é feita a fim de conduzir a uma decisão sobre a fundação da III Internacional.”

A resolução foi adotada por unanimidade menos 5 abstenções (delegação alemã).

Decisão (04 de Março de 1919)

            A conferência Comunista Internacional decide constituir-se como III Internacional e adotar o nome de Internacional Comunista. As proporções dos votos acordados não sofreram alteração. Todos os partidos, organizações e grupos conservam o direito, durante um período de 8 meses, de aderir definitivamente à III Internacional.

PLATAFORMA DA INTERNACIONAL COMUNISTA

As contradições do sistema mundial, antes escondidas, revelaram-se com uma força inaudita numa formidável explosão: a grande guerra imperialista mundial.

O capitalismo tentou superar sua própria anarquia pela organização da produção. Em vez de numerosas empresas concorrentes, organizaram-se vastas associações capitalistas (sindicatos, cartéis, trustes), o capital bancário se uniu ao capital industrial, toda uma vida econômica caiu sob o poder uma oligarquia financeira capitalista, que, numa organização baseada neste poder, adquiriu um domínio exclusivo. O monopólio suplanta a livre concorrência. O capitalista isolado se transforma em membro de uma associação capitalista. A organização substitui a anarquia insensata.

Mas na mesma medida em que, nos países, tomados separadamente, os procedimentos anárquicos da produção capitalista são substituídos pela organização capitalista, as contradições, a concorrência, a anarquia, atingem na economia capitalista uma agudeza maior. A luta entre os maiores países concorrentes conduz, com uma inflexível necessidade, à monstruosa guerra imperialista. A sede de lucros levou o capitalismo mundial à luta pela conquista de novos mercados, novas fontes de matérias-primas, mão de obra barata dos escravos coloniais. Os países imperialistas que dividiram o mundo inteiro entre si, que transformaram milhões de operários e camponeses da África, Ásia, América e Austrália em bestas de carga, devem revelar, mais cedo ou mais tarde, num grande conflito, a natureza anárquica do capital. Assim foi cometido o maior de todos os crimes – a guerra mundial.

O capitalismo tentou disfarçar as contradições de sua estrutura social. A sociedade burguesa é uma sociedade de classes. Mas o capital dos grandes países “civilizados” se esforçou para ocultar as contradições sociais. A expensa dos povos coloniais que destruiu, o capital comprou seus escravos assalariados, criando uma comunidade de interesses entre os exploradores e os explorados – comunidade de interesses dirigida contra as colônias oprimidas e os povos coloniais amarelos, negros e vermelhos; ele aprisionou o operário europeu ou americano à “pátria” imperialista.

Mas este mesmo método de corrupção contínua, que criou o patriotismo da classe operária e sua sujeição moral, produziu, graças à guerra, sua própria antítese. O extermínio, a sujeição total do proletariado, um domínio monstruoso, o empobrecimento, a degeneração, a fome no mundo inteiro – tal foi o preço último da paz social. E esta paz faliu. A guerra imperialista transformou-se em guerra civil.

Uma nova época nasceu. Época de desagregação do capitalismo, de sua derrocada interior. Época da revolução comunista do proletariado.

O sistema imperialista desaba. Problemas nas colônias, fermentação entre as pequenas nacionalidades até o momento privadas de independência revoltas do proletariado, revoluções proletárias vitoriosas em vários países, decomposição dos exércitos imperialistas, incapacidade absoluta das classes dirigentes de conduzir doravante os destinos dos povos – tal é o quadro da situação atual no mundo inteiro.

A humanidade, cuja cultura foi totalmente devastada, está ameaçada de destruição. Apenas uma força é capaz de salvá-la, e esta força é o proletariado. A antiga “ordem capitalista” morreu. Não pode mais existir. O resultado final dos processos capitalistas de produção é o caos, - e este caos só pode ser vencido pela maior classe produtora, a classe operária. Ela é que deve instituir a ordem verdadeira, a ordem comunista. Ela deve vencer a dominação do capital, tornar as guerras impossível, anular a fronteiras entre os países, transformar o mundo numa vasta comunidade que trabalha para si mesma, realizar a solidariedade fraternal e a libertação dos povos.

Enquanto isso, o capital mundial se arma para o último combate contra o proletariado. Sob o disfarce da Liga das Nações e das tagarelices pacíficas, o capital envida seus últimos esforços para arrumar as partes desconjuntadas dos sistema capitalista e dirigir suas forças contra a revolução proletária irresistivelmente desencadeada.

A este novo e imenso complô das classes capitalistas, o proletariado deve responder com a conquista do poder político, dirigir seu poder contra seus inimigos, servir-se dele como alavanca para a transformação econômica da sociedade. A vitória definitiva do proletariado marcará o início da história da humanidade libertada.

A Conquista do Poder Político

A conquista do poder político pelo proletariado significa o aniquilamento do poder político da burguesia. O aparelho governamental com seu exército capitalista, comandado por um corpo de oficiais burgueses e de “junkers”, com sua polícia e sua gendarmaria, seus carcereiros e seus juízes, seus padres, seus funcionários, etc, constitui, nas mãos da burguesia, o mais poderoso instrumento de governo. A conquista do poder governamental não pode se reduzir a um troca de pessoas na constituição de ministérios, mas deve significar o aniquilamento de um aparelho de estado estranho, colocado nas mãos da força real, o desarmamento da burguesia, do corpo de oficiais contra-revolucionários, das guardas brancas, o armamento do proletariado, dos soldados revolucionários e da guarda vermelha operária; a destituição de todos os juízes burgueses e a organização de tribunais proletários, a destruição do funcionalismo reacionário e a criação de novos órgãos proletários de administração. A vitória proletária é assegurada pela desorganização do poder inimigo e a organização do poder proletário, ela deve significar a ruína do aparelho estatal burguês e a criação do aparelho estatal proletário. Somente com a vitória completa, quando o proletariado tiver quebrado definitivamente a resistência da burguesia, ele poderá obrigar seus antigos adversários a lhes serem úteis, conduzindo-os progressivamente, sob seu controle, à obra de construção comunista.

Democracia e Ditadura

Como todo Estado, o Estado proletário representa um aparelho de coação e este aparelho é hoje dirigido contra os inimigos da classe operária. Sua missão é quebrar a resistência dos exploradores, que empregam em sua luta desesperada, todos os meios para afogar a revolução com sangue. Por outro lado, a ditadura do proletariado fazendo oficialmente esta classe a classe governante cria uma situação transitória.

Na medida em que for destruída a resistência da burguesia, ela será expropriada e se transformará em uma massa trabalhadora; a ditadura do proletariado desaparecerá, o Estado morrerá e as classes sociais desaparecerão com eles.

A pretensa democracia, isto é, a democracia burguesa, não é outra coisa que a ditadura burguesa disfarçada. A “vontade popular” tão enaltecida é uma ficção, bem como a unidade do povo. De fato, as classes existem porque os interesses contrários são irredutíveis. E como a burguesia é apenas uma minoria insignificante, ela utiliza esta ficção, esta pretensa “vontade popular” a fim de afirmar, com belas frases, seu domínio sobre a classe operária, para impor-lhe a vontade de sua classe. Ao contrário, o proletariado, constituindo a imensa maioria da população, usa abertamente o poder de suas organizações de massa, de seus sovietes, para encaminhar a transição em direção a uma sociedade comunista sem classes.

A essência da democracia burguesa reside no reconhecimento meramente formal dos direitos e das liberdades, completamente inacessíveis ao proletariado e aos elementos semiproletários, por causa da falta de recursos materiais enquanto a burguesia tem todas as possibilidades de tirar partido desses recursos materiais, de sua imprensa e de sua organização, para mentir e enganar o povo. Ao contrário, a essência do sistema dos Sovietes, - deste novo tipo de poder – consiste em que o proletariado tenha a possibilidade de assegurar de fato seus direitos e sua liberdade. O poder dos Sovietes entrega ao povo os mais belos palácios, as casas, as tipografias, as reservas de papel, etc, para sua imprensa, para suas reuniões, seus sindicatos. Só então se torna verdadeiramente possível a democracia proletária.

Com seu sistema parlamentar, a democracia burguesa dá o poder às massas apenas com palavras, e suas organizações estão completamente isoladas do poder verdadeiro e da verdadeira administração do Estado. No sistema dos Sovietes, as organizações das massas governam por si e para si, os Sovietes chamam à administração do Estado um número sempre maior de operários; apenas desta maneira todo o povo trabalhador é chamado a fazer parte efetivamente do Estado. O sistema dos Sovietes se apóia nas organizações das massas proletárias representadas pelos próprios Sovietes, as uniões profissionais revolucionárias, as cooperativas, etc.

A democracia burguesa e o parlamento, pela divisão dos poderes legislativo e executivo e com a ausência do direito de interpelação dos deputados, acaba por separar as massas do Estado. O sistema dos Sovietes, ao contrário, por garantir o direito de interpelação, pela reunião dos poderes executivo e legislativo e, consequentemente, pela sua capacidade de constituir coletivos de trabalho, liga as massas aos órgãos de administração. Esta ligação é ainda assegurada pelo fato de que, no sistema dos Sovietes, as eleições não se dão de acordo com divisões territoriais artificiais, mas coincidem com as unidades locais de produção.

