Combate Classista

Teoria Marxista, Política e História contemporânea.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

REVOLUÇÃO CHINESA: 1925 e 1949

Anotações de estudo, primeiro semestre de 2010
Alessandro de Moura 
            Fazemos uma breve análise acerca  da organização do movimento operário chines durante as décadas de 1920, 1930 e 1940, discutimos desde o surgimento do Kuomitang (o partido nacionalista chinês), passando pela fundação do primeiro primeiro partido comunista na China em 1921, o PCCh, e a influência que este recebia do Partido Comunista Russo sob controle do triunvirato Stalin, Rykov e Bukharin. Discutimos também de forma sintética a revolução operária decorrida no período 1925-1927 e suas principais conseqüências para o operariado chinês nos próximos anos. Por fim discutimos a terceira revolução chinesa desencadeada em 1949.
Palavras chave: China. Operários. Revolução chinesa, Stalinismo. Socialismo.

Apontamentos iniciais sobre a primeira revolução chinesa
A China, um país imenso com disputa de dinastias e grande opressão sobre a população trabalhadora. A repressão era imensa, os senhores feudais da China, por serem também chefes militares eram conhecidos como os “senhores da guerra”. Com os processos desencadeados a partir da Guerra do Ópio (1840-1841) pela Inglaterra, a China é convertida em um Estado semicolonial. Porém isso não impediu os levantes populares. Em 1900, o movimento “boxer” é lançado pelas massas camponesas, este caracterizado pelo intelectual revolucionário Peng Shu-tsé como um “movimento antiimperialista de libertação nacional lançado pelas massas camponesas pela pressão extrema dos imperialistas”. Sete exércitos de países diferentes invadem a China com pretexto de conter os levantes, depois de reprimir o movimento, por meio das guerras e “concessões” os sete exércitos (entre eles estava Inglaterra, França, Alemanha, Estados Unidos, Japão) dominam e colonizam as regiões sobre seu controle. Em meio a este processo desenvolvem-se frações burguesas na China, conquistando cada vez mais poder e influência.
Os a organização do povo chinês é intensa durante toda a década de 1910. Em 1911 eclode a primeira revolução na China que derruba a Dinastia Manchu, o principal dirigente do Partido Nacionalista Burguês, o Kuomitang, Sun Yat-sem é nomeado presidente. O Kuomitang constituía-se como um partido de massas com composição muito heterogênea. Em de maio de 1919, eclodem manifestações de estudantes e greves operárias.
Sobre impacto da Revolução Russa, em julho de 1921 no Congresso em Xangai, é fundado na China o Partido Comunista Chinês, o PCCh. Inicia-se um longo intercambio com o PC russo. Os primeiros giros à direita empreendidos na Rússia pela Troika (Stalin, Kamenev e Zinoviev) são materializados também na China a partir de 1923. Segundo Osvaldo Coggiola, já em 1923 o Partido Comunista Russo, buscando colocar em prática a perspectiva da revolução por etapas, primeiro democracia burguesa, depois socialismo, determinava que a China não estava madura para o socialismo
(...) Em 1923, o embaixador soviético Abraham M. Ioffe e o chefe do KMT, Sun Yat-sen, assinaram um acordo de cooperação. Tratava-se na verdade de um acordo político, pois nele se reconhecia que “a China não está ainda madura para o socialismo, mas para a realização de unidade e independência nacionais”. O Partido Comunista da URSS designou um “conselheiro político” para Sun Yat-sem (Mikhail Borodin).
O que o Kremlin temia seriamente que a vitória de um verdadeiro movimento revolucionário dos operários, porque receava não ser capaz de controlá-lo, o que por sua vez, ameaçaria sua própria existência. Segundo a análise da comunista chinesa Peng Pi Lan, a política de conciliação de classes levada a cabo pelo PC russo expressou-se com a determinação de que o PCCh deveria aderir ao Kuomitang
Cedo, em 1923, a Internacional Comunista pretendendo que a revolução chinesa era uma revolução nacional democrática que englobava todas as classes, havia ordenado aos membros do PCCh aderir ao Kuomintang e ter uma política de colaboração de classe com este último. Colocou-se a pergunta: qual é a classe que deveria dirigir a revolução?A ordem da Komintern implicava que o PCCh, representando o proletariado, não podia ter a inteira responsabilidade de dirigir sozinho a revolução nacional, portanto devia unir-se ao Kuomintang e colaborar com ele.
A atuação e os limites do PCCh eram determinados por sua filiação ao Kuomitang e ao PC russo, que defendiam que a China ainda tinha uma etapa histórica para ser cumprida, antes de se pensar na tomada do poder pelo proletariado. O PC russo, por meio da internacional Comunista difundia que a estratégia a ser seguida na China era o “Bloco das quatro classes”, composto pelo campesinato, proletariado, pequena burguesia e burguesia nacional. Por meio desta fórmula negava-se avidamente a possibilidade do proletariado ser capaz de cumprir um papel independente. Porém esta posição não era homogênea Peng Shu Tsé, por exemplo, escreve em 1925 um texto intitulado Quem dirige a revolução nacional? Neste trabalho Peng Shu Tsé chega a seguinte conclusão “Depois de haver analisado todas as classes... podemos afirmar agora que, do ponto de vista de sua base material, de sua consciência revolucionária e das condições da revolução internacional... só a classe operária pode converter-se em direção da revolução nacional”. Porém, sob o julgo do Kremlin sua posição não fora acatada pela maioria do PCCh.
O movimento operário não se baseia nas formulações do Kremlin ou do PCCh, em 3º de maio de 1925 inicia-se um grande levante proletário que arrasta multidão de trabalhadores para a arena política. Eclode uma greve geral em Xangai. Segundo Coggiola o PCCh neste ano já possuía 20 mil militantes, os levantes são crescentes durante o ano todo, em 1926 os operários de Catão insurgem-se e pegam em armas. Avança a segunda revolução chinesa, o processo estende-se até 1927. Segundo Peng Pi Lan
Em 1925, o Movimento de 30 de maio ativava a resistência contra o imperialismo e os senhores da guerra. Através de todo o país, em 1925 e 1926, os operários, camponeses, estudantes, mulheres e diferentes elementos da pequena burguesia, tomaram parte na onda revolucionária. Por exemplo, cada vez que eram motivados pelos acontecimentos, tais como a luta contra o senhor da guerra Feng, a invasão da Manchúria pelos japoneses, o massacre de 18 de março de 1926 em Pequim, centenas de milhares de pessoas manifestavam-se nas ruas de Xangai.
Em 20 de março de 1926 Chiang Kai-shek, apoiado por setores da burguesia comanda as tropas do Kuomitang “desarmou as milícias operárias de Cantão, prendeu vários dirigentes comunistas e excluiu os comunistas da direção do KMT. O PCC, ainda assim, se manteve dentro do KMT. Chiang se fez nomear “generalíssimo”. Em Moscou, por direta influência de Stalin, Chiang foi nomeado “presidente de honra” da Internacional Comunista”. (COGGIOLA, 2008).
O golpe de Chiang coloca os militantes do PCCh em crise profunda. Em 1926, após o “entrismo” feito pelo PCCh no Kuomitang, o triunvirato (Stalin, Rykov e Bukharin), chegara a decidir  dissolver o PCCh no Kuomitang (liquidacionismo) e ainda condecora Chiang Kai-shek como presidente honorário da Internacional Comunista, a oposição à conciliação se articula para desenvolver uma saída para a situação, colocando a necessidade de ruptura com o Kuomitang e Chiang, porém por meio de um golpe burocrático a oposição foi derrotada. De acordo com Peng Pi Lan
(...) no começo de junho de 1926, o CC do PCCh foi forçado a adotar a política da Komintern de submissão a Chiang Kai Shek. Com a ajuda de Borodin, Chiang consolidou sua ditadura militar sem obstáculos, manipulando o aparato do Kuomintang, a administração e o exército para seus próprios fins, e nomeando-se a si mesmo para o posto de comandante em chefe para empreender a expedição do Norte
Chiang, articulando a ala direita do Kuomitang, primeiro restringe as atividades do PCCh no Kuomitang, depois passa a perseguir e assassinar os comunistas chineses. Nesse período os principais dirigentes do Partido Comunista Chinês ainda não era stalinista, a direção do PCCh só chegou a esta conclusão depois da negativa do imposta pelo Komintern em romper com Chiang e o Kuomitang, proibindo que o PCCh tivesse uma atuação independente, de promovesse propaganda comunista dentro do Kuomitang, e ainda obrigando o PCCh a apoiar Chiang Kai Shek, respeitar o direito de propriedade dos latifundiários. De acordo com Peng Pi lan.
(...) Isto significava que o PCCh devia mobilizar o conjunto dos operários e dos camponeses para apoiar a expedição do Norte comandada por Chiang Kai Shek. A partir dali, os operários estavam obrigados a não violar os direitos de propriedade burguesa; negava-se aos camponeses o direito de tomar posse das terras em mãos dos latifundiários, sob o pretexto de que era cedo demais; o PCCh não podia fazer nenhum trabalho de propaganda entre as tropas do Kuomintang ou organizar algo em suas fileiras. Em particular, o PCCh não devia instaurar sua própria estratégia, baseada nos soviets de operários, camponeses e soldados, porque isto ameaçava prejudicar a colaboração entre o Kuomintang e o PCCh, e constituiria uma “louca aventura” que superava “a etapa da revolução nacional”. A revolução chinesa foi levada, passo a passo, a um beco sem saída no caminho de sua destruição.
Enquanto isso, o movimento operário em ascenso aos poucos vai conhecendo a própria força. As manifestações e os levante continuam a eclodir, até que em 21 de maço organizam um levante armado em Xangai, fazem mais de 2000 piquetes. De acordo com Peng Pi lan.
Os trabalhadores de Xangai organizaram uma insurreição armada no dia 21 de março de 1927, em resposta ao avanço da expedição do Norte. No dia seguinte, ocuparam a cidade inteira, com exceção das concessões estrangeiras. Organizaram-se mais de 2000 piquetes armados para manter a paz e a ordem. Os operários meteram-se nos sindicatos e no PCCh abrindo a perspectiva de instaurar um regime proletário.
O PCCh não volta seu apoio ao movimento. Com isso o movimento insurrecional deixa de espalhar-se pela China. Além de perder uma oportunidade histórica de abrir uma fase revolucionária no país, a falta de apoio deixa o movimento operário no terreno da reação. De acordo com Peng Pi lan.
Logo, na manhã do dia 12 de abril de 1927, Chiang, tendo-se beneficiado com o tempo necessário para montar um novo complô, deu o sinal para começar o massacre de seu segundo golpe. Muitos comunistas e operários caíram nas mãos dos verdugos em Xangai, e Chiang recolheu os lucros da revolução. Esse era o inevitável desencadeamento da insistência de Stalin para seguir uma política de colaboração com o Kuomintang e de ajuda a Chiang em sua expedição ao Norte.
Assim, a segunda revolução chinesa foi sacrificada para a preservação da posição privilegiada da burocracia na Rússia. A 21 dias do levante de Xangai
Chiang entrou na cidade como libertador, desarmou as milícias operárias, prendeu e massacrou os líderes sindicais e comunistas, que foram jogados nas caldeiras das locomotivas. O “massacre de Xangai” (de 12 de abril de 1927) deixou mais de cinco mil mortos. Chiang conseguia ser ao mesmo tempo o libertador da China e o defensor das classes possuidoras, contra a revolução social. De Xangai, ele partiu para esmagar as rebeliões camponesas no Sul.
