Carta de Convite ao Partido Comunista Alemão (Spartakusbund)
ao 1º Congresso da Internacional
Caros camaradas! Os partidos e organizações abaixo assinados
consideraram que a convocação do primeiro Congresso da nova Internacional
revolucionária é de uma necessidade urgente. Durante a guerra e a revolução,
manifestou-se não apenas a falência completa dos antigos partidos socialistas e
social-democratas e ao mesmo tempo da Segunda Internacional, não apenas a
incapacidade dos elementos intermediários da antiga social-democracia (dita
“Centro”) para a ação revolucionária efetiva, mas atualmente vêem-se desenhar
contornos da verdadeira Internacional revolucionária. O movimento ascendente
extremamente rápido da revolução mundial propondo constantemente novos
problemas, o perigo de sufocação desta revolução pela aliança dos países
capitalistas contra a revolução se unindo sob a bandeira hipócrita da
“Sociedade das Nações”, as tentativas dos partidos social-traidores de se unir
e ajudar seus governos a trair a classe operária pela negociação de uma
“anistia” recíproca; enfim, a experiência revolucionária extremamente rica já
adquirida e a internacionalização de todo o movimento revolucionário – todas essas circunstâncias nos obrigam a
tomar a iniciativa de colocar na pauta da discussão a questão da convocação de
um Congresso internacional dos partidos proletários revolucionários.
I – OBJETIVOS E A TÁTICA
O reconhecimento dos parágrafos seguintes, instituídos aqui
como programa e elaborados com base nos programas do Spartakusbund da Alemanha
e do Partido Comunista (bolchevique) da Rússia deve, a nosso ver, servir de
base para a nova Internacional.
1 – O período atual é de decomposição e ruína de todo o
sistema capitalista mundial e ele será a destruição da civilização européia em
geral, se não destruir o capitalismo com suas contradições insolúveis.
2 – A tarefa do proletariado consiste, presentemente, em
tomar o poder de Estado. A tomada do poder de Estado significa a destruição do
aparelho de Estado da burguesia e a organização de um novo aparelho de poder
proletário.
3 – O novo aparelho de poder deve representar a ditadura da
classe operária e em alguns lugares também a dos pequenos agricultores e
trabalhadores agrícolas, isto é, ela deve ser o instrumento de substituição
sistemática da classe exploradora por aquela que é hoje alvo de sua exploração.
Não a falsa democracia burguesa – esta forma hipócrita de dominação da oligarquia
financeira – com sua igualdade puramente formal, mas a democracia proletária,
com a possibilidade de realizar a liberdade das massas trabalhadoras; não o
parlamentarismo, mas auto-administração dessas massas por seus organismos
eleitos; não a burocracia capitalista, mas órgãos de administração criados
pelas próprias massas com a participação real dessas massas na administração do
país e no trabalho de edificação socialista – eis como deve ser o Estado
proletário. O poder dos conselhos operários ou das organizações operárias é a
sua forma concreta.
4 – A ditadura do proletariado deve ser a alavanca da
expropriação imediata do capital, da abolição da propriedade privada sobre os
meios de produção e da transformação dessa propriedade em propriedade popular.
A socialização (por socialização entende-se aqui a abolição
da propriedade privada que é remetida ao Estado proletário e à administração
socialista da classe operária) da grande indústria e dos bancos, seus centros
de organização; o confisco das terras dos grandes proprietários e a
socialização da produção agrícola capitalista; a monopolização do comércio; a
socialização dos grandes imóveis nas cidades e no campo; a introdução da
administração operária e a centralização das funções econômicas nas mãos de organismos
emanados da ditadura do proletariado – eis os problemas essenciais de hoje.
5 – Para a segurança da revolução socialista, para sua
defesa contra os inimigos internos e externos, para a ajuda às outras frações
nacionais do proletariado em luta, etc... o desarmamento completo da burguesia
e seus agentes, e o armamento geral do proletariado são necessários.
6 – A situação mundial exige atualmente o contato mais
estreito entre os diferentes partidos do proletariado revolucionário e a união
completa dos países nos quais a revolução socialista triunfou.
7 – O método fundamental da luta é a ação de massa do
proletariado e compreende a luta aberta e armada contra o poder de Estado do
capital.
II – RELAÇÕES COM OS PARTIDOS “SOCIALISTAS”
8 – A II Internacional se dividiu em três grupos principais:
os social-patriotas declarados que, durante toda a guerra imperialista dos anos
de 1.914-1.918, sustentaram sua própria burguesia e transformaram a classe
operária em carrasco da revolução internacional; o “centro” cujo dirigente
teórico atualmente é Kautsky, que representa uma organização de elementos
constantemente oscilantes, incapazes de seguir uma linha determinada,
constituindo-se, muitas vezes em verdadeiros traidores; e, enfim, a ala
esquerda revolucionária.
9 – Com relação aos social-patriotas que, por toda parte,
nos momentos críticos, se recusaram a pegar em armas para a revolução
proletária, só a luta implacável é possível. Com relação ao “centro” – a tática
de esgotamento dos elementos revolucionários, crítica implacável e
desmascaramento dos chefes. Em certa etapa do desenvolvimento, a separação
organizativa dos elementos do centro é absolutamente necessária.
10 – Por outro lado, é necessário a formação de um bloco com
esses elementos do movimento revolucionário que, não tendo pertencido outrora
ao partido socialista, se colocam agora no conjunto sobre o terreno da ditadura
do proletariado sob a forma do poder soviético. Estes são em primeira linha os
sindicalistas do movimento operário.
11 – Enfim, é necessário atrair todos os grupos e
organizações proletárias que, não estando abertamente vinculados à corrente
revolucionária de esquerda, manifestam muitas vezes em seu desenvolvimento uma
tendência nessa direção.
12 – Concretamente, nós propomos que participem do Congresso
os representantes dos seguintes partidos, tendências e grupos (os membros com
plenos direitos da Terceira Internacional serão outros e se colocarão
inteiramente sobre seu terreno):
1 – Spartakusbund (Alemanha); 2 – Partido Comunista
(Bolcheviques) (Rússia); 3 – Partido Comunista da Áustria alemão; 4 – Partido
Comunista da Hungria; 5 – Partido Comunista da Finlândia; 6 – Partido Comunista
Operário polonês; 7 – Partido Comunista da Estônia; 8 – Partido Comunista da
Letônia; 9 – Partido Comunista da Lituânia; 10 – Partido Comunista da Rússia
Branca; 11 – Partido Comunista da Ucrânia; 12 – Os elementos revolucionários do
Partido social-democrata tcheco; 13 – Partido social-democrata búlgaro
(restrito); 14 – P.s.-d. romeno; 15 – A ala esquerda do p.s.-d. sérvio; 16 – A
esquerda do Partido s.-d. sueco; 17 – Partido s.-d. norueguês; 18 – Pela
Dinamarca o grupo Klassemkampen; 19 – Partido Comunista holandês; 20 – Os
elementos revolucionários do partido operário belga; 21 e 22 – Os grupos e
organizações no interior do movimento socialista e sindicalista francês, que,
no conjunto, se solidarizam com Loriot; 23 – A esquerda s.-d. da Suíça; 24 – o
Partido Socialista italiano; 25 – Os elementos revolucionários do P.S.
espanhol; 26 – Os elementos de esquerda do Partido Socialista português; 27 –
Os partidos socialistas britânicos (sobretudo a corrente representada por Mac
Lean); 28 – S.L.P. (Inglaterra); 29 – I.W.W. (Inglaterra); 30 – I.W.
(Grã-Bretanha); 31 – Os elementos revolucionários da organizações operárias da
Irlanda; 32 – Os elementos revolucionários dos shop stewards (Grã-Bretanha); 33 – S.L.P. (América); 34 – Os
elementos de esquerda do P.S. da América (a tendência representada por Debs e a
Liga de Propaganda Socialista); 35 – I.W.W. (América); 36 – I.W.W. (Austrália);
37 – Workers International Industrial Union (América); 38 – Grupos socialistas
de Tóquio e Yokohama (representado pelo camarada Katayama); 39 – A
Internacional Socialista dos Jovens (representada pelo camarada Muzenberg).
III – A QUESTÃO DA ORGANIZAÇÃO E O NOME DO PARTIDO
13 – A base da Terceira Internacional é dada pelo fato de
que nas diferentes regiões da Europa já estão formados grupos e organizações de
camaradas de idéias, colocando-se sobre uma plataforma comum e empregando no
geral os mesmos métodos táticos. Trata-se em primeiro lugar dos espartaquistas
na Alemanha e dos partidos comunistas em muitos outros países.
14 – O Congresso deve criar, pela necessidade de uma ligação
permanente e de uma direção metódica do movimento, um órgão de luta conjunta,
centro da Internacional Comunista, subordinando os interesses do movimento de
cada país aos interesses comuns da revolução em escala internacional. As formas
concretas da organização, da representação, etc. serão elaboradas pelo
Congresso.
15 – O Congresso deverá tomar o nome de “Primeiro Congresso
da Internacional Comunista”, os diferentes partidos deverão ser seções desta.
Teoricamente Marx e Engels já achavam equivocado o nome “social-democrata”. O
desmoronamento vergonhoso da Internacional Social-democrata exige aqui também
uma separação. Enfim, o núcleo fundamental do grande movimento já está formado
por uma série de partidos que tomaram este nome.
Considerando o que foi dito, propomos a todas as
organizações e partidos irmãos colocar na ordem do dia a convocação do
congresso Comunista Internacional.
Saudações socialistas.
Comitê Central do
Partido Comunista Russo (Lênin, Trotsky).
Bureau Estrangeiro do
Partido Operário Comunista da Polônia (Karsky).
Bureau Estrangeiro do
Partido Operário Comunista da Hungria (Rudniansky).
Bureau Estrangeiro do
Partido Operário Comunista da Áustria alemã (Duda).
Bureau russo do Comitê
Central do Partido Comunista da Letônia (Rosing).
Comitê Central do
Partido Comunista da Finlândia (Sirola).
Comitê Executivo da
Federação social-democrata Revolucionária Balcânica (Ravovsky).
Pelo S.L.P. (América)
(Reinstein).
****
O convite acima
convocou os comunistas de todos os países para a conferência que deveria se
iniciar em Moscou, a 15 de fevereiro de 1.919. As grandes dificuldades de
circulação retardaram a inauguração. Ela só pôde acontecer no dia 2 de março. A
conferência foi aberta por Lênin, às dezoito horas. Adotou-se a língua alemã
para os debates, em outras circunstâncias falava-se russo, francês e inglês.
Como presidentes do
Congresso foram eleitos por unanimidade os seguintes camaradas: Lênin (Rússia),
Albert (Alemanha), Platten (Suíça), o quarto presidente foi eleito pela ordem
de inscrição pelos diversos países. O Congresso elegeu como secretário o
camarada Klinger.
A Comissão de mandatos
constatou a participação dos seguintes partidos e dividiu os votos:
PARTICIPANTES DO CONGRESSO DA INTERNACIONAL COMUNISTA DE
MOSCOU (2 a 6 de março de 1919)
Partido e Número de
votos
1 – Partido Comunista
Alemão (5)
2 – Partido Comunista
Russo (5)
3 – Partido Comunista
da Áustria alemã (3)
4 – Partido Comunista
Húngaro (3)
5 – S.-D. de esquerda
Sueca (3)
6 – P.S.-D. norueguês (3)
7 – P.S.-D. suíço (3)
8 – S.L.P. americano (5)
9 – Federação
Revolucionária Balcânica (Tchecoslováquia e PC romeno) (3)
10 – Partido Comunista
polonês (3)
11 – Partido Comunista
da Finlândia (3)
12 – Partido Comunista
ucraniano (3)
13 – Partido Comunista
da Letônia (1)
14 – Partido Comunista
branco-russo e lituano (1)
15 – Partido Comunista
da Estônia (1)
16 – Partido Comunista
armênio (1)
17 – Partido Comunista
da Volga alemã (1)
18 – Grupo Unificado
dos Povos da Rússia Oriental (1)
19 – Esquerda
Zimmerwaldense francesa (5)
VOTOS DELIBERATIVOS
20 – Partido Comunista
tcheco
21 – Partido Comunista
búlgaro
22 – Partido Comunista
dos países eslavos meridionais
23 – Partido Comunista
inglês
24 – Partido Comunista
francês
25 – P.S.-D. holandês
26 – Liga da
Propaganda Socialista da América
SEÇÕES DO BUREAU CENTRAL DOS PAÍSES ORIENTAIS
27 – Comunistas suíços
28 – Comunistas do
Turquestão
29 – Turco
30 – Georgiano
31 – Adzerbaidjano
32 – Persa
33 – Partido Operário
Socialista chinês
34 – União Operária da
Coréia
35 – Comissão de Zimmerwald
DISCURSO DE ABERTURA DE LÊNIN
Por solicitação do Comitê Central do Partido Comunista
russo, inauguro o primeiro Congresso Internacional. Antes de mais nada, pelo
que honrem a memória dos melhores representantes da III Internacional, Karl
Liebknecht e Rosa Luxemburgo.
Camaradas, nosso Congresso reveste-se de uma grande
importância na história mundial. Ele demonstra o fim de todas as ilusões da
democracia burguesa. A guerra civil se transformou num fato, não só na Rússia,
mas nos países capitalistas mais desenvolvidos, por exemplo a Alemanha.
O povo percebeu a grandeza e a importância desta luta.
Tratava-se de encontrar a forma prática quer permitisse ao proletariado exercer
sua dominação. Esta forma é o regime dos Sovietes com a ditadura do
proletariado. A ditadura do proletariado; essas palavras eram “latim” para as
massas até nossos dias. Agora, graças ao sistema dos Sovietes, esse latim se
traduziu para todas as línguas modernas; a forma prática da ditadura foi
encontrada pelas massas populares. Ela se tornou inteligível para a grande
massa de operários graças ao poder dos Sovietes na Rússia, aos espartaquistas
da Alemanha, às organizações análogas nos outros países, como Shop Stewards
Committes na Inglaterra. Tudo isso prova que a forma revolucionária da ditadura
do proletariado foi encontrada e que o proletariado está em ação para exercer
de fato sua dominação.
Camaradas! Penso que depois do que aconteceu na Rússia,
depois dos combates de janeiro na Alemanha, importa sobretudo observar que a
nova forma do movimento do proletariado se manifesta e se amplia também nos
outros países. Hoje, li num jornal inglês anti-socialista um telegrama
anunciando que o governo inglês recebeu o soviete de delegados operários de
Birmingham e prometeu-lhe reconhecer os Sovietes como organizações econômicas.
O sistema soviético conseguiu a vitória não apenas na Rússia atrasada, mas
também no país mais civilizado da Europa: a Alemanha, e no mais antigo país
capitalista: a Inglaterra.
A burguesia pode maltratar; pode também assassinar milhares
de operários – mas a vitória é nossa, a vitória da revolução comunista mundial
está assegurada.
Camaradas! Em nome do Comitê Central desejo cordialmente que
sejam bem-vindos.
TESES DE LÊNIN SOBRE A DEMOCRACIA BURGUESA E A DITADURA DO
PROLETARIADO
1 – O crescimento do movimento revolucionários proletário em
todos os países suscita os esforços convulsivos da burguesia e dos agentes que
ela possui nas organizações operárias para descobrir os argumentos
filosófico-políticos capazes de servir à defesa da dominação dos exploradores.
A condenação da ditadura e a defesa da democracia figuram entre esses
argumentos. A mentira e a hipocrisia de tal argumentação repetida à saciedade
na imprensa capitalista e na conferência da Internacional Amarela de Berna em
fevereiro de 1919 são evidentes para todos os que procuram não trair os
princípios fundamentais do socialismo.
2 – Em primeiro lugar, este argumento se apóia nas
concepções de “democracia geral” e de “ditadura em geral”, sem precisar a
questão da classe. Colocar assim o problema, fora da questão das classes,
pretendendo considerar o conjunto da nação, é zombar da doutrina fundamental do
socialismo, a saber a doutrina da luta de classes, aceita nas palavras, mas
esquecida na prática pelos socialistas que passaram para o campo da burguesia.
Pois em nenhum país civilizado, em nenhum país capitalista, existe democracia
em geral: existe apenas democracia burguesa. Não se trata mais da ditadura
exercida pela classe oprimida, isto é, pelo proletariado, sobre os opressores e
os exploradores, sobre a classe burguesa, com o objetivo de triunfar sobre a
resistência dos exploradores, sobre a classe burguesa, com o objetivo de
triunfar sobre a resistência dos exploradores lutando por seu poder.
3 – A história ensina que nenhuma classe oprimida jamais
chegou ao poder, e não pode fazê-lo sem passar um período de ditadura durante o
qual se ampara no poder político e abate pela força a resistência desesperada,
exasperada, que não se detém diante de nenhum crime, que sempre opuseram os
exploradores. A burguesia, cuja dominação é sustentada hoje pelos socialistas
que peroram sobre a ditadura em geral
e que se debatem a favor da democracia em
geral, conquistou o poder nos países civilizados ao preço de uma série de
insurreições, guerras civis, aniquilação pela força – de reis, nobres,
proprietários de escravos -, e pela repressão das tentativas de restauração.
Milhares de vezes os socialistas de todos os países
explicaram ao povo o caráter de classe dessas revoluções burguesas em seus
livros, brochuras, resoluções de seus congressos, discursos de propaganda. Eis
porque esta defesa atual da democracia burguesa em meio a discursos sobre a
“ditadura em geral”, são uma verdadeira traição ao socialismo, uma deserção
caracterizada em proveito da burguesia, uma negação do direito do proletariado
à sua revolução proletária. É defender o reformismo burguês, precisamente no
momento em que ele fracassou no mundo inteiro, quando a guerra criou um estado
de coisas revolucionário.