O sistema dos Sovietes assegura a possibilidade de uma verdadeira democracia proletária, a democracia para o proletariado e no proletariado, dirigida contra a burguesia. Neste sistema, uma posição de destaque é assegurada ao proletariado industrial, ao qual pertence, por sua melhor organização e seu maior desenvolvimento político, o papel de classe dirigente, cuja hegemonia permitirá ao semiproletariado e aos camponeses pobres elevarem-se progressivamente. Essa superioridade momentânea do proletariado industrial deve ser utilizada para afastar as massas não possuidoras da pequena burguesia rural da influência dos grandes proprietários rurais e da burguesia, para organizá-las e chamá-las a colaborar na construção comunista.

A Expropriação da Burguesia e a Socialização dos Meios de Produção

A decomposição do sistema capitalista e da disciplina capitalista do trabalho tornam impossível, dadas as relações entre classes, a reconstituição da produção sobre as antigas bases. A luta dos operários por aumento de salários, mesmo em caso de vitória, não leva à esperada melhoria das condições de vida, o aumento dos preços dos produtos anula cada vitória. A luta enérgica dos operários por aumento de salários nos países em que a situação é evidentemente sem saída, por seu caráter impetuoso e apaixonado, por sua tendência à generalização, torna impossível de agora em diante o progresso da produção capitalista. A melhoria da condição dos operários não poderá ser atendida sem que o proletariado se adone da produção. Para desenvolver as forças produtivas da economia, para vencer mais rapidamente a resistência da burguesia, que prolonga a agonia da velha sociedade criando o perigo de uma completa ruína da vida econômica, a ditadura do proletariado deve realizar a expropriação da grande burguesia e da nobreza e fazer dos meios de produção e de transporte propriedade coletiva do Estado proletário.

O comunismo nasce agora sob os escombros da sociedade capitalista; a história não deixou outra escolha à humanidade. Os oportunistas, em seu desejo de retardar a socialização por sua utópica reivindicação de restabelecimento da economia capitalista, não fazem senão adiar a solução da crise e criar a ameaça de uma ruína total, enquanto a revolução comunista aparece para verdadeira força produtiva da sociedade, para o proletariado – e com ele, para toda sociedade – como o melhor, o mais seguro meio de salvação.

A ditadura do proletariado não ocasiona nenhuma dispersão dos meios de produção e transporte. Ao contrário, sua tarefa é realizar uma grande centralização dos meios e a direção de toda a produção segundo um plano único.

O primeiro passo em direção à socialização de toda a economia acarreta, necessariamente, as seguintes medidas: socialização dos grandes bancos que hoje dirigem a produção; tomada pelo poder proletário de todos os órgãos de poder do Estado capitalista que regem a vida econômica; tomada de todas as empresa comunais; socialização dos ramos da indústria em que o grau de concentração tende à socialização tecnicamente possível; socialização das propriedades agrícolas e sua transformação em empresas agrícolas dirigidas pela sociedade.

Quanto às empresas de menor importância, o proletariado deve, lavando em consideração seu tamanho, socializá-las aos poucos.

É importante sublinhar aqui que a pequena propriedade não deve ser expropriada e que os pequenos proprietários que não exploram o trabalho de outrem não devem sofrer qualquer violência. Esta classe será aos poucos atraída para a nova organização social; o exemplo e a prática deverão demonstrar a superioridade da nova estrutura que liberta os pequenos proprietários e a pequena burguesia do jugo dos capitalistas, de toda a nobreza, dos impostos excessivos (principalmente pela anulação imediata dos débitos para com o Estado, etc.).

A tarefa da ditadura do proletariado no domínio econômico só se realiza na medida em que o proletariado souber criar os órgãos de direção da produção centralizada e realizar a gestão pelos próprios operários. Para esse fim será obrigado a aproveitar-se dessas organizações de massa que são mais estreitamente ligadas com o processo de produção.

No domínio da distribuição, a ditadura do proletariado deve realizar a substituição do comércio por uma justa repartição dos produtos. Através de medidas indispensáveis para atingir este fim, é necessário indicar: a socialização das grandes empresas comerciais, a transmissão ao proletariado de todos os órgãos de distribuição do Estado e das municipalidades burguesas; o controle das grandes uniões de cooperativas em que o aparelho organizado tenha ainda, durante o período de transição, uma importância econômica considerável, a centralização progressiva de todos esses órgãos e sua transformação num todo único para a distribuição racional dos produtos.

Assim como no terreno da produção, no da distribuição é importante utilizar todos os técnicos e especialistas qualificados – tão logo sua resistência no terreno político seja vencida, e quando estiverem em condições de servir, em vez do capitalismo, ao novo sistema de produção.

O proletariado não tem a intenção de oprimi-lo; ao contrário, eles lhes dará a possibilidade de desenvolverem plenamente a atividade criadora. A ditadura do proletariado substituirá a divisão do trabalho físico e intelectual, própria do capitalismo, pela união, reunindo assim o trabalho e a ciência.

Ao mesmo tempo em que expropriará as fábricas, as minas, as propriedades, etc., o proletariado deverá pôr fim à exploração da população pelos capitalistas proprietários de imóveis, transferir as grandes habitações para os Sovietes operários locais, instalara a população operária nos apartamentos burgueses, etc.

Durante esta imensa transformação, o poder dos Sovietes deve, de uma parte, construir um grande aparelho de governo, mais centralizado em sua forma, e, de outra parte, deve chamar para um trabalho imediato de direção às camadas mais amplas do povo trabalhador.

O Caminho da Vitória

O período revolucionário exige que o proletariado use um método de luta que concentre toda a sua energia, a saber a ação direta das massas ate, e incluindo sua continuação lógica, o choque direto, a guerra declarada com a máquina governamental burguesa. A esses objetivos devem estar subordinados todos os outros meios, tais como a utilização revolucionária do parlamento burguês.

As condições preliminares indispensáveis a esta luta vitoriosa são: a ruptura, não apenas com os lacaios diretos do capital e os verdugos da revolução comunista – cujo papel é hoje assumido pelos social-democratas de direita, - mas também com o “Centro” (grupo Kautsky), que no momento crítico, abandonam o proletariado e fazem aliança com seus inimigos declarados.

Por outro lado, é necessário constituir um bloco com esses elementos do movimento operário revolucionário que, ainda que antes não tenham pertencido ao partido socialista, se colocam agora em tudo e por tudo sobre o terreno da ditadura do proletariado sob a forma sovietista, isto é, com os elementos correspondentes do sindicalismo.

O crescimento do movimento revolucionário em todos os países, o perigo deste revolução ser abafada pela liga dos Estados burgueses, as tentativas de união dos partidos traidores do socialismo (formação da Internacional amarela de Berna), com o objetivo de servir ignobilmente à liga Wilson, - e enfim a necessidade absoluta para o proletariado de coordenar seus esforços -, tudo isso nos conduz, inevitavelmente, à fundação da Internacional Comunista, verdadeiramente revolucionária e verdadeiramente proletária.

A Internacional, que se revelará capaz de subordinar os interesses ditos nacionais aos interesses da revolução mundial, realizará assim a ajuda mútua dos proletários dos diferentes países, pois sem esta ajuda mútua, econômica e outra, o proletariado não tem condições de edificar uma sociedade nova. De outra parte, em oposição à Internacional socialista amarela, a Internacional proletária e comunista sustentará os povos explorados das colônias em sua luta contra o imperialismo, a fim de acelerar a derrocada final do sistema imperialista mundial.

Os malfeitores do capitalismo afirmavam no começo da guerra mundial que eles apenas defendiam sua pátria. Mas o imperialismo alemão revelou sua natureza bestial numa série de crimes sangrentos cometidos na Rússia, na Ucrânia, na Finlândia. Hoje as potências da Entente revelam-se, mesmo para as camadas mais atrasadas da população, como potências que pilham o mundo inteiro e assassinam o proletariado. Em conluio com a burguesia alemã e os social-patriotas, a palavra paz nos lábios, eles se esforçam por esmagar, com a ajuda de tanques e tropas coloniais incompreensíveis e bárbaras, a revolução do proletariado europeu. O terror branco dos burgueses-canibais foi indescritivelmente feroz. As vítimas das fileiras da classe operária são incontáveis, ela perdeu seus melhores combatentes: Liebknecht e Rosa Luxemburgo.

O proletariado deve se defender em qualquer situação. A Internacional Comunista chama o proletariado mundial para esta luta decisiva. Arma contra arma! Força contra força! Abaixo a conspiração imperialista do capital! Viva a República Internacional dos Sovietes Proletários!

TESES SOBRE A SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A POLÍTICA DA ENTENTE

As experiências da guerra mundial desmascararam a política imperialista das “democracias” burguesas como sendo a política de luta das grandes potências, tendente à divisão do mundo e ao endurecimento da ditadura econômica e política do capital financeiro sobre as massas exploradas e oprimidas. O massacre de milhões de vidas humanas, o empobrecimento do proletariado caído na escravidão, o enriquecimento inaudito das camadas superiores da burguesia graças aos fornecimentos de guerra, aos empréstimos, etc., o triunfo da reação militar em todos os países – tudo isso não tarda a destruir as ilusões sobre a defesa da pátria, a trégua e a “democracia”. A “política de paz” desmascara as verdadeiras aspirações dos imperialistas de todos os países e leva até o fim esse desmascaramento.