No mesmo ano (1927) eclode um novo levante em Catão, porém desta vez o movimento é muito mais radical em suas consignas. Por meio de comitês de fábrica (sovietes) estabeleceram controle operário da produção, determinaram a nacionalização da grande indústria e confisco das habitações da grande burguesia. Também levantaram a consigna “Abaixo o Kuomitang!”. Em meio aos massacres que já haviam sido impostos ao movimento operário pelas tropas de Chiang Kai Shek, o levante de Catão ficou isolado e foi derrotado. A derrota do levante operário de Catão consolidava a derrota da segunda revolução chinesa (1925-1927).
Nesse período (1927-1928) tem-se o desenvolvimento de divergências dentro da Oposição de esquerda sobre o papel do proletariado da China. A polemica estava exposta, por uma lado nas posições de Preobrazhensky e Radek e na oposição colocada por Trotsky. Para Preobrazhensky, o proletariado não poderia cumprir papel independente na China, pois na China o proletariado não poderia passar por cima da fase democrático-burguesa, nesse sentido não necessitava naquele momento da ditadura do proletariado. O eixo central da polêmica passa pela interpretação das revoluções proletárias na Rússia.
Segundo análise de Preobrazhensky (...) só depois de ter sido realizada a revolução democrático-burguesa, porém sem ter sido completada, em fevereiro, que Lênin levantou a consigna de ditadura do proletariado, a consigna da revolução que deveria, en route, completar a revolução democrático-burguesa e passar à reconstrução socialista da sociedade. O mesmo deveria ser feito na China, primeiro lutar pelas demandas democrático-burguesas, depois que se estabelecesse a ditadura operário-camponesa é que se poderia iniciar a luta pelo socialismo. Ao transpor, a seu intendimento, o exemplo do processo revolucionário russo para a China, Preobrazhensky assume uma perspectiva evolucionista da revolução proletária.
(...) as duas revoluções chinesas ainda não conseguiram o que nós conseguimos apenas em fevereiro, nem no sentido de conquistas materiais nem, o que é mais importante, no sentido de criar as condições para a organização de soviets de operários e camponeses em escala massiva, algo que nós obtivemos imediatamente depois da queda do czarismo. (...). Resumo: a China ainda tem pela frente uma luta colossal, amarga e prolongada por questões elementares como a unificação nacional, e nem falar do problema colossal da revolução democrático burguesa agrária. É impossível dizer hoje se a pequena burguesia chinesa poderia criar partidos análogos a nossos social-revolucionários, ou se tais partidos serão criados pelos comunistas da ala direita que rompam com o partido, etc. Há somente uma questão clara. A hegemonia do futuro movimento ainda pertence ao proletariado, porém o conteúdo social da primeira etapa da futura revolução chinesa não pode ser caracterizado como um giro socialista. (...) A revolução chinesa será dirigida desde o começo pelo proletariado, e este exigirá pagamento por isso desde o começo porém, apesar deste fato, a primeira etapa desta revolução permanecerá no estágio do giro democrático burguês, enquanto que a composição das forças organizadas estatais e atuantes continuará sendo a da ditadura do proletariado e dos camponeses.
Esta análise etapista da revolução leva Preobrazhensky a aproximar-se cada vez mais das posições stalinistas. Trotsky em debate com Preobrazhensky analisava que também na China a burguesia era incapaz de leva a cabo as tarefas democrático-burguesas. Mesmo porque para o autor a defesa da ditadura democrático-burguesa do proletariado e dos camponeses leva a dissolução do proletariado na ditadura dos camponeses, e isso levaria inevitavelmente ao fracasso da revolução socialista. Para Trotsky a China já estava madura para a ditadura do proletariado, seria a ditadura proletária, apoiada pelos camponeses, que resolveria as demanda democráticas do povo chinês.
A Rússia estava madura para a ditadura do proletariado como única forma de solucionar todos os problemas nacionais; porém no que diz respeito ao desenvolvimento socialista, este, que surge das condições econômicas e culturais de um país, está indissoluvelmente ligado ao desenvolvimento futuro da revolução mundial. Isto se aplica total e parcialmente à China. Se este era um prognóstico há oito ou dez meses (um tanto atrasado), então hoje é uma dedução irrefutável que surge da experiência do levantamento de Cantão.
Para o revolucionário, tratava-se de defender o protagonismo operário, entendendo que apenas o proletariado é que poderia levar a cabo a revolução democrático-burguesa. A revolução deveria ser operária com apoio do campesinato. A direção do processo seria do operariado organizado em um Partido Comunista, a burguesia ficaria fora desta aliança. A perspectiva defendida pelo PC russo era muito próxima da estratégia menchevique de 1917.
A análise de Trotsky era baseada na importância do levante de Catão em 1927, esta insurreição operária demonstrava que havia condições para política autônoma do proletariado. Durante a insurreição o proletariado chinês criou sovietes, colocou-se a tarefa de tomar o poder, tentou nacionalizar as fábricas, expulsando inclusive o Kuomitang. “o Soviet de Cantão emitiu decretos que estabeleciam [...] o controle operário da produção, efetuando este controle através dos comitês de fábrica [e] [...] da nacionalização da grande indústria, do transporte e da banca”“o confisco de todas as habitações da grande burguesia para sua utilização pelos trabalhadores [...]. Os operários de Catão autoorganizaram-se independentes da burguesia e do campesinato, esta ação independente “revelou o vazio da consigna de revolução democrático-burguesa”, colocando em seu lugar o ímpeto dos operários contra a propriedade privada e bases férteis para luta pelo socialismo.
Para Trotsky o programa dos operários de Catão era muito mais radical que o dos operários russos em 1917. “As forças de classe e os programas que surgem inevitavelmente delas foram expostos pela insurreição em toda sua legitimidade. A melhor prova disso é: que foi possível e necessário prever a relação de forças que a insurreição de Cantão revelou”. O programa destes operários incluía não só o confisco de qualquer propriedade feudal que ainda existisse na China; não só o controle operário da produção, mas também a nacionalização da grande indústria, da banca e do transporte, assim como o confisco das habitações burguesas e de todas as suas propriedades para uso dos trabalhadores.
Para Trotsky o proletariado chinês poderia ter uma política autônoma articulada ao ímpeto dos camponeses. Durante a insurreição de Catão, “uma das consignas de luta do levantamento de Cantão era: “Abaixo o Kuomintang!” As bandeiras e as insígnias do Kuomintang foram arrancadas e pisoteadas”. Isto apontava que o proletariado, também na China seria a vanguarda da revolução socialista. Comparando a insurreição de Catão com a insurreição de fevereiro na Rússia, Trotsky destaca que na Rússia a revolução democrática não conseguiu resolver a questão agrária. Apena com a revolução proletária de outubro é que se pode levar a cabo as demandas democráticas.
Pode-se objetar que a revolução agrária ainda não foi resolvida na China! Certo. Porém tampouco foi resolvida em nosso país antes do estabelecimento da ditadura do proletariado. Em nosso país não foi a revolução democrático-burguesa, mas sim a socialista que conquistou a revolução agrária, a qual, aliás, foi muito mais profunda do que a que é possível na China, vistas as condições históricas do sistema chinês de propriedade da terra. Pode-se dizer que a China ainda não amadureceu para a revolução socialista. Porém esta seria uma maneira abstrata e morta de colocar a questão.
Pensando as similitudes entre a revolução na Rússia e os processos da revolução chinesa, um país de desenvolvimento capitalista atrasado, Trotsky, pensando a debilidade das burguesias nacionais nos países subdesenvolvidos re-elabora a teoria da revolução permanente. Entre as teses centrais do texto esta:
1) A vinculação entre a revolução democrática e a revolução socialista. Com política independente o proletariado é o único realmente capaz de dirigir as lutas democrático-burguesas até atingir a realização do socialismo e avançar para o comunismo, por meio do transcrecimento das demandas democráticas em ditadura do proletariado e em socialismo. A passagem de uma fase para outra deve se dar em avanço permanente, sem uma fase estabilização intermediária. Conforme o autor destaca na tese 2 da revolução permanente
Para os países de desenvolvimento burguês atrasado e, em particular, para os países coloniais e semicoloniais, a teoria da revolução permanente significa que a resolução íntegra e efetiva das suas tarefas democráticas e de libertação nacional somente pode ser concebida por meio a ditadura do proletariado, que se coloca à cabeça da nação oprimida e, primeiro de tudo, das suas massas camponesas.
O proletariado precisa então lutar pelas demandas democráticas ao mesmo tempo em que luta pelas demandas históricas do socialismo. Com a direção da revolução democrática sendo exercida pelo proletariado “No decurso de seu desenvolvimento, a revolução democrática transforma-se diretamente em revolução socialista e torna-se assim uma revolução permanente”. A aliança com o campesinato é imprescindível, sem esta aliança não se pode resolver a questão da concentração de terras nas mãos dos latifundiários. O campesinato terá que defrontar-se com estes senhores de terras. Sobre este ponto o autor destaca:
Não só a questão agrária como também a questão nacional atribuem ao campesinato que constitui a enorme maioria da população dos países atrasados, um papel excepcional na revolução democrática. Sem a aliança entre o proletariado e os camponeses, as tarefas da revolução democrática não podem ser realizadas; nem sequer podem ser seriamente colocadas. Mas a aliança destas duas classes não poderá realizar-se a não ser através duma luta implacável contra a influência da burguesia liberal nacional.
O ponto dois (2) destaca que a tomada do poder pelo proletariado é apenas o inicio da revolução socialista. Na Rússia, durante a reação termidoriana o triunvirato Stalin, Rykov e Bukharin afirmava que a tomada do poder constituía 90% da revolução, ao que Trotsky, refletindo sobre os desdobramentos sociais da revolução de fevereiro e outubro de 1917, tomará posição oposta. Para o revolucionário, a tomada do poder pelo proletariado redefine totalmente o solo das classes sociais, com isso afloram uma série de contradições e enfrentamentos sociais. Assim, conforme o autor destaca na tese 9 da revolução permanente
A conquista do poder pelo proletariado não completa revolução; limita-se a iniciá-la. A construção socialista só é concebível na base da luta de classes à escala nacional e internacional. Dado o domínio decisivo das relações capitalistas na arena mundial, esta luta conduzirá inevitavelmente a erupções violentas, isto é, a guerras civis internas e a guerras revolucionárias no exterior. É nisso que consiste o caráter permanente da própria revolução socialista, quer se trate de um país atrasado que acabe de realizar a sua revolução democrática, quer dum velho país capitalista que já passou por um longo período de democracia e de parlamentarismo.
Também relacionado a discussão posta, quando se analisava a Rússia como exemplo para novas revoluções proletárias, o socialismo num só pias era posto em evidência. Trotsky opunha-se a disseminação desta fórmula cotra-revolucionária par outros processo revolucionários. Para o autor (3) constituía erro profundo, e ruptura com o marxismo a separação da revolução nacional da internacional. Isso porque a revolução internacional é a única forma de desenvolver o socialismo. A revolução socialista pode ocorrer em qualquer país do mundo, porém só atingirá a forma social socialista com a completude da revolução proletária mundial. De acordo com o autor na tese 10 da revolução permanente
O triunfo da revolução socialista é inconcebível nos limites nacionais. Uma das causas essenciais da crise da sociedade burguesa reside em que as forças produtivas por ela criadas não podem se conciliar com os limites do Estado nacional. De onde surgem as guerras imperialistas por um lado e a utopia dos Estados Unidos burgueses da Europa por outro. A revolução socialista começa no terreno nacional, desenvolve-se na arena internacional e completa-se na arena mundial. Assim, a revolução socialista torna-se permanente num sentido novo e mais amplo do termo: só está acabado com o triunfo definitivo da nova sociedade sobre todo o nosso planeta.