4 – Todos os socialistas, demonstrando o caráter de classe
da civilização burguesa, da democracia burguesa, do parlamento burguês,
expressaram a idéia já formulada com o máximo de exatidão científica por Marx e
Engels que a mais democrática das repúblicas burguesas não sabe ser outra coisa
que uma máquina de oprimir a classe operária à mercê da burguesia, a massa de
trabalhadores à mercê de um punhado de capitalistas. Não um único
revolucionários, um único marxista, entre os que gritam hoje contra a ditadura
e pela democracia que não tenha jurado por seus deuses diante dos operários que
aceitou essa verdade fundamental do socialismo; e agora que o proletariado
revolucionário está em fermentação e em movimento, que se encaminha para
destruir esta máquina de opressão e para conquistar a ditadura do proletariado,
esses traidores socialistas desejam fazer crer que a burguesia deu aos
trabalhadores a “democracia pura”, como se a burguesia tivesse renunciado a
toda resistência e estivesse prestes a obedecer à maioria dos trabalhadores,
como se, numa república democrática, não houvesse uma máquina governamental
feita para operar o esmagamento do trabalho pelo capital.
5 – A Comuna de Paris, que todos os que desejam passar por
socialistas honram em palavras, porque sabem que as massas operárias têm uma
viva e sincera simpatia por ela, mostrou com particular nitidez a relatividade
histórica, o valor limitado do parlamentarismo burguês e da democracia
burguesa, instituição que significaram um grande progresso em relação à Idade Média,
mas que exigem necessariamente uma reforma fundamental à época da revolução
proletária. Marx, que apreciou melhor que ninguém a importância histórica da
Comuna, provou, analisando o caráter de exploração da democracia e do
parlamentarismo burguês, que este é o regime sob o qual as classes oprimidas
ganham o direito de decidir num único dia para um período de vários anos quem
será o representante das classes possuidoras que representará e oprimirá o povo
no Parlamento. E esta é a hora em que o movimento sovietista, abarcando o mundo
inteiro, continua aos olhos de todos a obra da Comuna, que os traidores do
socialismo esquecem repetindo as velhas futilidades burguesas sobre a
“democracia em geral”. A Comuna não foi portanto uma instituição parlamentar.
6 – O valor da Comuna consiste em que ela tentou
desarticular, destruir completamente o aparelho governamental burguês na
administração, na justiça, no exército, na polícia, substituindo-o pela
organização autônoma das massas operárias, sem reconhecer qualquer distinção
entre os poderes legislativo e executivo.
Todas as democracias burguesas contemporâneas, sem excetuar
a República alemã que os traidores do socialismo chamam proletária apesar da
verdade, conservam o velho aparelho governamental. Assim, se confirma mais uma
vez, de forma absolutamente evidente, que todos esses clamores em favor da
democracia não servem, na realidade, senão para defender a burguesia e seus
privilégios de classe exploradora.
7 – A liberdade de reunião pode ser tomada como exemplo dos
princípios da democracia pura. Todo operário consciente que não rompeu com sua
classe compreenderá de imediato que seria insensato permitir a liberdade de
reunião aos exploradores, no momento e nas circunstâncias em que os
exploradores se opõem à sua desgraça e defendem seus privilégios. A burguesia,
quando era revolucionária, na Inglaterra em 1649 ou na França em 1793, jamais
concedeu a liberdade de reunião aos monarquistas ou aos nobres que chamaram
tropas estrangeiras e se “reuniram” para organizar as tentativas de
restauração. Se a burguesia de hoje, que há muito tempo se tornou reacionária,
exige do proletariado que ele garanta por antecipação, apesar de toda
resistência que farão os capitalistas à sua expropriação, a liberdade de
reunião para os exploradores, os operários só poderão rir da hipocrisia dessa
burguesia.
De outra parte, os operários sabem muito bem que a liberdade
de reunião, mesmo na república burguesa mais democrática, é uma frase vazia de
sentido, pois os ricos possuem os melhores prédios públicos e privados, assim
como o ócio necessário, para se reunirem sob a proteção deste aparelho
governamental burguês. Os proletários da cidade e do campo e os pequenos
agricultores, isto é, a imensa maioria da população, não possuem nem um nem outro.
Longe disso, a igualdade, isto é, a democracia pura, é um engodo. Para
conquistar a verdadeira legalidade, para realizar verdadeiramente a democracia
em proveito dos trabalhadores, é necessário, preliminarmente, dar tempo livre
aos trabalhadores; é necessário que a sua liberdade de reunião seja protegida
por operários armados e não por oficiais provincianos ou capitalistas com
soldados postados para sua devoção.
Só então se pode, sem zombar dos operários, dos
trabalhadores, falar de liberdade de reunião e igualdade. Ora, quem pode
executar essa mudança, a não ser a vanguarda dos trabalhadores, o proletariado,
pela derrubada dos exploradores e da burguesia?
8 – A liberdade de imprensa é igualmente uma das grandes
divisas da democracia pura. Mais uma vez, os operários sabem que os socialistas
de todos os países reconheceram milhões de vezes que esta liberdade é uma
mentira, tanto que as melhores impressores e os maiores estoques de papel são
açambarcados pelos capitalistas, tanto mais subsiste o poder do capital no
mundo inteiro com muito mais clareza, nitidez e cinismo quanto mais
desenvolvido é o regime democrático e republicano, como por exemplo na América.
A fim de conquistar a verdadeira igualdade e a verdadeira democracia no
interesse dos trabalhadores, dos operários e dos camponeses, é preciso começar
por tirar do capital a possibilidade de alugar todos os escritores, de comprar
e corromper os jornais e as editoras, e por isso é necessário destruir o jugo
do capital, destruir os exploradores, quebrar sua resistência. Os capitalistas
chamam liberdade de imprensa à faculdade dos ricos corromperem a imprensa, à
faculdade de utilizar sua riqueza para fabricar e sustentar uma suposta opinião
pública. Os defensores da “democracia pura” são na realidade os defensores do
sistema vil e corrompido da dominação dos ricos sobre a instrução das massas;
eles são os que enganam, o povo e o desviam com belas frases mentirosas desta
necessidade histórica de libertar a imprensa de sua submissão ao capital.
Verdadeira liberdade ou igualdade só existirá no regime
edificado pelos comunistas, no qual será materialmente impossível submeter a
imprensa direta ou indiretamente ao poder do dinheiro, no qual nada impedirá
cada trabalhador, ou cada grupo de trabalhadores, de possuir ou usar, em total
igualdade, o direito de se servir das máquinas e do papel do Estado.
A história do século XIX e do século XX nos mostrou, mesmo
antes da guerra, o que era a famosa democracia pura sob o regime capitalista.
Os marxistas sempre repetiram que quanto mais desenvolvida era a democracia
pura, quanto mais pura era ela, tanto mais devia estar viva, encarniçada e
impiedosa a luta de classes e mais nítido o domínio do capital e a ditadura da
burguesia. O caso Dreyfus na França republicana, as violências sangrentas dos
destacamentos assalariados e armados pelos capitalistas contra os grevistas na
república livre e democrática da América, estes milhares de outros fatos que em
vão a burguesia tenta esconder demonstram que é precisamente nas repúblicas
mais democráticas que reina na realidade o terror e a ditadura da burguesia,
terror e ditadura que aparecem abertamente toda vez que os exploradores supõem
que o poder do capital começa a ser abalado.
9 – A guerra imperialista de 1914-1918 demonstrou definitivamente,
mesmo aos olhos dos operários não esclarecidos, o verdadeiro caráter da
democracia burguesa, mesmo nas repúblicas mais livres – como característica da
ditadura burguesa. Para enriquecer um grupo alemão ou inglês de milionários ou
de miliardários foram massacrados dezenas de milhares de homens e foi
instituída a ditadura militar da burguesia nas repúblicas mais livres. Esta
ditadura militar persiste, mesmo após a derrota da Alemanha, nos países da
Entente. A guerra abriu os olhos dos trabalhadores, arrancou os falsos
atrativos da democracia burguesa, mostrou ao povo inteiro o abismo da
especulação e do lucro durante a guerra. Em nome da liberdade e da igualdade, a
burguesia fez esta guerra; em nome da liberdade e da igualdade os fornecedores
de armas acumularam riquezas inauditas. Todos os esforços da Internacional
amarela de Berna não conseguiram esconder das massas o caráter de exploração
atualmente manifesto da liberdade burguesa, da democracia burguesa.
10 – No país capitalista mais desenvolvido da Europa, a
Alemanha, os primeiros meses desta completa liberdade republicana, ocasionada
pela derrota da Alemanha imperialista, revelou aos operários alemães e ao mundo
inteiro o caráter de classe da república democrática burguesa. O assassinato de
Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo é um fato de importância histórica universal,
não só pela morte trágica de homens e dos melhores dirigentes da verdadeira
internacional proletária e comunista, mas também porque ele desnudou no Estado
mais avançado da Europa e, pode-se dizer, do mundo inteiro, a verdadeira
essência do regime burguês. Se pessoas em estado de prisão, isto é, presas pelo
poder governamental dos social-patriotas, sob sua guarda, puderam ser mortas
impunemente por oficiais e capitalistas, é porque a república democrática na
qual tal fato foi possível é apenas a ditadura da burguesia. Os que expressam
sua indignação pelo assassinato de Karl Liebknecht e Rosa Luxemburgo, mas não
compreendem esta verdade, mostram com isso sua ignorância ou sua hipocrisia. A
liberdade, numa das mais livres e avançadas repúblicas do mundo, na república
alemão, é a liberdade de matar impunemente os dirigentes do proletariado em
estado de prisão, e não pode ser de outra forma, pois o desenvolvimento do
princípio democrático, longe de enfraquecer, superexcita a luta de classes que,
por causa das repercussões e influências da guerra, chegou a seu ponto de
ebulição.
Em todo o mundo civilizado, os bolcheviques são hoje
expulsos, perseguidos e aprisionados. Na Suíça, uma da repúblicas mais livres,
massacram os bolcheviques. Na América também acontece a mesma coisa. Do ponto
de vista da democracia em geral ou da democracia pura, é de fato ridículo que
os Estados civilizados e avançados, democráticos, armados até os dentes, temam a
presença de algumas dezenas de homens vindos da Rússia atrasada, faminta,
arruinada, desta Rússia que, em suas dezenas de milhões de exemplares, os
jornais burgueses chama de selvagem, criminosa, etc. É claro que as condições
sociais nas quais uma contradição tão gritante pôde nascer realizam na
realidade a ditadura da burguesia.
11 – Neste estado de coisas, a ditadura do proletariado não
é apenas absolutamente legítima, enquanto instrumento adequado à destruição dos
exploradores e ao esmagamento de sua resistência, mas também absolutamente
indispensável para toda a massa trabalhadora, como o único meio de defesa
contra a ditadura da burguesia que causou a guerra e prepara novas guerras.
O ponto mais importante, que os socialistas não compreendem
e que constitui sua miopia teórica, seu apego aos preceitos burgueses e traição
política para com o proletariado, é que na sociedade burguesa, quando se
acentua a luta de classes, não há meio-termo entre a ditadura da burguesia e a
ditadura do proletariado. Todos os sonhos de uma solução intermediária são
apenas lamentações reacionárias de pequeno-burgueses.
A prova disso é apresentada pela experiência do
desenvolvimento da democracia burguesa e do movimento operário há mais de um
século em todos os países civilizados e em particular pela experiência dos
últimos cinco anos. É também verdade que ensina toda a ciência da economia
política, todo o conteúdo do marxismo que explica por qual necessidade
econômica nasce a ditadura da burguesia e como ela só pode ser substituída por
uma classe desenvolvida, multiplicada, fortalecida e tornada coerente com o
desenvolvimento do próprio capitalismo, isto é, a classe dos proletários.
12 – Um outro erro teórico e político dos socialistas
consiste em não compreenderem que as formas da democracia mudaram
constantemente ao longo dos séculos, desde seus primeiros germes na
Antiguidade, à medida que uma classe dominante era substituída por outra. Nas
antigas repúblicas da Grécia, nas cidades da Idade Média, nos países
capitalistas civilizados, a democracia assume formas diversas e um grau de
adaptação diferente. Seria a maior tolice crer que a revolução mais profunda da
história da humanidade, a passagem do poder, pela primeira vez no mundo, de uma
minoria de exploradores para maioria dos explorados, possa se produzir nos
velhos marcos da democracia burguesa e parlamentar, sem rupturas claras, sem
que se criem novas instituições encarnando as novas condições de vida, etc.
13 – A ditadura do proletariado assemelha-se à ditadura das
outras classes, porque ela é provocada, como toda espécie de ditadura, pela
necessidade de reprimir violentamente a resistência da classe que perde o poder
político. O ponto fundamental que separa a ditadura do proletariado da de
outras classes, da ditadura de elementos feudais na Idade Média, da ditadura da
burguesia em todos os países civilizados, consiste em que a ditadura dos
elementos feudais e da burguesia era o esmagamento violente da resistência da
imensa maioria da população, da classe trabalhadora, enquanto que a ditadura do
proletariado é o esmagamento pela força da resistência dos exploradores, isto
é, de uma ínfima minoria da população: os proprietários dos meios de produção e
os capitalistas.
Acrescente-se ainda que a ditadura do proletariado acarreta
não apenas uma modificação das formas e instituições democráticas em geral, mas
também uma modificação tal que atinge toda uma extensão até então desconhecida
do princípio democrático em favor das classes oprimidas pelo capitalismo, em
favor das classes trabalhadoras.
Com efeito, a forma da ditadura do proletariado, já
elaborada de fato, isto é, o poder dos Sovietes na Rússia, o “Raete” Sistema na
Alemanha, os “Shop Stewards Committes” e outras instituições análogas em outros
países, significa precisamente e realiza para classe trabalhadora, vale dizer,
para a imensa maioria da população, um rápido aproveitamento dos direitos e
liberdades democráticas como jamais houve, mesmo nas melhores e mais
democráticas repúblicas burguesas.
A essência do poder dos Sovietes consiste em que a base
constante e única de todo o poder governamental é a organização das massas
antes oprimidas pelos capitalistas, isto é, os operários e os semiproletários
(pequenos proprietários de terras que não exploram o trabalho de outrem e que
constantemente têm necessidade de vender parte de sua força de trabalho). Essas
são as massas que, mesmo nas repúblicas burguesas mais democráticas, gozando da
igualdade segundo a lei, estão isoladas na prática pela tradição e pelas
manobras de toda participação na vida política, do uso de direitos e liberdades
democráticas e que agora são chamadas a tomar parte, de forma decisiva, na
gestão democrática do Estado.
14 – A igualdade de todos os cidadãos, independentemente de
sexo, religião, raça, nacionalidade, que a democracia burguesa sempre e em
todos os lugares promete mas não executa, dada a dominação do capitalismo, o
poder dos Sovietes ou a ditadura do proletariado realiza imediata e
completamente, pois só ela tem condições de realizar o poder dos operários que
não estão interessados na propriedade privada dos meios de produção, mas na
luta por sua divisão e distribuição.
15 – a velha democracia, vale dizer, a democracia burguesa e
o parlamentarismo, está organizada de tal maneira que as massas operárias estão
cada vez mais distantes do aparelho governamental. O poder dos Sovietes, isto
é, a ditadura do proletariado, é, ao contrário, constituída de forma a
aproximar as massas trabalhadoras do aparelho governamental. A reunião dos
poderes legislativo e executivo atendem a este objetivo na organização
sovietista do Estado, assim com a substituição das circunscrições territoriais
pelas unidades de trabalho, como nas usinas e fábricas.
17 – Não é somente sob a monarquia que o exército é um
instrumento de opressão. Ele o é também em todas as repúblicas burguesas, mesmo
as mais democráticas. Assim, o poder dos Sovietes, organização permanente das
classes oprimidas pelo capitalismo, é capaz de suprimir a submissão do exército
ao comando burguês e fundir realmente o proletariado com o exército, realizando
o armamento do proletariado e o desarmamento da burguesia, sem o que é
impossível o triunfo do socialismo.
18 – Só a organização sovietista do Estado pode realmente
quebrar de imediato e destruir definitivamente o velho aparelho administrativo
e judiciário burguês que é conservado, e deve inevitavelmente ser conservado
sob o capitalismo, mesmo nas repúblicas mais democráticas, uma vez que ele é de
fato o maior empecilho à prática dos princípios democráticos em favor dos
operários e dos trabalhadores. A Comuna de Paris deu, nesse sentido, primeiro
passo de uma importância histórica universal; o poder dos Sovietes deu o segundo.
19 – O aniquilamento do poder governamental é o objetivo a
que se propõem todos os socialistas. Sem a realização desse objetivo, a
verdadeira democracia, isto é, a igualdade e a liberdade, é irrealizável. Ora,
o único meio de chegar a isso é a democracia sovietista ou proletária, pois
chamando as organizações das massas trabalhadoras a tomar uma parte real e
obrigatória no governo, ela começa a preparar o desaparecimento completo de
todo governo.
20 – A completa bancarrota dos socialistas reunidos em Berna,
sua incompreensão absoluta da nova democracia proletária, aparecem
particularmente no que segue: em 10 de fevereiro de 1919, Bratin encerrava em
Berna a Conferência Internacional da Internacional amarela. Em 11 de fevereiro,
em Berlim, era publicada no jornal de seus correligionários Die Freheit uma proclamação do partido
dos Independentes ao proletariado. Nesta proclamação é reconhecido o caráter
burguês do governo de Scheidemann, que é reprovado por seu desejo de abolir os
Sovietes, chamados de mensageiros e defensores da Revolução, é exigida a sua
legalização e a concessão de direitos políticos, o direito de voto contra s
decisões da Assembléia Constituinte, servindo o referendum de julgamento em
última instância.
Esta proclamação denota a completa falência dos teóricos que
defendiam a democracia sem compreender seu caráter burguês. Esta tentativa
ridícula de combinar o sistema dos Sovietes, isto é, a ditadura do
proletariado, com a Assembléia Constituinte, isto é, a ditadura da burguesia,
desvela até a raiz, ao mesmo tempo, a pobreza de pensamento dos socialistas
amarelos e dos social-democratas, seu caráter reacionário de pequeno-burgueses
e suas frouxas concessões diante da força irresistivelmente crescente da nova
democracia proletária.
21 – Condenando o bolchevismo, a maioria da Internacional de
Berna, que não ousou votar formalmente uma ordem do dia correspondente ao seu
pensamento por medo das massas operárias, agiu justamente segundo seu ponto de
vista de classe. Esta maioria é totalmente solidária aos mencheviques e
socialistas revolucionários russos, assim como aos Scheidemann na Alemanha.