A Paz de Brest-Litovsky e o Compromisso do Imperialismo Alemão

A paz de Brest-Litovsky e em seguida aquela de Bucarest revelaram a rapacidade e o reacionarismo das potências centrais. Os vencedores isolaram a Rússia indefesa, sem contribuições e anexações. Utilizaram o direito de livre determinação dos povos como pretexto para uma política de anexações, criando Estados vassalos, onde os governos reacionários favoreciam a política de rapina e repressão das massas trabalhadoras. O imperialismo alemão que, no combate internacional, não tinha obtido a vitória completa, não teve nesse momento a possibilidade de mostrar completamente suas verdadeiras intenções; ele deveria se resignar a viver sob uma aparência de paz com a Rússia dos Sovietes e cobrir sua política rapace e reacionária com frases hipócritas.

Ao mesmo tempo as potências da Entente, ainda que tivessem obtido a vitória mundial, deixaram cair as máscaras e revelaram aos olhos de todo o mundo o verdadeiro rosto do imperialismo mundial.

A Vitória da Entente e o Reagrupamento dos Países

A vitória da Entente dividiu em diferentes grupos os países pretensamente civilizados do mundo. O primeiro grupo é constituído pelas potências do mundo capitalista, as grandes potências imperialistas vitoriosas (Inglaterra, América, França, Japão, Itália). Diante delas se colocam os países do imperialismo vencido, arruinados pela guerra e abalados em sua estrutura pelo início da revolução proletária (Alemanha, Áustria-Hungria com seus vassalos de antes). O terceiro grupo é formado pelos países vassalos das potências da Entente. Ele se compõe de pequenos países capitalistas, que participaram da guerra às custas da Entente (Bélgica, Sérvia, Portugal, etc) e das pequenas Repúblicas “nacionais” e Estados tampões criados recentemente (República Tcheco-Eslovaca, Polônia, Repúblicas Russas contra-revolucionárias, etc). Os países neutros se aproximam, segundo sua situação, dos países vassalos, mas sofrem uma forte pressão política e econômica, que, às vezes, torna sua situação semelhante àquela dos países derrotados. A República socialistas russa é um estado operário e camponês colocando-se fora do mundo capitalista e representando para o imperialismo vitorioso um grande perigo social, o perigo de que todos os resultados da vitória desmoronem sob o assalta da revolução mundial.

A “Política de Paz” da Entente ou o Imperialismo se Desmascara

A “política de paz” das cinco potências mundiais, quando consideradas em seu conjunto, era e é uma política que se desmascara constantemente.

Apesar de todas as frases sobre sua “política externa democrática”, ela constitui o triunfo completo da diplomacia secreta que, por trás e às custas de milhões de operários de todos os países, decide os destinos do mundo através de arranjos entre os detentores de poder dos trustes financeiros. Todas as questões essenciais são tratadas sem exceção a portas fechadas pelo comitê parisiense das cinco grandes potências, sem a presença dos países vencidos, neutros e dos próprios países vassalos.

Os discursos de Lloyd George, de Clemenceau, de Sonnino, etc, proclamam e tentam motivar abertamente a necessidade das anexações e das contribuições.

Apesar das frases mentirosas sobre a “guerra pelo desarmamento geral”, proclamam a necessidade de ser armar ainda e antes de tudo de manter o poderio marítimo britânico por causa de uma pretensa necessidade de “proteção à liberdade de navegação”.

O direito de livre determinação dos povos, proclamado pela Entente é manifestamente violado e substituído pela divisão dos domínios contestados entre os países poderosos e seus vassalos.

Sem consultar a população, a Alsácia-Lorena foi incorporada à França; Irlanda, Egito, Índia, não têm o direito de dispor sobre seus próprios destinos; o Estado eslavo meridional e a República Tchecoslovaca foram criados pela força das armas. Negocia-se sem vergonha sobre a divisão da Turquia, da Europa e da Ásia, a divisão das colônias alemãs já começou, etc.

A política de contribuições chegou a um grau de completa pilhagem dos vencidos. Não se apresentam aos vencidos contas que atingem milhões e milhões, não só se lhes arrebatam todos os meios de guerra – mas também suas locomotivas, estradas de ferro, navios, instrumentos agrícolas, provisões em ouro, etc, etc... Além de tudo, os prisioneiros de guerra devem se tornar escravos dos vencedores. Discutem proposições que devem levar os operários alemães aos trabalhos forçados. As potências aliadas têm a intenção de fazê-los escravos miseráveis e famintos do capital da Entente.

A política de emulação nacional conduzida ao máximo de sua expressão pela excitação constante contra as nações vencidas através da imprensa da Entente e das administrações de ocupação, assim como os bloqueios de fome, condenam os povos da Alemanha e da Áustria ao extermínio. Esta política leva aos progroms contra os alemães, organizados pelos que sustentam a Entente – os elementos chauvinistas tchecos e poloneses, e aos progroms contra os judeus, que ultrapassam todos os desmandos do czarismo russo.

Os Estados “democráticos” da Entente seguem uma política de reação extrema.

A reação triunfa também no interior dos países da própria Entente. Entre eles, a França voltou aos piores momentos de Napoleão III, que em todo o mundo capitalista se encontra sob a influência da Entente. Os aliados estrangulam a revolução nos países ocupados, Alemanha, Hungria, Bulgária, etc, emulam os governos oportunistas-burgueses dos países vencidos contra os operários revolucionários ameaçando-os de suprimir o fornecimento de víveres. Os aliados declaram que afundarão todos os navios que ousarem hastear a bandeira vermelha da revolução; eles se recusam a reconhecer os conselhos alemães; nas regiões alemãs ocupadas, eles aboliram a jornada de oito horas. Abstraindo o fato de sustentarem a política reacionária nos países neutros, e o favorecimento desses nos países vassalos (o regime Paderevsky na Polônia), os aliados excitaram os elementos reacionários desses países (na Finlândia, Polônia e Suécia, etc.) contra a Rússia revolucionária e pedem a intervenção das forças armadas alemãs.

Contradições entre os Países da Entente

Apesar da identidade de linhas fundamentais de sua política imperialista, uma série de contradições profundas se manifestam no seio das grandes potências que dominam o mundo.

Essas contradições se concentram sobretudo em torno do programa de paz do capital financeiro americano (o dito programa Wilson). Os pontos mais importantes deste programa são os seguintes: “Liberdade de navegação”, “Sociedade das Nações” e “Internacionalização das colônias”. A palavra de ordem “liberdade de navegação” – desembaraçada de sua máscara hipócrita – significa na realidade a abolição do predomínio militar naval de algumas grandes potências (em primeiro lugar, a Inglaterra), e a abertura de todos os caminhos marítimos ao comércio americano. A “Sociedade das Nações” significa que o direito à anexação imediata dos Estados e povos fracos será recusado às grandes potências européias (em primeiro lugar à França). A “internacionalização das colônias” fixa a mesma regra para os domínios coloniais.

Este programa está condicionado pelos seguintes fatos: o capital americano não possui a maior frota do mundo; não tem possibilidade de proceder as anexações diretamente na Europa, e por isso ele visa à exploração dos países e povos fracos através de relações comerciais e investimentos de capitais. Por isso deseja constranger as outras grandes potências a formar um sindicato dos trustes dos países, a repartir “honestamente” entre eles as partes da exploração mundial e a transformar a luta entre os trustes de países em uma luta puramente econômica. No domínio da exploração econômica, o capital financeiro americano altamente desenvolvido obterá uma hegemonia efetiva que lhe assegurará o predomínio econômico e político do mundo.

A “liberdade de navegação” está em contradição aguda com os interesses da Inglaterra, do Japão, em parte também com os da Itália (no Adriático). A “Sociedade das Nações” e “Internacionalização das colônias”. A palavra de tradição decisiva com os interesses da França e do Japão – em menor medida com os interesses de todas as outras potências imperialistas. A política dos imperialistas da França, onde o capital financeiro tem uma forma particularmente usurária, onde a indústria é pouco desenvolvida e onde a guerra arruinou as forças produtivas, visa por meios desesperados à manutenção do regime capitalista; esses meios são: a pilhagem bárbara da Alemanha, a submissão direta e a exploração rapace dos países vassalos (projetos de uma União Danubiana, dos Estados eslavos meridionais) e extorsão pela violência das dívidas contraídas pelo czarismo russo próxima do Shylock francês. França e Itália (e de uma forma alterada isto vale também para o Japão), na condição de países continentais, são também capazes de seguir uma política de anexações diretas.

Além de estarem em contradição com os interesses da América, as grandes potências têm interesses que se opõem reciprocamente entre elas. A Inglaterra teme o fortalecimento da França sobre o continente, ela tem interesses na Ásia Menor e na África, interesses que se opõem aos da França. O Japão disputa com a Austrália inglesa as ilhas situadas no Oceano Pacífico.

Grupos e Tendências no Interior da Entente

Essas contradições entre as grandes potências tornam possíveis diferentes grupos no interior da Entente. Até agora duas combinações principais estão delineadas: a combinação franco-anglo-japonesa, que está dirigida contra a América e a Itália, e a combinação anglo-americana que se opõe às outras grandes potências.

A primeira dessas combinações prevalece até o início de janeiro de 1919, quando o Presidente Wilson não tinha ainda desistido de exigir a abolição da dominação marítima inglesa. O desenvolvimento do movimento revolucionário dos operários e soldados na Inglaterra, que conduz a uma entente entre os imperialistas de diferente países para liquidar a aventura russa e para apressar a conclusão da paz, reforça a inclinação da Inglaterra em direção a esta combinação. Ela se torna predominante a partir de janeiro de 1919. O bloco anglo-americano se opõe à prioridade da França na pilhagem da Alemanha e à intensidade exagerada desta pilhagem. Ele coloca alguns limites às exigências anexionistas exageradas da França, da Itália e do Japão. Ele impede que os Estados vassalos recentemente fundados lhes seja diretamente submissos. No que concerne à questão russa, a combinação anglo-americana tem disposições pacíficas: deseja ter as mãos livres para completar a divisão do mundo, sufocar a revolução européia e em seguida também a revolução russa.