As demandas democráticas (divisão do latifúndio, habitação, alimentação, liberdades políticas, educação, igualdade racial, igualdade sexual, liberdade de palavra, de imprensa, de reunião, de associação, de opinião, direito de greve, etc), nos países subdesenvolvidos adquirem muito peso social, é impossível falar de revolução nestes países sem tocar nestes pontos. Também nestes países as demandas democráticas só podem ser realizadas pelo proletariado por meio de uma ditadura proletária, principalmente pois a burguesia é muito frágil, gelatinosa. Além disso, por conta de seu desenvolvimento histórico, nestes países a burguesia é atrelada ao latifúndio e ao capital financeiro internacional, desta forma, sem o imperativo proletário jamais poderá realizar-se uma reforma agrária.
Por todas as tarefas organizativas sociais, a revolução proletária apoiada nos camponeses e nas massas empobrecidas é sempre apenas o primeiro passo para a construção do socialismo. Será necessário um salto em direção a auto-organização como forma de seguir em busca da autoemancipação para a construção do socialismo, como uma sociedade baseada na autoorganização das capacidades humanas como forças próprias, como controle coletivo livre, autoconsciente e universal dos trabalhadores sobre o processo de produção e assim da organização social. Porém, como a história já o colocou diversas vezes desde a revolução russa, se a revolução permanecer isolada da cadeia mundial ela será sufocada, mais cedo ou mais tarde, pelas potencias capitalistas, agudizar-se-ão as contradições internas e externas. É necessário então um partido comunista internacionalista, que pensando as particularidades de cada país e as demandas históricas da cada classe operária, de forma dialética, organize o proletariado do mundo inteiro na luta pela emancipação humana.
REVOLUÇÃO PERMANENTE E A TERCEIRA REVOLUÇÃO CHINESA
Sabendo que a teoria da revolução permanente não fora adotada na segunda revolução na China (1925-1927), fiquemos atentos então a qual estratégia fora adotada pelo PCCh durante a terceira revolução chinesa decorrida em 1949. Depois do massacre da revolução de 1925-1927, recebendo ataques permanentes das tropas de Chiang Kai-shek, o proletariado chinês demora muito para se recompor. Mesmo com as prisões e assassinatos dos militantes operários e direções revolucionários, com considerável baixa nos quadros revolucionário, o PCCh sob orientação do Kremlin que inistia que o capitalismo estava próximo da derrocada final e que era necessário organizar todas as forças imediatamente e tomar o poder, num giro ultra-esquerdista determina em 1930 uma onda de novas insurreições, o resultado já era previsto pelos militantes anti-stalinistas, concretizaram-se novos fracassos e novos massacres, o que praticamente dizimou o PCCh e minou sua influencia entre os operários.
Em seguida sob a direção stalinista de Mao Tsetung e Chuh Teh empreendeu-se a retirada em direção ao campo, onde criam “bases vermelhas”. A partir de então, e por longo tempo, toda a força do PCC estaria concentrada no campo, a reconstrução da vanguarda operária revolucionária ficou relegada a segundo plano.
O campesinato provou-se capaz de grandes lutas e enfretamentos, resistira ade 1930 a 1933 a quatro ataques das tropas de Chiang, sendo que o quinto ataque em 1934 obrigou o exército camponês a empreender em outubro de 1934A longa Marcha para o noroeste. Até outubro de 1935 a Longa Marcha percorreu logos dez mil quilômetros a pé. Depois de um ano, dos cem mil que partiram, apenas nove mil chegaram. Porém, ainda assim, materializava-se uma mudança no sujeito da revolução. Esta mudança estratégica faria toda diferença mudaria toda a linha da revolução chinesa. Conforme destaca Peng Shu Tsé, com a retirada ao campo, o PCCh  “degenerou gradualmente de partido operário a partido camponês”. De acordo com o revolucionário
A principal razão de semelhante juízo é a seguinte: depois da derrota da segunda Revolução, o PC chinês abandonou o movimento operário das cidades, deixou de lado o proletariado urbano e girou completamente para o campo. Dedicou todas as suas forças aos combates guerrilheiros camponeses, e em conseqüência englobou dentro do partido uma importante quantidade de camponeses. O resultado foi que a composição da base do partido tornou-se puramente camponesa. Apesar da participação de alguns elementos operários que haviam deixado as cidades, o débil número destes operários não bastou para determinar a composição do partido. Além disso, no transcurso de uma estadia prolongada no campo, estes elementos adotaram pouco a pouco as perspectivas do campesinato em sua ideologia.
A mudança de base fez do PCCh um partido pequeno burguês. O PC chinês não tinha mobilizado as massas operárias e dependia somente das forças armadas camponesas para conquistar o poder, isso revela a natureza pequeno burguesa desse partido. Assim
(...) no “partido operário-camponês” não são os elementos proletários que assimilam os camponeses, mas sim o contrário, são os elementos camponeses que englobam os demais. Assim portanto, do ponto de vista revolucionário, nunca é possível para duas classes ter um peso igual em um partido comum. Em conseqüência, um “partido operário-camponês” chamado bipartido é sempre um instrumento reacionário de políticos pequeno burgueses pronto para decepcionar a classe operária
Os trabalho do PCCh com  operariado, na prática, foi secundarizado. Mas a luta interna no PCCh continuava, em 1931, um grupo de trotskystas fundam a Liga Comunista da China que reivindicava a estratégia da revolução proletária dirigida pelo operariado, para a Liga tratava-se de expandir a base operária do partido. Porém este grupo era pequeno para conseguir mudar a orientação do PCCh.
Mas, como aponta o revolucionário comunista chinês Peng Shu Tsé, durante o período do pós-guerra, entre setembro de 1945 e o final de 1946, tem-se “um considerável florescimento e um nascimento do movimento de massas. Durante este período, as massas trabalhadoras em todas as grandes cidades, sendo Xangai o seu centro, exigiram a escala móvel de salários, o direito sindical e se opuseram ao bloqueio de salários”. O movimento operário nas ruas desencadeia uma onda de greves e de manifestações. Os operários (...) iniciaram um combate resoluto contra a burguesia e seu governo reacionário pela melhoria de suas condições de vida e de sua situação geral. Este movimento teve grande êxito; foi, sem dúvida alguma, a expressão do despertar do movimento operário chinês”. O levante operário articula-se aos camponeses e estudantes.
Ao mesmo tempo, nas massas camponesas, os fermentos da revolta ferviam sob o peso das contribuições forçadas, dos impostos em espécie, a conscripção, a ameaça de fome, e as desordens já haviam estalado nas regiões controladas por Chiang Kai Shek. Os estudantes, representando a pequena-burguesia em geral, iniciaram uma série de protestos, greves, manifestações em grande escala em cidades como Chungking, Nanquim, Xangai, Pequim, etc, sob as bandeiras e consignas que pediam a democracia e a paz contra a ditadura do Kuomintang, contra a mobilização para a guerra civil e contra a repressão dos agentes do Kuomintang.
As lutas se intensificam e se radicalizam a cada ato. “As lutas operárias, os fermentos de ódio e de rebelião nos camponeses, as grandes manifestações estudantis, completadas pela debilidade e a corrupção do regime de Chiang Kai Shek e pelo fortalecimento do PC chinês, criavam visivelmente uma situação pré-revolucionária”.
Porém, para Peng Shu Tsé, o PCCh ainda não estava preparado para dirigir uma batalha revolucionária pelo socialismo, o Partido vacilou frente a pressão proletária, não conseguiu ligar as demandas democráticas à revolução proletária e a ditadura do proletariado apoiada pelos camponeses,“Se o PC chinês tivesse se mostrado então à altura da situação, isto é, tivesse aceitado “a pressão das massas”, levantando consignas com as reivindicações de reformas democráticas, e especialmente, a reforma agrária, teria transformado rapidamente a situação de “pré-revolucionária” numa situação diretamente revolucionária, e pela insurreição teria conquistado o poder da maneira mais propícia”.
Esta estratégia desastrosa, que desperdiçava os ânimos revolucionários das massas tem causação histórica. A direção do PCCh continuava alinhada com o PC russo, considerando as demandas do operariado insurgente como sendo muito radicais, buscando impedir seus “excessos”, e junto com o bloqueio dos “excessos”, bloqueava também toda mobilização autônoma das massas proletárias. Como analisa Peng Shu Tsé o PCCh
pactuou servilmente com os sindicatos amarelos com o objetivo de fazer fracassar as reivindicações “excessivas” dos operários. No campo, suas atividades se limitaram à organização de guerrilhas, e evitou por todos os meios qualquer movimento de massas amplo que teria encorajado e unificado as massas camponesas. O grande movimento dos estudantes foi utilizado como um simples instrumento com o único objetivo de fazer pressão sobre o Kuomintang para que aceitasse os porta-vozes de paz, e nunca se ligou às greves dos operários num combate comum contra o regime de Chiang Kai Shek.
De acordo com o balanço do revolucionário, o PCCh não se colocava a tarefa de organizar o proletariado para a derrubada do governo Chiang Kai Shek e levar a cabo a reforma agrária, como forma de articular o campesinato ao proletariado insurgente das cidades. Ao invés disso, o PCCh tendo a frente Mao Tse Tung, queria criar um governo de coalizão com Chiang Kai Shek e com as burguesias da China, para isso o PCCh lutava intensamente para convencer o proletariado chinês da necessidade histórica desta aliança entre as quatro classes.
(...) Contrariamente ao que teria que fazer: mobilizar as massas na luta pelo poder sob as consignas de “derrubada do governo de Chiang e reforma agrária”, o PC chinês se curvou frente a Chiang Kai Shek e queria um governo de coalizão (com esse objetivo, Mao foi a Chunking para negociar diretamente com Chiang, e inclusive lhe expressou seu apoio em encontros de massas). O PC chinês fez todo o possível para reunir os políticos das camadas altas da burguesia e da pequena burguesia e estabelecer conversações de paz por iniciativa do imperialismo norte-americano. No que concerne às lutas reivindicativas da classe operária, o PC chinês não apenas não lhes ofereceu uma direção positiva para transformar essas lutas econômicas em lutas políticas, o que era muito possível neste momento, como ao contrário, com o objetivo de fazer “frente única” com a burguesia nacional, persuadiu os trabalhadores a não ir até os “extremos” em suas lutas.
PODE UMA DITADURA CAMPONESA CONDUZIR AO SOCIALISMO?
O PCCh rebaixando o programa do operariado e debastando suas mobilizações, inclinava-se cada vez mais para conseguir acordos com as classes dominantes, Mao Tse Tung propunha inclusive a fusão militar de seus exércitos com os de Chiang Kai Shek. Porém Chiang Kai-shek, apoiado por tropas norte-americanas, frente a crescente onda de levantes, empreende a partir de junho de 1946 nova ofensiva contra o proletariado e o PCCh. O PCCh tenta se apoiar no Kremlin contra o Kuomitang e Chiang, mas o PC russo manteve-se ao lado de Chiang Kai Shek, abandonando o PCCh a sua própria sorte, para que fosse dizimado. O PC russo acreditava que o PCCh não teria chances contra as tropas de Chiang, então o PCCh deveria deixar-se dissolver. O PC russo voltou seu apoio a Kuomitang inclusive reconhecendo diplomaticamente seu governo na China, supondo que o PCC seria derrotado numa nova guerra civil.