Os mencheviques e socialistas revolucionários russos,
queixando-se de serem perseguidos pelos bolcheviques, tentam esconder o fato de
que essas perseguições são causadas pela posição assumida pelos mencheviques e
os socialistas revolucionários na guerra civil ao lado da burguesia contra os
operários.
É, portanto, perfeitamente natural que a maioria dos
participantes da Internacional de Berna tenha se pronunciado contra os
bolcheviques; aqui e ali é evidente não tanto o desejo de defender a democracia
pura, mas o desejo de se defenderem perante os que sentem e sabem que na guerra
civil eles estão ao lado da burguesia e contra o proletariado.
Eis porque, do ponto de vista da luta de classes, é
impossível não reconhecer a justeza da decisão da maioria da Internacional
amarela. O proletariado não deve temer a verdade, mas olhá-la de frente e tirar
as conclusões que dela decorrem.
Com base nessas teses, e considerando os relatos dos
delegados dos diferentes países, o Congresso da Internacional Comunista declara
que a tarefa principal dos partidos comunistas, nas diversas regiões onde o
poder dos Sovietes ainda não está constituído, consiste em:
1º - Esclarecer amplamente as massas operárias sobre a
significação histórica e a necessidade política e prática de uma nova
democracia proletária, que deve ocupar o lugar da democracia burguesa no
parlamento;
2º - Ampliar e organizar Sovietes em todos os setores da
indústria, exército, marinha, entre os operários agrícolas e os pequenos
camponeses;
3º - Conquistar, no interior dos Sovietes, uma maioria
comunista segura e consciente.
DISCURSO DE LÊNIN SOBRE SUAS TESES
Camaradas,
Gostaria de acrescentar algumas palavras aos dois últimos
pontos. Penso que os camaradas que nos devem fazer relato sobre a Conferência
de Berna nos darão mais detalhes.
Nenhuma palavra foi dita sobre a significação do poder
soviético durante toda a Conferência de Berna. Há dois anos nós discutíamos
esta questão na Rússia. Já em abril de 1917, no congresso do partido, colocamos
esta questão do ponto de vista teórico e político: “O que é o poder soviético,
qual é sua substância, qual é sua significação histórica?” Durante 2 anos
estudamos esta questão e no congresso do partido adotamos uma resolução a esse
respeito.
A Freheit, de
Berlim, publicou em 11 de fevereiro um chamado ao proletariado alemão assinado
não só pelos dirigentes social-democratas independentes da Alemanha, mas por
todos os membros da fração dos independentes. Em agosto de 1918, Kautsky o
maior teórico dos independentes, escreveu em sua brochura, A Ditadura do Proletariado, que ele era partidário da democracia e
dos órgãos soviéticos, mas que os Sovietes deveriam ter apenas um caráter econômico
e não deveriam ser reconhecidos como organizações do Estado. Kautsky repete
essa afirmação nos números da Freheit de 11 de novembro de 12 de janeiro. Em 9
de fevereiro aparece um artigo de Rudolph Hilferding, que é igualmente
considerado um dos teóricos mais autorizados da II Internacional. Ele propõe
fundir juridicamente, isto é, pela via legislativa, os dois sistemas – o dos
Sovietes e o da Assembléia Nacional. Era 9 de fevereiro. Esta segunda
proposição foi adotada por todo o Partido dos Independentes e publicada sob a
forma de conclamação.
Apesar da Assembléia Nacional já existir de fato, mesmo
depois da “democracia pura” tomar corpo e realidade, depois que os maiores
teóricos social-democratas independentes explicaram que as organizações
soviéticas não saberiam ser organizações do Estado, depois e apesar de tudo
isso, há ainda hesitações. Isso prova que esses senhores realmente não
compreenderam nada do novo movimento e de suas condições de luta. Mas isso
prova, além do mais, outra coisa, a saber que deve haver circunstância, motivos
determinando tais hesitações. Quando depois de todos esses fatos, depois de
dois anos de revolução vitoriosa na Rússia, nos propõem semelhantes resoluções
como tendo sido adotadas na Conferência de Berna, resoluções nas quais nada é
dito dos Sovietes e sua significação, Conferência na qual nenhum delegado
sequer balbuciou uma palavra dentro de um discurso qualquer sobre essas
questões, nós temos o direito de afirmar que todos esses senhores estão mortos
para nós como socialistas e como teóricos.
Mas, de fato, do ponto de vista político, isso prova,
camaradas, que um grande progresso se realiza nas massas, pois esses
independentes,, teoricamente e por princípio adversários dessas organizações do
Estado, nos propõem subitamente tamanha tolice como a fusão “pacífica” da
Assembléia Nacional com o sistema dos Sovietes, isto é, a fusão da ditadura da
burguesia com a ditadura do proletariado. Vê-se a que ponto essas pessoas
caíram política e teoricamente e que enorme transformação se produziu nas
massas. As massas atrasadas do proletariado alemão vêm a nós, digo, elas vieram
a nós. Assim, a significação do partido independente social-democrata alemão, a
melhor parte do ponto de vista teórico e socialista é igual a zero; entretanto ela
conserva uma certa importância no sentido em que esses elementos nos servem
como indicação do estado de espírito do setor mais atrasado do proletariado.
Segundo meu ponto de vista, esta é a enorme importância histórica desta
conferência. Vimos alguma coisa análoga durante nossa revolução: nossos
mencheviques seguiram passo a passo, por assim dizer, a mesma evolução que os
teóricos dos independentes da Alemanha. Quando eles tinham a maioria nos
Sovietes, eles eram pelos Sovietes. Ouviam-se somente os gritos de “Viva os
Sovietes!" “Para os Sovietes!”, “Os Sovietes e a democracia
revolucionária!”. Mas quando nós tivemos a maioria nos Sovietes, nós
bolcheviques, eles entoaram outros cantos: “Os Sovietes, declararam eles, não
devem existir ao mesmo tempo que a Assembléia Constituinte”: e inclusive certos
teóricos mencheviques propuseram qualquer coisa análoga à fusão do sistema dos
Sovietes com a Assembléia Constituinte e sua inclusão nas organizações do
Estado. Uma vez mais surgiu que o curso geral da revolução proletária é
idêntico no mundo inteiro. Primeiro constituição espontânea, elementar, dos
Sovietes, depois sua ampliação e desenvolvimento, em seguida surgimento na
prática da questão: Sovietes ou Assembléia Nacional Constituinte ou então
parlamentarismo burguês, confusão absoluta entre os dirigentes e enfim
revolução proletária. Parece-me, entretanto, que depois de dois anos de
revolução nós não devemos colocar a questão de tal maneira, mas tomar
resoluções concretas dado que a propagação do sistema dos Sovietes é para nós,
e particularmente para a maioria dos países da Europa Ocidental, a mais
essencial das tarefas. O estrangeiro que nunca ouviu falar do bolchevismo
dificilmente terá uma opinião própria sobre nossas discussões. Tudo o que os
bolcheviques afirmam, os mencheviques contradizem e vice-versa. Certamente não
será de outra forma ao longo da luta, pois é extremamente importante que a
última conferência do partido menchevique, realizada em dezembro de 1918, tenha
adotado uma longa e detalhada resolução inteiramente publicada no Jornal dos
Tipógrafos, órgão menchevique. Nesta resolução os próprios mencheviques expõem
brevemente o histórico da luta de classes e da guerra civil. A resolução diz
que os mencheviques condenam os grupos do partido aliado das classe possuidoras
do Ural e no Midi, na Criméia e na Geórgia e indicam com precisão todas essas
regiões. Os grupos do partido menchevique que, aliados às classes possuidoras,
combateram contra o poder soviético são agora condenados nesta resolução, mas o
último ponto condena igualmente aqueles que passaram para o lado dos
comunistas. Mais adiante dizem que os mencheviques são obrigados a reconhecer
que não ponto de unidade em seu partido e que se jogam ou para o lado da
burguesia ou para o lado do proletariado. Uma grande parte dos mencheviques
passou para o lado da burguesia e lutou contra nós durante a guerra civil.
Naturalmente nós perseguimos os mencheviques, inclusive os fuzilamos, pois na
guerra contra nós, eles combatem nosso exército vermelho e fuzilam nossos
oficiais vermelhos. À burguesia que nos declarou guerra, nós respondemos com a
guerra proletária: não pode haver outra saída. Então, do ponto de vista
político, tudo isso é apenas hipocrisia menchevique. Historicamente é
incompreensível que, na Conferência de Berna, pessoas que não são oficialmente
reconhecidas como loucas, pudessem, sob a ordem dos mencheviques e dos
socialistas revolucionários, falar da luta dos bolcheviques contra eles calando
sobre sua luta em comum com a burguesia contra o proletariado.
Todos eles nos atacam com obstinação porque nós os
perseguimos; isto é exato, mas eles se reservam de falar um palavra que seja
sobre a posição que tomaram na guerra civil. Penso que é conveniente retomar,
para que conste em ata, o texto completo da resolução e peço aos camaradas
estrangeiros que prestem toda a atenção, pois é um documento histórico no qual
a questão está perfeitamente colocada e que fornece a melhor documentação para
a apreciação da discussão entre as diversas tendências “socialistas” na Rússia.
Entre o proletariado e a burguesia existe uma classe de pessoas que se inclinam
ora para um lado, ora para outro. Sempre foi assim em todas as revoluções, e é
absolutamente impossível que na sociedade capitalista, em que o proletariado e
a burguesia constituem dois campos inimigos e opostos não existem entre eles
camadas sociais intermediárias. Historicamente a existência desses elementos
flutuantes é inevitável; infelizmente esses elementos que não sabem de que lado
combaterão amanhã existirão por um tempo ainda relativamente grande.
Desejo fazer uma proposição concreta no sentido de se adotar
uma resolução na qual três pontos devem ser especialmente sublinhados:
1 – Uma das tarefas mais importantes para os camaradas dos
países da Europa Ocidental consiste em explicar às massas a significação, a
importância e a necessidade dos Sovietes. Constata-se sobre esta questão uma
compreensão ainda insuficiente. Se é verdade que Kautsky e Hilferding faliram
como teóricos, os últimos artigos da Freiheit provam entretanto que eles
souberam expressar exatamente o estado de espírito dos partidos atrasados do
proletariado alemão. Aconteceu o mesmo entre nós: durante os oito primeiros
anos da revolução russa a questão da organização soviética foi muito discutida,
e os operários não viam muito claramente em que consistia o novo sistema; nem
se se podia constituir aparelho de Estado com os sovietes. Em nossa revolução
progredimos não pela via teórica, mas pela via prática. Assim, por exemplo,
jamais antes tínhamos colocado teoricamente a questão da Assembléia
Constituinte e jamais dissemos que não a reconhecíamos. Somente mais tarde,
depois que as instituições soviéticas se espalharam por todo o país
conquistaram o poder político, decidimos dispersar a Assembléia Constituinte.
Vemos atualmente que a questão se coloca com muito mais agudeza na Hungria e na
Suíça. De um lado é excelente que seja assim; quanto a isso temos a convicção
absoluta de que a revolução avança mais rapidamente nos países da Europa Ocidental
e que ela nos dará grandes vitórias. Mas, por outro lado, há um certo perigo e
esse é saber que a luta será de tal forma encarniçada e longa que a consciência
das massas operárias poderá não estar em condições de seguir esse ritmo. Ainda
hoje a significação do sistema dos Sovietes não está clara para as grandes
massas operárias alemãs politicamente instruídas, porque eles foram conduzidos
dentro do espírito parlamentar e de precedentes burgueses.
2 – Ponto relativo à propagação dos sistema dos Sovietes.
Quando nós vemos quão rapidamente a idéia dos Sovietes se espalha na Alemanha e
mesmo na Inglaterra, podemos dizer que esta é uma prova essencial de que a
revolução proletária vencerá. Só se poderá deter seu curso por pouco tempo. Mas
isso é outro caso quando os camaradas Albert e Platten vêm-nos declarar que não
há nada de Sovietes entre eles, no campo, entre os trabalhadores rurais e os
pequenos proprietários. Li, na Rote Fahne, um artigo contra os sovietes de
pequenos proprietários, mas (e isso é absolutamente certo) favorável aos
Sovietes de trabalhadores rurais e de camponeses pobres. A burguesia e seus
lacaios , como Scheidemann e companhia, já deram a palavra de ordem dos
Sovietes camponeses. Mas nós queremos apenas os Sovietes de trabalhadores rurais
e camponeses pobres. Resulta, infelizmente, dos relatos dos camaradas Albert e
Platten e outros que, à exceção da Hungria, muito pouco foi feito para a
expansão do sistema soviético. Isso talvez seja porque lá há um perigo bastante
considerável para a obtenção da vitória pelo proletariado alemão. Com efeito, a
vitória só será considerada segura quando estiverem organizados não só os
trabalhadores da cidade, mas também os proletários do campo e organizados não
mais como antes, dentro dos sindicatos e cooperativas, mas nos Sovietes.
Obtivemos a vitória com mais facilidade porque em outubro de 1917 nós
caminhamos junto com todo o campesinato. Nesse sentido, nossa revolução era
ainda burguesa. O primeiro passo de nosso governos proletário consistiu em que as
velhas reivindicações do campesinato, expressas ainda no governo de Kerenski
pelos Sovietes e assembléias de camponeses, foram atendidas pela lei editada
por nosso governo em 26 de outubro (antigo calendário) de 1917, dia imediato ao
da revolução. Nisso consistia nossa força e por isso foi fácil conquistar a
simpatia da ampla maioria. Para o campo, nossa revolução continua a ser
burguesa, mas, mais tarde, fomos forçados a começar, nos planos da organização
do Estado, a luta de classes no campo, a instituir em cada povoado comitês da
pobreza, de semiproletários, e a lutar sistematicamente contra a burguesia
rural. Isso era inevitável entre nós, pois a Rússia é um país atrasado. Isso
será totalmente diferente na Europa Ocidental e é por isso que devemos sublinhar
a necessidade absoluta da expansão do sistema dos Sovietes também entre a
população rural em formas correspondentes e talvez novas.
3 – Devemos dizer que a conquista da maioria comunista nos
Sovietes constitui a principal tarefa em todos os países onde o poder soviético
ainda não triunfou. Nossa comissão de resoluções estudou ontem esta questão.
Talvez outros camaradas também queiram dar sua opinião, mas eu gostaria de
propor que se adote este terceiro ponto sob a forma de resolução especial. Ele
vai sem dizer que nós não sabemos como prescrever sua via de desenvolvimento. É
de fato provável que em muitos países da Europa Ocidental a revolução eclodirá
rapidamente; em todo caso, nós, na qualidade de fração organizada dos operários
e do Partido, tendemos e devemos tender a obter a maioria nos Sovietes. Então
nossa vitória estará assegurada e não haverá mais nenhuma força em condições de
interpor o que quer que seja contra a revolução comunista. De outro lado, a
vitória não será tão fácil e não será duradoura.
RESOLUÇÃO SOBRE A POSIÇÃO EM RELAÇÃO ÀS CORRENTES
SOCIALISTAS E À CONFERÊNCIA DE BERNA
Já em 1907, no Congresso Internacional Socialista de
Stuttgart, quando a Segunda Internacional abordou a questão da política
colonial e das guerras imperialistas, se constatou que mais da metade da
Segunda Internacional e a maior parte dos seus dirigentes estavam, nessas
questões, mais próximos do ponto de vista da burguesia do que do ponto de vista
comunista de Marx e Engels.
Apesar disso, o Congresso de Stuttgart, adotou uma emenda
proposta pelos representantes da ala revolucionária, N. Lênin e Rosa
Luxemburgo, que começava nos seguintes termos:
“Se todavia inicia-se
uma guerra, os socialistas têm o dever de agir para seu fim imediato e utilizar
de todos os modos a crise econômica e política provocada pela guerra para
despertar o povo e apressar com isso o fim da dominação capitalista.”
No Congresso de Bâle, em novembro de 1912, convocado na
época da guerra dos Bálcãs, a Segunda Internacional declarou:
“Que os governos
burgueses não esqueçam como a guerra franco-alemã deu origem à insurreição
revolucionária da Comuna, e que a guerra russo-japonesa colocou em movimento as
forças revolucionários da Rússia. Aos olhos dos proletários é um crime se
entrematar para aumentar o lucro dos capitalistas, em proveito da rivalidade
dinástica e da proliferação dos tratados diplomáticos.”
***
No final de julho e começo de agosto
de 1914, 24 horas antes de iniciar a guerra mundial, os organismos e
instituições competentes da Segunda Internacional ainda continuavam a condenar
a guerra que se aproximava como o maior crime da burguesia. As declarações
concordavam nesses dias e emanando dos partidos dirigentes da Segunda
Internacional constituem o ato de acusação mais eloquente contra os dirigentes
da Segunda Internacional.
Com o primeiro tiro de canhão disparado sobre os campos de
batalha, os principais partidos da Segunda Internacional traíram a classe
operária e passaram, sob o disfarce da “defesa nacional”, cada um para o lado
da “sua” burguesia. Scheidemann e Ebert na Alemanha, Thomas e Renaudel na
França, Henderson e Hyndman na Inglaterra, Vandervelde e De Brockère na
Bélgica, Renner e Pernestorfer na Áustria, Plékhanov e Roubanovitch na Rússia,
Branting e seu partido na Suécia, Compers e seus camaradas de idéias na
América, Mussolini e Cie na Itália, exortaram o proletariado a uma “trégua” com
a burguesia de “seu” país, a renunciar à guerra contra a guerra e servir de
carne de canhão para os imperialistas.
Foi neste momento que a Segunda Internacional faliu
definitivamente e pereceu.
Graças ao desenvolvimento econômico geral, a burguesia dos
países mais ricos, através de pequenas esmolas tiradas de seus ganhos enormes,
teve a possibilidade de corromper e seduzir a camada mais alta da classe
operária, a aristocracia operária. Os “companheiros de luta” pequeno-burgueses
do socialismo afluíram às fileiras dos partidos social-democratas oficiais e
orientaram pouco a pouco o seu curso no sentido da burguesia. Os dirigentes do
movimento operário parlamentar e pacífico, os dirigentes sindicais,
secretários, redatores e empregados da social-democracia, formaram uma casta de
uma burocracia operária, tendo seus próprios interesses de grupo, e que foi na
verdade hostil ao socialismo.