A essas duas combinações de potências correspondem duas tendências no interior das grandes potências, uma ultra-anexionista e outra moderada, sendo que segunda sustenta a combinação Wilson-Lloyd George.

A Sociedade das Nações

Vistas as contradições irreconciliáveis existentes no interior da Entente, a Sociedade das Nações – mesmo que ela exista só no papel – desempenhará enquanto isso o papel de uma santa aliança entre os capitalistas para repressão da revolução operária. A propagação da “Sociedade das Nações” é o melhor meio para confundir a consciência revolucionária da classe operária. Em vez da palavra de ordem de uma Internacional das repúblicas operárias revolucionárias, lançam a de uma associação internacional de pretensas democracias, devendo estar atenta para uma coalizão do proletariado e das classes burguesas.

A “Sociedade das Nações” é a palavra de ordem mentirosa em meio à qual os social-traidores sob a ordem do capitalismo internacional dividem as forças proletárias e favorecem a contra-revolução imperialista.

Os proletários revolucionários de todos os países devem levar uma luta implacável contra as idéias da Sociedade das Nações de Wilson e protestar contra a entrada neste sociedade de roubo, exploração e contra-revolução imperialista.

A Política Externa e Interna dos Países Vencidos

A derrota militar e o desmoronamento interior do imperialismo austríaco e alemão causaram, nos países centrais e durante o primeiro período da revolução, a dominação do regime burguês social-oportunista. Sob a cor da democracia e do socialismo, os social-traidores alemães protegem e restauram a dominação econômica e a ditadura política da burguesia. Em sua política exterior visam ao restabelecimento do imperialismo alemão exigindo a restituição das colônias e a admissão da Alemanha na Sociedade de rapinas. Na medida em que se fortalecem na Alemanha os bandos de guardas brancas e avança o processo de decomposição no campo da Entente, as veleidades da burguesia e dos social-traidores de se tornarem uma grande potência crescem também. Ao mesmo tempo o governo burguês social-oportunista mina a solidariedade internacional do proletariado e separa os operários alemães de seus irmãos de classe, executando as ordens contra-revolucionárias dos aliados e sobretudo emulando os operários alemães contra a revolução russa proletária para agradar a Entente. A Política da burguesia e dos social-oportunistas na Áustria e na Hungria é a repetição da política do bloco burguês-oportunista da Alemanha de forma atenuada.

Os Países Vassalos da Entente

Nos países vassalos e nas Repúblicas que a Entente acaba de criar (Tchecoslováquia, países eslavos meridionais; é necessário também contar a Polônia e a Finlândia, etc.) a política da Entente, apoiada pelas classes dominantes e os social-nacionalistas, visa a criar centros de um movimento nacional contra-revolucionário. Esse movimento deve ser dirigido aos países vencidos, deve manter em equilíbrio as forças dos novos Estados e sujeitá-los à Entente, deve frear os movimento revoluconários que nascem no seio das novas repúblicas “nacionais” e fornecer, afinal de contas, guardas brancas para a luta contra a revolução internacional e principalmente contra a revolução russa.

No que concerne à Bélgica, a Portugal, à Grécia e a outros pequenos países aliados à Entente, sua política é inteiramente determinada pela dos grandes bandidos, aos quais estão completamente submetidos e aos quais solicitam ajuda para obter pequenas anexações e indenizações de guerra.

Os Países Neutros

Os países neutros estão na situação de vassalos não favorecidos pelo imperialismo da Entente. Tal como faz com os demais, a Entente emprega, de forma atenuada, os mesmos métodos que emprega com os países vencidos. Os países neutros favorecidos formulam diferentes reivindicações aos inimigos da Entente (as pretensões da Dinamarca sobre Flensburg, a proposta suíça da internacionalização do Reno, etc.). Ao mesmo tempo, eles executam as ordens contra-revolucionárias da Entente (expulsão do embaixador russo, recrutamento das guardas brancas nos países escandinavos, etc). Outros ainda estão expostos ao perigo do desmembramento territorial (projeto da incorporação da província de Limbourg à Bélgica e a internacionalização da embocadura do rio Escault).

A Entente e a Rússia Soviética

O caráter rapace, anti-humanitário e reacionário do imperialismo da Entente, se manifesta mais nitidamente diante da Rússia soviética. Desde o início da Revolução de Outubro, as potências da Entente se colocaram aos lado dos partidos e governos contra-revolucionários da Rússia. Com a ajuda dos contra-revolucionários burgueses, eles anexaram a Sibéria, o Ural, as costas da Rússia na Europa, o Cáucaso e uma parte do Turquestão. Eles tiram matérias-primas desses países anexados (madeira, nafta, manganês, etc.). Com a ajuda dos bandos tchecoslovacos a seu soldo, eles roubam a provisão de ouro da Rússia. Sob a direção do diplomata inglês Lockhart e os espiões ingleses e franceses explodiram pontes e estradas de ferro e tentaram prejudicar o armazenamento de alimentos. A Entente forneceu armas e ajuda militar aos generais reacionários Denikine, Koltchak e Krasnov, que fuzilaram e enforcaram milhares de operários e camponeses em Rostov, Jousovka, Novorssijsk, Omsk, et... Pelos discursos de Clemenceau e Pichon, a Entente proclama abertamente o princípio do “isolamento econômico”, isto é, desejam levar fome e destruição à República dos operários e camponeses revolucionários; prometendo “apoio técnico” aos bandos de Denikine, Koltchak e Krasnov. A Entente recusou em diferentes oportunidades as propostas de paz da potência soviética.

Em 23 de janeiro de 1919 as potências da Entente, no interior das quais as tendências moderadas estão momentaneamente fortalecidas, remeteram a todos os governos russo a proposta de enviar delegados à Ilha dos Príncipes. Certamente esta proposta não está desprovida de uma intenção provocadora em relação ao governo soviético. Ainda que a 4 de fevereiro a Entente tenha recebido uma resposta afirmativa do governo soviético, resposta na qual este se declarava pronto a examinar a questão das anexações, as contribuições e as concessões, a fim de livrar os operários e os camponeses russos da guerra que lhes foi imposta pela Entente – esta não respondeu a esta proposta de paz da mesma forma que às outras.

Isto confirma que as tendências anexionistas-reacionárias dos imperialistas da Entente se fundam sobre um terreno sólido. Ameaçam a república socialista com novas anexações e novos assaltos contra-revolucionários.

A “política de paz” da Entente desvela aqui definitivamente aos olhos do proletariado internacional a natureza do imperialismo da Entente e do imperialismo em geral. Ela prova ao mesmo tempo que os governos imperialistas são incapazes de estabelecer uma paz “justa e duradoura”, e que o capital financeiro é incapaz de recuperar a economia destruída. A manutenção da dominação do capital financeiro conduzirá ou à destruição completa da sociedade ou ao aumento da exploração, da escravidão, da reação política, do armamento e finalmente a novas guerras destruidoras.

RESOLUÇÃO SOBRE O TERROR BRANCO

O sistema capitalista foi, desde o seu início, um sistema de rapina e de assassinatos massivos. Os horrores da acumulação primitiva, a política colonial que, com a ajuda da Bíblia, da sífilis e do álcool, levou ao extermínio impiedoso de raças e povos inteiros; a miséria, a fome, o esgotamento e a morte prematuros de incontáveis milhões de proletários explorados, a repressão sangrenta da classe operária quando ela se insurgia contra seus exploradores, e enfim a carnificina imensa e inaudita que transformou a produção mundial numa produção de cadáveres humanos – eis a imagem da ordem capitalista.

Desde o início da guerra as classes dominantes que, sobre os campos de batalha mataram mais de dez milhões de homens e feriram muitos mais, erigiram no interior de seus países também o regime da ditadura sangrenta. O governo czarista russo fuzilou e enforcou operários, organizou progroms contra os judeus, exterminou tudo o que vivia no país. A monarquia austríaca afogou em sangue a insurreição dos camponeses e dos operários ucranianos e tchecos. A burguesia inglesa assassinou os melhores representantes do povo irlandês. O imperialismo alemão ficou enraivecido no interior de seu país e os marinheiros revolucionários foram as primeiras vítimas desta brutalidade. Na França abateram os soldados russos que não estavam prontos para defender os interesses dos banqueiros franceses. Na América a burguesia linchou os internacionalistas, condenou centenas entre os melhores proletários a vinte anos de trabalhos forçados, abateu operários por causa das greves.

Quando a guerra imperialista começou a se transformar em guerra civil, e as classes dominantes, os maiores malfeitores que a história jamais conheceu, foram ameaçadas com o perigo imediato de desmoronamento do seu regime sangrento, sua bestialidade se tornou ainda mais cruel.

Em sua luta pela manutenção da ordem capitalista, a burguesia emprega os métodos mais inusitados, diante dos quais são quase nada as crueldades da Idade Média, da Inquisição e da colonização.

A classe burguesa, diante de sua queda, destrói hoje fisicamente a força produtiva mais importante da sociedade humana – o proletariado, e é desmascarada presentemente por este terror branco em toda sua hedionda nudez.