Com a intensificação das perseguições, da repressão e o risco de ser disimado pelas tropas de Chiang, expulso da coalizão que sustentava a anos, e num instinto de auto-sobrevivência o PCCh, que estava à direita das massas, busca abrigo no proletariado. Esse era seu ultimo refúgio, porém para se embrenhar no seio do operariado, o PCCh se vê obrigado também a fazer algumas concessões às reivindicações das massas, tendo que lutar ao lado do povo o PCCh se viu brigado a ultrapassar seu próprios limites. Somado as mobilizações operárias e camponesas o 4° e 8° Exércitos foram denominados Exército Libertação do Povo. De acordo com Peng Shu Tsé
Finalmente, quando o governo de Chiang tornou pública a “ordem de prisão de Mao Tsé Tung” (25 de junho de 1947) e proclamou o “decreto de mobilização para suprimir as revoltas” (4 de julho), depois de vários meses de vacilações durante os quais o PC chinês pareceu esperar as ordens de Moscou, publicou em 10 de outubro um manifesto em nome do “Exército de Libertação do Povo” chamando à derrubada de Chiang Kai Shek, à construção de uma “Nova China”. Ao mesmo tempo, levantou novamente sua “lei agrária” que expropriava os latifundiários e os camponeses ricos (excluindo suas propriedades comerciais e industriais) e que redistribuía as terras aos camponeses que não possuíam nada ou muito pouco.
Para Peng Shu Tsé a mudança estratégica do PCCh era uma mudança considerável na estratégia política com relação o período em que apoiava Chiang Kai Shek e abandonava a reforma agrária em 1937. Abandonando esta consigna o PCCh isolava a luta camponesa da luta operária. Porém para o autor esta mudança de estratégia não fora levada a cabo por conta das pressões da massa proletária, e sim devido a conclusão a que chegara o PCCh que a aliança como o Kuomitang mostrava-se inviável. Para “manter sua própria existência e continuar se desenvolvendo, o PC chinês é obrigado a buscar um apoio em certas camadas das massas e a estabelecer uma base entre elas”. Assim, para o autor, fora a ruptura total de Chiang Kai Shek com o PCCh que obrigara redefinição de sua estratégia
Esta mudança era o resultado da “pressão as massas”? visivelmente não. Nesse momento o movimento de massas já havia sido esmagado pelo regime de Chiang e estava em um nível muito baixo, os agentes do Kuomintang castigavam em toda parte, milhares de estudantes haviam sido presos, torturados e inclusive assassinados, os elementos ativos da classe operária haviam sido presos ou expulsos. Estes fatos mostram indiscutivelmente que o giro do PC chinês proveio somente do fato de que Chiang Kai Shek havia cortado todas as pontes que levavam a um compromisso e que o PC chinês tinha que se enfrentar com a ameaça mortal de um ataque violento cujo objetivo era quebrá-lo para sempre. Então, podemos dizer que este giro deveu-se mais à “pressão de Chiang” que à “pressão das massas”.
Para efetuar este giro à esquerda o PCCh se viu obrigado a romper com os Kulaks (camponeses ricos) e os comerciante ricos da China. “No curso desta luta, o PC chinês liquidou todos os privilégios acordados até então com os latifundiários e os kulaks, re-expropriando e distribuindo as terras aos camponeses pobres. Arrancou os latifundiários e os kulaks dos postos que ocupavam na administração local, no exército e no Partido”. Com o distanciamento dos Kulaks, o PCCh passou-se a apoiar diretamente a organização dos camponeses pobres.
Criaram-se Comitês de camponeses pobres, aos quais se outorgou alguns direitos democráticos para que pudessem combater aos senhores e aos kulaks, autorizou-se a crítica aos quadros locais do Partido, e alguns foram inclusive expulsos de seu posto e castigados. Todos estes atos deram ao PC chinês um fortalecimento considerável em sua base camponesa e em sua força militar. Porém não se pode esquecer que esse “esquerdismo” não era mais que fruto da “pressão de Chiang.
Em 1948, o Exército Libertação do Povo passou à ofensiva na Manchúria, no Norte e na China Central. Em janeiro de 1949, o PCCH e o Exército Libertação do Povo entraram Pequim, Chiang fugiu. Em outubro de 1949 eclode a terceira revolução chinesa, após a completa vitória militar do PCCh e do Exército Popular de Libertação contra o KMT e as tropas de Chiang Kay Shek, é proclamada a República Popular da China (RPC), com capital em Pequim. Os nacionalistas, sob Chiang Kai-shek, retiram-se para Taiuan (Formosa). (dezembro).
Mao visita a URSS em 4 de março de 1950, assinando, com Stalin, o Tratado de Amizade, Aliança e Ajuda. Por meio deste Tratado de Cooperação com a URSS foi destinado a China um empréstimo 300 milhões de dólares em cinco anos. Além disso, foram composta três companhias mistas com a URSS, que enviava vários técnicos à China. No mesmo ano, sobre a política do PCCh no governo da República Popular da China, Mao continua defendendo a estratégia do “bloco das quatro classes”. A República Popular da China constituía um governo de coalizão com a burguesia, e não de uma sociedade socialista.
Nós entendemos que a meta desta revolução não é acabar com a burguesia em geral, mas é acabar com a opressão nacional e feudal; que as medidas tomadas nesta revolução não visam a abolir, mas a proteger a propriedade privada, e que, como resultado desta revolução, a classe trabalhadora poderá constituir a força que conduzirá a China ao socialismo, embora o capitalismo possa ainda crescer em certa medida durante um tempo bastante longo. 'Terra para os pequenos proprietários' significa a transferência da terra dos exploradores feudais para os camponeses, transformando a propriedade privada dos senhores feudais em propriedade privada dos camponeses, emancipados das relações agrárias feudais, permitindo assim a transformação de um país agrícola em um país industrial.
Mao Tse Tung não colocou-se a tarefa de constituir a ditadura do proletariado, ancorado na “revolução por etapas”, no “bloco das quatro classes”, na “nova democracia”, poupou os capitalistas. A chegada do PCCh ao poder, um partido eminentemente camponês, está envolta em uma série de contradições. Segundo análise do revolucionário chinês Peng Shu Tsé “o PC chinês chegou a esta verdadeira vitória com seu programa menchevique extremamente reacionário da “revolução por etapas”, apoiando-se nas forças armadas camponesas que estavam completamente desconectadas da classe operária das cidades”.
A revolução eclodiu não tinha nem programa nem direção proletária, pelo contrário, o PCCh procurava a todo custo manter o proletariado urbano isolado da revolução. Estes elementos caracterizavam a revolução chinesa desde o inicio, de acordo com Peng Shu Tsé, como uma revolução “deformada”. Completamente distinto do que foi a revolução russa de outubro de 1917. Desta forma para o autor, o regime que se estabeleceu, após a revolução, devia ser caracterizado como um tipo de dominação ditatorial burocrática. Havia se criado mais um “Estado operário deformado”, pois o permanecia sendo um partido stalinista e seu regime, uma ditadura burocrática. Segundo análise do autor, baseada nas relações de classe e nas relações de propriedade, a terceira revolução chinesa se apoiava “sobre a base social da pequena burguesia, depende do campesinato quanto a sua base e é uma ditadura militar bonapartista. Em última instância portanto, do ponto de vista de seu papel fundamental na relação de propriedade, é um regime burguês”.
Porém qual é a situação real do regime estabelecido pelo PC chinês? No que diz respeito às relações de classe, este regime proclama ser um “governo de coalizão das quatro classes” (operários, camponeses, pequena burguesia e burguesia nacional). É muito claro então que este regime não está controlado ou “sob a direção” do proletariado. De fato, a base social do regime está constituída pela pequena burguesia, na qual os camponeses constituem a maioria. Ainda que a burguesia não tenha um papel decisivo no governo, em comparação com o proletariado ela desempenha um papel predominante (ao menos em aparência). Nas relações de propriedade, este regime não apenas não aboliu o sistema de propriedade privada, como ao contrário, promulgou deliberadamente leis e regulamentos para proteger a propriedade privada, para desenvolver a economia da suposta “Nova democracia”, isto é, uma economia não socialista. Então devo perguntar: sobre que base podemos afirmar que este regime é uma “ditadura do proletariado”?
De acordo com Peng Shu Tsé a base essencial o novo regime era o enorme exército camponês, que era totalmente dirigido pelo PCCh stalinista, que tinha imenso poder para determinar e controlar o governo chinês. O PCCh dividia o poder com camadas superiores da pequena burguesia que “ocupava posições significativas no regime. Por outro lado, o proletariado estava em posição de subaltenização em relação a nova composição de classe que dirigia o governo.
Ainda que um punhado de indivíduos entre os trabalhadores tenha sido designado para participar no governo (muito poucos têm postos importantes), a classe operária em seu conjunto segue estando ainda em uma posição subordinada. As massas operárias estão privadas dos direitos fundamentais de eleições livres de seus próprios delegados (tais como soviets ou outros comitês operários similares, etc) para participar neste regime e controlá-lo; os direitos políticos gerais (liberdade de palavra, de reunião e associação, publicação, crenças, etc) estão limitados consideravelmente e mesmo completamente proibidos (como o direito de greve). Em conseqüência, ainda que os operários sejam postos em evidência como os “amos” do regime, na realidade não têm direito de “reivindicações” para a melhoria de suas condições de vida para além dos “limites impostos pela lei”.
A reforma agrária foi, em grande medida, realizada em grande escala, por outro lado, nesse período, ainda preservava “a propriedade industrial e comercial” dos latifundiários e dos kulaks, assim como a “livre compra da terra” isto é, a não violação das relações capitalistas de propriedade. Sob base camponesa pequeno-burguesa, segundo o autor, o regime “arbitrava” entre o proletariado e a burguesia. Constituído a partir de profundas e agudas contradições nas relações sociais e econômicas, nas relações de classe e nas relações internacionais, para o autor esta situação deveria ser transitória.
Conseqüentemente, o regime em si mesmo está carregado de contradições incompatíveis entre si e que são fortemente explosivas. Do ponto de vista histórico, só pode ser de curta duração e transitório. No desenvolvimento dos futuros acontecimentos, será obrigado a eleger sua base social entre o proletariado e a burguesia para decidir sua sorte entre o socialismo e o capitalismo. Caso contrário, será derrubado por uma ou outra das classes, ou abatido pelas duas, e não será mais do que um episódio no curso da história.
Para Peng Shu Tsé, em novembro de 1951, para que a revolução chinesa deformada seguisse em direção a uma vitória proletária era necessário a  uma reviravolta do proletariado, uma revolução politca que derrubase o PCCh, com “Realização completa da reforma agrária, liquidação de todos os vestígios feudais, expropriação de todas as propriedades privadas da burguesia, culminação da estatização de suas propriedades como base para uma construção socialista”. Nesse sentido, era necessário combater o “governo de coalizão”, governo de colaboração de classes, liquidando a ditadura bonapartista militar de Mao Tse Tung. Em vez desta, tratava-se de estabelecer uma ditadura do proletariado dirigindo os camponeses pobres para o socialismo. Caso não se seguisse esse caminho, outra via possível seria a assimilação unificação da República Popular da China com a URSS.