Devido a todas essas circunstâncias, a social-democracia
degenerou em um partido anti-socialista e chauvinista.
No seio da Segunda Internacional já se revelavam três
tendência fundamentais. Durante a guerra e no início da revolução proletária na
Europa, os contornos dessas três tendência se desenhavam já com toda nitidez:
1 – A tendência
social-chauvinista (tendência da “maioria”), em que os representantes mais
típicos são os social-democratas alemães, que hoje dividem o poder com a
burguesia alemã e que se tornaram os assassinos dos dirigentes da Internacional
Comunista, Karl Liebkencht e Rosa Luxemburgo.
Os social-chauvinistas se revelam hoje completamente como os
inimigos do proletariado e seguem o programa de “liquidação” da guerra que a
burguesia lhes ditou: fazer recair a maior parte dos impostos sobre as massas
trabalhadores, inviolabilidade da propriedade privada, manutenção do exército
nas mãos da burguesia, dissolução dos conselhos operários formados em todos os
lugares, manutenção do poder político nas mãos da burguesia – a democracia
burguesa contra o socialismo.
Apesar da aspereza com a qual os comunistas lutaram até aqui
contra os “social-democratas da maioria”, os operários reconheceram entretanto
o perigo com o qual esses traidores ameaçavam o proletariado internacional.
Abrir os olhos de todos os trabalhadores para o trabalho de traição dos
social-chauvnistas e colocar pela força das armas esse partido
contra-revolucionário fora desse quadro confuso, eis uma das tarefas mais
importantes da revolução proletária internacional.
2 – A tendência
centrista (social-pacifistas, kautskystas, independentes). Esta tendência
começou a se formar desde antes da guerra, principalmente na Alemanha. No
começo da guerra, os princípios gerais do “Centro” coincidiam quase sempre com
os dos social-chauvinistas. Kautsky, o chefe teórico do “Centro”, defendia a
política seguida pelos social-chauvinistas alemães e franceses. A Internacional
era apenas um “instrumento em tempo de paz”, “luta de classes em tempo de paz”,
tais eram as palavras de ordem de Kautsky.
Desde o início da guerra, o “Centro” (Kautsky, Victor Adler,
Turatia, MacDonald) se puseram a pregar a “anistia recíproca”, com relação aos
chefes dos partidos social-chauvinistas da Alemanha e da Áustria, por um lado,
da França e da Inglaterra por outro. O “Centro” preconiza essa anistia até
hoje, depois da guerra, impedindo assim os operários de fazerem uma idéia clara
sobre as causas do desmoronamento da Segunda Internacional.
O “Centro” enviou seus representantes a Berna para a
conferência internacional dos socialistas comprometidos, facilitando assim aos
Scheidemann e as Renaudel sua tarefa de enganar os operários.
É absolutamente necessários separar do “Centro” os elementos
mais revolucionários, e só se pode chegar a isso através da crítica implacável
e comprometendo os dirigentes do “Centro”. A ruptura organizativa com o
“Centro” é uma necessidade histórica absoluta. A tarefa dos comunistas de cada
país é determinar o momento desta ruptura segundo a etapa que o movimento
atingiu em cada um.
3 – Os comunistas.
No interior da Segunda Internacional onde esta tendência defendeu as concepções
comunistas-marxistas sobre a guerra e as tarefas do proletariado (Stuttgart
1907, resolução Lênin-Luxemburgo) essa corrente estavam minoria. O gruo da
“esquerda radical” (o futuro Spartakusbund) na Alemanha, o partido dos
bolcheviques na Rússia, os “tribunistas” na Holanda, o grupo de Jovens numa
série de países, formaram o primeiro núcleo da nova Internacional.
Fiel aos interesses da classe operária, esta tendência
proclamou desde o início da guerra a palavra de ordem de transformação da
guerra imperialista em guerra civil. Esta tendência se constitui hoje na
Terceira Internacional.
A conferência socialista de Berna, em fevereiro de 1919, foi
uma tentativa de galvanizar o que restava da Segunda Internacional.
A composição da Conferência de Berna demonstrou que o
proletariado revolucionário de todo o mundo nada tem em comum com esta
conferência.
O proletariado vitorioso da Rússia, o proletariado heróico
da Alemanha, o proletariado italiano, o partido comunista do proletariado
austríaco e húngaro, o proletariado suíço, a classe operária da Bulgária,
Romênia, Sérvia, os partidos operários de esquerda suecos, noruegueses,
finlandeses, o proletariado ucraniano, letão, polonês, a Juventude
Internacional, a Internacional de Mulheres, recusaram-se ostensivamente a
participar da Conferência de Berna dos social-patriotas.
Os participantes da Conferência de Berna, que têm ainda
algum contato com o verdadeiro movimento operário de nossa época, formaram um
grupo de oposição que, na questão essencial, pelo menos, “apreciação da
Revolução russa”, estão em oposição à astúcia dos social-patriotas. A
declaração do camarada francês Loriot, que estigmatizou a maioria da
Conferência de Berna como suporte da burguesia, reflete a verdadeira opinião de
todos os operários conscientes do mundo inteiro.
Na pretendida “questão das responsabilidades”, a Conferência
de Berna se moveu sempre nos limites da ideologia burguesa. Os social-patriotas
alemães e franceses fizeram-se mutuamente as mesmas censuras que se lançaram
reciprocamente os burgueses alemães e franceses. A Conferência de Berna se
perdeu em detalhes mesquinhos sobre tal ou qual diligência de tal ou qual
ministro burguês antes da guerra, não querendo reconhecer que o capitalismo, o
capital financeiro dos dois grupos de poder e seus vassalos social-patriotas
eram os principais responsáveis pela guerra. Uma olhadela no espelho seria
suficiente para que todos eles se reconhecessem como os responsáveis.
As declarações da Conferência de Berna sobre a questão
territorial estão cheias de equívocos. É precisamente desses equívocos que a
burguesia precisa. O senhor Clemenceau, o representante mais reacionário da
burguesia imperialista, reconheceu os méritos da conferência social-patriota de
Berna e lhe propôs participar de todas as comissões da conferência imperialista
de Paris.
A questão colonial revelou claramente que a Conferência de
Berna estava a reboque desses políticos liberais-burgueses da colonização que
justificam a exploração e a escravização das colônias pela burguesia
imperialista e procuram apenas mascara-las com frases
filantrópico-humanitárias. Os social-patriotas alemães exigiram que o domínio
das colônias alemãs pelo Reich fosse mantido, isto é, a manutenção da
exploração dessas colônias pelo capital alemão. As divergências que se
manifestaram sobre esse assunto demonstram que os social-patriotas da Entente
têm o mesmo ponto de vista dos negreiros, e considera natural a escravização
das colônias francesas e inglesas pelo capital metropolitano. Assim a
Conferência de Berna mostra que esqueceu completamente a palavra de ordem de
“Abaixo o política colonial”.
Na avaliação da “Sociedade das Nações”, a Conferência de
Berna mostra que segue a linha desses elementos burgueses que, pela aparência
enganadora da pretensa “Liga das Nações”, desejam banir a revolução proletária
que cresce no mundo inteiro. Em vez de desmascarar os estratagemas da
conferência dos aliados em Paris, como os de um bando que espolia as colônias e
os domínios econômicos, a Conferência de Berna a secunda, servindo-lhe de
instrumento.
A atitude servil da conferência, que entregou a uma
conferência governamental burguesa de Paris o trabalho de resolver a questão da
legislação de proteção ao trabalho, mostra que os social-democratas estão
conscientemente a favor da conservação da escravidão do trabalho assalariado
pelo capitalismo e estão prontos a enganar a classe operária com vagas
reformas.
As tentativas inspiradas pela política burguesa de fazer a
Conferência de Berna adotar uma resolução segundo a qual uma intervenção armada
na Rússia teria cobertura da Segunda Internacional não frutificaram graças aos
esforços da oposição. Esta vitória da oposição de Berna sobre os elementos
chauvinistas declarados é para nós a prova indireta de que o proletariado da
Europa Ocidental simpatiza com a revolução proletária da Rússia e de que está
pronto para lutar contra a burguesia imperialista.
Em seu temor de se ocupar deste fenômeno de importância
histórica mundial se reconhece o medo que toma conta desses vassalos da
burguesia diante da extensão dos conselhos operários.
Os conselhos operários constituem o fenômeno mais importante
depois da Comuna de Paris. A Conferência de Berna, ignorando esta questão,
manifestou sua indigência espiritual e sua falência teórica.
O congresso da Internacional Comunista considera a
“Internacional” que a Conferência de Berna tenta construir como uma
Internacional amarela de fura-greves, como um instrumento da burguesia.
O Congresso conclama os operários de todos os países a
empreenderem uma luta enérgica contra a Internacional amarela e a preservar as
massas mais amplas do povo desta Internacional de mentira e traição.
DECLARAÇÃO FEITA PELOS PARTICIPANTES DA CONFERÊNCIA DE
ZIMMERWALD AO CONGRESSO DA INTERNACIONAL COMUNISTA
As Conferência de Zimmerwald e de Kiethal tiveram sua
importância numa época em que era necessário unir todos os elementos
proletários dispostos de uma forma ou outra a protestar contra a carnificina
imperialista. No grupamento de Zimmerwald entraram, ao lado de elementos
nitidamente comunistas, elementos “centristas”, pacifistas e hesitantes. Esses
elementos centristas, como mostrou a Conferência de Berna, estão atualmente
unidos aos social-patriotas para lutar contra o proletariado revolucionário,
utilizando assim Zimmerwald em proveito da reação.
Ao mesmo tempo, o movimento comunista crescia em vários
países, e a luta contra os elementos centristas que obstaculizavam o
desenvolvimento da revolução social se tornava a tarefa principal do
proletariado revolucionário. O grupamento de Zimmerwald teve sua época. Tudo o
que havia de verdadeiramente revolucionário no grupamento de Zimmerwald passa e
adere à Internacional Comunista.
Os participantes abaixo de Zimmerwald declaram que
consideram dissolvido o grupamento de Zimmerwald e solicitam ao Bureau da
Conferência de Zimmerwald que remeta todos os seus documentos ao Comitê
Executivo da 3ª Internacional.
Rakovsky, Lênin, Trotsky, Platten
Decisão Referente ao Grupamento de Zimmerwald
Depois de escutar o relato do camarada Balabanov, secretário
do Comitê Socialista Internacional, e dos camaradas Rakovsky, Lênin, Trotsky e
Zinoviev, membros do grupamento de Zimmerwald, o primeiro Congresso de
Zimmerwald comunistas decide: considerar dissolvido o grupamento de Zimmerwald.
Decisão Referente à Questão da Organização
A fim de poder começar sem demora seu trabalho ativo, o
Congresso designa imediatamente os órgãos necessários, dentro da idéia de que a
constituição definitiva da Internacional Comunista deverá ser dada pelo próximo
congresso sob proposição do Bureau.
A direção da Internacional Comunista é confiada a um Comitê
Executivo. Este se compõe de um representante de cada um dos partidos
comunistas dos países mais importantes. Os partidos da Rússia, Alemanha,
Áustria alemão, Hungria, Federação dos Bálcãs, Suíça e Escandinávia devem
enviar imediatamente seus representantes ao primeiro Comitê Executivo.
Os partidos dos países que declararam aderir à Internacional
Comunista antes do segundo congresso obterão um lugar no Comitê Executivo.
Até a chegada dos representantes estrangeiros, os camaradas
dos países que têm lugar no Comitê Executivo se encarregam de assegurar os
trabalhos. O Comitê Executivo elege um bureau de cinco pessoas.
RESOLUÇÃO SOBRE A FUNDAÇÃO DA INTERNACIONAL COMUNISTA
PLATTEN – presidente - ...Agora, levo ao seu conhecimento
uma proposição apresentada pelos delegados Rakovsky, Gruber, Grimland,
Rudniansky.
Ela está apresentada assim:
“Os representantes do
Partido Comunista da Áustria alemã, do Partido social-democrata dos Bálcãs, do
Partido Comunista da Hungria, propõem a fundação da Internacional Comunista.
1 – A necessidade da
luta pela ditadura do proletariado exige a organização unificada, comum e
internacional de todos os elementos comunistas que se colocam neste terreno.
2 – Esta fundação é um
dever tanto mais imperioso quando atualmente tenta-se em Berna e talvez se
tente mais tarde em algum outro lugar restabelecer a antiga Internacional
oportunista e reunir todos os elementos confusos e hesitantes do proletariado.
Por isso é necessário estabelecer uma separação nítida entre os elementos
revolucionários proletários e os elementos social-traidores.
3 – Se a III
Internacional não for fundada pela Conferência a realizar-se em Moscou, isto
dará a impressão de que os partidos comunistas estão em desacordo, o que
enfraquecerá nossa posição e aumentará a confusão entre os elementos indecisos
do proletariado de todos os países.
4 – A constituição da
III Internacional é portanto um dever histórico absoluto, e a Conferência
comunista internacional a realizar-se em Moscou deve torná-la uma realidade.”
Esta proposição supõe que nós nos debruçamos sobre uma
resolução para sabermos se éramos uma conferência ou um congresso. A proposição
visa à constituição da III Internacional. A discussão é aberta.
Após a discussão, o
camarada Platten apresenta a proposição assinada por Rakovsky, Gruber,
Grimland, Rudniansky.
“Esta proposição, diz
ele, é feita a fim de conduzir a uma decisão sobre a fundação da III
Internacional.”
A resolução foi adotada por unanimidade menos 5 abstenções
(delegação alemã).
Decisão (04 de Março de 1919)
A
conferência Comunista Internacional decide constituir-se como III Internacional
e adotar o nome de Internacional Comunista. As proporções dos votos acordados
não sofreram alteração. Todos os partidos, organizações e grupos conservam o
direito, durante um período de 8 meses, de aderir definitivamente à III
Internacional.
PLATAFORMA DA INTERNACIONAL COMUNISTA
As contradições do sistema mundial, antes escondidas,
revelaram-se com uma força inaudita numa formidável explosão: a grande guerra
imperialista mundial.
O capitalismo tentou superar sua própria anarquia pela
organização da produção. Em vez de numerosas empresas concorrentes,
organizaram-se vastas associações capitalistas (sindicatos, cartéis, trustes),
o capital bancário se uniu ao capital industrial, toda uma vida econômica caiu
sob o poder uma oligarquia financeira capitalista, que, numa organização
baseada neste poder, adquiriu um domínio exclusivo. O monopólio suplanta a
livre concorrência. O capitalista isolado se transforma em membro de uma
associação capitalista. A organização substitui a anarquia insensata.
Mas na mesma medida em que, nos países, tomados separadamente,
os procedimentos anárquicos da produção capitalista são substituídos pela
organização capitalista, as contradições, a concorrência, a anarquia, atingem
na economia capitalista uma agudeza maior. A luta entre os maiores países
concorrentes conduz, com uma inflexível necessidade, à monstruosa guerra
imperialista. A sede de lucros levou o capitalismo mundial à luta pela
conquista de novos mercados, novas fontes de matérias-primas, mão de obra
barata dos escravos coloniais. Os países imperialistas que dividiram o mundo
inteiro entre si, que transformaram milhões de operários e camponeses da
África, Ásia, América e Austrália em bestas de carga, devem revelar, mais cedo
ou mais tarde, num grande conflito, a natureza anárquica do capital. Assim foi
cometido o maior de todos os crimes – a guerra mundial.
O capitalismo tentou disfarçar as contradições de sua
estrutura social. A sociedade burguesa é uma sociedade de classes. Mas o
capital dos grandes países “civilizados” se esforçou para ocultar as
contradições sociais. A expensa dos povos coloniais que destruiu, o capital
comprou seus escravos assalariados, criando uma comunidade de interesses entre
os exploradores e os explorados – comunidade de interesses dirigida contra as
colônias oprimidas e os povos coloniais amarelos, negros e vermelhos; ele
aprisionou o operário europeu ou americano à “pátria” imperialista.
Mas este mesmo método de corrupção contínua, que criou o
patriotismo da classe operária e sua sujeição moral, produziu, graças à guerra,
sua própria antítese. O extermínio, a sujeição total do proletariado, um
domínio monstruoso, o empobrecimento, a degeneração, a fome no mundo inteiro –
tal foi o preço último da paz social. E esta paz faliu. A guerra imperialista
transformou-se em guerra civil.
Uma nova época nasceu. Época de desagregação do capitalismo,
de sua derrocada interior. Época da revolução comunista do proletariado.
O sistema imperialista desaba. Problemas nas colônias,
fermentação entre as pequenas nacionalidades até o momento privadas de independência
revoltas do proletariado, revoluções proletárias vitoriosas em vários países,
decomposição dos exércitos imperialistas, incapacidade absoluta das classes
dirigentes de conduzir doravante os destinos dos povos – tal é o quadro da
situação atual no mundo inteiro.
A humanidade, cuja cultura foi totalmente devastada, está
ameaçada de destruição. Apenas uma força é capaz de salvá-la, e esta força é o
proletariado. A antiga “ordem capitalista” morreu. Não pode mais existir. O
resultado final dos processos capitalistas de produção é o caos, - e este caos
só pode ser vencido pela maior classe produtora, a classe operária. Ela é que
deve instituir a ordem verdadeira, a ordem comunista. Ela deve vencer a
dominação do capital, tornar as guerras impossível, anular a fronteiras entre
os países, transformar o mundo numa vasta comunidade que trabalha para si
mesma, realizar a solidariedade fraternal e a libertação dos povos.
Enquanto isso, o capital mundial se arma para o último
combate contra o proletariado. Sob o disfarce da Liga das Nações e das
tagarelices pacíficas, o capital envida seus últimos esforços para arrumar as
partes desconjuntadas dos sistema capitalista e dirigir suas forças contra a
revolução proletária irresistivelmente desencadeada.