Os generais russos, personificação viva do regime czarista, mataram e ainda matam em massa os operários com apoio direto ou indireto dos social-traidores. Durante a dominação dos socialistas-revolucionários e dos mencheviques na Rússia, milhares de operários e de camponeses lotaram as prisões e os generais exterminavam regimentos inteiros por causa da desobediência. Atualmente, os Krasnov e os Denikine, contando com a colaboração benevolente da Entente, mataram e enforcaram dezenas de milhares de operários; para aterrorizar os que ainda restavam deixaram os cadáveres expostos durante três dias. No Ural e na região do Volga, enterraram-nos vivos. Na Sibéria, os generais abateram milhares de comunistas, um número incontável de operários e camponeses.

A burguesia alemã e austríaca assim como os social-traidores mostraram sua natureza de canibais, quando na Ucrânia eles enforcaram em forcas transportáveis por ferrovia os operários e camponeses que eles haviam saqueado, assim como os comunistas, seus próprios compatriotas, camaradas alemães e austríacos. Na Finlândia, país da democracia burguesa, eles ajudaram a burguesia finlandesa a fuzilar entre treze e quatorze mil proletários e a torturar e matar mais de quinze mil nas prisões.

Em Helsinque eles colocaram diante deles mulheres e crianças para proteger das metralhadoras. Com seu apoio, as guardas brancas finlandesas e as forças auxiliares suecas puderam entregar-se a orgias sangrentas contra o proletariado finlandês derrotado. Em Tammefors forçaram as mulheres condenadas à morte a cavar suas próprias sepulturas; em Viborg abateram centenas de homens, mulheres e crianças finlandesas e russas.

No interior de seu país, a burguesia e a social-democracia alemã pela repressão sangrenta da insurreição operária comunista, pelo assassinato de Karl Liebknecht e Luxemburgo, matando e exterminando os operários espartaquistas, chegaram ao último degrau da fúria reacionária. O terror massivo e individual dos brancos – eis a bandeira que guia a burguesia.

Em outras países é idêntico o quadro que se nos oferece.

Na democrática Suíça está tudo pronto para a execução dos operários caso eles ousem violar a lei capitalista. Na América, a prisão com trabalhos forçados, a lei do linchamento e a cadeira elétrica aparecem como símbolos destacados da democracia e da liberdade.

Na Hungria e na Inglaterra, na Boêmia e na Polônia – em todos os lugares, a mesma coisa. Os assassinos burgueses não recuam diante de nenhuma infâmia. Para consolidar sua dominação, eles desencadeiam o chauvinismo e organizam, por exemplo, a democracia burguesa ucraniana, com o menchevique Petlyura à frente; a da Polônia com o social patriota Pilsudsky e imediatamente imensos progroms contra os judeus que superam de longe os que organizaram os policiais do Czar. E se a canalha reacionária polonesa e “socialista” assassinou os representantes da Cruz Vermelha russa, isto é apenas uma gota d’água no mar de crimes e horrores do canibalismo burguês decadente.

A “Liga das Nações” que, segundo as declarações de seus fundadores, deve conduzir à paz, vai em direção a uma guerra sangrenta contra o proletariado de todos os países. As potências da Entente querem salvar sua dominação traçando com exércitos mercenários o caminho em direção a um terror de uma brutalidade inacreditável.

Maldizendo os assassinos capitalistas e seus criados social-democratas, o primeiro Congresso da Internacional Comunista conclama os operários todos os países para reunir todas as suas forças para pôr fim, definitivamente, ao sistema de assassinato e rapina destruindo o poder do regime capitalista.

DISCURSO DO CAMARADA TROTSKY

Camarada L. Trotsky (Rússia). – O camarada Albert disse que o exército vermelho é freqüentemente, na Alemanha, objeto de discussão, e se bem compreendi ele inquieta também os senhores Ebert e Scheidemann em sua noites de insônia, isto é, eles temem a irrupção ameaçadora do Exército Vermelho na Prússia Oriental. Quanto a irrupção, o camarada Albert pode tranqüilizar os atuais senhores da Alemanha: felizmente ou infelizmente – isso depende do ponto de vista – nós ainda não estamos lá. Em todo caso, no que concerne às invasões que nos ameaçam, nossa situação é hoje bem melhor que à época da paz de Brest-Litovsk. Isto é certo. Naquela época éramos ainda crianças quanto ao desenvolvimento geral do governo soviético bem como quanto ao do Exército Vermelho. Naquela época, o seu nome era ainda Guarda Vermelha era composta pelas primeiras tropas de camponeses, pelas seções improvisadas de operários revolucionários, que, imbuídos de espírito revolucionário, levaram a revolução proletária de Petrogrado e Moscou para todo o território russo. Este período durou até o primeiro choque desta Guarda Vermelha com os regimentos regulares alemães, quando se viu claramente que esses grupos improvisados não eram capazes de fornecer à República socialista revolucionária uma verdade proteção uma vez que não se tratava apenas de vencer a contra-revolução russa, mas de repelir um exército disciplinado.

Depois disso é que começa a mudança no estado de espírito da classe operária em relação ao exército, e também a mudança de seus métodos de organização. Pressionados pela situação, procedemos à construção de um exército bem organizado, com consciência de classe. Pois em nosso programa há a milícia popular. Mas falar de milícia popular, desta reivindicação política da democracia num país governado pela ditadura do proletariado, é uma coisa impossível, pois o exército é sempre estreitamente ligado ao caráter da força que detém o poder. A guerra, como dizia o velho Clausewitz, é a continuação da política, mas por outros meios. E o exército é o instrumento da guerra e deve corresponder à política. O governo é proletário e, em sua composição social, o exército deve corresponder a ele.

Assim nós introduzimos o senso na composição do exército. Desde o mês de maio do último ano, passamos de exército de voluntários da Guarda Vermelha ao exército que repousa sobre o serviço militar obrigatório, mas nós não admitimos aí que os proletários ou os camponeses explorem mão de obra externa.

É impossível falar seriamente de uma milícia popular na Rússia, quando se tem em conta o fato de que tivemos, e ainda temos, vários exércitos de classe inimigos sobre o território do Dom, um exército monárquico, dirigido por oficiais cossacos. Pois tínhamos na região do Volga e do Ural o exército da Constituinte, que era também, segundo sua concepção, o exército “popular”, como se chamava. Este exército se dissolveu rapidamente. Esses senhores da Constituinte ficaram em desvantagem, deixaram o terreno da democracia do Volga e do Ural de uma maneira totalmente involuntária e procuraram-nos para desfrutar a hospitalidade do governo soviético. O almirante Koltchak simplesmente pôs em estado de prisão o governo da Constituinte e o exército se transformou em um exército monárquico. Em um país que se encontra em estado de guerra civil, só se pode constituir um exército segundo o princípio da classe. Foi assim que fizemos – e com sucesso aliás.

A questão dos chefes militares tem levantado grandes dificuldades para nós. Evidentemente, o primeiro cuidado era educar os oficiais vermelhos, recrutados nas fileiras da classe operária e entre os filhos de camponeses ricos. Desde o início executamos este trabalho, e mesmo aqui, diante da porta desta sala, vocês podem ver bem os “sargentos” vermelhos que, em pouco tempo, entrarão como oficiais vermelhos no exército soviético. Nós temos muitos deles. Não quero dizer quantos, pois um segredo de guerra é sempre um segredo de guerra. O número – digo – é grande, mas não podemos esperar que jovens sargentos vermelhos se tornem generais vermelhos, pois o inimigo não gostaria de nos deixar tempo para tão longo descanso. Para aproveitar com sucesso esta reserva e torná-los homens capazes, nós devemos recorrer também aos antigos chefes militares. Não vamos, evidentemente, procurar nossos oficiais nas camadas superiores da carreira militar, mas entre os elementos mais simples recrutamos forças todavia capazes, que nos ajudam hoje a combater seus antigos colegas. De uma parte, bons e leais elementos compondo o antigo corpo de oficiais, aos quais nós juntamos bons comunistas como comissários, e de outra parte, os melhores elementos entre os soldados, os operários, os camponeses, para os postos de comando inferiores. Desta maneira, formamos um corpo de oficiais vermelhos.

Desde que a República soviética existe na Rússia, ela tem sido sempre forçada a fazer a guerra e ela a faz ainda hoje. Temos um front de mais de 8.000 quilômetros. No sul e no norte, no leste e no oeste, por todos os lugares, de armas na mão, nos combatem e somos obrigados a nos defender. Kautsky chegou a nos acusar de cultivarmos o militarismo. Ora, eu penso que se nós desejamos conservar o poder dos operários, devemos nos defender seriamente. Para nos defendermos, devemos aprender com os operários a fazer uso das armas que eles forjam. Começamos por desarmar a burguesia e a armar os operários. Se isso é militarismo, muito bem, então nós criamos nosso militarismo socialista e perseveramos firmemente apoiando-nos sobre ele.

Segundo esta visão, nossa situação em agosto último era bem má: não apenas estávamos cercados, mas o cerco contornava Moscou. Desde esta época alargamos mais e mais o cerco e, nos últimos seis meses, o Exército Vermelho reconquistou para a União Soviética pelo menos 700.000 quilômetros quadrados, com uma população de aproximadamente 42 milhões de habitantes, 16 governos com 16 grandes cidades nas quais a classe operária tinha e tem o costume de levar uma luta áspera. Ainda hoje, se de Moscou vocês traçarem sobre o mapa uma linha numa direção qualquer prolongando-a, vocês encontrarão por todos os lugares um camponês russo, um operário russo no front que, nessa noite fria, se posta com seu fuzil na fronteira da República para defendê-la.