A pressão proletária é crescente durante a década de 1950, o PCC de Mao não consegui conte-la. Isso o obrigou a avançar muito mais profundamente na revolução. As expropriações viriam apenas por meio das pressões sociais. Três transformações socialistas eram exigidas: expropriação da burguesia industrial, expropriação do comércio urbano e implantação de um movimento cooperativo no campo. Marchou-se para a ditadura do proletariado, mas essa não se concretizou. Lutando com todas as forças contra as tendências revolucionárias, na defesa intransigente e policialesca dateoria da revolução por etapas, os quadros dirigentes do PCCh de Mao, isolando o movimento operário e a luta proletária, conseguiram quebrar o curso da revolução permanente.
O proletariado urbano foi mantido isolado da atuação revolucionária. Mao Tse Tung continuava a perseguir, prender e executar os marxistas revolucionários que queriam aprofundar ainda mais a revolução até a conquista do socialismo e do comunismo.
Sob a égide stalinista, Mao impunha uma ditadura bonapartista sobre o proletariado chinês. Um Estado operário deformado nunca alcança existência estável. Após sua morte em 1976, assume Deng Shao Peng em 1978, a partir desse momento inicia-se a linha restauracionista. Linha que também estava sendo levada a cabo na URSS no mesmo período. Tem-se a re-introdução do capitalismo e da economia de mercado.



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STALINISMO NA RÚSSIA: ESTADO OPERÀRIO, TERMIDOR SOVIÈTICO E BONAPARTISMO

Anotações de estudo, primeiro semestre de 2010
Alessandro de Moura

           Fazemos uma breve análise acerca  da organização do movimento operário russo na década de 1920 e 1930, discutimos desde os primeiro giros à direita datroika Stalin, Kamenev e Zinoviev, passando pelo triunvirato Stalin, Rykov e Bukharin até a consolidação do período do terrorismo anti-soviético, ou a fase termidoriana. Além de destacarmos as bases socais do que ficou conhecido como stalinismo, ou seja a relação de dominação sobre o proletariado russo a partir da aliança politica-governamental dos Kulaks (camponeses ricos) e dos Nepmans (comerciantes ricos) com a burocracia anti-soviética, apontamos também de forma ligeira a relativa autonomia que Stalin adquiriu em relação a estes grupos dominantes, o que caracterizaria o período pós 1935 como a fase bonapartista do Governo anti-soviético.

Palavras chave: Operários. Kulaks, Nepmans. Stalinismo. Socialismo.

A TOMADA DO PODER É APENAS UM DECIMO DA REVOLUÇÃO
A tomada do Palácio de Inverno, em 25 de outubro de 1917, é desencadeada sem violência. Os bolcheviques queriam fazer a revolução sem um banho de sangue. Em dezembro de 1917, o II Congresso dos Sovietes aboliu a propriedade privada dos grandes latifúndios. Os comitês de fábricas e os comitês operários, com mandatos revogáveis pela base, geriam a produção. Em 1918 é decretada a expropriação da propriedade burguesa, com isso a burguesia é suplantada como classe, embora a Rússia ainda não fosse socialista, esta era a direção em que marchava.
Porém a burguesia e os latifundiários, por meio do exército branco restauracionista e suas nações aliadas não mediriam esforços ou custos humanos para depor o proletariado do poder, neste contexto dá-se inicio em 1918 a Guerra civil, um enfrentamento armado entre o proletariado e a burguesia (em unidade com o imperialismo mundial). Esta duraria não apenas dias ou semanas, mas sim cinco longos anos (1918-1921), sob o comunismo de guerra intensificou-se o ritmo de trabalho no país, tencionaram-se para produzi ao máximo para suprir com alimentos os soldados que combatiam contra 14 exércitos que invadiam a Rússia, os trabalhadores passam por mais um período de sacrifícios. A guerra e o comunismo de guerra contribuíram muito para o esgotamento da classe operária russa. Além disso, a guerra civil será responsável também pela eliminação de grande parte da vanguarda revolucionária operária e marxista.
Os bolcheviques colocaram acima de tudo a defesa da jovem república soviética. O que estava em jogo era a sobrevivência do Estado operário diante da guerra civil, que combinava o ataque dos Guardas Brancos com a invasão da Rússia por tropas estrangeiras. A situação exigia posições firmes e incisivas contra a burguesia, a aristocracia e seus agentes. Apenas em 1920, um ano antes do término da guerra civil, a pena de morte foi abolida. Também durante a guerra civil os bolcheviques se viram obrigados a proibir o funcionamento do partido Socialistas-Revolucionários e também dos mencheviques que co-organizavam o exército branco.
Em 1921 tem-se também a sublevação dos marinheiros de Krontadt contra os bolcheviques. Sobre ordem de Zinoviev, os marinheiros são reprimidos. Com todos os problemas desta intervenção, se destacar que os marinheiros de 1921 não eram os mesmo de 1917. A maior parte dos revolucionários de 1917, que tinham acúmulos imensos nas lutas contra o regime tsarista teria sido remanejada para travar batalhas em defesa do socialismo nascente, muitos sucumbiram na guerra civil, esta mudança de composição constitui elemento importante para compreender o porque da sublevação e a repressão. (confira os escritos de Trotsky sobre Krontadt).
Os desafios internos e externos para sustentar as conquistas de 1917 eram imensos, bem porque esta era a primeira revolução socialista da história da humanidade. A tomada do poder foi apenas o inicio do processo, agora tratava-se de extingui-lo para construção do socialismo. Trotski, no Balanço e perspectivas, afirmava que para construir o socialismo não bastava tomar o poder e fazer decretos. Nas palavras do auto O poder político não é todo-poderoso. Seria absurdo acreditar que basta ao proletariado, para substituir o capitalismo pelo socialismo, tomar o poder e fazer em seguida alguns decretos. Um sistema econômico não é o produto de medidas tomadas pelo governo. Tudo quanto o proletariado pode fazer é utilizar com toda a energia possível o poder político para facilitar e encurtar o caminho que conduz a evolução econômica para o coletivismo”.
V. I. Lênin e Leon Trotski defendiam que para revolução proletária triunfar, estabelecer o socialismo e marchar para o comunismo era necessário que a revolução se espalhasse pelo mundo, ganhava centralidade então o sucesso da revolução na Alemanha. Trotski, ainda no Balanço e perspectivas,  destacava  que: “Sem o apoio estatal direto do proletariado europeu, a classe operária russa não poderá manter-se no poder e transformar a sua dominação temporária em ditadura socialista durável. Sobre isto, dúvida alguma é permitida. Mas também não há dúvida nenhuma de que uma revolução socialista no ocidente tornar-nos-á diretamente capazes de transformar a dominação temporária da classe operária numa ditadura socialista”.
 Porém a posição revolucionária fora traída na Alemanha em 1919, Rosa Luxemburgo e Karl Liebknecht teóricos e dirigentes revolucionários foram assassinados. Assim, a derrota da revolução no Ocidente (Alemanha e Hungria) e no Oriente (China), durante a década de 1920, isolou a revolução russa.
A Rússia ainda não era socialista Lênin utilizava caracterizações que muitas vezes eram aparentemente contraditórias para definir o que era a Rússia em transição: “Estado operário”, “Estado operário e camponês”, “Estado burguês sem burguesia” e outras. Assim também como o próprio Lênin reconhecia o avanço da burocratização do partido por conta do isolamento da URSS. Lênin afirmara “Não se trata de um estado completamente operário, aí está o x da questão (...) Em nosso país, o Estado não é, na realidade, operário, e sim operário e camponês" (https://www.marxists.org/portugues/lenin/1920/12/30.htm). No texto “A crise do partido”, de 30 de dezembro de 1920: De fato nós temos um Estado operário, 1º, com a particularidade de que não é a população operária mas a população camponesa que predomina no país; e 2º, um Estado operário com uma deformação burocrática” (v. 5, p. 215).  Em texto de 1922, Lênin mantém sua análise de que o Estado  soviético sustentava deformações burocráticas. (https://www.marxists.org/portugues/lenin/1922/01/04.htm). Isso porque Lênin tinha claro que para que a humanidade desse um salto na direção de sua emancipação na construção do socialismo, como uma sociedade baseada na autoorganização das capacidades humanas como forcas próprias, ou controle coletivo livre, autoconsciente e universal dos trabalhadores sobre o processo de produção, a revolução proletária não poderia limitar-se a um país só.
Também é clássica a afirmação feita por Trotski no livro A revolução traída sobre o caráter e limitações do Estado operário russo: “A princípio, o Estado operário não pode ainda permitir a cada um trabalhar ‘segundo suas as capacidades’, o que significa fazer o que quiser e puder, nem recompensar cada um ‘segundo as suas necessidades’, independentemente do trabalho fornecido. O interesse do crescimento das forças produtivas obriga a recorrer às habituais normas do salário, isto é, à repartição de bens segundo a quantidade e a qualidade do trabalho individual” (p. 35). Assim, para o autor a União Soviética era uma sociedade intermediária entre o capitalismo e o socialismo”. (p.176).
PERSEGUIÇÃO AOS REVOLUCIONÁRIOS E O AVANÇO DO STALINISMO
Mesmo com o fim a guerra civil em 1921, as contradições sociais não cessaram. Dentro desse processo, desenvolveram-se importantes lutas internas no país, primeiro pelo restabelecimento das forças produtivas que ficaram arrasadas com a guerra. Depois ter-se-ia que combater elementos contraditórios gerado pela política criada em 1921 para a reconstrução do país a NEP – Nova Política Econômica.
Em 1922 Lênin adoece, a direção do partido é assumida pela troika Stalin, Kamenev e Zinoviev, que em 1925 será sucedida pelo triunvirato Stalin, Rykov e Bukharin, que se mantém no poder 1928. Durante esse período a revolução russa, que estava ainda na sua fase inicial, será estagnada e totalmente redirecionada. Lênin em seu “testamento político” recomenda ao congresso do partido o imediato afastamento de Stalin da Secretaria Geral, porém atroika censurou o documento.
A tendência contra-revolucionária da troika é combatida pela “ala” esquerda do Parido e recua em alguns momentos. Em 1923 os bolcheviques revolucionários lançam a “Declaração dos quarenta e seis” exigindo a democratização do partido (que burocratiza-se a largos passos) e mudanças na política econômica do país. Com a derrota da revolução alemã em 1923 o isolamento da Rússia é consolidado, com isso a troika sai fortalecida. A derrota da revolução alemã leva a marca da troika. Zinoviev então presidente da internacional negara apoio ao proletariado alemão, o que contribuiu para que se desse o massacre do proletariado em 1923. A partir de 1924 a ala mais conservadora do Partido Bolchevique chega ao controle do processo revolucionário, desse ano em diante tem-se o desenvolvimento progressivo do Termidor Soviético.
Em 1926 a URSS acumula uma série de contradições sociais que evoluem progressivamente, colocando em risco as conquistas da revolução de outubro e a própria possibilidade de colaboração do proletariado russo para uma revolução mundial. Trotski analisa que o Partido Bolchevique não está pronto para resistir às ameaças contra-revolucionárias que se desenvolvem internamente na Rússia, tenta então identificar as principais tendências contrarevolucionárias e formas organizativas que possibilitem combatê-las.
Em suma, pensado o processo revolucionário russo a luz de outros processos revolucionários já decorridos, como a Revolução Francesa, Comuna de Paris, a Revolução de 1905 a Revolução de outubro de 1917, em meio aos descaminhos da revolução russa após a morte de Lênin, Trotski elabora em 1926 o texto Tese sobre a revolução e contra-revolução, onde além de lições históricas dos processos revolucionários faz um breve balanço da revolução russa.