A este novo e imenso complô das classes capitalistas, o
proletariado deve responder com a conquista do poder político, dirigir seu
poder contra seus inimigos, servir-se dele como alavanca para a transformação
econômica da sociedade. A vitória definitiva do proletariado marcará o início
da história da humanidade libertada.
A Conquista do Poder Político
A conquista do poder político pelo proletariado significa o
aniquilamento do poder político da burguesia. O aparelho governamental com seu
exército capitalista, comandado por um corpo de oficiais burgueses e de
“junkers”, com sua polícia e sua gendarmaria, seus carcereiros e seus juízes,
seus padres, seus funcionários, etc, constitui, nas mãos da burguesia, o mais
poderoso instrumento de governo. A conquista do poder governamental não pode se
reduzir a um troca de pessoas na constituição de ministérios, mas deve
significar o aniquilamento de um aparelho de estado estranho, colocado nas mãos
da força real, o desarmamento da burguesia, do corpo de oficiais
contra-revolucionários, das guardas brancas, o armamento do proletariado, dos
soldados revolucionários e da guarda vermelha operária; a destituição de todos
os juízes burgueses e a organização de tribunais proletários, a destruição do
funcionalismo reacionário e a criação de novos órgãos proletários de
administração. A vitória proletária é assegurada pela desorganização do poder
inimigo e a organização do poder proletário, ela deve significar a ruína do
aparelho estatal burguês e a criação do aparelho estatal proletário. Somente
com a vitória completa, quando o proletariado tiver quebrado definitivamente a
resistência da burguesia, ele poderá obrigar seus antigos adversários a lhes
serem úteis, conduzindo-os progressivamente, sob seu controle, à obra de
construção comunista.
Democracia e Ditadura
Como todo Estado, o Estado proletário representa um aparelho
de coação e este aparelho é hoje dirigido contra os inimigos da classe
operária. Sua missão é quebrar a resistência dos exploradores, que empregam em
sua luta desesperada, todos os meios para afogar a revolução com sangue. Por
outro lado, a ditadura do proletariado fazendo oficialmente esta classe a
classe governante cria uma situação transitória.
Na medida em que for destruída a resistência da burguesia,
ela será expropriada e se transformará em uma massa trabalhadora; a ditadura do
proletariado desaparecerá, o Estado morrerá e as classes sociais desaparecerão
com eles.
A pretensa democracia, isto é, a democracia burguesa, não é
outra coisa que a ditadura burguesa disfarçada. A “vontade popular” tão
enaltecida é uma ficção, bem como a unidade do povo. De fato, as classes
existem porque os interesses contrários são irredutíveis. E como a burguesia é
apenas uma minoria insignificante, ela utiliza esta ficção, esta pretensa “vontade
popular” a fim de afirmar, com belas frases, seu domínio sobre a classe
operária, para impor-lhe a vontade de sua classe. Ao contrário, o proletariado,
constituindo a imensa maioria da população, usa abertamente o poder de suas
organizações de massa, de seus sovietes, para encaminhar a transição em direção
a uma sociedade comunista sem classes.
A essência da democracia burguesa reside no reconhecimento
meramente formal dos direitos e das liberdades, completamente inacessíveis ao
proletariado e aos elementos semiproletários, por causa da falta de recursos
materiais enquanto a burguesia tem todas as possibilidades de tirar partido
desses recursos materiais, de sua imprensa e de sua organização, para mentir e
enganar o povo. Ao contrário, a essência do sistema dos Sovietes, - deste novo
tipo de poder – consiste em que o proletariado tenha a possibilidade de
assegurar de fato seus direitos e sua liberdade. O poder dos Sovietes entrega
ao povo os mais belos palácios, as casas, as tipografias, as reservas de papel,
etc, para sua imprensa, para suas reuniões, seus sindicatos. Só então se torna
verdadeiramente possível a democracia proletária.
Com seu sistema parlamentar, a democracia burguesa dá o
poder às massas apenas com palavras, e suas organizações estão completamente
isoladas do poder verdadeiro e da verdadeira administração do Estado. No
sistema dos Sovietes, as organizações das massas governam por si e para si, os
Sovietes chamam à administração do Estado um número sempre maior de operários;
apenas desta maneira todo o povo trabalhador é chamado a fazer parte
efetivamente do Estado. O sistema dos Sovietes se apóia nas organizações das
massas proletárias representadas pelos próprios Sovietes, as uniões
profissionais revolucionárias, as cooperativas, etc.
A democracia burguesa e o parlamento, pela divisão dos
poderes legislativo e executivo e com a ausência do direito de interpelação dos
deputados, acaba por separar as massas do Estado. O sistema dos Sovietes, ao
contrário, por garantir o direito de interpelação, pela reunião dos poderes
executivo e legislativo e, consequentemente, pela sua capacidade de constituir
coletivos de trabalho, liga as massas aos órgãos de administração. Esta ligação
é ainda assegurada pelo fato de que, no sistema dos Sovietes, as eleições não
se dão de acordo com divisões territoriais artificiais, mas coincidem com as
unidades locais de produção.
O sistema dos Sovietes assegura a possibilidade de uma
verdadeira democracia proletária, a democracia para o proletariado e no
proletariado, dirigida contra a burguesia. Neste sistema, uma posição de
destaque é assegurada ao proletariado industrial, ao qual pertence, por sua
melhor organização e seu maior desenvolvimento político, o papel de classe
dirigente, cuja hegemonia permitirá ao semiproletariado e aos camponeses pobres
elevarem-se progressivamente. Essa superioridade momentânea do proletariado
industrial deve ser utilizada para afastar as massas não possuidoras da pequena
burguesia rural da influência dos grandes proprietários rurais e da burguesia,
para organizá-las e chamá-las a colaborar na construção comunista.
A Expropriação da Burguesia e a Socialização dos Meios de
Produção
A decomposição do sistema capitalista e da disciplina
capitalista do trabalho tornam impossível, dadas as relações entre classes, a
reconstituição da produção sobre as antigas bases. A luta dos operários por
aumento de salários, mesmo em caso de vitória, não leva à esperada melhoria das
condições de vida, o aumento dos preços dos produtos anula cada vitória. A luta
enérgica dos operários por aumento de salários nos países em que a situação é
evidentemente sem saída, por seu caráter impetuoso e apaixonado, por sua
tendência à generalização, torna impossível de agora em diante o progresso da
produção capitalista. A melhoria da condição dos operários não poderá ser
atendida sem que o proletariado se adone da produção. Para desenvolver as
forças produtivas da economia, para vencer mais rapidamente a resistência da
burguesia, que prolonga a agonia da velha sociedade criando o perigo de uma
completa ruína da vida econômica, a ditadura do proletariado deve realizar a
expropriação da grande burguesia e da nobreza e fazer dos meios de produção e
de transporte propriedade coletiva do Estado proletário.
O comunismo nasce agora sob os escombros da sociedade
capitalista; a história não deixou outra escolha à humanidade. Os oportunistas,
em seu desejo de retardar a socialização por sua utópica reivindicação de
restabelecimento da economia capitalista, não fazem senão adiar a solução da
crise e criar a ameaça de uma ruína total, enquanto a revolução comunista
aparece para verdadeira força produtiva da sociedade, para o proletariado – e
com ele, para toda sociedade – como o melhor, o mais seguro meio de salvação.
A ditadura do proletariado não ocasiona nenhuma dispersão
dos meios de produção e transporte. Ao contrário, sua tarefa é realizar uma
grande centralização dos meios e a direção de toda a produção segundo um plano
único.
O primeiro passo em direção à socialização de toda a economia
acarreta, necessariamente, as seguintes medidas: socialização dos grandes
bancos que hoje dirigem a produção; tomada pelo poder proletário de todos os
órgãos de poder do Estado capitalista que regem a vida econômica; tomada de
todas as empresa comunais; socialização dos ramos da indústria em que o grau de
concentração tende à socialização tecnicamente possível; socialização das
propriedades agrícolas e sua transformação em empresas agrícolas dirigidas pela
sociedade.
Quanto às empresas de menor importância, o proletariado
deve, lavando em consideração seu tamanho, socializá-las aos poucos.
É importante sublinhar aqui que a pequena propriedade não
deve ser expropriada e que os pequenos proprietários que não exploram o
trabalho de outrem não devem sofrer qualquer violência. Esta classe será aos
poucos atraída para a nova organização social; o exemplo e a prática deverão
demonstrar a superioridade da nova estrutura que liberta os pequenos
proprietários e a pequena burguesia do jugo dos capitalistas, de toda a
nobreza, dos impostos excessivos (principalmente pela anulação imediata dos
débitos para com o Estado, etc.).
A tarefa da ditadura do proletariado no domínio econômico só
se realiza na medida em que o proletariado souber criar os órgãos de direção da
produção centralizada e realizar a gestão pelos próprios operários. Para esse
fim será obrigado a aproveitar-se dessas organizações de massa que são mais
estreitamente ligadas com o processo de produção.
No domínio da distribuição, a ditadura do proletariado deve
realizar a substituição do comércio por uma justa repartição dos produtos.
Através de medidas indispensáveis para atingir este fim, é necessário indicar:
a socialização das grandes empresas comerciais, a transmissão ao proletariado
de todos os órgãos de distribuição do Estado e das municipalidades burguesas; o
controle das grandes uniões de cooperativas em que o aparelho organizado tenha
ainda, durante o período de transição, uma importância econômica considerável,
a centralização progressiva de todos esses órgãos e sua transformação num todo
único para a distribuição racional dos produtos.
Assim como no terreno da produção, no da distribuição é
importante utilizar todos os técnicos e especialistas qualificados – tão logo
sua resistência no terreno político seja vencida, e quando estiverem em
condições de servir, em vez do capitalismo, ao novo sistema de produção.
O proletariado não tem a intenção de oprimi-lo; ao
contrário, eles lhes dará a possibilidade de desenvolverem plenamente a
atividade criadora. A ditadura do proletariado substituirá a divisão do
trabalho físico e intelectual, própria do capitalismo, pela união, reunindo
assim o trabalho e a ciência.
Ao mesmo tempo em que expropriará as fábricas, as minas, as
propriedades, etc., o proletariado deverá pôr fim à exploração da população
pelos capitalistas proprietários de imóveis, transferir as grandes habitações
para os Sovietes operários locais, instalara a população operária nos
apartamentos burgueses, etc.
Durante esta imensa transformação, o poder dos Sovietes
deve, de uma parte, construir um grande aparelho de governo, mais centralizado
em sua forma, e, de outra parte, deve chamar para um trabalho imediato de
direção às camadas mais amplas do povo trabalhador.
O Caminho da Vitória
O período revolucionário exige que o proletariado use um
método de luta que concentre toda a sua energia, a saber a ação direta das
massas ate, e incluindo sua continuação lógica, o choque direto, a guerra
declarada com a máquina governamental burguesa. A esses objetivos devem estar
subordinados todos os outros meios, tais como a utilização revolucionária do
parlamento burguês.
As condições preliminares indispensáveis a esta luta
vitoriosa são: a ruptura, não apenas com os lacaios diretos do capital e os
verdugos da revolução comunista – cujo papel é hoje assumido pelos
social-democratas de direita, - mas também com o “Centro” (grupo Kautsky), que
no momento crítico, abandonam o proletariado e fazem aliança com seus inimigos
declarados.
Por outro lado, é necessário constituir um bloco com esses
elementos do movimento operário revolucionário que, ainda que antes não tenham
pertencido ao partido socialista, se colocam agora em tudo e por tudo sobre o
terreno da ditadura do proletariado sob a forma sovietista, isto é, com os
elementos correspondentes do sindicalismo.
O crescimento do movimento revolucionário em todos os
países, o perigo deste revolução ser abafada pela liga dos Estados burgueses,
as tentativas de união dos partidos traidores do socialismo (formação da
Internacional amarela de Berna), com o objetivo de servir ignobilmente à liga
Wilson, - e enfim a necessidade absoluta para o proletariado de coordenar seus
esforços -, tudo isso nos conduz, inevitavelmente, à fundação da Internacional
Comunista, verdadeiramente revolucionária e verdadeiramente proletária.
A Internacional, que se revelará capaz de subordinar os
interesses ditos nacionais aos interesses da revolução mundial, realizará assim
a ajuda mútua dos proletários dos diferentes países, pois sem esta ajuda mútua,
econômica e outra, o proletariado não tem condições de edificar uma sociedade
nova. De outra parte, em oposição à Internacional socialista amarela, a
Internacional proletária e comunista sustentará os povos explorados das
colônias em sua luta contra o imperialismo, a fim de acelerar a derrocada final
do sistema imperialista mundial.
Os malfeitores do capitalismo afirmavam no começo da guerra
mundial que eles apenas defendiam sua pátria. Mas o imperialismo alemão revelou
sua natureza bestial numa série de crimes sangrentos cometidos na Rússia, na
Ucrânia, na Finlândia. Hoje as potências da Entente revelam-se, mesmo para as
camadas mais atrasadas da população, como potências que pilham o mundo inteiro
e assassinam o proletariado. Em conluio com a burguesia alemã e os
social-patriotas, a palavra paz nos lábios, eles se esforçam por esmagar, com a
ajuda de tanques e tropas coloniais incompreensíveis e bárbaras, a revolução do
proletariado europeu. O terror branco dos burgueses-canibais foi
indescritivelmente feroz. As vítimas das fileiras da classe operária são
incontáveis, ela perdeu seus melhores combatentes: Liebknecht e Rosa
Luxemburgo.
O proletariado deve se defender em qualquer situação. A
Internacional Comunista chama o proletariado mundial para esta luta decisiva.
Arma contra arma! Força contra força! Abaixo a conspiração imperialista do
capital! Viva a República Internacional dos Sovietes Proletários!
TESES SOBRE A SITUAÇÃO INTERNACIONAL E A POLÍTICA DA ENTENTE
As experiências da guerra mundial desmascararam a política
imperialista das “democracias” burguesas como sendo a política de luta das
grandes potências, tendente à divisão do mundo e ao endurecimento da ditadura
econômica e política do capital financeiro sobre as massas exploradas e
oprimidas. O massacre de milhões de vidas humanas, o empobrecimento do
proletariado caído na escravidão, o enriquecimento inaudito das camadas
superiores da burguesia graças aos fornecimentos de guerra, aos empréstimos,
etc., o triunfo da reação militar em todos os países – tudo isso não tarda a
destruir as ilusões sobre a defesa da pátria, a trégua e a “democracia”. A
“política de paz” desmascara as verdadeiras aspirações dos imperialistas de
todos os países e leva até o fim esse desmascaramento.
A Paz de Brest-Litovsky e o Compromisso do Imperialismo
Alemão
A paz de Brest-Litovsky e em seguida aquela de Bucarest
revelaram a rapacidade e o reacionarismo das potências centrais. Os vencedores
isolaram a Rússia indefesa, sem contribuições e anexações. Utilizaram o direito
de livre determinação dos povos como pretexto para uma política de anexações,
criando Estados vassalos, onde os governos reacionários favoreciam a política
de rapina e repressão das massas trabalhadoras. O imperialismo alemão que, no
combate internacional, não tinha obtido a vitória completa, não teve nesse
momento a possibilidade de mostrar completamente suas verdadeiras intenções;
ele deveria se resignar a viver sob uma aparência de paz com a Rússia dos
Sovietes e cobrir sua política rapace e reacionária com frases hipócritas.
Ao mesmo tempo as potências da Entente, ainda que tivessem
obtido a vitória mundial, deixaram cair as máscaras e revelaram aos olhos de
todo o mundo o verdadeiro rosto do imperialismo mundial.
A Vitória da Entente e o Reagrupamento dos Países
A vitória da Entente dividiu em diferentes grupos os países
pretensamente civilizados do mundo. O primeiro grupo é constituído pelas
potências do mundo capitalista, as grandes potências imperialistas vitoriosas
(Inglaterra, América, França, Japão, Itália). Diante delas se colocam os países
do imperialismo vencido, arruinados pela guerra e abalados em sua estrutura
pelo início da revolução proletária (Alemanha, Áustria-Hungria com seus
vassalos de antes). O terceiro grupo é formado pelos países vassalos das
potências da Entente. Ele se compõe de pequenos países capitalistas, que
participaram da guerra às custas da Entente (Bélgica, Sérvia, Portugal, etc) e
das pequenas Repúblicas “nacionais” e Estados tampões criados recentemente
(República Tcheco-Eslovaca, Polônia, Repúblicas Russas contra-revolucionárias,
etc). Os países neutros se aproximam, segundo sua situação, dos países
vassalos, mas sofrem uma forte pressão política e econômica, que, às vezes,
torna sua situação semelhante àquela dos países derrotados. A República
socialistas russa é um estado operário e camponês colocando-se fora do mundo
capitalista e representando para o imperialismo vitorioso um grande perigo
social, o perigo de que todos os resultados da vitória desmoronem sob o assalta
da revolução mundial.
A “Política de Paz” da Entente ou o Imperialismo se
Desmascara
A “política de paz” das cinco potências mundiais, quando
consideradas em seu conjunto, era e é uma política que se desmascara
constantemente.
Apesar de todas as frases sobre sua “política externa
democrática”, ela constitui o triunfo completo da diplomacia secreta que, por
trás e às custas de milhões de operários de todos os países, decide os destinos
do mundo através de arranjos entre os detentores de poder dos trustes
financeiros. Todas as questões essenciais são tratadas sem exceção a portas
fechadas pelo comitê parisiense das cinco grandes potências, sem a presença dos
países vencidos, neutros e dos próprios países vassalos.
Os discursos de Lloyd George, de Clemenceau, de Sonnino,
etc, proclamam e tentam motivar abertamente a necessidade das anexações e das contribuições.
Apesar das frases mentirosas sobre a “guerra pelo
desarmamento geral”, proclamam a necessidade de ser armar ainda e antes de tudo
de manter o poderio marítimo britânico por causa de uma pretensa necessidade de
“proteção à liberdade de navegação”.
O direito de livre determinação dos povos, proclamado pela
Entente é manifestamente violado e substituído pela divisão dos domínios
contestados entre os países poderosos e seus vassalos.