E posso assegurar a vocês que os operários comunistas que formam verdadeiramente o núcleo deste exército se conduzem não apenas como o exército de proteção da República Socialista russa, mas também como o Exército Vermelho da III Internacional. E se nós temos hoje a possibilidade de dar hospitalidade a esta conferência comunista para agradecer a nossos irmãos da Europa Ocidental a hospitalidade que eles nos deram durante dezenas de anos, nós o devemos, de nossa parte, aos esforços e aos sacrifícios do Exército Vermelho, no interior do qual os melhores camaradas da classe operária comunista agem como simples soldados, como oficiais vermelhos ou como comissários, isto é, como os representantes diretos de nosso partido, do governo soviético, e que, em cada regimento, em cada divisão, dão o tom político e moral, isto é, ensinam com seu exemplo os soldados vermelhos como se luta e se morre pelo socialismo. Entre esses homens, essas não são palavras vazias, pois elas são seguidas de atos, e nessa luta nós perdemos centenas e milhares dos melhores operários socialistas. Penso que eles não tombaram apenas pela República soviética, mas também pela III Internacional.

E se hoje nós não pensamos também em invadir a Prússia Oriental – ao contrário, ficaríamos felizes se os senhores Ebert e Scheidemann nos deixassem em paz – isto é exato por enquanto, quando chegar o momento em que os irmãos do Ocidente nos chamarem em seu auxílio, nos responderemos: “Eis-nos aqui, durante este tempo nós aprendemos a manejar as armas, estamos prontos para lutar e morrer pela causa da Revolução mundial!”

DISCURSO DE ENCERRAMENTO DE LÊNIN (7 de março de 1919)

Assim terminamos nosso trabalho.

Se pudemos nos reunir apesar de todas as dificuldades e da repressão policial, se conseguimos, sem divergências essenciais, tomar, em curto espaço de tempo, decisões importantes sobre todas as questões candentes da época revolucionária atual, é porque as massas proletárias do mundo inteiro colocaram todas essas questões praticamente na ordem do dia por seus atos e começaram a resolvê-los na prática.

Resumimos aqui o que as massas já conseguiram conquistar em sua luta revolucionária.

O movimento em favor dos Sovietes se estende sempre para mais longe, não só nos países da Europa Ocidental, mas também nos países vitoriosos como a Inglaterra, por exemplo; e esse movimento não é nada mais que um movimento que tem como objetivo a criação de uma nova democracia proletária: ele é o progresso mais considerável em direção à ditadura do proletariado, em direção à vitória completa do comunismo.

Que a burguesia do mundo inteiro continue a seviciar, que ela persiga, aprisione e inclusive assassine espartaquistas e bolcheviques, isso de nada lhe servirá. Isso só poderá esclarecer as massas e determinar que elas se livrem de seus velhos precedentes burgueses democráticos e se retemperem na luta. A vitória da revolução proletária está assegurada no mundo inteiro: A constituição da República Soviética Internacional está em andamento.

MANIFESTO DA INTERNACIONAL COMUNISTA AOS PROLETÁRIOS DO MUNDO INTEIRO!

Há setenta e dois anos o Partido Comunista apresentou ao mundo seu programa sob a forma de um manifesto escrito pelos maiores profetas da Revolução proletária, Karl Marx e Friedrich Engels. Já nessa época, o comunismo recém entrado em sua luta, era oprimido pelas perseguições e mentiras, pela ira das classes possuidoras que divisavam nele seu inimigo mortal. Durante esses três quartos de século, o desenvolvimento do comunismo seguiu vias complexas, conhecendo alternadamente as tempestades do entusiasmo e os períodos de desencorajamento, as vitórias e as duras derrotas. Mas no fundo o movimento seguiu a rota traçada pelo Manifesto do Partido Comunista. A hora da luta final e decisiva chegou mais tarde do que esperavam os apóstolos da Revolução social. Mas ela chegou. Nós, comunistas, representantes do proletariado revolucionário dos diferentes países da Europa, América e Ásia, reunidos em Moscou, capital da Rússia sovietista, nós nos sentimos herdeiros e os continuadores da obra cujo programa foi anunciado a 72 anos.

Nossa tarefa é de generalizar a experiência revolucionária da classe operária, de desvencilhar o movimento das mentiras impuras do oportunismo e do social-patriotismo, de unir forças de todos os partidos verdadeiramente revolucionários do proletariado mundial e com isso facilitar e acelerar a vitória da Revolução comunista no mundo inteiro.

Hoje, quando a Europa está coberta de ruínas fumegantes, os maiores culpados pelos incêndios se ocupam em procurar os responsáveis pela guerra. Eles são seguidos por seus lacaios, professores, parlamentares, jornalistas, social-patriotas e outros apoiadores políticos da burguesia.

Durante muitos anos o socialismo predisse a inelutabilidade da guerra imperialista; ele viu suas causas n o desejo insaciável de lucro e de propriedade das classes possuidoras dos dois principais concorrentes e em geral de todos os países capitalistas. Dois anos antes da explosão, no congresso de Bâle, os dirigentes socialistas responsáveis de todos os países denunciaram o imperialismo como fator de guerra futura. Eles ameaçaram a burguesia de desencadear sobre sua cabeça a Revolução social, vingança do proletariado contra os crimes do capitalismo.

Hoje, após uma experiência de 5 anos, quando a história, pondo em dia os apetites rapaces da Alemanha, desvela os procedimentos não menos criminosos dos Aliados, os socialistas oficiais dos países da Entente, junto com seus governos, não cessam de denunciar no kaiser alemão deposto o grande culpado pela guerra. E mais, no seu abjeto servilismo, os social-patriotas alemães, que, em agosto de 1914, fazendo do livro branco diplomático de Hohenzollern o evangelho sagrado das nações, acusam agora por seu turno esta monarquia alemã abatida, da qual foram fiéis servidores, de ser a causa principal da guerra. Eles esperam assim a vez de esquecer o papel que desempanharam e ganhar a indulgência dos vencedores. Mas ao lado do papel desempenhado pelas dinastias derrotadas dos Romanov, Hohenzollern, dos Habsburgos e da súcia capitalista de seus países, o papel das classes dirigentes da França, da Inglaterra, da Itália e dos Estados Unidos aparece em toda sua amplitude criminosa à luz dos fatos ocorridos e das revelações diplomáticas.

Até a explosão da própria guerra, a diplomacia inglesa não levantou um milímetro de sua máscara misteriosa. O governo da City acreditava que se ele declarasse categoricamente seu desejo de participar da guerra às custas da Entente, o governo de Berlim não recuaria e não haveria a guerra. Por isso, tudo se conduziu de modo a fazer esperar, de uma parte, em Berlim e em Viena, a neutralidade da Inglaterra e a permitir, de outra parte, em Paris e Petrogrado, que contassem firmemente com sua intervenção.

Preparada pela marcha da história durante várias dezenas de anos, a guerra foi desencadeada por uma provocação direta e consciente da Grã-Bretanha. O governo deste país tinha feito o cálculo de sustentar a Rússia e a França apenas na medida necessária para esgotá-las esgotando a Alemanha, seu inimigo mortal. Mas o poderio do sistema militar alemão surgiu mais perigoso e impôs uma intervenção não mais aparente, mas real da Inglaterra.

O papel de espectador sorridente, ao qual a Grã-Bretanha aspirava por tradição, coube aos Estados Unidos. O governo de Wilson aceitou tanto mais facilmente o bloqueio inglês, quanto diminuíam as possibilidades de especulação da Bolsa americana sobre o sangue europeu com que as potências da Entente indenizaram com grandes recursos a burguesia americana por esta violação do “direito internacional”. Enquanto a enorme superioridade militar da Alemanha obrigou por seu turno o governo de Washington a sair do estado de neutralidade fictícia em relação à Europa, os Estados Unidos se encarregaram da missão que a Inglaterra havia cumprido em guerras passadas e que ela tinha tentado cumprir na última guerra em relação ao continente: enfraquecer um dos campos servindo-se do outro, e se envolver em operações militares apenas na medida indispensável para assegurar todas as vantagens da situação. A aposta da loteria americana não era grande, mas foi a última e assim lhe assegurou o prêmio.

As contradições do regime capitalista se revelaram à humanidade com a guerra, sob a forma de sofrimentos físicos: a fome, o frio, as doenças epidêmicas e um recrudescimento da barbárie. Assim é jogada sem apelação a velha disputa acadêmica dos socialistas sobre a teoria da pauperização e da passagem progressiva do capitalismo ao socialismo. Os estatísticos e os pontífices da teorias do arredondamento dos ângulos procuraram, durante dezenas de anos, em todos os cantos do mundo, fatos reais ou imaginários capazes de demonstrar o progresso do bem-estar de certos grupos ou categorias da classe operária. A teoria da pauperização das massas era vista como enterrada sob os apupos desdenhosos dos eunucos que ocupavam as tribunas da burguesia e dos mandarins do oportunismo socialista. Agora não se trata apenas da pauperização social, mas de um empobrecimento fisiológico, biológico, que apresenta diante de nós toda a sua realidade hedionda.

A catástrofe da guerra imperialista varreu completamente todas as conquistas das batalhas sindicalistas e parlamentares. E por isso esta guerra nasceu das tendências internas do capitalismo da mesma forma que os negócios econômicos ou os compromissos parlamentares que ela afogou no sangue e na abjeção.