O autor destaca que a revolução é impossível sem a participação das massas em grande escala, e que a revolução sempre sofre um período de contra-revolução. Porém, mesmo com retrocessos, a contra-revolução não consegue fazer retroceder a revolução até o seu ponto inicial. As massas revolucionárias depositam sempre muitas esperanças de um futuro melhor na revolução. Por isso Trotski afirma que as esperanças desencadeadas pela revolução são sempre exageradas, o que dificulta ainda mais a realização das expectativas gerais da massa revolucionária.
Segundo o autor a revolução de massas sempre apodera-se “de muito mais do que mais tarde será capaz de manter”. Desta forma, todo processo revolucionário produz um quantun de desilusão nas massas revolucionárias, uma vez que “A desilusão destas massas, seu retorno à rotina e a futilidade, é parte integrante do período pós-revolucionário tanto como a passagem ao campo da ‘lei e da ordem’ daquelas classes ou setores de classe ‘satisfeitos’, que haviam participado na revolução.” Como a motivação de estratos sociais podem variar, grupos podem satisfazer-se com diferentes níveis das conquistas do processo revolucionário. Assim, ao atingir sua demanda, parte das pessoas que apoiaram a revolução ontem, após as primeiras conquistas pode deixar de apoiar seu avanço. Soma-se a isso, o sentimento de desilusão causado pela projeção de expectativas imediatas exageradas sobre o processo revolucionário, articulado com o esgotamento físico e psicológico das massas combatentes. Essa soma de elementos sociais aumenta a confiança das frações contra-revolucionárias, produzindo um terreno muito propicio para que as forças contrarevolucionárias cresçam. Para o autor
A desilusão de um setor considerável das massas oprimidas com os benefícios imediatos da revolução e – diretamente ligado a isto – o declínio da energia política e da atividade da classe revolucionária desencadeia um ressurgimento da confiança entre as classes contra-revolucionárias, tanto entre aqueles derrotados pela revolução mas não completamente aniquilados como entre aqueles que ajudaram a revolução num certo momento, mas foram jogados ao campo da contra-revolução pelo devir da revolução.
Trotski analisa que na Rússia também  houve uma fase de desilusão nas massas revolucionárias com os frutos imediatos da revolução, diretamente relacionados com a melhora das condições de vida, o proletariado continuava revolucionário, porém mais cético e cuidoso. Isto somado ao esgotamento físico e psíquico de revolucionários que fizeram duas revoluções (1905 e 1917) e lutaram numa prolongada guerra civil (1918-1921) produziu certamente o “declínio da energia política e da atividade da classe revolucionária”, ao qual Trotski se refere.
Porem, ainda assim, a contra-revolução não conseguira avançar devido o alcance e profundidade da revolução de outubro e também por causa de sua direção proletária, “as velhas classes e instituições dominantes de ambas as formações sócio-econômicas – a pré-capitalista e a capitalista (a monarquia com sua burocracia, a nobreza, e a burguesia) – sofreram uma derrota política total”. Mesmo com a invasão da Rússia por exércitos estrangeiros, ou seja com a reação armada das classes dominantes nacionais e internacionais, a contrarevolução não conseguiu derrubar  a ditadura do proletariado.  Assim, um importante elemento que impedia a restauração, tanto do absolutismo como da burguesia no país era justamente a destruição completa das velhas classes dominantes, esta “é uma das garantias contra o perigo da restauração”.
O campesinato pobre, os mujiques, diretamente beneficiados pela divisão do latifúndio levada a cabo pelo proletariado articulado nos sovietes e pelo Partido Bolchevique, constituíam base social importante para impedir a restauração da monarquia e dos latifundiários. Os camponeses pobres, que eram a maioria entre os camponeses tinham “interesse material direto (...) em manter em seu poder as antigas grandes estâncias”.
Porém, se os mujiques eram um impeditivo social e material para a restauração do latifúndio, isolados da luta proletária, a defesa da pequena propriedade fazia deles uma pequena burguesia. Nesse sentido, o proletariado dada sua relação social com a propriedade privada, ainda era a principal classe para fazer avançar a revolução socialista com a suprasunção da propriedade e manutenção da propriedade coletiva.  Desta forma, o perigo da restauração residia justamente no desenvolvimento no seio do proletariado de falta de interesse em manter o regime socialista na indústria e do conseqüente distanciamento e separação do proletariado do campesinato. Isso arriscaria a possibilidade de avanço do socialismo e lançaria bases para a restauração.
Embora o comunismo de guerra tivesse provocado o estrangulamento das tendências pequeno-burguesas latentes na economia camponesa, a NEP – Nova Política Econômica, que tinha por fim aumentar a produção agrícola para melhorar a qualidade de vida do proletariado russo, ao estabelecer que quem produzisse mais ganharia mais, possibilitou que uma camada de produtores acumulasse capital.
Com a introdução de elementos capitalistas na Rússia criou-se terreno para repor elementos de diferenciação de classes no campo e na cidade. Os camponeses acumulavam e com isso desenvolveu-se o comércio de produtos agrícolas nas cidades, os comerciantes, por sua vez também acumulavam, assim criara-se classes abastadas: o Kulak (camponês rico), e o Nepman (comerciante abastado). Desta forma, “Os camponeses, tendo vivido seus esforços econômicos como produtores de mercadorias privadas que compram e vendem, recriaram inevitavelmente os elementos da restauração capitalista. A base econômica para estes elementos é o interesse material dos camponeses em obter altos preços para os grãos e baixos preços para os produtos industriais”. Enquanto isso, o pequeno camponês, o mujike (camponês pobre), pagava mais impostos que os camponeses ricos.
Em conseqüência de tal problemática conjugada, Trotski analisa que “A NEP reviveu as tendências contraditórias pequeno-burguesas entre o campesinato, com a consequente possibilidade de uma restauração capitalista”. Lênin anteriormente calculava esta possibilidade, afirmava que a NEP introduzindo elementos capitalistas na produção e na circulação, seria um passo atrás para dar dois passos a frente. A venda dos produtos agrícolas era uma forma de estimular a produção para livrar a Rússia da fome, era calculado que tal política geraria diferenciações sociais no país, por isso, inevitavelmente suas conseqüências deveriam ser reparadas futuramente. Mas, estas tendências não estavam sendo contidas, ao invés disso, no leme do Estado, Bukarin, propagava “Kulaks enriquecei-vos”, como forma de estimular a produção agrícola, difundia-se que com a tomada do poder 90% da revolução já estava assegurado, tratava-se de desenvolver a economia, para estes o acumulo do Kulaks e dos Nepman não podia oferecer perigo ao desenvolvimento do socialismo. A combinação destes elementos aos poucos lançava bases para fortalecer as possibilidades de fortalecimento das “alas” restauracionista. Desta forma para Trotski,
Os elementos políticos da restauração são recriados através do capital comercial, que restabelece as conexões entre o campesinato disperso e fragmentado, por um lado, e entre o campo e a cidade, por outro. Com os estratos superiores das aldeias atuando como intermediários, o comerciante organiza uma greve contra a cidade. Isso se aplica em primeiro lugar, naturalmente, ao capital comercial privado, porém em grande medida também se aplica ao capital comercial cooperativo, com seu pessoal, que tem muita experiência no comércio e uma inclinação natural em favor dos Kulaks.
A abertura para o comércio incorporaram a Rússia ao sistema do mercado mundial. Os Kulaks e os Nepman têm relações diretas com setores dirigentes do Partido Bolchevique, articulados com a burocracia do Partido, diretamente beneficiados pelas contradições da sociedade russa, buscaram criar mecanismos que prolongassem tal estado de coisas, e que assim assegurassem seus privilégios e benefícios. Para a manutenção de tais benesses era necessário manter as coisas como elas estavam, passar de um Estado de revolução permanente para um Estado de conservação. Os elementos mais conservadores da sociedade russa passam a buscar desmobilizar a todo custo as alas revolucionárias da sociedade. Pois, se a busca por transformações constantes na sociedade russa continuasse, os Nepman, os kulaks e a burocracia inevitavelmente perderiam suas posições de privilégio frente à classe trabalhadora.
Buscando prevenir-se contra a possibilidade de novos ascensos revolucionários do proletariado, desde 1925, com Kamenev, Stalin e Zinoviev, mas também o triunvirato Stalin, Rykov e Bukharin, articulado com os Nepman, os kulaks e a burocracia estatal, impulsionam uma campanha de amplo alcance afirmando e difundindo interna e internacionalmente que o socialismo já avia sido atingido, que estavam sob o “socialismo real”, estes setores passam a afirmar que o socialismo era possível num só pais. Os marxistas revolucionários dentro e fora da Rússia entenderam que e essa era uma ruptura profunda com o materialismo histórico dialético. O “socialismo num só pais” defendia como constitutivo do socialismo real o enriquecimento progressivo dos Kulaks dos Nepmans e os privilégios do corpo político-administrativo do Estado operário. Nesse sentido, quem questionava o “socialismo real” era denunciado por estes setores como “traidor da revolução”, sendo perseguido, preso e assassinado.
Mas este processo de capitulação ao “socialismo num só país” não era homogêneo, grupos sociais se organizaram contra a reação articulada em torno da teoria do socialismo num só país. A forma de superar os problemas colocados pelo passo atrás, desenvolvimento do comércio, a diferenciação social era desenvolver bases mais sólidas dentro proletariado, ampliando a participação operária no governo, fazendo a revolução avançar por meio de seu ativismo político, além disso era necessário instituir imposto progressivo aos Kulaks, fazendo com que este pagassem mais impostos que os mujikes como forma de fazer atrofiar a desigualdade econômica entre esses grupos, e ainda conceder isenção de impostos aos 40% do campesinato mais empobrecido. Pois, para Trotski, frente às adversidades postas, o principal perigo seria “ignorar os perigos de classe, passa por cima deles, e combate qualquer tentativa de chamar a atenção sobre eles. Deste modo adormece a vigilância e reduz a disposição de combate do proletariado”.
Embora fosse necessário, para um diagnóstico sincero e profundo das condições da luta proletária na Rússia, considerar que o proletariado estava em 1926 “consideravelmente menos receptivo às perspectivas revolucionárias e às amplas generalizações do que durante a Revolução de Outubro e os anos que a seguiram”. Para Trotski o partido revolucionário não poderia “se adaptar passivamente a todas as mudanças no estado de ânimo das massas. Mas este também não deve ignorar as alterações produzidas por causas históricas profundas”. O partido deveria ter um programa e uma estratégia revolucionária para a luta pela emancipação humana.
Trotski entendia que o Partido Comunista Russo tinha grande responsabilidade em manter os ânimos revolucionários do proletariado enquanto a revolução socialista não eclodisse em outros pais do globo. Principalmente por que a “A velha geração da classe trabalhadora, que fez duas revoluções, ou fez a última, começando em 1917, está sofrendo de esgotamento nervoso, e uma porção substancial deles teme qualquer nova convulsão, com sua perspectiva concomitante de guerra, destruição, epidemias e tudo o mais”. O Partido, para manter viva a luta do proletariado por seu programa histórico, necessitava criar e recriar constantemente bases sócias revolucionárias. Buscar fazer avançar os elementos mais revolucionários e dispostos das gerações anteriores, que fizeram a revolução de 1905 e 1917, e ainda, era necessário formar as novas gerações na perspectiva da revolução permanente. Necessitava-se de uma vanguarda revolucionária que trabalhasse intensamente para reanimar a classe trabalhadora como forma de aprofundar a revolução, contra a burocracia estatal do Partido, contra os Kulaks e os Nepmans. Porém as gerações mais velhas estavam sendo isoladas do Partido, dando lugar aos elementos mais conservadores, e as novas gerações portadoras de animo e disposição revolucionária não estavam encontrando espaço dentro do Partido.