Sem consultar a população, a Alsácia-Lorena foi incorporada
à França; Irlanda, Egito, Índia, não têm o direito de dispor sobre seus
próprios destinos; o Estado eslavo meridional e a República Tchecoslovaca foram
criados pela força das armas. Negocia-se sem vergonha sobre a divisão da
Turquia, da Europa e da Ásia, a divisão das colônias alemãs já começou, etc.
A política de contribuições chegou a um grau de completa
pilhagem dos vencidos. Não se apresentam aos vencidos contas que atingem
milhões e milhões, não só se lhes arrebatam todos os meios de guerra – mas
também suas locomotivas, estradas de ferro, navios, instrumentos agrícolas,
provisões em ouro, etc, etc... Além de tudo, os prisioneiros de guerra devem se
tornar escravos dos vencedores. Discutem proposições que devem levar os
operários alemães aos trabalhos forçados. As potências aliadas têm a intenção
de fazê-los escravos miseráveis e famintos do capital da Entente.
A política de emulação nacional conduzida ao máximo de sua
expressão pela excitação constante contra as nações vencidas através da
imprensa da Entente e das administrações de ocupação, assim como os bloqueios
de fome, condenam os povos da Alemanha e da Áustria ao extermínio. Esta
política leva aos progroms contra os alemães, organizados pelos que sustentam a
Entente – os elementos chauvinistas tchecos e poloneses, e aos progroms contra
os judeus, que ultrapassam todos os desmandos do czarismo russo.
Os Estados “democráticos” da Entente seguem uma política de
reação extrema.
A reação triunfa também no interior dos países da própria
Entente. Entre eles, a França voltou aos piores momentos de Napoleão III, que
em todo o mundo capitalista se encontra sob a influência da Entente. Os aliados
estrangulam a revolução nos países ocupados, Alemanha, Hungria, Bulgária, etc,
emulam os governos oportunistas-burgueses dos países vencidos contra os
operários revolucionários ameaçando-os de suprimir o fornecimento de víveres.
Os aliados declaram que afundarão todos os navios que ousarem hastear a
bandeira vermelha da revolução; eles se recusam a reconhecer os conselhos
alemães; nas regiões alemãs ocupadas, eles aboliram a jornada de oito horas.
Abstraindo o fato de sustentarem a política reacionária nos países neutros, e o
favorecimento desses nos países vassalos (o regime Paderevsky na Polônia), os
aliados excitaram os elementos reacionários desses países (na Finlândia,
Polônia e Suécia, etc.) contra a Rússia revolucionária e pedem a intervenção das
forças armadas alemãs.
Contradições entre os Países da Entente
Apesar da identidade de linhas fundamentais de sua política
imperialista, uma série de contradições profundas se manifestam no seio das
grandes potências que dominam o mundo.
Essas contradições se concentram sobretudo em torno do
programa de paz do capital financeiro americano (o dito programa Wilson). Os
pontos mais importantes deste programa são os seguintes: “Liberdade de
navegação”, “Sociedade das Nações” e “Internacionalização das colônias”. A
palavra de ordem “liberdade de navegação” – desembaraçada de sua máscara
hipócrita – significa na realidade a abolição do predomínio militar naval de
algumas grandes potências (em primeiro lugar, a Inglaterra), e a abertura de
todos os caminhos marítimos ao comércio americano. A “Sociedade das Nações”
significa que o direito à anexação imediata dos Estados e povos fracos será
recusado às grandes potências européias (em primeiro lugar à França). A
“internacionalização das colônias” fixa a mesma regra para os domínios
coloniais.
Este programa está condicionado pelos seguintes fatos: o
capital americano não possui a maior frota do mundo; não tem possibilidade de
proceder as anexações diretamente na Europa, e por isso ele visa à exploração
dos países e povos fracos através de relações comerciais e investimentos de
capitais. Por isso deseja constranger as outras grandes potências a formar um
sindicato dos trustes dos países, a repartir “honestamente” entre eles as
partes da exploração mundial e a transformar a luta entre os trustes de países
em uma luta puramente econômica. No domínio da exploração econômica, o capital
financeiro americano altamente desenvolvido obterá uma hegemonia efetiva que
lhe assegurará o predomínio econômico e político do mundo.
A “liberdade de navegação” está em contradição aguda com os
interesses da Inglaterra, do Japão, em parte também com os da Itália (no
Adriático). A “Sociedade das Nações” e “Internacionalização das colônias”. A
palavra de tradição decisiva com os interesses da França e do Japão – em menor
medida com os interesses de todas as outras potências imperialistas. A política
dos imperialistas da França, onde o capital financeiro tem uma forma
particularmente usurária, onde a indústria é pouco desenvolvida e onde a guerra
arruinou as forças produtivas, visa por meios desesperados à manutenção do
regime capitalista; esses meios são: a pilhagem bárbara da Alemanha, a
submissão direta e a exploração rapace dos países vassalos (projetos de uma
União Danubiana, dos Estados eslavos meridionais) e extorsão pela violência das
dívidas contraídas pelo czarismo russo próxima do Shylock francês. França e
Itália (e de uma forma alterada isto vale também para o Japão), na condição de
países continentais, são também capazes de seguir uma política de anexações
diretas.
Além de estarem em contradição com os interesses da América,
as grandes potências têm interesses que se opõem reciprocamente entre elas. A
Inglaterra teme o fortalecimento da França sobre o continente, ela tem
interesses na Ásia Menor e na África, interesses que se opõem aos da França. O
Japão disputa com a Austrália inglesa as ilhas situadas no Oceano Pacífico.
Grupos e Tendências no Interior da Entente
Essas contradições entre as grandes potências tornam
possíveis diferentes grupos no interior da Entente. Até agora duas combinações
principais estão delineadas: a combinação franco-anglo-japonesa, que está
dirigida contra a América e a Itália, e a combinação anglo-americana que se
opõe às outras grandes potências.
A primeira dessas combinações prevalece até o início de
janeiro de 1919, quando o Presidente Wilson não tinha ainda desistido de exigir
a abolição da dominação marítima inglesa. O desenvolvimento do movimento
revolucionário dos operários e soldados na Inglaterra, que conduz a uma entente
entre os imperialistas de diferente países para liquidar a aventura russa e
para apressar a conclusão da paz, reforça a inclinação da Inglaterra em direção
a esta combinação. Ela se torna predominante a partir de janeiro de 1919. O bloco
anglo-americano se opõe à prioridade da França na pilhagem da Alemanha e à
intensidade exagerada desta pilhagem. Ele coloca alguns limites às exigências
anexionistas exageradas da França, da Itália e do Japão. Ele impede que os
Estados vassalos recentemente fundados lhes seja diretamente submissos. No que
concerne à questão russa, a combinação anglo-americana tem disposições
pacíficas: deseja ter as mãos livres para completar a divisão do mundo, sufocar
a revolução européia e em seguida também a revolução russa.
A essas duas combinações de potências correspondem duas
tendências no interior das grandes potências, uma ultra-anexionista e outra
moderada, sendo que segunda sustenta a combinação Wilson-Lloyd George.
A Sociedade das Nações
Vistas as contradições irreconciliáveis existentes no
interior da Entente, a Sociedade das Nações – mesmo que ela exista só no papel
– desempenhará enquanto isso o papel de uma santa aliança entre os capitalistas
para repressão da revolução operária. A propagação da “Sociedade das Nações” é
o melhor meio para confundir a consciência revolucionária da classe operária.
Em vez da palavra de ordem de uma Internacional das repúblicas operárias
revolucionárias, lançam a de uma associação internacional de pretensas
democracias, devendo estar atenta para uma coalizão do proletariado e das
classes burguesas.
A “Sociedade das Nações” é a palavra de ordem mentirosa em
meio à qual os social-traidores sob a ordem do capitalismo internacional
dividem as forças proletárias e favorecem a contra-revolução imperialista.
Os proletários revolucionários de todos os países devem
levar uma luta implacável contra as idéias da Sociedade das Nações de Wilson e
protestar contra a entrada neste sociedade de roubo, exploração e
contra-revolução imperialista.
A Política Externa e Interna dos Países Vencidos
A derrota militar e o desmoronamento interior do
imperialismo austríaco e alemão causaram, nos países centrais e durante o
primeiro período da revolução, a dominação do regime burguês
social-oportunista. Sob a cor da democracia e do socialismo, os
social-traidores alemães protegem e restauram a dominação econômica e a
ditadura política da burguesia. Em sua política exterior visam ao
restabelecimento do imperialismo alemão exigindo a restituição das colônias e a
admissão da Alemanha na Sociedade de rapinas. Na medida em que se fortalecem na
Alemanha os bandos de guardas brancas e avança o processo de decomposição no
campo da Entente, as veleidades da burguesia e dos social-traidores de se
tornarem uma grande potência crescem também. Ao mesmo tempo o governo burguês
social-oportunista mina a solidariedade internacional do proletariado e separa
os operários alemães de seus irmãos de classe, executando as ordens
contra-revolucionárias dos aliados e sobretudo emulando os operários alemães
contra a revolução russa proletária para agradar a Entente. A Política da
burguesia e dos social-oportunistas na Áustria e na Hungria é a repetição da
política do bloco burguês-oportunista da Alemanha de forma atenuada.
Os Países Vassalos da Entente
Nos países vassalos e nas Repúblicas que a Entente acaba de
criar (Tchecoslováquia, países eslavos meridionais; é necessário também contar
a Polônia e a Finlândia, etc.) a política da Entente, apoiada pelas classes
dominantes e os social-nacionalistas, visa a criar centros de um movimento
nacional contra-revolucionário. Esse movimento deve ser dirigido aos países
vencidos, deve manter em equilíbrio as forças dos novos Estados e sujeitá-los à
Entente, deve frear os movimento revoluconários que nascem no seio das novas
repúblicas “nacionais” e fornecer, afinal de contas, guardas brancas para a
luta contra a revolução internacional e principalmente contra a revolução
russa.
No que concerne à Bélgica, a Portugal, à Grécia e a outros
pequenos países aliados à Entente, sua política é inteiramente determinada pela
dos grandes bandidos, aos quais estão completamente submetidos e aos quais
solicitam ajuda para obter pequenas anexações e indenizações de guerra.
Os Países Neutros
Os países neutros estão na situação de vassalos não
favorecidos pelo imperialismo da Entente. Tal como faz com os demais, a Entente
emprega, de forma atenuada, os mesmos métodos que emprega com os países
vencidos. Os países neutros favorecidos formulam diferentes reivindicações aos
inimigos da Entente (as pretensões da Dinamarca sobre Flensburg, a proposta
suíça da internacionalização do Reno, etc.). Ao mesmo tempo, eles executam as
ordens contra-revolucionárias da Entente (expulsão do embaixador russo,
recrutamento das guardas brancas nos países escandinavos, etc). Outros ainda
estão expostos ao perigo do desmembramento territorial (projeto da incorporação
da província de Limbourg à Bélgica e a internacionalização da embocadura do rio
Escault).
A Entente e a Rússia Soviética
O caráter rapace, anti-humanitário e reacionário do
imperialismo da Entente, se manifesta mais nitidamente diante da Rússia
soviética. Desde o início da Revolução de Outubro, as potências da Entente se
colocaram aos lado dos partidos e governos contra-revolucionários da Rússia.
Com a ajuda dos contra-revolucionários burgueses, eles anexaram a Sibéria, o
Ural, as costas da Rússia na Europa, o Cáucaso e uma parte do Turquestão. Eles
tiram matérias-primas desses países anexados (madeira, nafta, manganês, etc.).
Com a ajuda dos bandos tchecoslovacos a seu soldo, eles roubam a provisão de
ouro da Rússia. Sob a direção do diplomata inglês Lockhart e os espiões
ingleses e franceses explodiram pontes e estradas de ferro e tentaram
prejudicar o armazenamento de alimentos. A Entente forneceu armas e ajuda
militar aos generais reacionários Denikine, Koltchak e Krasnov, que fuzilaram e
enforcaram milhares de operários e camponeses em Rostov, Jousovka, Novorssijsk,
Omsk, et... Pelos discursos de Clemenceau e Pichon, a Entente proclama
abertamente o princípio do “isolamento econômico”, isto é, desejam levar fome e
destruição à República dos operários e camponeses revolucionários; prometendo
“apoio técnico” aos bandos de Denikine, Koltchak e Krasnov. A Entente recusou
em diferentes oportunidades as propostas de paz da potência soviética.
Em 23 de janeiro de 1919 as potências da Entente, no
interior das quais as tendências moderadas estão momentaneamente fortalecidas,
remeteram a todos os governos russo a proposta de enviar delegados à Ilha dos
Príncipes. Certamente esta proposta não está desprovida de uma intenção
provocadora em relação ao governo soviético. Ainda que a 4 de fevereiro a
Entente tenha recebido uma resposta afirmativa do governo soviético, resposta
na qual este se declarava pronto a examinar a questão das anexações, as
contribuições e as concessões, a fim de livrar os operários e os camponeses
russos da guerra que lhes foi imposta pela Entente – esta não respondeu a esta
proposta de paz da mesma forma que às outras.
Isto confirma que as tendências anexionistas-reacionárias
dos imperialistas da Entente se fundam sobre um terreno sólido. Ameaçam a
república socialista com novas anexações e novos assaltos
contra-revolucionários.
A “política de paz” da Entente desvela aqui definitivamente
aos olhos do proletariado internacional a natureza do imperialismo da Entente e
do imperialismo em geral. Ela prova ao mesmo tempo que os governos
imperialistas são incapazes de estabelecer uma paz “justa e duradoura”, e que o
capital financeiro é incapaz de recuperar a economia destruída. A manutenção da
dominação do capital financeiro conduzirá ou à destruição completa da sociedade
ou ao aumento da exploração, da escravidão, da reação política, do armamento e
finalmente a novas guerras destruidoras.
RESOLUÇÃO SOBRE O TERROR BRANCO
O sistema capitalista foi, desde o seu início, um sistema de
rapina e de assassinatos massivos. Os horrores da acumulação primitiva, a
política colonial que, com a ajuda da Bíblia, da sífilis e do álcool, levou ao
extermínio impiedoso de raças e povos inteiros; a miséria, a fome, o
esgotamento e a morte prematuros de incontáveis milhões de proletários
explorados, a repressão sangrenta da classe operária quando ela se insurgia
contra seus exploradores, e enfim a carnificina imensa e inaudita que
transformou a produção mundial numa produção de cadáveres humanos – eis a
imagem da ordem capitalista.
Desde o início da guerra as classes dominantes que, sobre os
campos de batalha mataram mais de dez milhões de homens e feriram muitos mais,
erigiram no interior de seus países também o regime da ditadura sangrenta. O
governo czarista russo fuzilou e enforcou operários, organizou progroms contra
os judeus, exterminou tudo o que vivia no país. A monarquia austríaca afogou em
sangue a insurreição dos camponeses e dos operários ucranianos e tchecos. A
burguesia inglesa assassinou os melhores representantes do povo irlandês. O
imperialismo alemão ficou enraivecido no interior de seu país e os marinheiros
revolucionários foram as primeiras vítimas desta brutalidade. Na França
abateram os soldados russos que não estavam prontos para defender os interesses
dos banqueiros franceses. Na América a burguesia linchou os internacionalistas,
condenou centenas entre os melhores proletários a vinte anos de trabalhos
forçados, abateu operários por causa das greves.
Quando a guerra imperialista começou a se transformar em
guerra civil, e as classes dominantes, os maiores malfeitores que a história
jamais conheceu, foram ameaçadas com o perigo imediato de desmoronamento do seu
regime sangrento, sua bestialidade se tornou ainda mais cruel.
Em sua luta pela manutenção da ordem capitalista, a
burguesia emprega os métodos mais inusitados, diante dos quais são quase nada
as crueldades da Idade Média, da Inquisição e da colonização.
A classe burguesa, diante de sua queda, destrói hoje
fisicamente a força produtiva mais importante da sociedade humana – o
proletariado, e é desmascarada presentemente por este terror branco em toda sua
hedionda nudez.
Os generais russos, personificação viva do regime czarista,
mataram e ainda matam em massa os operários com apoio direto ou indireto dos
social-traidores. Durante a dominação dos socialistas-revolucionários e dos
mencheviques na Rússia, milhares de operários e de camponeses lotaram as
prisões e os generais exterminavam regimentos inteiros por causa da
desobediência. Atualmente, os Krasnov e os Denikine, contando com a colaboração
benevolente da Entente, mataram e enforcaram dezenas de milhares de operários;
para aterrorizar os que ainda restavam deixaram os cadáveres expostos durante
três dias. No Ural e na região do Volga, enterraram-nos vivos. Na Sibéria, os
generais abateram milhares de comunistas, um número incontável de operários e
camponeses.
A burguesia alemã e austríaca assim como os social-traidores
mostraram sua natureza de canibais, quando na Ucrânia eles enforcaram em forcas
transportáveis por ferrovia os operários e camponeses que eles haviam saqueado,
assim como os comunistas, seus próprios compatriotas, camaradas alemães e
austríacos. Na Finlândia, país da democracia burguesa, eles ajudaram a
burguesia finlandesa a fuzilar entre treze e quatorze mil proletários e a
torturar e matar mais de quinze mil nas prisões.
Em Helsinque eles colocaram diante deles mulheres e crianças
para proteger das metralhadoras. Com seu apoio, as guardas brancas finlandesas
e as forças auxiliares suecas puderam entregar-se a orgias sangrentas contra o
proletariado finlandês derrotado. Em Tammefors forçaram as mulheres condenadas
à morte a cavar suas próprias sepulturas; em Viborg abateram centenas de
homens, mulheres e crianças finlandesas e russas.
No interior de seu país, a burguesia e a social-democracia
alemã pela repressão sangrenta da insurreição operária comunista, pelo
assassinato de Karl Liebknecht e Luxemburgo, matando e exterminando os
operários espartaquistas, chegaram ao último degrau da fúria reacionária. O
terror massivo e individual dos brancos – eis a bandeira que guia a burguesia.
Em outras países é idêntico o quadro que se nos oferece.
Na democrática Suíça está tudo pronto para a execução dos
operários caso eles ousem violar a lei capitalista. Na América, a prisão com
trabalhos forçados, a lei do linchamento e a cadeira elétrica aparecem como
símbolos destacados da democracia e da liberdade.