O capital financeiro, depois de ter precipitado a humanidade no abismo da guerra, sofreu também durante esta guerra uma modificação catastrófica. O estado de dependência em que estava colocado o papel-moeda diante do fundamente material da produção foi definitivamente rompido. Perdendo mais e mais o seu valor de meio e regulador da troca de produtos no regime capitalista, o papel-moeda se transformou em instrumento de requisição, de conquista e em geral de opressão militar e econômica.

A depreciação total das cédulas bancárias marcou a crise mortal geral que afeta a circulação dos produtos no regime capitalista. Se a livre concorrência, como reguladora da produção e da repartição, foi substituída nos principais campos da economia pelo sistema de trustes e de monopólios, várias dezenas de anos antes da guerra, o curso da própria guerra tirou o papel regulador e diretor dos grupamentos econômicos para passá-lo diretamente ao poder militar e governamental. A repartição das matérias-primas, a exploração da nafta de Bakou ou da Romênia, do óleo de Donetz, do trigo da Ucrânia, a utilização das locomotivas, dos vagões e automóveis da Alemanha, as provisões de pão e carne da Europa faminta, todas essas questões fundamentais da vida econômica do mundo não são reguladas pela livre concorrência, nem mesmo por combinações de trustes e consórcios nacionais e internacionais. Eles caem sob o jugo da tirania militar para lhe servir de salvaguarda a partir de hoje. Se a absoluta sujeição do poder político ao capital financeiro conduziu a humanidade à carnificina imperialista, esta carnificina permitiu ao capital financeiro não apenas militarizar totalmente o Estado, mas militarizar-se a si mesmo, de maneira que pode apenas cumprir suas funções econômicas essenciais a ferro e sangue.

Os oportunistas que antes da guerra convidavam os operários a moderar suas reivindicações sob o pretexto de passar lentamente ao socialismo, que, durante a guerra, foram obrigados a renunciar à luta de classes em nome da união sagrada e da defesa nacional, exigem do proletariado um novo sacrifício, desta vez a fim de triunfar sobre as consequências assustadoras da guerra. Se com tais pregações pudessem influenciar as massas operárias, o desenvolvimento do capital se daria sacrificando inúmeras gerações, com formas novas, ainda mais concentradas e mais monstruosas, com a perspectiva fatal de nova guerra mundial. Felizmente para a humanidade isso não é mais possível

A estatização da vida econômica, contra a qual protestou tanto o liberalismo capitalista, é um fato consumado. Voltar, não de todo, à livre concorrência, mas apenas à dominação dos trustes, sindicatos e outros polvos capitalistas, é de agora em diante impossível. A questão é unicamente saber qual será, a partir de agora, aquele que adotará a produção estatizada: o Estado imperialista ou o Estado do proletariado vitorioso.

Em outros termos, a humanidade trabalhadora em sua totalidade se tornará a escrava tributária de uma corja mundial triunfante, que, sob a insígnia da Liga das Nações, em meio a um exército “internacional” saqueará e estrangulará uns, preservará outros, mas sempre e em todos os lugares aprisionará o proletariado, com o fim único de manter sua dominação? Ou a classe operária da Europa e dos países mais avançados das outras partes do mundo se apoderará da vida econômica, mesmo desorganizada e destruída, a fim de assegurar sua reconstrução em bases socialistas?

Abreviar o período de crise que atravessamos só é possível pelos métodos da ditadura do proletariado, que não olha para o passado, que não conta com os privilégios hereditários ou com o direito de propriedade, que, considerando apenas a necessidade de salvar as massas famintas, mobiliza para isso todas as forças, decreta para todo mundo a obrigação do trabalho, institui o regime da disciplina operária, a fim de sanar, em alguns anos, as chagas vivas provocadas pela guerra e conduzir a humanidade a uma altura nova e insuspeitada.

O Estado nacional, depois de ter dado um impulso vigoroso ao desenvolvimento capitalista, se tornou mais estreito para a expansão das forças produtivas. Este fenômeno tornou mais difícil a situação dos pequenos Estados incrustados no meio das grandes potências da Europa e do Mundo. Esses pequenos Estados nasceram em diferentes épocas a partir de fragmentos dos grandes, como a miúda moeda destinada a pagar diversos tributos, com tampões estratégicos, possuindo suas dinastias, suas castas dirigentes, suas pretensões imperialistas, suas patifarias diplomáticas. Sua independência ilusória baseou-se, até a guerra, exatamente como estava baseado o equilíbrio europeu, sobre o antagonismo dos dois campos imperialistas. A guerra destruiu este equilíbrio. Dado de início uma imensa vantagem à Alemanha, a guerra obrigou os pequenos países a procurarem sua salvação na magnanimidade do militarismo alemão. Vencida a Alemanha, a burguesia dos países pequenos, em combinação com seus “socialistas” patriotas, se voltou para saudar o imperialismo triunfante dos Aliados, e nos artigos hipócritas do programa de Wilson empenhou-se em procurar as garantias para manutenção de sua existência independente. Ao mesmo tempo, o número de pequenos países aumentou: da monarquia austro-húngara, do império dos czares destacam-se novos Estados que, recém-nascidos, puseram-se imediatamente a pegar uns nas gargantas dos outros por questões fronteiriças. Os imperialistas Aliados, durante esse tempo, preparam combinações de pequenas potências, antigas e novas, a fim de prender uns aos outros por uma raiva mútua e uma fragilidade geral.

Arrasando e violentando os povos pequenos e frágeis, condenando-os à fome e à humilhação, mesmo que pouco tempo antes os imperialistas dos impérios centrais, os imperialistas aliados não parassem de falar do direito das nacionalidades, direitos que eles pisoteiam com seus pés na Europa e no mundo inteiro.

Só a Revolução proletária pode garantir aos pequenos povos sua existência livre, pois ela libertará as forças produtivas de todos os países dos tentáculos movidos pelos Estados nacionais, unindo os povos numa estreita colaboração econômica, conforme um plano econômico comum. Só ela dará aos povos mais fracos e menos populosos a possibilidade de administrar com liberdade e independência absoluta sua cultura nacional, sem impor o menor dano à vida econômica unificada e centralizada da Europa e do mundo.

A última guerra, foi em larga medida uma guerra pela conquista das colônias, foi ao mesmo tempo uma guerra feita com a ajuda das colônias. Em proporções até então desconhecidas, os povos coloniais foram arrastados para a guerra européia. Os hindus, os negros, os árabes, os malgaches, foram batidos em solo europeu, em nome de quê? Em nome de seu direito de permanecerem mais tempo como escravos da Inglaterra e da França. Jamais o espetáculo da desonestidade do Estado capitalista nas colônias foi tão edificante; jamais o problema do escravismo colonial foi posto com tamanha acuidade.

Desde então uma série de revoltas ou movimentos revolucionários em todas as colônias. Na Europa, a Irlanda lembrou com sangrentos combates de rua que era ainda, e que tinha consciência de ser uma país escravizado. Em Madagáscar, em Annam, em outros lugares, as tropas da república burguesa tiveram mais de uma vez, ao longo da guerra, de abafar insurreições de escravos das colônias. Na Índia, o movimento revolucionário não cessou um só dia. Ele chegou nesses últimos tempos a greves operárias grandiosas, às quais o governo britânico respondeu com a intervenção de carros blindados em Bombaim.

Assim a questão colonial está colocada em toda sua amplitude não somente sobre o tapete verde do congresso de diplomatas de Paris, mas nas próprias colônias. O programa de Wilson tem por objetivo, na melhor das interpretações, mudar a etiqueta da escravidão colonial. A libertação das colônias não se dará ao mesmo tempo que a libertação da classe operária das metrópoles. Os operários e os camponeses não somente de Annam, Argélia ou Bengala, mas também da Pérsia e da Armênia, não poderão desfrutar de uma existência independente antes que os operários da Inglaterra e da França, depois de terem derrubado Lloyd George e Clemenceau, tomem em suas mãos o poder governamental. Até o presente, nas colônias mais desenvolvidas, a luta não se dá mais sob a bandeira da libertação nacional, ela assume de imediato um caráter social mais ou menos evidente. Se a Europa capitalista arrastou apesar delas os partidos mais atrasados do mundo no turbilhão das relações capitalistas, a Europa socialista, por seu turno, virá socorrer as colônias libertadas com sua técnica, sua organização, sua influência moral, a fim de abrir passagem à vida econômica regularmente organizada pelo socialismo.

Escravos coloniais da África e da Ásia: a hora da ditadura proletária na Europa soará para vós como a hora da vossa libertação.

Todo mundo burguês acusa os comunistas de abolirem a liberdade e a democracia política. Isso é falso. Tomando o poder, o proletariado apenas manifesta a completa impossibilidade de aplicar os métodos da democracia burguesa e cria as condições e as formas de uma democracia operária nova e mais elevada. Todo o curso do desenvolvimento capitalista, em particular na última época imperialista, solapou as bases da democracia política, não apenas dividindo as nações em duas classes inimigas e irreconciliáveis, mas também condenando ao enfraquecimento econômico e à impotência política múltiplas camadas da pequena burguesia e do proletariado da mesma forma que os elementos mais deserdados desse mesmo proletariado.

A classe operária dos países onde o desenvolvimento histórico permitiu, utilizou o regime da democracia política para se organizar contra o capitalismo. Esses será o mesmo futuro nos países onde não estão realizadas as condições preliminares de uma revolução operária. Mas as massas da população intermediária, nas vilas e nas cidades são mantidas pelo capitalismo em completo atraso, várias épocas atrasadas em relação ao desenvolvimento histórico.