A jovem geração, que está amadurecendo somente agora, carece de experiência na luta de classes e da têmpera revolucionária necessária. Não explora por si mesma, como fez a geração anterior, porém fica imediatamente envolvida pelo ambiente das mais poderosas instituições do governo e do partido, pela tradição do partido, a autoridade, a disciplina etc. No momento isto dificulta que a jovem geração cumpra um papel independente. A questão da correta orientação da jovem geração do partido e da classe trabalhadora adquire uma importância colossal.
A articulação do Partido com os elementos mais conservadores, com progressivo isolamento dos revolucionários e a falta de espaço para atuação da juventude revolucionária certamente tinha como objetivo maior manter o equilíbrio do poder dos grupos dominantes na Rússia. O Partido Estatal optou abertamente pela manutenção das políticas de beneficiamento social-econômico dos Kulaks dos Nepmans e aumento progressivo da influencia e das liberdades dos grupos mais conservadores dentro do Partido. Nesse período
(...) teve lugar um aumento extremo do papel exercido no partido e no aparato do Estado pela categoria especial dos velhos bolcheviques, que eram membros ou trabalharam ativamente no partido durante o período de 1905; que depois, no período da reação, deixaram o partido, se adaptaram ao regime burguês e ocuparam postos mais ou menos destacados no mesmo; que eram defensistas, como toda a intelligentsia burguesa; e que, junto com esta última, foram impulsionados adiante na Revolução de Fevereiro (com a qual nem sequer sonhavam ao princípio da guerra); que foram ferrenhos oponentes do programa leninista e da Revolução de Outubro; porém que retornaram ao partido depois que a vitória esteve assegurada ou depois da estabilização do novo regime, na época em que aintelligentsia burguesa deteve sua sabotagem. Estes elementos, que se reconciliaram mais ou menos com o regime czarista depois de seu golpe contra-revolucionário em 13 de Junho de 1907, por sua própria natureza não podem ser mais que elementos de tipo conservador. Estão a favor da estabilização em geral e contra a oposição em geral. A educação da juventude do partido está na sua maior parte em suas mãos. (...) Tal é a combinação de circunstâncias que no período recente do desenvolvimento do partido determinou a reorganização da direção do partido e o deslocamento da política do partido para a direita.
 Partir da análise das principais tendências que envolviam o Partido e a sociedade russa pós-1917, a influência dos Kulaks, dos Nepmans e da burocracia, Trotsky pontuou elementos centrais que contribuíam para a restauração, ou criavam base para a restauração burguesa: “(a) a situação do campesinato, que não deseja o regresso dos latifundiários, mas que ainda não tem interesses materiais no socialismo (aqui se mostra a importância de nossos laços políticos com os camponeses pobres); (b) o estado de ânimo de um setor considerável da classe trabalhadora, a diminuição de sua energia revolucionária, a fadiga da velha geração, o aumento do peso específico dos elementos conservadores”.
Por outro lado, o autor também elenca os elementos que considerava se colocavam contra qualquer tentativa de restauração capitalista, estes eram: “(a) o temor do mujik de que o latifundiário voltará com os capitalistas, do mesmo modo que fugiu com os capitalistas; (b) o fato de o poder e os mais importantes meios de produção permanecerem efetivamente nas mãos do Estado operário, ainda que com deformações extremas.; (c) o fato de que a direção do Estado realmente permanece nas mãos do Partido Comunista, mesmo quando este reflita as mudanças moleculares das forças de classe e os variáveis estados de ânimo político”. O Estado Russo se caracterizava como um Estado operário degenerado, que estagnava o avanço da revolução proletária, mas que ainda não havia juntado forças para um forte contragolpe restauracionista.
A via contrarevolucionária continuou a fortalecer-se. E entre 1926 e 1927 consolidou-se no poder na Rússia, nas palavras de Trotski em A revolução traída “uma casta incontrolável, estranha ao socialismo”, o partido governante articulava-se com os setores conservadores e reformistas em ataque direto contra o proletariado e os grupos opositores e semi-opositores, bem como aos elementos isolados que mantiveram atitude critica frente ao termidor soviético. Apostou-se tudo nos Kulaks (camponeses ricos) e nos Nepman (novos ricos). Segundo a nova análise de Trotsky, no texto Estado operário, termidor e bonapartismo escrito em 1935 no exílio
O burocratismo soviético (seria mais correto dizer anti-soviético) é o produto das contradições sociais entre a cidade e a aldeia, entre o proletariado e o campesinato – estas duas classes de contradições não são idênticas –, entre as repúblicas e os distritos nacionais, entre os diferentes grupos do campesinato, entre as distintas camadas da classe operária, entre os diversos grupos de consumidores e, finalmente, entre o Estado soviético de conjunto e seu entorno capitalista.
        Em meio à uma infinidade de contradições sociais e políticas a ditadura do proletariado foi substituída, por meio de prisões, deportações, desaparecimentos misteriosos, e fuzilamentos armados, por uma ditadura burocrática, apoiada hora centralmente nos kulaks hora centralmente nos nepmans. “Elevando-se por cima das massas trabalhadoras a burocracia regula estas contradições. Utiliza esta função para fortalecer seu próprio domínio. Com seu governo sem nenhum controle, sujeito unicamente a sua vontade, a burocracia acumula novas contradições. Explorando-as cria o regime do absolutismo burocrático”. Em prol destes o poder executivo foi concentrado e subaltenizado ao capital financeiro. Com tudo isso, na revolução soviética se deu um giro à direita, ainda que em um ritmo lento e formalmente dissimulado.

Trotski debate ainda com o grupo “Centralismo Democrático” (V.M. Smirnov, Sapronov e outros, aos quais foram perseguidos no exílio até a morte), apontando as divergências entre o grupo e a “Oposição de Esquerda”. O grupo “Centrismo Democrático” de Smirnov defendia
(...) o atraso na industrialização, o avanço do kulak e do nepman (os novos burgueses), a ligação entre eles e a burocracia e, finalmente, a degeneração do partido teriam progredido tanto que seria impossível voltar à construção socialista sem uma nova revolução. O proletariado já havia perdido força. Com o esmagamento da Oposição de Esquerda, a burocracia começaria a expressar os interesses de um regime burguês em reconstituição. Teriam sido liquidadas as conquistas fundamentais da Revolução de Outubro. Esta era a essência da posição do grupo “Centralismo Democrático”.
Porém para a Oposição de Esquerda, segundo Trotski, a burocracia que se consolidava no poder com base centrada nos Kulaks e nos Nepman, também tinham interesses conflitantes. Os kulaks, em 1927, exigindo maiores concessões do governo, com apoio da ala direita do PCUS golpearam a burocracia negando-se a provê-la de pão, que concentravam em suas mãos. Para a Oposição de Esquerda “Eram inevitáveis outras rupturas nas fileiras burocráticas”.
Em 1928 a burocracia se dividiu abertamente. A direita estava a favor de maiores concessões ao kulak. Os centristas, armados com as idéias da Oposição de Esquerda, as mesmas que haviam caluniado em coro com a direita, se apoiaram nos trabalhadores, tiraram do meio a direita e tomaram o caminho da industrialização e, conseqüentemente, da coletivização. Finalmente se salvaram as conquistas sociais básicas da Revolução de Outubro, ao custo de inumeráveis e desnecessários sacrifícios.
Na perspectiva da Oposição de Esquerda “o setor mais importante da burocracia centrista se inclinaria ante os operários em busca de apoio contra a burguesia rural em avanço. Ainda estávamos muito longe da solução final do conflito. Era prematuro enterrar a Revolução de Outubro”. Em meio a tais processos a URSS tornou-se uma sociedade de transição contraditória, embora tivesse elementos de negação capitalista, como os meios de produção nacionalizados, mantinha também desigualdade das condições de vida com grandes privilégios a burocracia, aos Kulaks e os Nepmans, a URSS se mantinha muito mais próxima do regime capitalista do que do futuro socialismo. Porém ainda portava condições para avanço das conquistas dos trabalhadores se conseguisse liquidar a burocracia e a desigualdade social.
Nesse sentido, segundo o revolucionário, dois caminhos se colocavam, à URSS; a busca do socialismo a restauração capitalista. O passo seguinte do Partido Comunista Russo definiria os rumos desta disputa. Internamente o partido sobre a égide stalinista inicia uma onda de perseguições e fuzilamentos para calar os revolucionários, críticos e descontentes. Victor Serge, que fora membro do Partido Bolchevique, exilado no México em 1947 no livro O ano I da revolução russa afirma que até 1928 havia mais de 30 mil presos políticos na Rússia, mas, segundo o autor, este número cresceu assustadoramente até 1947 para cerca de 10 a 12 milhões! Eliminando os revolucionários aos milhares, quebrando a resistência socialista, cada vez mais aumentava a distância entre a Rússia e o socialismo.
Os dirigentes e intelectuais da tradição marxista revolucionária se agruparam em torno de Trotsky criando um grupo de oposição. Já durante a segunda metade da década de 1920 as obras de Trotsky foram proibidas e queimadas na Rússia. Exilando-se em vários países, mas ainda combatendo o regime stalinista e defendendo a emancipação humana Trotsky fora perseguido e finalmente assassinado no México em 1940. Sobre tal contexto analisa Serge:
(...) O grande fato essencial é que em 1927 e 1928, por meio de um golpe de força perpenetrado dentro do partido, o estado-partido revolucionário torna-se um estado-policial-burocrático, reacionário, sobre o terreno social criado pela revolução. A mudança de ideologia se acentua violentamente. O marxismo das fórmulas vulgares, elaboradas pelas repartições, substitui o marxismo critico dos homens pensantes. Instaura-se o culto do Chefe. O “socialismo num só país” se torna o clichê chave-mestra dos adventícios que nada mais querem além de manter os próprios privilégios. O que as oposições mal entrevêem, angustiados, é que se desenha um novo regime, o regime totalitário. A maioria dos velhos bolcheviques, que havia derrotado a oposição trotskista, os Bukharin, Rykov, Tomski, Riutin, ao se aperceberem disso se apavoraram e passaram também para resistência. Tarde demais. (p.426-427).