Na Hungria e na Inglaterra, na Boêmia e na Polônia – em
todos os lugares, a mesma coisa. Os assassinos burgueses não recuam diante de
nenhuma infâmia. Para consolidar sua dominação, eles desencadeiam o chauvinismo
e organizam, por exemplo, a democracia burguesa ucraniana, com o menchevique
Petlyura à frente; a da Polônia com o social patriota Pilsudsky e imediatamente
imensos progroms contra os judeus que superam de longe os que organizaram os
policiais do Czar. E se a canalha reacionária polonesa e “socialista”
assassinou os representantes da Cruz Vermelha russa, isto é apenas uma gota
d’água no mar de crimes e horrores do canibalismo burguês decadente.
A “Liga das Nações” que, segundo as declarações de seus
fundadores, deve conduzir à paz, vai em direção a uma guerra sangrenta contra o
proletariado de todos os países. As potências da Entente querem salvar sua
dominação traçando com exércitos mercenários o caminho em direção a um terror
de uma brutalidade inacreditável.
Maldizendo os assassinos capitalistas e seus criados
social-democratas, o primeiro Congresso da Internacional Comunista conclama os
operários todos os países para reunir todas as suas forças para pôr fim,
definitivamente, ao sistema de assassinato e rapina destruindo o poder do
regime capitalista.
DISCURSO DO CAMARADA TROTSKY
Camarada L. Trotsky (Rússia). – O camarada Albert disse que
o exército vermelho é freqüentemente, na Alemanha, objeto de discussão, e se
bem compreendi ele inquieta também os senhores Ebert e Scheidemann em sua
noites de insônia, isto é, eles temem a irrupção ameaçadora do Exército
Vermelho na Prússia Oriental. Quanto a irrupção, o camarada Albert pode
tranqüilizar os atuais senhores da Alemanha: felizmente ou infelizmente – isso
depende do ponto de vista – nós ainda não estamos lá. Em todo caso, no que
concerne às invasões que nos ameaçam, nossa situação é hoje bem melhor que à
época da paz de Brest-Litovsk. Isto é certo. Naquela época éramos ainda
crianças quanto ao desenvolvimento geral do governo soviético bem como quanto
ao do Exército Vermelho. Naquela época, o seu nome era ainda Guarda Vermelha
era composta pelas primeiras tropas de camponeses, pelas seções improvisadas de
operários revolucionários, que, imbuídos de espírito revolucionário, levaram a
revolução proletária de Petrogrado e Moscou para todo o território russo. Este
período durou até o primeiro choque desta Guarda Vermelha com os regimentos
regulares alemães, quando se viu claramente que esses grupos improvisados não
eram capazes de fornecer à República socialista revolucionária uma verdade
proteção uma vez que não se tratava apenas de vencer a contra-revolução russa,
mas de repelir um exército disciplinado.
Depois disso é que começa a mudança no estado de espírito da
classe operária em relação ao exército, e também a mudança de seus métodos de
organização. Pressionados pela situação, procedemos à construção de um exército
bem organizado, com consciência de classe. Pois em nosso programa há a milícia
popular. Mas falar de milícia popular, desta reivindicação política da
democracia num país governado pela ditadura do proletariado, é uma coisa
impossível, pois o exército é sempre estreitamente ligado ao caráter da força
que detém o poder. A guerra, como dizia o velho Clausewitz, é a continuação da
política, mas por outros meios. E o exército é o instrumento da guerra e deve
corresponder à política. O governo é proletário e, em sua composição social, o
exército deve corresponder a ele.
Assim nós introduzimos o senso na composição do exército.
Desde o mês de maio do último ano, passamos de exército de voluntários da
Guarda Vermelha ao exército que repousa sobre o serviço militar obrigatório,
mas nós não admitimos aí que os proletários ou os camponeses explorem mão de
obra externa.
É impossível falar seriamente de uma milícia popular na
Rússia, quando se tem em conta o fato de que tivemos, e ainda temos, vários
exércitos de classe inimigos sobre o território do Dom, um exército monárquico,
dirigido por oficiais cossacos. Pois tínhamos na região do Volga e do Ural o
exército da Constituinte, que era também, segundo sua concepção, o exército
“popular”, como se chamava. Este exército se dissolveu rapidamente. Esses
senhores da Constituinte ficaram em desvantagem, deixaram o terreno da
democracia do Volga e do Ural de uma maneira totalmente involuntária e
procuraram-nos para desfrutar a hospitalidade do governo soviético. O almirante
Koltchak simplesmente pôs em estado de prisão o governo da Constituinte e o
exército se transformou em um exército monárquico. Em um país que se encontra
em estado de guerra civil, só se pode constituir um exército segundo o
princípio da classe. Foi assim que fizemos – e com sucesso aliás.
A questão dos chefes militares tem levantado grandes
dificuldades para nós. Evidentemente, o primeiro cuidado era educar os oficiais
vermelhos, recrutados nas fileiras da classe operária e entre os filhos de
camponeses ricos. Desde o início executamos este trabalho, e mesmo aqui, diante
da porta desta sala, vocês podem ver bem os “sargentos” vermelhos que, em pouco
tempo, entrarão como oficiais vermelhos no exército soviético. Nós temos muitos
deles. Não quero dizer quantos, pois um segredo de guerra é sempre um segredo
de guerra. O número – digo – é grande, mas não podemos esperar que jovens
sargentos vermelhos se tornem generais vermelhos, pois o inimigo não gostaria
de nos deixar tempo para tão longo descanso. Para aproveitar com sucesso esta
reserva e torná-los homens capazes, nós devemos recorrer também aos antigos
chefes militares. Não vamos, evidentemente, procurar nossos oficiais nas
camadas superiores da carreira militar, mas entre os elementos mais simples
recrutamos forças todavia capazes, que nos ajudam hoje a combater seus antigos
colegas. De uma parte, bons e leais elementos compondo o antigo corpo de
oficiais, aos quais nós juntamos bons comunistas como comissários, e de outra
parte, os melhores elementos entre os soldados, os operários, os camponeses, para
os postos de comando inferiores. Desta maneira, formamos um corpo de oficiais
vermelhos.
Desde que a República soviética existe na Rússia, ela tem
sido sempre forçada a fazer a guerra e ela a faz ainda hoje. Temos um front de
mais de 8.000 quilômetros. No sul e no norte, no leste e no oeste, por todos os
lugares, de armas na mão, nos combatem e somos obrigados a nos defender.
Kautsky chegou a nos acusar de cultivarmos o militarismo. Ora, eu penso que se
nós desejamos conservar o poder dos operários, devemos nos defender seriamente.
Para nos defendermos, devemos aprender com os operários a fazer uso das armas
que eles forjam. Começamos por desarmar a burguesia e a armar os operários. Se
isso é militarismo, muito bem, então nós criamos nosso militarismo socialista e
perseveramos firmemente apoiando-nos sobre ele.
Segundo esta visão, nossa situação em agosto último era bem
má: não apenas estávamos cercados, mas o cerco contornava Moscou. Desde esta
época alargamos mais e mais o cerco e, nos últimos seis meses, o Exército
Vermelho reconquistou para a União Soviética pelo menos 700.000 quilômetros
quadrados, com uma população de aproximadamente 42 milhões de habitantes, 16
governos com 16 grandes cidades nas quais a classe operária tinha e tem o
costume de levar uma luta áspera. Ainda hoje, se de Moscou vocês traçarem sobre
o mapa uma linha numa direção qualquer prolongando-a, vocês encontrarão por
todos os lugares um camponês russo, um operário russo no front que, nessa noite
fria, se posta com seu fuzil na fronteira da República para defendê-la.
E posso assegurar a vocês que os operários comunistas que
formam verdadeiramente o núcleo deste exército se conduzem não apenas como o
exército de proteção da República Socialista russa, mas também como o Exército
Vermelho da III Internacional. E se nós temos hoje a possibilidade de dar
hospitalidade a esta conferência comunista para agradecer a nossos irmãos da
Europa Ocidental a hospitalidade que eles nos deram durante dezenas de anos,
nós o devemos, de nossa parte, aos esforços e aos sacrifícios do Exército
Vermelho, no interior do qual os melhores camaradas da classe operária
comunista agem como simples soldados, como oficiais vermelhos ou como
comissários, isto é, como os representantes diretos de nosso partido, do
governo soviético, e que, em cada regimento, em cada divisão, dão o tom
político e moral, isto é, ensinam com seu exemplo os soldados vermelhos como se
luta e se morre pelo socialismo. Entre esses homens, essas não são palavras
vazias, pois elas são seguidas de atos, e nessa luta nós perdemos centenas e
milhares dos melhores operários socialistas. Penso que eles não tombaram apenas
pela República soviética, mas também pela III Internacional.
E se hoje nós não pensamos também em invadir a Prússia
Oriental – ao contrário, ficaríamos felizes se os senhores Ebert e Scheidemann
nos deixassem em paz – isto é exato por enquanto, quando chegar o momento em
que os irmãos do Ocidente nos chamarem em seu auxílio, nos responderemos:
“Eis-nos aqui, durante este tempo nós aprendemos a manejar as armas, estamos
prontos para lutar e morrer pela causa da Revolução mundial!”
DISCURSO DE ENCERRAMENTO DE LÊNIN (7 de março de 1919)
Assim terminamos nosso trabalho.
Se pudemos nos reunir apesar de todas as dificuldades e da
repressão policial, se conseguimos, sem divergências essenciais, tomar, em
curto espaço de tempo, decisões importantes sobre todas as questões candentes
da época revolucionária atual, é porque as massas proletárias do mundo inteiro
colocaram todas essas questões praticamente na ordem do dia por seus atos e
começaram a resolvê-los na prática.
Resumimos aqui o que as massas já conseguiram conquistar em
sua luta revolucionária.
O movimento em favor dos Sovietes se estende sempre para
mais longe, não só nos países da Europa Ocidental, mas também nos países
vitoriosos como a Inglaterra, por exemplo; e esse movimento não é nada mais que
um movimento que tem como objetivo a criação de uma nova democracia proletária:
ele é o progresso mais considerável em direção à ditadura do proletariado, em
direção à vitória completa do comunismo.
Que a burguesia do mundo inteiro continue a seviciar, que
ela persiga, aprisione e inclusive assassine espartaquistas e bolcheviques,
isso de nada lhe servirá. Isso só poderá esclarecer as massas e determinar que
elas se livrem de seus velhos precedentes burgueses democráticos e se
retemperem na luta. A vitória da revolução proletária está assegurada no mundo
inteiro: A constituição da República Soviética Internacional está em andamento.
MANIFESTO DA INTERNACIONAL COMUNISTA AOS PROLETÁRIOS DO
MUNDO INTEIRO!
Há setenta e dois anos
o Partido Comunista apresentou ao mundo seu programa sob a forma de um
manifesto escrito pelos maiores profetas da Revolução proletária, Karl Marx e
Friedrich Engels. Já nessa época, o comunismo recém entrado em sua luta, era
oprimido pelas perseguições e mentiras, pela ira das classes possuidoras que
divisavam nele seu inimigo mortal. Durante esses três quartos de século, o
desenvolvimento do comunismo seguiu vias complexas, conhecendo alternadamente
as tempestades do entusiasmo e os períodos de desencorajamento, as vitórias e
as duras derrotas. Mas no fundo o movimento seguiu a rota traçada pelo
Manifesto do Partido Comunista. A hora da luta final e decisiva chegou mais
tarde do que esperavam os apóstolos da Revolução social. Mas ela chegou. Nós,
comunistas, representantes do proletariado revolucionário dos diferentes países
da Europa, América e Ásia, reunidos em Moscou, capital da Rússia sovietista,
nós nos sentimos herdeiros e os continuadores da obra cujo programa foi
anunciado a 72 anos.
Nossa tarefa é de generalizar a experiência revolucionária da classe
operária, de desvencilhar o movimento das mentiras impuras do oportunismo e do
social-patriotismo, de unir forças de todos os partidos verdadeiramente
revolucionários do proletariado mundial e com isso facilitar e acelerar a
vitória da Revolução comunista no mundo inteiro.
Hoje, quando a Europa está coberta de ruínas fumegantes, os maiores
culpados pelos incêndios se ocupam em procurar os responsáveis pela guerra.
Eles são seguidos por seus lacaios, professores, parlamentares, jornalistas,
social-patriotas e outros apoiadores políticos da burguesia.
Durante muitos anos o socialismo predisse a inelutabilidade da guerra
imperialista; ele viu suas causas n o desejo insaciável de lucro e de
propriedade das classes possuidoras dos dois principais concorrentes e em geral
de todos os países capitalistas. Dois anos antes da explosão, no congresso de
Bâle, os dirigentes socialistas responsáveis de todos os países denunciaram o
imperialismo como fator de guerra futura. Eles ameaçaram a burguesia de
desencadear sobre sua cabeça a Revolução social, vingança do proletariado
contra os crimes do capitalismo.
Hoje, após uma experiência de 5 anos, quando a história, pondo em dia os
apetites rapaces da Alemanha, desvela os procedimentos não menos criminosos dos
Aliados, os socialistas oficiais dos países da Entente, junto com seus
governos, não cessam de denunciar no kaiser alemão deposto o grande culpado
pela guerra. E mais, no seu abjeto servilismo, os social-patriotas alemães,
que, em agosto de 1914, fazendo do livro branco diplomático de Hohenzollern o
evangelho sagrado das nações, acusam agora por seu turno esta monarquia alemã
abatida, da qual foram fiéis servidores, de ser a causa principal da guerra.
Eles esperam assim a vez de esquecer o papel que desempanharam e ganhar a
indulgência dos vencedores. Mas ao lado do papel desempenhado pelas dinastias
derrotadas dos Romanov, Hohenzollern, dos Habsburgos e da súcia capitalista de
seus países, o papel das classes dirigentes da França, da Inglaterra, da Itália
e dos Estados Unidos aparece em toda sua amplitude criminosa à luz dos fatos
ocorridos e das revelações diplomáticas.
Até a explosão da própria guerra, a diplomacia inglesa não levantou um
milímetro de sua máscara misteriosa. O governo da City acreditava que se ele
declarasse categoricamente seu desejo de participar da guerra às custas da
Entente, o governo de Berlim não recuaria e não haveria a guerra. Por isso,
tudo se conduziu de modo a fazer esperar, de uma parte, em Berlim e em Viena, a
neutralidade da Inglaterra e a permitir, de outra parte, em Paris e Petrogrado,
que contassem firmemente com sua intervenção.
Preparada pela marcha da história durante várias dezenas de anos, a
guerra foi desencadeada por uma provocação direta e consciente da Grã-Bretanha.
O governo deste país tinha feito o cálculo de sustentar a Rússia e a França
apenas na medida necessária para esgotá-las esgotando a Alemanha, seu inimigo
mortal. Mas o poderio do sistema militar alemão surgiu mais perigoso e impôs
uma intervenção não mais aparente, mas real da Inglaterra.
O papel de espectador sorridente, ao qual a Grã-Bretanha aspirava por
tradição, coube aos Estados Unidos. O governo de Wilson aceitou tanto mais
facilmente o bloqueio inglês, quanto diminuíam as possibilidades de especulação
da Bolsa americana sobre o sangue europeu com que as potências da Entente
indenizaram com grandes recursos a burguesia americana por esta violação do
“direito internacional”. Enquanto a enorme superioridade militar da Alemanha
obrigou por seu turno o governo de Washington a sair do estado de neutralidade
fictícia em relação à Europa, os Estados Unidos se encarregaram da missão que a
Inglaterra havia cumprido em guerras passadas e que ela tinha tentado cumprir
na última guerra em relação ao continente: enfraquecer um dos campos
servindo-se do outro, e se envolver em operações militares apenas na medida
indispensável para assegurar todas as vantagens da situação. A aposta da
loteria americana não era grande, mas foi a última e assim lhe assegurou o
prêmio.
As contradições do regime capitalista se revelaram à humanidade com a
guerra, sob a forma de sofrimentos físicos: a fome, o frio, as doenças
epidêmicas e um recrudescimento da barbárie. Assim é jogada sem apelação a
velha disputa acadêmica dos socialistas sobre a teoria da pauperização e da
passagem progressiva do capitalismo ao socialismo. Os estatísticos e os
pontífices da teorias do arredondamento dos ângulos procuraram, durante dezenas
de anos, em todos os cantos do mundo, fatos reais ou imaginários capazes de
demonstrar o progresso do bem-estar de certos grupos ou categorias da classe
operária. A teoria da pauperização das massas era vista como enterrada sob os
apupos desdenhosos dos eunucos que ocupavam as tribunas da burguesia e dos
mandarins do oportunismo socialista. Agora não se trata apenas da pauperização
social, mas de um empobrecimento fisiológico, biológico, que apresenta diante
de nós toda a sua realidade hedionda.
A catástrofe da guerra imperialista varreu completamente todas as
conquistas das batalhas sindicalistas e parlamentares. E por isso esta guerra
nasceu das tendências internas do capitalismo da mesma forma que os negócios
econômicos ou os compromissos parlamentares que ela afogou no sangue e na
abjeção.
O capital financeiro, depois de ter precipitado a humanidade no abismo
da guerra, sofreu também durante esta guerra uma modificação catastrófica. O
estado de dependência em que estava colocado o papel-moeda diante do fundamente
material da produção foi definitivamente rompido. Perdendo mais e mais o seu
valor de meio e regulador da troca de produtos no regime capitalista, o
papel-moeda se transformou em instrumento de requisição, de conquista e em
geral de opressão militar e econômica.
A depreciação total das cédulas bancárias marcou a crise mortal geral
que afeta a circulação dos produtos no regime capitalista. Se a livre
concorrência, como reguladora da produção e da repartição, foi substituída nos
principais campos da economia pelo sistema de trustes e de monopólios, várias
dezenas de anos antes da guerra, o curso da própria guerra tirou o papel
regulador e diretor dos grupamentos econômicos para passá-lo diretamente ao
poder militar e governamental. A repartição das matérias-primas, a exploração
da nafta de Bakou ou da Romênia, do óleo de Donetz, do trigo da Ucrânia, a
utilização das locomotivas, dos vagões e automóveis da Alemanha, as provisões
de pão e carne da Europa faminta, todas essas questões fundamentais da vida
econômica do mundo não são reguladas pela livre concorrência, nem mesmo por
combinações de trustes e consórcios nacionais e internacionais. Eles caem sob o
jugo da tirania militar para lhe servir de salvaguarda a partir de hoje. Se a
absoluta sujeição do poder político ao capital financeiro conduziu a humanidade
à carnificina imperialista, esta carnificina permitiu ao capital financeiro não
apenas militarizar totalmente o Estado, mas militarizar-se a si mesmo, de
maneira que pode apenas cumprir suas funções econômicas essenciais a ferro e
sangue.