O camponês da Baviera ou de Bade, ainda estreitamente vinculado ao campanário de sua vida, o pequeno vinhateiro francês arruinado pela falsificação de vinhos pelos grandes capitalistas, o pequeno fazendeiro americano endividado e enganado pelos banqueiros e deputados, todas essas camadas sociais rejeitadas pelo capitalismo, distantes da grande rota do desenvolvimento histórico, estão convidadas no papel pelo regime da democracia política a participar do governo do Estado. Na realidade, nas questões fundamentais das quais depende o destino das nações, é uma oligarquia financeira que governa nos bastidores da democracia parlamentar. Assim foi recentemente na questão da guerra. É assim hoje na questão da paz.

Na medida em que a oligarquia financeira se dá ao trabalho de fazer sancionar seus atos de tirania pelos votos parlamentares, o Estado burguês se serve, para chegar aos resultados desejados, de todas as armas da mentida, da demagogia, da perseguição da calúnia, da corrupção, do terror, que os séculos passados de escravidão colocaram à sua disposição e que multiplicaram os prodígios da técnica capitalista.

Exigir do proletariado, em sua última luta de morte contra o capital, que observe piedosamente os princípios da democracia política equivaleria a exigir de um homem que defende a sua existência e sua vida dos bandidos que observa as regras artificiais e convencionais do boxe francês, instituídas por seu inimigo e que seu inimigo não observa.

Em meio à devastação, aonde não apenas os meios de produção e de transporte, mas também as instituição da democracia política não são mais que um amontoado de fragmentos ensanguentados, o proletariado é obrigado a criar um aparato para ele, que serve antes de tudo para conservar a coesão interna da própria classe operária e que lhe dá a faculdade de intervir revolucionariamente no desenvolvimento ulterior da humanidade. Este aparelho, são os Sovietes.

Os antigos partidos, as antigas organizações sindicais se manifestam na pessoa de seus dirigentes, incapazes não só de decidir, mas também de compreender os problemas colocados pela nova época. O proletariado criou um novo tipo de organização ampla, englobando as massas operárias independentemente da profissão ou do grau de desenvolvimento político; um aparelho flexível, capaz de perpétua renovação, de perpétuo alargamento, podendo sempre arrastar para sua órbita as novas categorias e abranger as camadas de trabalhadores vizinhos do proletariado da cidade e do campo. Esta organização insubstituível da classe operária governando-se a si mesmo, lutando e conquistando finalmente o poder político, fez em vários países a prova prática; ela constitui a conquista e a arma mais poderosa do proletariado de nossa época.

Em todos os países onde as massas trabalhadoras vivem uma vida consciente se formam hoje e se formarão os sovietes de deputados operários, soldados e camponeses. Fortalecer os sovietes, elevar sua autoridade, opô-los ao aparelho governamental da burguesia, eis qual é atualmente o objetivo essencial dos operários conscientes e leais de todos os países. Através dos Sovietes, a classe operária pode escapar dos elementos de dissolução que levam em seu interior os sofrimentos infernais da guerra, da fome, da tirania dos ricos com a traição de seus antigos chefes. Através dos Sovietes, a classe operária, da maneira mais segura e mais fácil, pode chegar ao poder em todos os países onde os Sovietes reúnam a maioria dos trabalhadores. Através dos Sovietes, a classe operária, senhora do poder, governará todos os domínios da vida econômica e moral do país, como acontece hoje na Rússia. A ruína do Estado imperialista, desde suas formas czaristas até as mais democráticas, dá-se com a ruína dos sistema militar imperialista. Os exércitos de vários milhões de homens mobilizados pelo imperialismo podem manter-se apenas durante o tempo que o proletariado aceitar o jugo da burguesia. A destruição da unidade nacional significa a destruição inevitável dos exércitos. Foi isso que aconteceu primeiramente na Rússia, depois na Alemanha e na Áustria. É também o que se deve esperar que aconteça em outros países imperialistas. A revolta do camponês contra a burocracia monarquista ou “democrática” conduz inevitavelmente à revolta dos soldados contra os oficiais, e em seguida a uma cisão caracterizada entre os elementos proletários e burgueses do próprio exército. A guerra imperialista, opondo as nações, se transformou e se transforma cada vez mais em guerra civil opondo as classes.

As lamentações do mundo burguês sobre a guerra civil e o terror vermelho constituem a mais monstruosa hipocrisia que jamais registrou a história das lutas políticas. Não haveria guerra civil se a concorrência dos exploradores que levaram a humanidade à beira do abismo não se opusessem a todo progresso dos trabalhadores, se não se organizassem os complôs e os homicídios e não solicitassem o auxílio armado estrangeiro para conservar ou restaurar seus privilégios expropriados.

A guerra civil é imposta à classe operária por seus inimigos mortais. Se ela não quer se suicidar e renunciar a seu futuro que é o futuro de toda a humanidade, a classe operária não pode deixar de responder aos golpes de seus agressores. Os partidos comunistas não suscitam nunca artificialmente a guerra civil, se esforçam por diminuir-lhe tanto quanto possível sua duração todas as vezes que ela surge como uma necessidade inelutável, de reduzir ao mínimo o número de vítimas, mas acima de tudo assegurar a vitória do proletariado. Disso decorre a necessidade de desarmar a tempo a burguesia, armar os operários, criar um exército comunista para defender o poder do proletariado e a inviolabilidade de sua construção socialista. Tal é o exército vermelho da Rússia sovietista que surgiu e se desenvolveu como a muralha protetora das conquistas da classe operária contra todos os ataques de dentro o de fora. Um exército sovietista é inseparável de um Estado sovietista.

Conscientes do caráter universal de sua causa, os operários mais avançados foram, desde os primeiros passas do movimento socialista organizado, em direção de uma união internacional deste movimento. As bases foram, lançadas em 1864 em Londres, pela Primeira Internacional. A guerra franco-alemã, da qual nasceu a Alemanha dos Hohenzollern, destruiu a Primeira Internacional e ao mesmo tempo deu a ela os partidos operários nacionais. Desde 1889, esses partidos se reuniram em Congresso em Paris e criaram a organização da III Internacional. Mas o centro de gravidade do movimento operário estava inteiramente colocado nesta época sobre o terreno do nacional no quadro dos Estados nacionais, sob a base da indústria nacional. Várias dezenas de anos de trabalho de organização e reformas criaram uma geração de dirigentes cuja maioria aceitava em palavras o programa da revolução social, mas a ele renunciaram na prática, afundados no reformismo, numa adaptação servil à dominação burguesa. O caráter oportunista dos partidos dirigentes da II Internacional se revelou claramente e conduziu à maior falência da história mundial no momento em que o curso dos fatos históricos reclamava dos partidos da classe operária métodos revolucionários de luta. Se a guerra de 1870 trouxe consigo um golpe para a Primeira Internacional, revelando que por trás de seu programa social e revolucionário não havia ainda nenhuma força organizada de massas, a guerra de 1914 matou a Segunda Internacional mostrando que por baixo das organizações poderosas das massas operárias mantinham-se partidos convertidos em instrumentos dóceis da dominação burguesa.

Essas observação não se aplicam apenas aos social-patriotas que passaram nítida e abertamente para o campo da burguesia, que se tornaram seus delegados preferidos e seus agentes de confiança, os verdugos mais seguros da classe operária, elas se aplicam também à tendência centrista, indeterminada e inconsciente, que tenta restaurar a II Internacional, isto é, perpetuar o estreitamente das visões, o oportunismo, a impotência revolucionária de seus círculos dirigentes. O Partido Independente da Alemanha, a maioria atual do Partido Operário Independente da Inglaterra e todos os outros grupos semelhantes tentaram de fato tomar os lugares que ocupavam antes da guerra os antigos partidos oficiais da II Internacional. Eles se apresentam como outrora com idéias de compromisso e unidade, paralisando por todos os meios a energia do proletariado, prolongando a crise e multiplicando assim as infelicidades da Europa. A luta contra o centro socialista é a conclusão indispensável da vitória da luta contra o imperialismo.

Afastando para longe de nós as meias-medidas, as mentiras e a preguiça dos partidos socialistas oficiais, caducos, nós, comunistas, unidos na III Internacional, nós nos reconhecemos como continuadores diretos dos esforços do martírio heróico aceito por várias gerações de revolucionários, da Babeuf a Karl Liebkenecht e Rosa Luxemburgo.

Se a Primeira Internacional previu o desenvolvimento para o futuro e preparou os caminhos, se a Segunda Internacional reuniu e organizou milhões de proletários, a Terceira Internacional é a Internacional da ação das massas, a Internacional da realização revolucionária.

A crítica socialista flagelou suficientemente a ordem burguesa. A tarefa do partido comunista internacional é reverter este estado de coisas e edificar em seu lugar o regime socialista. Convocamos os operários e operárias de todos os países a se unirem sob a bandeira do comunismo que é desde já a bandeira das primeiras grandes vitórias proletárias de todos os países! Na luta contra a barbárie imperialista, contra a monarquia e as classes privilegiadas, contra os Estado burguês e a propriedade burguesa, contra todas as manifestações e todas as formas de opressão das classes e das nações, uní-vos!

Sob a bandeira dos Sovietes operários, da luta revolucionária pelo poder e a ditadura do proletariado, sob a bandeira da III Internacional, proletários de todos os países, uní-vos!


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