A contra revolução avança a passos largos, mas cresce também a oposição à perspectiva teórico-política stalinista. A cúpula de Stalin elabora nova estratégia de contenção e silenciamento violento da oposição crescente. Inicia-se então mais dez anos de repressão, exílio, prisão e fuzilamentos com crivo estatal. De 1927 a 1937 a cúpula impõem então um extenso expurgo no partido em âmbito nacional e internacional, extirpando os revolucionários, Nesta fase elimina desde a raiz os que viveram a experiência da revolução, atinge-se inclusive a geração intermediária adepta ao bolchevismo e que engajava-se na perspectiva marxista revolucionária. Sabia-se que o stalinismo não poderia triunfar na Rússia caso não se eliminasse a geração revolucionária. Produz-se então uma ruptura sangrenta entre bolchevismo e stalinismo. Sobre os elemento de ruptura entre bolchevismo e stalinismo confira o artigo de Bernardo Cerdeira Bolchevismo e stalinismo: um velho debate.[9]

O MASSACRE DOS REVOLUCIONÁRIOS RUSSOS DURANTE A DÉCADA DE 1930
Na década de 1930 intensificam-se as perseguições, prisões e assassinatos dos revolucionários. Coggiola no artigo Trotsky, a ascensão do nazismo e o papel do stalinismo[10] discutindo ascensão do nazismo, bem como o acordo do stalinismo com Hitler e depois do stalinismo com o imperialismo, coloca elementos importantes para um dimencionamento dos processos decorridos no período. Segundo o autor
Em 1931, o “caso” de Syrtsov e Lominadzé, (...) foram acusados de formar um “bloco anti-partido” (os dois dirigentes acusavam à direção do partido de “tratar operários e camponeses à maneira dos barines”: foram excluídos do CC [Comite Central]); em 1932, o “affaire Riutin”, do nome do dirigente que apregoou a descoletivização, a reintegração dos excluídos do partido, e a destituição de Stalin (descoberto, Riutin foi excluído do partido, assim como Zinoviev e Kamenev; há também numerosas detenções, mas o Bureau Político recusou executá-lo, como Stalin queria).
         Coggiola destaca que em 1934 formou-se uma nova coalizão contra Stalin, 270 delegados votam contra Stalin. A oposição escolhe um substituto Sergo Kirov, porém em 1º de dezembro de 1934 este é assassinado. O assassinato de Kirov foi utilizado como pretexto para a deflagração de um processo de repressão e fuzilamentos em massa, “com leis de exceção, milhares de deportados na Sibéria (remetidos nos chamados “trens de Kirov”), todos “suspeitos” de complô para assassinar Kirov... (...) A repressão em massa acabou com a ‘sociedade dos velhos bolcheviques’.” (p. 12). Colaboradores da primeira fase do stalinismo, por mudar de posição, também são fuzilados. Em 1935 Kamenev é “julgado” e fuzilado no Processo de Moscou, em 1936 é a vez de Zinoviev, Rykov e Bukharin que tiveram o mesmo destino.
Mesmo frente a todos estes processos contra-revolucionários, entendendo que a o stalinismo operou a substituição de um regime revolucionário por outro contra-revolucionário “através de uma série de medidas, de pequenas guerras civis da burocracia contra a vanguarda operária”. Trotsky, ainda exilado, continuava acreditar na possibilidade da derrubada do stalinismo com liquidação da casta burocrática, com retomada da ditadura proletária e da marcha para o socialismo. No texto Estado operário, termidor e bonapartismo escrito em 1935, citado anteriormente, o autor afirma:
Ao mesmo tempo afirmamos que, a pesar da monstruosa degeneração burocrática, o Estado soviético continua sendo o instrumento histórico da classe operária na medida em que garante o desenvolvimento da economia e da cultura com base nos meios de produção nacionalizados e, em virtude disso, prepara as condições para uma genuína emancipação dos trabalhadores, através da liquidação da burocracia e da desigualdade social.
Mas a contra-revolução empreenderia um novo avanço. Em junho de 1937, tem novo impulso a condenação e execução da cúpula do Exército Vermelho. De acordo com Coggiola “além dos remanescentes da velha guarda bolchevique, foram eliminados 98 dos 117 membros do Comitê Central eleito em 1934, 1108 dos 1966 delegados ao XVII Congresso, 4 membros do Bureau Político, 3 dos 5 membros do Bureau de Organização”. (p. 12).
Ainda segundo o autor “o massacre abrangeu todos os antigos opositores e suas famílias, 90% dos quadros superiores do Exército Vermelho, todos os dirigentes da polícia política antes de Ekhov, a maioria dos comunistas estrangeiros refugiados na URSS (no total, houve de 4 a 5 milhões de detenções, um soviético para cada 17 foi detido, um para cada 85, executado)”. (p. 11-12). Ainda segundo o autor, mais de 35 mil dos oficiais do exército vermelho foram assassinados. (p. 12). Victor Serge destaca que além do fuzilamento dos bolcheviques mais conhecidos também “Outros, menos célebres, morreram, às centenas e milhares, fuzilados sem processo.” (p. 21). E fevereiro de 1935 Trotski analisa: “a URSS de hoje se parece muito pouco com a república soviética que descreveu Lênin em 1917 (nem burocracia nem exército permanentes, direito de revogação a qualquer momento dos funcionários eleitos e controle ativo das massas sobres eles “independentemente de quem sejam os indivíduos” etc.). O domínio da burocracia sobre o país e o de Stálin sobre a burocracia são quase absolutos”. A sociedade soviética aproximava-se muito mais do capitalismo do que do socialismo. Ao mesmo tempo Trotski afirmava que mesmo com toda degeneração burocrática o Estado soviético continuava “sendo o instrumento histórico da classe operária na medida em que garante o desenvolvimento da economia e da cultura com base nos meios de produção nacionalizados e, em virtude disso, prepara as condições para uma genuína emancipação dos trabalhadores, através da liquidação da burocracia e da desigualdade social”. Nesse sentido, o autor afirma que Stalin, num bonapartismo soviético, sustentava-se sobre uma política oscilante.
Stálin não somente preserva as conquistas da Revolução de Outubro contra a contra-revolução feudal-burguesa, mas também contra as reivindicações dos operários, sua impaciência, seu descontentamento; esmaga a ala esquerda, que expressa as tendências históricas progressivas das massas trabalhadoras sem privilégios; cria uma nova aristocracia através da extrema diferenciação dos salários, de privilégios, hierarquias etc. Apoiando-se nos setores superiores da nova hierarquia social contra os mais baixos – e às vezes ao contrário – Stálin conseguiu concentrar totalmente o poder em suas mãos.
Com tal massacre ficava livre o caminho para a conciliação stalinista, com a defesa intransigente do socialismo num só país, e da revolução por etapas por meio da aliança com as “burguesias nacionais progressistas”, ao invés do apoio a auto-organizacão dos trabalhadores, desta forma o stalinismo obteve êxito em bloquear e/ou estrangular os desenvolvimentos revolucionários. Certamente, se o proletariado entrasse numa fase de vitórias revolucionárias pelo mundo, a casta dominante da Rússia seria defenestrada do poder. Porém para além do controle interno do país, com a consolidação de alianças contrarevolucionárias, com conseqüente esmagamento do revolucionários, o Comintern bloqueava também as revoluções proletárias em outros países, forçando a aliança do operariado com setores da burguesia. Desta forma, para Trotsky os elementos se combinavam, “O que mais debilita a luta da vanguarda proletária da URSS contra o bonapartismo são as constantes derrotas do proletariado mundial. (...) A causa principal das derrotas do proletariado mundial radica na criminosa política da Comintern, cega servente do bonapartismo stalinista e ao mesmo tempo a melhor aliada e defensora da burocracia reformista.”
Sem considerar o que se passava no Partido Comunista da União Soviética (PCUS) na década de 1930, com a consolidação do bonapartismo soviético a partir de 1935, fica muito mais difícil entender o que aconteceu na Espanha e na China durante a década de 1930. Para além das alternativas revolução 'republicana' ou 'democrática', a atuação dos marxista revolucionários na Espanha, inspirada na experiencia russa de 1917,  era contundente: nem revolução republicana nem revolução democrática burguesa, mas sim, autoorganização proletária para revolução socialista. A atuação dos stalinistas insistiu até o fim na aliança com frações da burguesia defendendo a revolução democrática burguesa baseados na tese menchevique, já defendida na China em 1927, de que existiriam países “maduros” e “não maduros" para o socialismo.
Para os marxistas revolucionários  os desafios eram imensos, combater a via republicana e a via stalinista, que combatia os revolucionários e pactuavam com os social-democratas na defesa de uma "semi-revolução" que favorecia as classes possuidoras. Assim,  na Espanha desencadearam-se "duas contra-revoluções": a franquista e a mais pérfida, a que levou adiante o stalinismo no maio catalão de 1937 liquidando o melhor da vanguarda espanhola, entre ela estava Andrés Nin e os centristas (que oscilam entre reforma e revolução) do POUM.

Tratava-se de buscar discutir a realidade social e as demandas históricas do proletariado espanhol, utilizando-se das experiencias de auto-organização dos trabalhadores russos em outubro de 1917, a ponto de o proletariado espanhol passar a buscar transformar conscientemente esta revolução híbrida, confusa, em revolução contra o Estado monárquico, republicano, democrático-burguês, em uma revolução socialista, criando por meio da auto-organização dos trabalhadores e trabalhadoras em comitês de fábrica, coordenações, sovietes etc., um Estado operário em marcha para o socialismo. O confronto foi sangrento uma multidão de revolucionários deram a vida pela revolução que acabou por não sendo vitoriosa. Triunfou a via stalinista pactuada com a social-democracia, uma pseudo-democracia com conseqüente "aborto da revolução proletária”.


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[1]              Confira: Bolchevismo e stalinismo: um velho debate. Disponível no site: http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/03/out3_06.pdf
[2]              Trotsky, a ascensão do nazismo e o papel do stalinismo. Disponível no site: http://www.rebelion.org/docs/9198.pdf
[3]              Para além das indiscutíveis contribuições filosóficas e literárias do autor ao campo da produção marxista, há de se considerar também sua atuação como político marxista e suas formulações neste campo, dadas relações dialéticas entre teoria e pratica efetiva. Nesse sentido, cientes de que o autor não pode ser tomado exclusivamente em virtude seu apoio ao stalinismo, não nos furtamos a criticar sua atuação. O filósofo Hungaro Lukács, Ministro indicado pela URSS, em plena insurreição do proletariado húngaro opôs-se ferreamente a ruptura do operariado da Hungria com a URSS. Isso porque, segundo Lessa, o filósofo húngaro entedia a defesa das teses de Stalin do “‘socialismo em um só país’ e [a] defesa do modelo soviético como um passo efetivo na direção da sociedade comunista” (p. 1). De Lukács confira Conversando com Lukács, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1969, e Pensamento Vivido, São Paulo, Ad Hominen, 1999. A tese do socialismo em um só país é eminentemente antimarxista, Marx e Engels passaram a vida toda afirmando que o socialismo só seria possível em âmbito mundial, assim, fundaram a primeira Internacional Comunista. Após a morte de Marx, Engels fundará a segunda Internacional Comunista, Lenin e Trotsky fundarão a terceira Internacional Comunista, que será dissolvida por Stalin. Será Trotsky quem fundará a Quarta Internacional Comunista em 1938. Sobre a relação entre Lukács e a ordem política do stalinismo, embora este não seja propriamente o campo de reflexão do autor, a questão acaba sendo colocada mesmo que de forma introdutória, confira Sergio Lessa Lukács e a ontologia: uma introdução. Disponível no site: http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/05/out5_06.pdf. Ver também, mais focado neste aspecto, Edison Salles Lukács e o stalinismo. In: Revista Iskra. 2008.
[4]              Confira: O possível e o necessário: as estratégias das esquerdas. Disponível no site: http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/03/out3_07.pdf
[5]              Confira: Por um novo internacionalismo. Disponível no site: http://www.pucsp.br/neils/downloads/v5_artigo_michael.pdf
[6]              Confira: A natureza social da ex-União Soviética - Atualidade de uma polêmica. Disponível no site: http://www.revistaoutubro.com.br/edicoes/01/out01_07.pdf
[8]              Veja as reportagens: http://www.youtube.com/?gl=BR&hl=pt

 
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