Os oportunistas que antes da guerra convidavam os operários a moderar
suas reivindicações sob o pretexto de passar lentamente ao socialismo, que,
durante a guerra, foram obrigados a renunciar à luta de classes em nome da
união sagrada e da defesa nacional, exigem do proletariado um novo sacrifício,
desta vez a fim de triunfar sobre as consequências assustadoras da guerra. Se
com tais pregações pudessem influenciar as massas operárias, o desenvolvimento
do capital se daria sacrificando inúmeras gerações, com formas novas, ainda
mais concentradas e mais monstruosas, com a perspectiva fatal de nova guerra
mundial. Felizmente para a humanidade isso não é mais possível
A estatização da vida econômica, contra a qual protestou tanto o
liberalismo capitalista, é um fato consumado. Voltar, não de todo, à livre
concorrência, mas apenas à dominação dos trustes, sindicatos e outros polvos
capitalistas, é de agora em diante impossível. A questão é unicamente saber
qual será, a partir de agora, aquele que adotará a produção estatizada: o
Estado imperialista ou o Estado do proletariado vitorioso.
Em outros termos, a humanidade trabalhadora em sua totalidade se tornará
a escrava tributária de uma corja mundial triunfante, que, sob a insígnia da
Liga das Nações, em meio a um exército “internacional” saqueará e estrangulará
uns, preservará outros, mas sempre e em todos os lugares aprisionará o
proletariado, com o fim único de manter sua dominação? Ou a classe operária da
Europa e dos países mais avançados das outras partes do mundo se apoderará da
vida econômica, mesmo desorganizada e destruída, a fim de assegurar sua
reconstrução em bases socialistas?
Abreviar o período de crise que atravessamos só é possível pelos métodos
da ditadura do proletariado, que não olha para o passado, que não conta com os
privilégios hereditários ou com o direito de propriedade, que, considerando
apenas a necessidade de salvar as massas famintas, mobiliza para isso todas as
forças, decreta para todo mundo a obrigação do trabalho, institui o regime da
disciplina operária, a fim de sanar, em alguns anos, as chagas vivas provocadas
pela guerra e conduzir a humanidade a uma altura nova e insuspeitada.
O Estado nacional, depois de ter dado um impulso vigoroso ao
desenvolvimento capitalista, se tornou mais estreito para a expansão das forças
produtivas. Este fenômeno tornou mais difícil a situação dos pequenos Estados
incrustados no meio das grandes potências da Europa e do Mundo. Esses pequenos
Estados nasceram em diferentes épocas a partir de fragmentos dos grandes, como
a miúda moeda destinada a pagar diversos tributos, com tampões estratégicos,
possuindo suas dinastias, suas castas dirigentes, suas pretensões
imperialistas, suas patifarias diplomáticas. Sua independência ilusória
baseou-se, até a guerra, exatamente como estava baseado o equilíbrio europeu,
sobre o antagonismo dos dois campos imperialistas. A guerra destruiu este
equilíbrio. Dado de início uma imensa vantagem à Alemanha, a guerra obrigou os
pequenos países a procurarem sua salvação na magnanimidade do militarismo
alemão. Vencida a Alemanha, a burguesia dos países pequenos, em combinação com
seus “socialistas” patriotas, se voltou para saudar o imperialismo triunfante
dos Aliados, e nos artigos hipócritas do programa de Wilson empenhou-se em
procurar as garantias para manutenção de sua existência independente. Ao mesmo tempo,
o número de pequenos países aumentou: da monarquia austro-húngara, do império
dos czares destacam-se novos Estados que, recém-nascidos, puseram-se
imediatamente a pegar uns nas gargantas dos outros por questões fronteiriças.
Os imperialistas Aliados, durante esse tempo, preparam combinações de pequenas
potências, antigas e novas, a fim de prender uns aos outros por uma raiva mútua
e uma fragilidade geral.
Arrasando e violentando os povos pequenos e frágeis, condenando-os à
fome e à humilhação, mesmo que pouco tempo antes os imperialistas dos impérios
centrais, os imperialistas aliados não parassem de falar do direito das
nacionalidades, direitos que eles pisoteiam com seus pés na Europa e no mundo
inteiro.
Só a Revolução proletária pode garantir aos pequenos povos sua
existência livre, pois ela libertará as forças produtivas de todos os países
dos tentáculos movidos pelos Estados nacionais, unindo os povos numa estreita
colaboração econômica, conforme um plano econômico comum. Só ela dará aos povos
mais fracos e menos populosos a possibilidade de administrar com liberdade e
independência absoluta sua cultura nacional, sem impor o menor dano à vida
econômica unificada e centralizada da Europa e do mundo.
A última guerra, foi em larga medida uma guerra pela conquista das
colônias, foi ao mesmo tempo uma guerra feita com a ajuda das colônias. Em
proporções até então desconhecidas, os povos coloniais foram arrastados para a
guerra européia. Os hindus, os negros, os árabes, os malgaches, foram batidos
em solo europeu, em nome de quê? Em nome de seu direito de permanecerem mais
tempo como escravos da Inglaterra e da França. Jamais o espetáculo da
desonestidade do Estado capitalista nas colônias foi tão edificante; jamais o
problema do escravismo colonial foi posto com tamanha acuidade.
Desde então uma série de revoltas ou movimentos revolucionários em todas
as colônias. Na Europa, a Irlanda lembrou com sangrentos combates de rua que
era ainda, e que tinha consciência de ser uma país escravizado. Em Madagáscar,
em Annam, em outros lugares, as tropas da república burguesa tiveram mais de
uma vez, ao longo da guerra, de abafar insurreições de escravos das colônias.
Na Índia, o movimento revolucionário não cessou um só dia. Ele chegou nesses
últimos tempos a greves operárias grandiosas, às quais o governo britânico
respondeu com a intervenção de carros blindados em Bombaim.
Assim a questão colonial está colocada em toda sua amplitude não somente
sobre o tapete verde do congresso de diplomatas de Paris, mas nas próprias colônias.
O programa de Wilson tem por objetivo, na melhor das interpretações, mudar a
etiqueta da escravidão colonial. A libertação das colônias não se dará ao mesmo
tempo que a libertação da classe operária das metrópoles. Os operários e os
camponeses não somente de Annam, Argélia ou Bengala, mas também da Pérsia e da
Armênia, não poderão desfrutar de uma existência independente antes que os
operários da Inglaterra e da França, depois de terem derrubado Lloyd George e
Clemenceau, tomem em suas mãos o poder governamental. Até o presente, nas
colônias mais desenvolvidas, a luta não se dá mais sob a bandeira da libertação
nacional, ela assume de imediato um caráter social mais ou menos evidente. Se a
Europa capitalista arrastou apesar delas os partidos mais atrasados do mundo no
turbilhão das relações capitalistas, a Europa socialista, por seu turno, virá
socorrer as colônias libertadas com sua técnica, sua organização, sua
influência moral, a fim de abrir passagem à vida econômica regularmente
organizada pelo socialismo.
Escravos coloniais da África e da Ásia: a hora da ditadura proletária na
Europa soará para vós como a hora da vossa libertação.
Todo mundo burguês acusa os comunistas de abolirem a liberdade e a
democracia política. Isso é falso. Tomando o poder, o proletariado apenas
manifesta a completa impossibilidade de aplicar os métodos da democracia
burguesa e cria as condições e as formas de uma democracia operária nova e mais
elevada. Todo o curso do desenvolvimento capitalista, em particular na última
época imperialista, solapou as bases da democracia política, não apenas
dividindo as nações em duas classes inimigas e irreconciliáveis, mas também
condenando ao enfraquecimento econômico e à impotência política múltiplas
camadas da pequena burguesia e do proletariado da mesma forma que os elementos
mais deserdados desse mesmo proletariado.
A classe operária dos países onde o desenvolvimento histórico permitiu,
utilizou o regime da democracia política para se organizar contra o
capitalismo. Esses será o mesmo futuro nos países onde não estão realizadas as
condições preliminares de uma revolução operária. Mas as massas da população
intermediária, nas vilas e nas cidades são mantidas pelo capitalismo em
completo atraso, várias épocas atrasadas em relação ao desenvolvimento
histórico.
O camponês da Baviera ou de Bade, ainda estreitamente vinculado ao
campanário de sua vida, o pequeno vinhateiro francês arruinado pela
falsificação de vinhos pelos grandes capitalistas, o pequeno fazendeiro
americano endividado e enganado pelos banqueiros e deputados, todas essas
camadas sociais rejeitadas pelo capitalismo, distantes da grande rota do
desenvolvimento histórico, estão convidadas no papel pelo regime da democracia
política a participar do governo do Estado. Na realidade, nas questões
fundamentais das quais depende o destino das nações, é uma oligarquia
financeira que governa nos bastidores da democracia parlamentar. Assim foi
recentemente na questão da guerra. É assim hoje na questão da paz.
Na medida em que a oligarquia financeira se dá ao trabalho de fazer
sancionar seus atos de tirania pelos votos parlamentares, o Estado burguês se
serve, para chegar aos resultados desejados, de todas as armas da mentida, da
demagogia, da perseguição da calúnia, da corrupção, do terror, que os séculos
passados de escravidão colocaram à sua disposição e que multiplicaram os
prodígios da técnica capitalista.
Exigir do proletariado, em sua última luta de morte contra o capital,
que observe piedosamente os princípios da democracia política equivaleria a
exigir de um homem que defende a sua existência e sua vida dos bandidos que
observa as regras artificiais e convencionais do boxe francês, instituídas por
seu inimigo e que seu inimigo não observa.
Em meio à devastação, aonde não apenas os meios de produção e de
transporte, mas também as instituição da democracia política não são mais que
um amontoado de fragmentos ensanguentados, o proletariado é obrigado a criar um
aparato para ele, que serve antes de tudo para conservar a coesão interna da
própria classe operária e que lhe dá a faculdade de intervir
revolucionariamente no desenvolvimento ulterior da humanidade. Este aparelho,
são os Sovietes.
Os antigos partidos, as antigas organizações sindicais se manifestam na
pessoa de seus dirigentes, incapazes não só de decidir, mas também de
compreender os problemas colocados pela nova época. O proletariado criou um
novo tipo de organização ampla, englobando as massas operárias
independentemente da profissão ou do grau de desenvolvimento político; um
aparelho flexível, capaz de perpétua renovação, de perpétuo alargamento,
podendo sempre arrastar para sua órbita as novas categorias e abranger as
camadas de trabalhadores vizinhos do proletariado da cidade e do campo. Esta
organização insubstituível da classe operária governando-se a si mesmo, lutando
e conquistando finalmente o poder político, fez em vários países a prova
prática; ela constitui a conquista e a arma mais poderosa do proletariado de
nossa época.
Em todos os países onde as massas trabalhadoras vivem uma vida
consciente se formam hoje e se formarão os sovietes de deputados operários,
soldados e camponeses. Fortalecer os sovietes, elevar sua autoridade, opô-los
ao aparelho governamental da burguesia, eis qual é atualmente o objetivo
essencial dos operários conscientes e leais de todos os países. Através dos
Sovietes, a classe operária pode escapar dos elementos de dissolução que levam
em seu interior os sofrimentos infernais da guerra, da fome, da tirania dos
ricos com a traição de seus antigos chefes. Através dos Sovietes, a classe
operária, da maneira mais segura e mais fácil, pode chegar ao poder em todos os
países onde os Sovietes reúnam a maioria dos trabalhadores. Através dos
Sovietes, a classe operária, senhora do poder, governará todos os domínios da
vida econômica e moral do país, como acontece hoje na Rússia. A ruína do Estado
imperialista, desde suas formas czaristas até as mais democráticas, dá-se com a
ruína dos sistema militar imperialista. Os exércitos de vários milhões de
homens mobilizados pelo imperialismo podem manter-se apenas durante o tempo que
o proletariado aceitar o jugo da burguesia. A destruição da unidade nacional
significa a destruição inevitável dos exércitos. Foi isso que aconteceu
primeiramente na Rússia, depois na Alemanha e na Áustria. É também o que se
deve esperar que aconteça em outros países imperialistas. A revolta do camponês
contra a burocracia monarquista ou “democrática” conduz inevitavelmente à
revolta dos soldados contra os oficiais, e em seguida a uma cisão caracterizada
entre os elementos proletários e burgueses do próprio exército. A guerra
imperialista, opondo as nações, se transformou e se transforma cada vez mais em
guerra civil opondo as classes.
As lamentações do mundo burguês sobre a guerra civil e o terror vermelho
constituem a mais monstruosa hipocrisia que jamais registrou a história das
lutas políticas. Não haveria guerra civil se a concorrência dos exploradores
que levaram a humanidade à beira do abismo não se opusessem a todo progresso
dos trabalhadores, se não se organizassem os complôs e os homicídios e não
solicitassem o auxílio armado estrangeiro para conservar ou restaurar seus
privilégios expropriados.
A guerra civil é imposta à classe operária por seus inimigos mortais. Se
ela não quer se suicidar e renunciar a seu futuro que é o futuro de toda a
humanidade, a classe operária não pode deixar de responder aos golpes de seus
agressores. Os partidos comunistas não suscitam nunca artificialmente a guerra
civil, se esforçam por diminuir-lhe tanto quanto possível sua duração todas as
vezes que ela surge como uma necessidade inelutável, de reduzir ao mínimo o
número de vítimas, mas acima de tudo assegurar a vitória do proletariado. Disso
decorre a necessidade de desarmar a tempo a burguesia, armar os operários,
criar um exército comunista para defender o poder do proletariado e a
inviolabilidade de sua construção socialista. Tal é o exército vermelho da
Rússia sovietista que surgiu e se desenvolveu como a muralha protetora das conquistas
da classe operária contra todos os ataques de dentro o de fora. Um exército
sovietista é inseparável de um Estado sovietista.
Conscientes do caráter universal de sua causa, os operários mais
avançados foram, desde os primeiros passas do movimento socialista organizado,
em direção de uma união internacional deste movimento. As bases foram, lançadas
em 1864 em Londres, pela Primeira Internacional. A guerra franco-alemã, da qual
nasceu a Alemanha dos Hohenzollern, destruiu a Primeira Internacional e ao mesmo
tempo deu a ela os partidos operários nacionais. Desde 1889, esses partidos se
reuniram em Congresso em Paris e criaram a organização da III Internacional.
Mas o centro de gravidade do movimento operário estava inteiramente colocado
nesta época sobre o terreno do nacional no quadro dos Estados nacionais, sob a
base da indústria nacional. Várias dezenas de anos de trabalho de organização e
reformas criaram uma geração de dirigentes cuja maioria aceitava em palavras o
programa da revolução social, mas a ele renunciaram na prática, afundados no
reformismo, numa adaptação servil à dominação burguesa. O caráter oportunista
dos partidos dirigentes da II Internacional se revelou claramente e conduziu à
maior falência da história mundial no momento em que o curso dos fatos
históricos reclamava dos partidos da classe operária métodos revolucionários de
luta. Se a guerra de 1870 trouxe consigo um golpe para a Primeira
Internacional, revelando que por trás de seu programa social e revolucionário
não havia ainda nenhuma força organizada de massas, a guerra de 1914 matou a
Segunda Internacional mostrando que por baixo das organizações poderosas das
massas operárias mantinham-se partidos convertidos em instrumentos dóceis da
dominação burguesa.
Essas observação não se aplicam apenas aos social-patriotas que passaram
nítida e abertamente para o campo da burguesia, que se tornaram seus delegados
preferidos e seus agentes de confiança, os verdugos mais seguros da classe
operária, elas se aplicam também à tendência centrista, indeterminada e
inconsciente, que tenta restaurar a II Internacional, isto é, perpetuar o
estreitamente das visões, o oportunismo, a impotência revolucionária de seus
círculos dirigentes. O Partido Independente da Alemanha, a maioria atual do
Partido Operário Independente da Inglaterra e todos os outros grupos
semelhantes tentaram de fato tomar os lugares que ocupavam antes da guerra os
antigos partidos oficiais da II Internacional. Eles se apresentam como outrora
com idéias de compromisso e unidade, paralisando por todos os meios a energia
do proletariado, prolongando a crise e multiplicando assim as infelicidades da
Europa. A luta contra o centro socialista é a conclusão indispensável da
vitória da luta contra o imperialismo.
Afastando para longe de nós as meias-medidas, as mentiras e a preguiça
dos partidos socialistas oficiais, caducos, nós, comunistas, unidos na III
Internacional, nós nos reconhecemos como continuadores diretos dos esforços do
martírio heróico aceito por várias gerações de revolucionários, da Babeuf a
Karl Liebkenecht e Rosa Luxemburgo.
Se a Primeira Internacional previu o desenvolvimento para o futuro e
preparou os caminhos, se a Segunda Internacional reuniu e organizou milhões de
proletários, a Terceira Internacional é a Internacional da ação das massas, a
Internacional da realização revolucionária.
A crítica socialista flagelou suficientemente a ordem burguesa. A tarefa
do partido comunista internacional é reverter este estado de coisas e edificar
em seu lugar o regime socialista. Convocamos os operários e operárias de todos
os países a se unirem sob a bandeira do comunismo que é desde já a bandeira das
primeiras grandes vitórias proletárias de todos os países! Na luta contra a
barbárie imperialista, contra a monarquia e as classes privilegiadas, contra os
Estado burguês e a propriedade burguesa, contra todas as manifestações e todas
as formas de opressão das classes e das nações, uní-vos!
Sob a bandeira dos Sovietes operários, da luta revolucionária pelo poder
e a ditadura do proletariado, sob a bandeira da III Internacional, proletários
de todos os países, uní-vos!
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